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quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Uma proposta modesta: a reforma do Brasil - Paulo Roberto de Almeida (2005)

Um leitor, que visitou um antigo site meu, encontrou esta pequena proposta de reformas, feitas mais de onze anos atrás.

terça-feira, 20 de dezembro de 2005

43) Uma proposta modesta: a reforma do Brasil


Monteiro Lobato, num de seus livros da série do Sítio do Pica-Pau Amarelo, atribuiu a Emília a tarefa de fazer uma "reforma da Natureza": coisa de corrigir alguns mal-feitos do Criador, e consertar o que parecia errado aos olhos de retrós de uma boneca de pano. Mas ele também tentou "consertar o Brasil" várias vezes, chegando até a enfrentar prisão devido algumas de suas sugestões [nota em 12/01/2017: petróleo, por exemplo].
Não creio que eu corra o mesmo risco agora; provavelmente vou receber apenas sorrisos condescendentes.
Em todo caso, dou primeiro o meu diagnóstico (muito rápido), depois um pequeno receituário, também rápido e rasteiro, já que nenhuma dessas tarefas será empreendida anytime soon... [nota em 12/01/2017: como eu tinha razão, podemos colocar muitos anos mais à frente.]

Uma proposta modesta: a reforma do Brasil
Paulo Roberto de Almeida

Prolegômenos:
Não creio que o Brasil necessite, tão simplesmente, de uma mera reforma econômica. Ele precisa, sobretudo, de várias reformas estruturais, a começar pelo terreno político, onde se encontra a chave para a resolução dos muitos problemas que explicam o nosso baixo desempenho econômico.

Primeira parte - O Diagnóstico

1. Constituição intrusiva demais, codificando aspectos de detalhe que deveriam estar sendo regulados por legislação ordinária.

2. Estado intrusivo, despoupador, perdulário, disforme e pouco funcional para as tarefas do crescimento econômico.

3. Legislação microeconômica (para o ambiente de negócios e para a regulação das relações trabalhistas) excessivamente intrusiva na vida dos cidadãos e das empresas, deixando pouco espaço para as negociações diretas no mercado de bens, serviços e de trabalho.

4. Preservação de monopólios, cartéis e outras reservas de mercado, com pouca competição e inúmeras barreiras à entrada de novos ofertantes.

5. Reduzida abertura externa, seja no comércio, seja nos investimentos, seja ainda nos fluxos de capitais, gerando ineficiências, preços altos, ausência de competição e de inovação.

6. Sistemas legal e jurídico atrasado e disfuncional, permitindo manobras processualísticas que atrasam a solução de controvérsias e criam custos excessivos para as transações entre indivíduos.

Segunda parte - A Reforma

1. Reforma política, a começar pela Constituição: seria útil uma “limpeza” nas excrescências indevidas da CF, deixando-a apenas com os princípios gerais, remetendo todo o resto para legislação complementar e regulatória. Operar diminuição drástica de todo o corpo legislativo em todos os níveis (federal, estadual e municipal), retirando um custo enorme que é pago pelos cidadãos; Proporcionalidade mista, com voto distrital em nível local e alguma representação por lista no plano nacional, preservando o caráter nacional dos partidos.

2. Reforma administrativa com diminuição radical do número de ministérios, e atribuições de diversas funções a agências reguladoras. Privatização dos grandes monstrengos públicos que ainda existem e são fontes de ineficiências e corrupção, no setor financeiro, energético, e outros; fim da estabilidade no serviço público.

3. Reforma econômica ampla, com diminuição da carga tributária e redução das despesas do Estado; aperto fiscal nos “criadores de despesas” irresponsáveis que são os legislativos e o judiciário; reforma microeconômica para criar um ambiente favorável ao investimento produtivo, ao lucro e para diminuir a sonegação e a evasão fiscal.

4. Reforma trabalhista radical, no sentido da flexibilização da legislação laboral, dando maior espaço às negociações diretas entre as partes; extinção da Justiça do Trabalho, que é uma fonte de criação e sustentação de conflitos; Retirada do imposto sindical, que alimenta sindicalistas profissionais, em geral corruptos.

5. Reforma educacional completa, com retirada do terceiro ciclo da responsabilidade do Estado e concessão de completa autonomia às universidades “públicas” (com transferência de recursos para pesquisa e projetos específicos, e os salários do pessoal remanescente, mas de outro modo fim do regime de dedicação exclusiva, que nada mais é do que um mito); concentração de recursos públicos nos dois primeiros níveis e no ensino técnico-profissional.

6. Abertura econômica e liberalização comercial, acolhimento do investimento estrangeiro e adesão a regimes proprietários mais avançados.

Brasília, 15 de dezembro de 2005.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Venezuela: relacoes "carnais" com o governo lulopetista? - Valor (telegramas do Itamaraty)

07/01/2017 às 11h43 5 
Brasil pressionava Venezuela por dívida bilionária com a Odebrecht 

SÃO PAULO  -  Em meio a dívidas bilionárias da Venezuela com a Odebrecht, o governo do Brasil pressionou autoridades do país vizinho a honrar os compromissos e quitar suas obrigações com a empresa. As informações constam em relatórios do Itamaraty produzidos durante o governo Dilma Rousseff, obtidos pela reportagem.
Os documentos afirmam que os atrasos, que vinham desde o governo de Hugo Chávez, chegaram a US$ 2 bilhões em 2014, já sob a Presidência de Nicolás Maduro. Outras empreiteiras, como Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa, e a Petrobras também viviam rotinas de atraso, de acordo com os despachos do Itamaraty, mas a Odebrecht era a mais afetada.
De acordo com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, o grupo baiano pagou US$ 98 milhões em propina na Venezuela desde 2006 -o maior valor em um país depois dos pagos no Brasil. Os documentos afirmam que empresas brasileiras tinham vantagens de dispensa de licitação no regime chavista em casos envolvendo "nações amigas".
Um dos despachos dizia que o governo local buscava, em uma "diplomacia do petróleo", fortalecer o apoio externo ao bolivarianismo com alianças comerciais.
A embaixada ressalta a importância da aproximação política entre Luiz Inácio Lula da Silva e Hugo Chávez, que morreu em 2013, para a concretização desses negócios.
Mas relata o clima de "insegurança jurídica" para o comércio com o país e o medo das empresas brasileiras de estatização de operações pelo governo local, como ocorreu com multinacionais de outros países.
"Não obstante Chávez ter dito, diversas vezes, que as empresas brasileiras estariam a salvo de expropriações, casos como a estatização da Techint argentina reforçam a conveniência de manter sempre fortes os laços políticos entre os dois países", diz documento de 2011.
Criatividade
Também em 2011, em um relatório enviado a Dilma, com informações prévias para um encontro dela com Chávez, a embaixada reforça a necessidade de cobrar do venezuelano "atitude mais assertiva com relação a dívidas e interesses de empresas e investidores brasileiros". "A parte venezuelana tem sido, via de regra, evasiva sobre o pagamento de tais obrigações, o que recomendaria uma intervenção presidencial objetiva", diz o documento.
Semanas depois, um despacho que descreve detalhes da reunião de Dilma e Chávez não traz informações sobre a questão. Na transcrição dos principais trechos da conversa, há um pedido do venezuelano por um teto mais alto de financiamento Brasil pressionava Venezuela por dívida bilionária com a Odebrecht do BNDES em projetos em seu país. Ele fala em "acelerar o cronograma de obras".
Dilma, segundo o despacho, sugere ir a Caracas com uma delegação de empresários e diz que a Odebrecht "pode ajudar muito com habitação". Ainda de acordo com a transcrição, Chávez diz à então presidente que a Odebrecht aceitou adotar um outro "mecanismo de
remuneração". Ele se referia a uma solução encontrada pela empresa para ser paga no país vizinho, chamada de "criativa" em um despacho: compensaria créditos detidos na área de construção civil com compras de nafta da Venezuela pela Braskem, braço petroquímico do grupo. Com os atrasos, a Odebrecht acabou retirando funcionários e parando projetos, como a construção da hidrelétrica Tocoma, em 2014.
Outro documento do Itamaraty, de 2011, relata cobrança de dívidas em encontro da diplomacia com Maduro, que então chanceler da Venezuela. O relato da reunião cita que foi dito ao venezuelano que, para continuar com uma boa relação bilateral, seria preciso "não criar dificuldades", mencionando as dívidas com a Odebrecht e subsidiárias da Petrobras. Maduro disse, segundo o documento, que Chávez ordenara a quitação da dívida. O diplomata pede "discrição, sem alto-falantes" ao venezuelano na negociação.
Além da hidrelétrica, a Odebrecht mantinha projetos em diversas áreas, como o metrô de Caracas, um monotrilho chamado "Cabletren Bolivariano" e um polo agrícola de soja intitulado "projeto agrário socialista Abreu e Lima".
Procurada, a empreiteira disse apenas que mantém compromisso de colaborar com a Justiça e que está implantando práticas de controle internas.
(Folhapress)

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Brazil in Transition: Beliefs, Leadership, and Institutional Change - book by Lee J. Alston, Marcus Andre Melo, Bernardo Mueller and Carlos Pereira

Published by EH.Net (January 2017)

Lee J. Alston, Marcus Andre Melo, Bernardo Mueller and Carlos Pereira:
Brazil in Transition: Beliefs, Leadership, and Institutional Change
Princeton: Princeton University Press, 2016. xviii + 259 pp. $39.50 (hardcover), ISBN: 978-0-691-16291-1.

Reviewed for EH.Net by Leonardo Weller, São Paulo School of Economics, FGV.

Brazil in Transition is an intriguing book that holds the reader’s attention throughout. Alston, Melo, Mueller and Pereira make a rather provocative claim: that Brazil is likely to grow into a developed economy because it is in the process of becoming an open, inclusive and fiscally sound society. This inevitably comes as a surprise because Brazil is in its worst economic crisis since the 1930s: GDP fell by 3.8% in 2015 and is expected to fall again by 3.2% in 2016; the government is running a fiscal deficit of 10% of GDP; inflation is way above the 4.5% target; unemployment is at two digits; and poverty has been rising quickly. If one reads the Brazilian press, the book seems out of place, to say the least. Yet this is precisely the reason why it is interesting, whether it is right or wrong. The authors refer to history to contradict the current hysteria. They claim that Brazil is likely to follow a development path that started in the 1990s. The present crisis would be a “bump in the road.”

The authors apply a version of the New Institutional Economics in which beliefs play a central role. Beliefs are the way the “dominant network” understands how the “world works.” Composed of politicians, entrepreneurs, the media and top civil servants, the dominant network builds institutions that they believe will deliver specific economic results.

In the 1960s and ‘70s, Brazil’s dominant network believed that the state was supposed to stimulate industrialization without redistributing wealth. The institutions put in place resulted in rapid growth and rising inequality. Brazil was ruled by a dictatorship and the well-being of the majority did not concern those in power. This changed, however, in the 1980s, when democratization enfranchised the people, so the need to promote social inclusion became part of the dominant network’s beliefs. The book analyzes in detail the 1988 Constitution as an institution forged to redistribute wealth and introduce checks and balances in statecraft. The new constitution extended the public retirement scheme to rural workers, required the state to provide universal free education and healthcare, and professionalized civil servant careers.

The constitution was inclusive but not fiscally sustainable. It required the state to increase expenditure, which resulted in enormous deficits. Four-digit inflation compromised economic growth and lowered real wages in the 1980s. Income concentration reached its record level in the early 1990s. The institutions designed to promote social inclusion failed to do so. Nevertheless, that frustrated outcome opened a “window of opportunity,” which the authors define as a crucial moment in which the dominant network may (or may not) adjust its beliefs and change institutions in order to improve economic results.

The authors claim that institutional change is not automatic: it takes leadership to bring about the transition. They assert that former President Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) was such a man to provide it. An influential intellectual and respected politician, Cardoso had the reputation and skills to form a strong coalition that transformed institutions for the better. The Real Plan controlled inflation and the Fiscal Responsibility Law reduced the fiscal deficit. In parallel, the Cardoso administration launched a number of social programs, universalized the access to basic education and privatized inefficient state-owned companies.

Though growth was dismal in the 1990s, price stability redistributed wealth. The public acknowledged the positive outcomes of orthodoxy, so former President Lula (2003-10), a left-wing trade unionist, maintained Cardoso’s main macroeconomic policies once in office. His successor and protégé Dilma Rousseff (2011-16) increased expenditure to boost demand but was impeached based on the fiscal laws approved under Cardoso. The book was released before President Michel Temer took office. As predicted in the foreword, his administration is attempting to rebalance fiscal accounts (though so far without success).

Brazil has indeed become a more inclusive, open society. The authors are persuasive when they assert that the changes in beliefs under Cardoso have driven the country into an institutional deepening process that works in an autopilot mode. Yet the conclusion that this process will transform Brazil into a developed economy is quite a stretch. It is true that development is more than growth, but it takes growth to make a developing economy into a developed economy. The book lacks an economic analysis to back its conclusion. It presents rather limited quantitative evidence. It ignores the consequences of deindustrialization and labor laws that date from the 1940s, when the country was industrializing. Legal rigidities between employers and employees keep productivity low in a service economy, and that has not changed at all.

Brazil’s extremely complex tax system is a fundamental problem for the book’s main argument. Since the 1990s the government has been increasing taxation to match the rise in expenditure that the 1988 Constitution requires. The conjunction of social inclusion and fiscal orthodoxy has pushed Brazil to the wrong side of the Laffer Curve, where companies either evade taxes or go out of business. Taxation alone may block economic development. It explains to a great extent why the investment rate is below 20%, which is far too low for sustainable growth.

Finally, the authors ignore the impact of the demographic bonus in social indicators, from education to income distribution. This is problematic because Brazil experienced one of the world’s quickest falls in fertility in the last six decades (precisely the period under analysis): the number of births per fertile woman fell from 6.2 to 1.8 since 1960. As a Brazilian who intends to retire at some point in life, I am afraid that the improvements in education the book joyfully describes have been too little too late. Schools are not forming the highly productive workers the country will need to support its aging population. The public pension scheme is already bankrupt and Brazil performs rather poorly in international education surveys. We will likely get old before getting rich.

Brazil in Transition has the merit of addressing the present crisis in a historical context. Though Alston, Melo, Mueller and Pereira are right in recognizing the country’s institutional changes since the 1990s, they fail to acknowledge that persistent economic problems are likely to keep it in the mid-income trap. A window of opportunity may appear in the near future, but, as the authors suggest, it will take leadership to make Brazil suitable for growth. This is guesswork rather than history, but it seems highly unlikely that President Temer will be the man to provide it.

Leonardo Weller’s research is on Latin America’s financial history, more specifically sovereign debt crises and rescue loans before the First World War.

Hannah Arendt: sempre atual



A permanência de Hannah Arendt

Aos 110 anos de seu nascimento, os fundamentos lançados pela pensadora continuam férteis

MÁRCIO FERRARI | 

Pesquisa Fapesp, ED. 250 | DEZEMBRO 2016

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Reprodução de cenas do documentário Hannah Arendt – Ein portrait (2006), do alemão Jochen Kölsch: escritos continuam atuais

Reprodução de cenas do documentário Hannah Arendt – Ein portrait (2006), do alemão Jochen Kölsch: escritos continuam atuais

Passados 110 anos de seu nascimento, completados em 14 de outubro, e 41 anos de sua morte, a pensadora alemã Hannah Arendt adquiriu status de autor clássico e desfruta de consenso em torno da importância de sua obra, segundo Celso Lafer, professor emérito da Universidade de São Paulo (USP). Lafer foi aluno de Hannah Arendt em 1965 na Universidade Cornell (Estados Unidos), época em que, segundo ele, a pensadora era conhecida, mas controversa, entre outros motivos, por seu diagnóstico da atuação de Adolf Eichmann, alto funcionário da Alemanha nazista encarregado da deportação em massa de judeus para campos de concentração. Para Arendt, o militar era como a peça de uma engrenagem, que agia sem os benefícios da razão e do pensamento, um homem comum, o que a levou a cunhar a expressão pela qual é mais conhecida do grande público, “a banalidade do mal”.

Sua reflexão sobre o julgamento de Eichmann em Israel (1961) foi publicada primeiro como reportagem para a revista New Yorker e depois no livro Eichmann em Jerusalém(1963). Arendt foi acusada de minimizar ou relativizar a crueldade do nazismo, sem que se percebesse a coerência de uma obra que teve seu marco fundador no livro As origens do totalitarismo (1951), no qual descreveu os regimes nazista e stalinista como voltados para uma dominação absoluta e que não poderiam ser estudados com referências do passado, dadas suas características inéditas.

É essa coerência, de acordo com Lafer, que hoje se reconhece e permite que sua obra produza reflexões em artigos e livros publicados anualmente. O ex-aluno recorre às condições reunidas pelo cientista político italiano Norberto Bobbio (1909-2004): sua obra é uma interpretação esclarecedora do século XX, instiga contínuas leituras e releituras, e seus conceitos se mantêm válidos para entender o mundo atual. “O que ela escreveu continua reverberando nos problemas com os quais nos defrontamos”, afirma Lafer, ex-presidente da FAPESP.

Os escritos de Arendt hoje não se restringem aos estudos exclusivos sobre teoria política – que a pensadora reivindicava como sua área de atuação, rejeitando o epíteto de filósofa –, mas se tornam ferramentas para pensar a educação (ver Pesquisa FAPESP nº 247), a condição da mulher, as relações internacionais ou as instituições norte-americanas (a pensadora viveu nos Estados Unidos de 1941 até sua morte, em 1975). “O desafio que Hannah Arendt se impôs foi como lidar com um mundo que perdeu os andaimes conceituais da tradição, sem recorrer ao corrimão de conceitos corroídos pela realidade”, diz Lafer. “Vem daí a importância da atividade do julgar, em toda sua complexidade, atentando para as singularidades de cada caso, sem subsumi-los a categorias universais.”

No lugar de conceitos utilizados de antemão, Hannah Arendt propôs a experiência. Nesse aspecto, foi uma autora privilegiada para a abordagem dos direitos humanos. A pensadora viveu a situação de apátrida desde que, por ser judia, foi perseguida, presa e destituída da nacionalidade alemã pelo regime nazista, em 1937, até conseguir a nacionalidade norte-americana, em 1951. Não é por outro motivo que o Centro de Estudos Hannah Arendt, ligado à Faculdade de Direito da USP, escolheu, como tema do colóquio dedicado a marcar os 110 anos do nascimento da pensadora, o tema A questão das migrações e os direitos humanos.

“Ela era muito crítica em relação aos direitos humanos estabelecidos pela Revolução Francesa”, diz Laura Mascaro, pesquisadora e coordenadora do centro, ao lado de Claudia Perrone-Moisés, professora da Faculdade de Direito da USP. “Para ela, esse conceito estaria vinculado ao pertencimento a um Estado e cessaria na medida em que estrangeiros não fossem mais úteis ao país em que se encontravam, o que levaria ao acolhimento de imigrantes apenas de forma precária.” Surge daí o conceito do “direito a ter direitos”, próprio de toda a humanidade e que deveria ser o fundamento de todo o direito internacional.

Laura é, com os pesquisadores Luciana Garcia de Oliveira e Thiago Dias da Silva, a responsável pela tradução dos artigos reunidos em Escritos judaicos, lançado este ano pela primeira vez no Brasil pela editora Manole. São ensaios a respeito de “uma das poucas causas em que ela se engajou, a construção da Palestina como um Estado federado binacional”, e relacionados à obtenção de direitos pelo povo judeu, destituído de pátria ao longo de séculos.

Segundo Laura, entre outros interesses atuais do texto, Hannah Arendt previa que, sem diálogos e acordos entre judeus e palestinos, além dos países vizinhos, Israel estaria destinado a se tornar um país em permanente estado de guerra. Sua proposta era a criação de um Estado binacional judeu-palestino estruturalmente diferente dos Estados-nações europeus. Seria uma democracia fundada em governos locais autônomos formados por judeus e árabes. As duas partes se organizariam para discutir os problemas comuns, em uma federação vertical de diversos níveis de conselhos.

Mundo compartilhado
A ideia da organização política por meio de um mundo compartilhado era cara a Hannah Arendt e fazia parte da preocupação com a necessidade de ampliar a democracia dos Estados modernos. O principal fator para isso seria a ação política de todo ser humano. “A ação política transborda a ideia de democracia representativa por não se restringir ao campo das instâncias definidas pelo direito”, esclarece André Duarte, docente do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), estudioso da obra da alemã.

De acordo com o pesquisador, o estudo da pensadora sobre o modus operandi do totalitarismo a fez detectar o estabelecimento da lógica de uma ideia – no caso do nazismo, a superioridade ariana. Essa lógica passa a ter condição de premissa, o que leva o Estado a prescindir de outros fundamentos, e isso produz solidão individualista e desconfiança geral na sociedade. “Um Estado não vinculado a fundamentos morais demandaria os espaços de compartilhamento, no qual a ação política constituiria sua própria essência”, afirma Duarte. Nem mesmo a liberdade seria uma finalidade em si, mas uma condição para a ação política.

Adriano Correia, professor de ética e filosofia política da Universidade Federal de Goiás (UFG), lembra que, para Arendt, a ação política só se exerce por quem ama o mundo. “Uma política que não é amada pelos indivíduos não abre espaço para a participação”, explica. Correia é autor da revisão técnica da nova edição (a 13ª) de A condição humana (1958), lançada em outubro pelo selo Forense Universitária do Grupo Editorial Nacional (Gen), com introdução da cientista política inglesa Margaret Canovan, hoje aposentada. Segundo ele, um dos aspectos fundamentais do livro é a apresentação da crítica da autora às democracias modernas por terem promovido o primado da economia sobre o campo da política. Embora Hannah Arendt tenha escrito o livro no período da Guerra Fria, observa Correia, ele tem sido mais discutido após a queda do Muro de Berlim (1989), em grande medida devido ao poder alcançado pelo capital internacional.

A filósofa Yara Frateschi, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (IFCH-Unicamp), considera o pensamento político de Arendt continuamente fértil “porque é muito crítico em relação ao funcionamento da sociedade, mas ao mesmo tempo interessado em seus potenciais”. De acordo com a pesquisadora, a pensadora defende que é preciso contrabalançar os conceitos universalistas com as diversidades, os contextos e as especificidades. “Para ela, o universalismo por si só poderia se tornar um fantasma que perpetuaria injustiças”, conta.

Segundo Yara, Arendt era uma entusiasta da desobediência civil e via os períodos revolucionários como propícios a experiências políticas interessantes, mas rejeitava absolutamente a violência política por ser “a destruição de pontes que propiciam a construção de acordos e leis para uma vida comum – toda violência levaria ao perigo da dissolução absoluta do indivíduo, como no totalitarismo”.

domingo, 8 de janeiro de 2017

Mario Soares; perfil de um democrata socialista - Alfredo Barroso

Mário Soares (1924-2017)
Breve retrato de um longo percurso político

Alfredo Barroso, 8/1/2017

Foi, sem dúvida, um político de todos os combates contra a ditadura, pela Liberdade, pela Democracia e pelos Direitos do Homem, considerado uma referência democrática em Portugal, na Europa e no Mundo
Não é fácil resumir em poucas palavras o longo percurso político de Mário Soares, que se estende por mais de sete décadas.

Foi, sem dúvida, um político de todos os combates contra a ditadura, pela Liberdade, pela Democracia e pelos Direitos do Homem, considerado uma referência democrática – não só em Portugal, como na Europa e no Mundo – tão simbolicamente como o foram, por exemplo, Winston Churchill, na Grã-Bretanha, ou o general De Gaulle, em França.

Desde muito jovem, Mário Soares foi um ativo resistente à ditadura de Salazar e Marcello Caetano. Além da sua militância política, sobretudo a partir do MUD Juvenil e da candidatura do General Norton de Matos a Presidente da República, Mário Soares defendeu, como advogado, muitos presos políticos, nos tribunais plenários criados pelo Estado Novo. Preso 12 vezes pela PIDE, foi deportado sem julgamento para a ilha de São Tomé em 1968, esteve exilado em França entre 1970 e 1974, e só pôde regressar a Portugal após o 25 de Abril.

Em poucas palavras, poderemos salientar quatro etapas fundamentais no percurso político de Mário Soares:

1. Fundador do Partido Socialista, um ano antes do 25 de Abril

Como activo resistente à ditadura de Salazar e Marcello Caetano, uma das preocupações fundamentais de Mário Soares foi a de constituir uma oposição de esquerda credível, independente e autónoma do Partido Comunista Português. Em suma: uma oposição republicana, socialista e democrática, defensora das liberdades, dos direitos humanos e de uma democracia pluripartidária, numa sociedade aberta.

Mário Soares consegue atingir esse objetivo, em várias fases:

Em 1953, funda, juntamente com Manuel Mendes, Fernando Piteira Santos, Gustavo Soromenho e Francisco Ramos da Costa, a Resistência Republicana e Socialista, grupo de reflexão que procurará construir uma nova alternativa de esquerda não comunista;

Em 1957, passa a integrar, em representação da Resistência Republicana e Socialista, o Diretório Democrato-Social, constituído, entre outros, por António Sérgio, Jaime Cortesão e Mário de Azevedo Gomes;

Em 1964, funda a Acção Socialista Portuguesa (ASP), com Francisco Ramos da Costa e Manuel Tito de Morais;

Em 1969, constitui a Comissão Eleitoral de Unidade Democrática (CEUD), que congrega vários representantes da oposição de esquerda não comunista, para enfrentar a primeira farsa eleitoral organizada por Marcello Caetano, o qual, não por acaso, elege Mário Soares como seu adversário principal;

Finalmente, em 19 de Abril de 1973, funda, com os seus companheiros da ASP, o Partido Socialista (PS), do qual virá a ser o Secretário-Geral até 1986.

2. Símbolo da luta contra a tentação totalitária, durante o PREC

A iniciativa de propor a fundação do PS foi uma ação política notável e premonitória de Mário Soares, que veio a revelar-se fundamental logo após o 25 de Abril, sobretudo durante o PREC (o chamado “Processo Revolucionário Em Curso”) e o célebre “Verão Quente” de 1975.

Foi a existência de um Partido Socialista consolidado e forte – sob a liderança de um democrata convicto, corajoso e lúcido como Mário Soares – que permitiu impedir que a jovem democracia portuguesa sucumbisse, dilacerada pela violenta luta política entre a tentação totalitária, de sinal comunista, e a reação saudosista dos velhos adeptos da ditadura. No célebre comício da Fonte Luminosa, no “Verão Quente” de 1975, Mário Soares escreve uma página crucial da história da democracia em Portugal.

3. Pioneiro da adesão e da integração de Portugal na CEE (hoje UE)

Institucionalizado o regime democrático em 1976 — num país ainda a sarar as feridas causadas pelo PREC, pela descolonização e pela desordem económica generalizada — foi também Mário Soares, como primeiro-ministro do I Governo constitucional, que iniciou e desbravou, a partir de 1976, o caminho que conduziria à adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (CEE) e à sua posterior integração na Europa comunitária, em 1985.

Entre 1976 e 1978, primeiro, e entre 1983 e 1985, depois, enfrentando e resolvendo a gravíssima crise económica e financeira herdada dos Governos da Aliança Democrática (AD), foi Mário Soares quem abriu e encerrou o ciclo da integração europeia de Portugal, outra página crucial da história da democracia em Portugal.

4. Notável “magistratura de influência” como Presidente da República

Finalmente, em 1986 – apesar da enorme dificuldade e extrema dureza de uma campanha eleitoral em que teve de enfrentar adversários da estatura política de Freitas do Amaral, Salgado Zenha e Lourdes Pintassilgo –, Mário Soares foi o primeiro civil a ser eleito Presidente da República após o 25 de Abril. Foi o culminar feliz, justo e natural de uma carreira política excepcional e também, como vários comentadores fizeram questão de sublinhar, a consagração de um “pai fundador da democracia portuguesa”.

Colocando-se numa posição suprapartidária, Mário Soares soube ser, durante 10 anos, “o Presidente de todos os portugueses”. Logo no início do seu primeiro mandato, encetou e exerceu uma verdadeira “magistratura de influência”, assim garantindo a estabilidade política e o equilíbrio de poderes essencial ao regime democrático — tendo consolidado, porventura por várias décadas, o regime semi-presidencial sabiamente consagrado na Constituição da República aprovada em 1976.

Se muitas outras razões não bastassem — numa carreira política tão longa, tão intensa e tão brilhante — estas quatro hão de ser mais do que suficientes para reservar a Mário Soares um lugar proeminente na História de Portugal, assim como na história das transições pacíficas da ditadura para a Democracia durante o último quartel do século XX.

Alfredo Barroso / Lisboa, 8 de Janeiro de 2017

Como os holandeses perderam o Brasil? Um livro do pesquisador Michiel van Groesen

Como os holandeses da Companhia das Índias Ocidentais perderam o Brasil? Bem, eles nunca o possuíram, de verdade. Conquistaram, pela força das armas, num momento em que a administração portuguesa tinha sido enfraquecida pela incorporação do reino de Portugal aos domínios da Casa espanhola (União Ibérica, 1580-1640), e depois tiveram dificuldades em manter, inclusive porque não pretendiam fazer nada de muito diferente do que os colonizadores portugueses já estavam fazendo. Esta exposição, e livro, jogam mais luz sobre a questão.

Paulo Roberto de Almeida

How Dutch Brazil was lost

The Amsterdam media played a major role in the rise and fall of Dutch Brazil, the colony held briefly by the Dutch West India Company in the 17th century. This is the conclusion reached by Professor of Maritime History Michiel van Groesen in his book ‘Amsterdam’s Atlantic’.
Amsterdam's Atlantic: Print Culture and the Making of Dutch Brazil 
Penn Press 272 blz. Hardcover | ISBN 978-0-8122-4866-1 | € 41,50 
Ebook | ISBN 978-0-8122-9345-6


Colony was front-page news

Few Dutch people know that from 1630 to 1654 Brazil was a Dutch colony even though in the Golden Age events in Brazil were for years front-page news for the period's many newspapers and pamphlets. This is the conclusion reached by Van Groesen based on his research on how contemporary media reported on the colony. 

Europe's media capital

Amsterdam at that time was Europe's media capital because of the city's relatively high level of press freedom. Newspapers were published weekly and there were also many pamphlets in circulation in the city. The Amsterdam media had significant influence on public opinion not only in the Netherlands but also in the rest of Europe where Dutch reports were translated into local languages.    
Andries van Eertvelt, The Dutch Conquest of  Salvador (Antwerp?, 1624?).
At that time it took seven to nine weeks before a ship brought news from Brazil to the Republic. 

Media initially enthusiastic

Initially, the papers wrote enthusiastically about the conflict in the New World. In the seventeenth century the Dutch Republic was at war with Spain, and in 1624 decided to launch a second front in Brazil, a Portuguese colony under Spanish rule. There were positive reports in the media about the many opportunities in the region: for the trade in sugar, for example, and as a means of expanding geopolitical influence. 

Lost battles and corruption

Opinion makers were under the influence of Amsterdam regents and merchants, who were originally positive, Van Groesen comments. But the newspapers quickly turned their attention to issues that the elite preferred to keep under wraps: battles lost and corruption in the colony being two such issues. Surprisingly enough, the slave trade was paid little attention by the media. The West India Company used African slaves for work in the colony.
A news report on the Dutch war fleet that was used in Brazil, Courante extraordinarij, 27 August 1624

Public opinion reversed

Brazil never came completely under Dutch control, which meant that money and troops had to be sent repeatedly to the colony. The media began to include critical reports of Amsterdam regents who were sceptical about the situation, unlike the regents in Zeeland who were more favourably disposed towards Brazil. Under the influence of the media, public opinion turned slowly but surely against the money-guzzling colony.   
Claes Jansz. Visscher, news print of the conquest of Olinda and Recife by the West India Company (Amsterdam, 1630)

WIC criticised

The propaganda bulletins from the WIC were ineffective in turning the tide of public opinion. Van Groesen also examined the correspondence of politicians and merchants of the period. Amsterdam merchants, too, began to oppose the monopoly enjoyed by the WIC, and consequently withdrew their support. 

‘Brazil was neglected’

When in 1645 the Portuguese were threatening to drive the Dutch out of Brazil, the Amsterdam regents blocked a proposal to send a fleet to the region. In 1654 the Portuguese managed to expel the Dutch completely and returned the colony to Portuguese rule. This loss was felt for a long time as a 'national disgrace', according to Van Groesen. Those who had wanted to retain Brazil talked about a 'Neglected Brazil'. 'People no longer wanted to talk about this scandal, which explains why so few Dutch people today know that Brazil was ever a Dutch colony.' 

(LvP)
Amsterdam's Atlantic: Print Culture and the Making of Dutch Brazil 
Penn Press 272 blz. Hardcover | ISBN 978-0-8122-4866-1 | € 41,50 
Ebook | ISBN 978-0-8122-9345-6

After Obama years, back to Kissinger years? - Eli Lake

Bom artigo, equilibrado, informativo, analítico.
Grato a meu amigo Stelio Amarante, pelo envio.
Paulo Roberto de Almeida

BLOOMBERG VIEW - POLITICS
Kissinger's Washington Is Coming Back Around
JAN 4, 2017 6:00 AM EST
By Eli Lake

Let’s take a moment to savor what looks to be Henry Kissinger’s final act. The man is 93 years old. At that age, most people are lucky to have enough energy for “Wheel of Fortune” and a few Facebook posts. Not Kissinger. These days, he’s playing the influence game against insiders who hadn’t even been born when he was Richard Nixon’s secretary of state.
Officials with Donald Trump’s transition team tell me Kissinger has spent several hours since the election advising incoming national security adviser Michael Flynn and his team. He’s also putting his network in place. He recommended his former assistant, K.T. McFarland, to be Flynn’s deputy, and urged Trump to nominate Rex Tillerson, the chief executive officer of Exxon Mobil, as his secretary of state. Kissinger is one of the few people in Trump’s orbit who can get him on the phone whenever he wants, according to one transition adviser.
That’s just behind the scenes. Consider that Kissinger is also an important validator for Trump in the press. When some Republicans questioned Tillerson’s closeness to Russian President Vladimir Putin, Kissinger defended the pick on “Face the Nation.” Kissinger helped soften the blow of Trump’s phone call with Taiwan’s president in December before the Committee of 100, which advocates for the U.S.-China relationship. Before that, Kissinger winged his way to Oslo to urge his fellow Nobel laureates to give the next president’s foreign policy a chance. It feels like 1975 all over again. I’m half-expecting to read something in the tabloids about a Kissinger affair with a Hollywood starlet.   
It should be said that almost all recent presidents and secretaries of state at one time or another have consulted Kissinger for advice. But in the Obama years, Kissinger was not that influential. After he co-authored an op-ed critical of the Iran nuclear deal, State Department deputy spokeswoman Marie Harf dismissed it as “big words and big thoughts” with few specifics.
It’s nonetheless strange that Kissinger would have Trump’s ear. To start, he is the author of many of the policies Trump is hinting he will undo. It’s not just the one-China policy, which forbids official recognition of Taiwan, even though it allows the U.S. to arm the island. Kissinger is also an architect of arms-control deals that recent Trump tweets suggest may be in jeopardy.
“Kissinger is apparently willing to advise someone who has publicly questioned the essential building blocks of the international system that Kissinger himself helped create,” Tim Naftali, a former executive director of the Richard Nixon Presidential Library and Museum, told me.
Then there’s the matter of how Trump won the presidency. Remember his closing argument: “For those who control the levers of power in Washington and for the global special interests, they partner with these people who don’t have your good in mind.” That’s not an unreasonable description of Kissinger’s own consulting firm, which has provided strategic advice to foreign governments and big corporations since 1982.
Of course, Kissinger has always contained multitudes. For his supporters, he is the American Metternich, the 19th-century Austrian diplomat and scholar who both shaped and explained the geopolitics of his era. It’s no coincidence that Metternich was a subject of Kissinger’s first book, published in 1957.
Niall Ferguson, the historian and Kissinger biographer, put it like this: “The reason Trump has turned to Kissinger is that he rightly sees him as the most brilliant and experienced geopolitical theorist and diplomatic practitioner in the United States today, and he realizes he could use Kissinger’s advice to sort out his strategic priorities.”
This is no doubt music to the ears of the Washington and New York foreign-policy establishment. For idealists on the left and right, however, Kissinger’s influence on Trump is a red flag. For all of his foreign-policy success, Kissinger is also an author of more dubious moments in Cold War history. He helped orchestrate the 1973 coup that toppled Chile’s elected president, Salvador Allende. Kissinger devised the strategy to bomb North Vietnamese Army positions in Cambodia, something he kept from Congress. This history earned Hillary Clinton a rebuke from Bernie Sanders during the Democratic primary, when he questioned the judgment of anyone who would consider Kissinger to be a personal friend.
But Kissinger is not just a bête noire for the left. He also clashed with neoconservatives when he was Richard Nixon’s national security adviser. Democratic Senator Henry “Scoop” Jackson pushed the Nixon administration to adopt sanctions on the Soviet Union tied directly to its treatment of Jewish dissidents. Kissinger famously opposed this policy because it would undermine his own policy to lower tensions with Moscow, known as detente.
As Trump prepares to take power, Russia is once again dividing Washington. The Obama administration just last week released a report from the FBI and Department of Homeland Security that concluded Russian intelligence services hacked leading Democrats and leaked the information to the press. Trump and his transition team have cast doubt on the intelligence. 
Kissinger hasn’t weighed in on that. But he has been saying for the past few years that it would be smart to find ways to work more closely with Putin. In a speech in February at the Gorchakov Foundation in Moscow, he said, “In the emerging multipolar order, Russia should be perceived as an essential element of any new global equilibrium, not primarily as a threat to the United States.”
This perspective meshes nicely with Trump’s own view that a deal can be done with Putin. Ferguson told me that one of the appeals of Kissinger for Trump is that voters were fed up with the approaches of George W. Bush and Barack Obama to foreign policy. “Kissinger was associated with neither approach, though he was much less openly critical of the former,” he said. “I think Trump is attracted to Kissinger’s reputation as a realist, though -- as I have argued -- this is rather an inaccurate characterization of him. He surely also appreciates the unique network of relationships Kissinger brings to the table: Think only of his regular meetings with Presidents Putin and Xi.”
Delicious. The president-elect who waged a campaign against global elites is turning to a man who knows most of them on a first-name basis. It’s an irony Henry Kissinger’s former clients likely appreciate.

Obama Years: a selection from the New Yorker - para admiradores e opositores

Não sou um "obamista" convencido, apenas um observador crítico dos seus anos na presidência da nação mais poderosa (mas isso não é importante) e a mais inventiva (isso sim é importante, mas os chineses veem atrás), do planeta, ainda e talvez por muitos anos no horizonte previsível. O balanço que faço dos seus anos, independentemente do que diga a New Yorker, é globalmente positivo. Um homem digno, uma mulher mais digna ainda, que tornaram os EUA melhores do que aquele país destruído pela ignorância política, pela irresponsabilidade econômica (e em política externa) de Bush filho.
Não vamos esquecer isso: em 2008, os EUA eram uma nação em frangalhos, e Obama devolveu um país melhor do que aquele que recebeu, e isso é indiscutível.
A força de Obama não está propriamente nele (ainda que seja, sem dúvida alguma, uma personalidade cativante, um espírito superior), e sim no povo americano, inclusive branco (ou seja, potencialmente praticante "natural" do Apartheid que ainda existe naquele país) que o elegeu, junto com os negros, que o consideraram que ele seria a sua (dos negros) salvação, o que ele não foi. Ele preferia acreditar na responsabilidade invidudual, o que acho que está certo: políticas de ação afirmativa podem melhorar a sorte de alguns, mas não são elas que vão melhorar a condição social de toda uma fração da população que foi, sem dúvida alguma, tremendamente maltradada pelos brancos majoritários. Mas, as políticas de ação afirmativa estão estacionando muitos negros no mesmo lugar, e os próprios negros deveriam recusá-las, arregaçar as mangas e estudar, estudar, estudar...
Como eu disse várias vezes, Obama faria um bom socialista europeu, empenhado em políticas moderadamente distributivistas, reguladoras (do grande capital, obviamente) e "justas" (com esse sentido de "justiça social" que só um socialista europeu possui).
Isso é verdade, mas é também verdade que o mesmo povo (OK, diferentes estratos dele) que lhe deu a vitória em 2008, agora dá a vitória a um fanfarrão, um sujeitinho execrável, mentiroso, ignorante, autoritário, enfim, um grande idiota, como é o Trump (Paul Krugman, de quem não sou particularmente fã, em sua fase publicista de esquerda, ainda que tenha admirado alguns de seus livros de economista, acaba de referir-se ao Trumpistão, em construção nos EUA).
Acredito que pessoas educadas sejam, em primeiro lugar, pessoas abertas à leituras de todos os tipos, mesmo de um magazine típico da intelectualidade novayorkina de esquerda como é o New Yorker, de esquerda, mas inteligente, como digo sempre...
Esta é a seleção deste domingo sobre os Obama years. Vamos ler, e aguardar o que vem por aí em torno desse sujeitinho lamentável que toma posse em 12 dias...
Paulo Roberto de Almeida
PS.: Não vou julgar o Trump pelo que ele diz (e tudo é horrível no que ele diz), mas pelo que ele fizer, efetivamente.

The New Yorker
A selection of stories from The New Yorker’s archive

The Obama Years
The election of Barack Obama suggested—and still suggests—that our country is capable of changing for the better in fresh, unexpected ways. This week, we bring you pieces that measure the transformations his Presidency both reflected and ushered in. In “The Conciliator,” written in 2007, Larissa MacFarquhar introduces us to Obama the Presidential candidate, a man who “has staked his candidacy on union—on bringing together two halves of America that are profoundly divided.” In “The Other Obama,” written the next year, Lauren Collins profiles Michelle Obama, who “chafes at being asked to make herself seem duller and less independent than she is.” In other, later pieces, Jelani Cobb reflects on what the Obama Presidency has meant to African-Americans, Ryan Lizza surveys the President’s foreign policy, and Jeffrey Toobin assesses his judicial legacy. Finally, in a piece based on interviews conducted before, during, and after Donald Trump’s election, I speak with the President about what he has accomplished—and what remains to be done—in the project to build a better America.
—David Remnick

The Conciliator
Obama’s aunt told him that his father had never understood that, as she put it, “if everyone is family, no one is family.” Obama found this striking enough so that he repeated it later on in his book, in italics: If everyone is family, no one is family. Universalism is a delusion. Freedom is really just abandonment.
BY LARISSA MACFARQUHAR
 
The Other Obama
It’s not that Michelle Obama doesn’t know the anodyne, wifely things to say (essentially, nothing). She is, after all, a “community and external affairs” professional. But her pride visibly chafes at being asked to subsume her personality.
BY LAUREN COLLINS

The Consequentialist
Most of the foreign-policy issues that Obama emphasized in his first two years involved stepping away from idealism. In the hope of persuading Iran’s regime to abandon its nuclear ambitions, Obama pointedly rejected Bush’s “axis of evil” terminology.
BY RYAN LIZZA

Barack X
The net result of this awkward balancing act is that Obama’s Presidency appears like a type of infidelity: married to America at large but conducting an affair with black people. As such, he speaks to us most often in veiled dispatches and surreptitious winks.
BY JELANI COBB

The Obama Brief
I asked President Obama to name the best Supreme Court decision of his tenure. When the Court upheld the constitutionality of the Affordable Care Act, in 2012? When it struck down the Defense of Marriage Act, a year later? Neither, it turned out.
BY JEFFREY TOOBIN

It Happened Here
Although Obama and his people admit that the election results caught them completely by surprise—“We had no plan for this,” one told me—the President sought to be reassuring. “This is not the apocalypse,” Obama said. History does not move in straight lines; sometimes it goes sideways, sometimes it goes backward.
BY DAVID REMNICK