Não creio que seja o caso, mas os especialistas não se cansam de apontar para a commoditização das exportações brasileiras e as importações de bens manufaturados, insistindo, grande parte deles, no problema cambial.
Curioso que poucos falam que os empresários industriais brasileiros, como os de outros setores, são esmagados por uma carga brutal de impostos, o que torna seus produtos pouco competitivos lá fora e aqui dentro também.
Quando vão acordar para o óbvio?
Distorção na indústria do Brasil
Alberto Tamer*
O Estado de S. Paulo, 4.03.2010
Há algo estranho no comércio exterior brasileiro. Sabemos que estamos nos transformando cada vez mais em exportador de commodities - as exportações representam 36,4% da nossa balança -, mas não sabíamos ainda que a indústria está importando cada vez mais matérias-primas e bens duráveis. Isto é, estamos importando produtos de consumo que também produzimos no País.
Em outras palavras, lembra editorial no caderno de Economia do Estado de ontem, isso parece indicar que nossa indústria está se transformando cada vez numa atividade de montagem, importando mais bens e insumos para vender no País, sem chegar a ter uma produção competitiva nos bens de alta tecnologia.
Estamos em parte abastecendo o mercado interno não mais com produtos fabricados, mas montados com itens importados. Leia-se, produtos da China, entre outros.
Não é uma desindustrialização, como se poderia dizer, mas um empobrecimento relativo da indústria nacional. É o que revelam os números da balança comercial no primeiro bimestre do ano anunciados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e comércio exterior.
COMMODITIZAÇÃO
Há explicações para isso, mas não convincentes. Afirma-se que é um processo decorrente do excepcional aumento dos preços das commodities nos anos dourados da economia mundial que antecederam à crise. Houve um crescimento extraordinário nas exportações de produtos agrícolas e minerais, que desde então passaram a dominar a pauta do comércio exterior. As vendas industriais também cresceram, mas em ritmo bem menor. O setor de commodities era mais bem estruturado que o setor industrial.
Outro motivo: a crise atingiu mais duramente a demanda de produtos industriais do que o agrícolas.
São argumentos válidos, mas não explicam totalmente esse aumento das importações (vejam bem, importações e não exportações de bens industriais, neste momento em que a economia mundial começa a se recuperar).
CAMBIO, ETC.
Há ainda o argumento da desvalorização do dólar que favorece as importações, e até ajuda no controle da inflação. Mas esse é um fenômeno que afeta toda a pauta comercial, desde produtos como commodities a produtos industriais. Sei que é mais difícil exportar bens acabados, com alto valor agregado, que produtos primários, principalmente num mercado mundial ainda em recuperação. Isso, porém, não explica nem justifica o aumento das importações de bens intermediários do setor industrial.
No fundo, tudo indica estar havendo uma falta de política industrial integrada, difícil de se obter quando os ministérios não se entendem.
A manter esse clima, a tendência é de que não só a agricultura continuará superando a indústria na área do comércio exterior, como a própria indústria caminha para o que poderíamos chamar de terceirização. É um processo ainda incipiente, mas perigoso por ser indolor.
1 BILHÃO DE FAMINTOS
Jamil Chade, correspondente do Estado em Genebra, está lançando hoje, no Shopping Higienópolis, a partir das 19h30, o seu livro O Mundo não é Plano. A tragédia silenciosa de 1 bilhão da Famintos. Um livro-análise-reportagem bem documentado sobre o drama da fome no mundo. Destaque especial para suas viagens à África e à Itália, onde viu de perto o desespero dos imigrantes ilegais que tentam fugir da fome.
*Email: at@attglobal.net
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Corrigindo o que disse ao início. Sim, tem que preste atenção aos fatores reais de desindustrialização, como abaixo:
Reflexões sobre a desindustrialização
Editorial
O Estado de S. Paulo, Quinta-feira, 4 de março de 2010
Na entrevista concedida ao Estado, o ex-ministro colombiano Mauricio Cárdenas, da Brookings Institution, não hesitou em afirmar que o Brasil já se está desindustrializando e se commoditizando, enquanto países como Índia e China apresentam melhor equilíbrio entre a produção de manufaturados e de matérias-primas.
A opinião merece melhor exame, ainda que os industriais brasileiros reconheçam que é fundamentada. Para eles, três fatores levaram a essa situação: o excesso de carga tributária, a péssima infraestrutura do País e uma taxa cambial valorizada.
São fatores que realmente contribuem para inibir o desenvolvimento da indústria brasileira, embora pelo menos um seja irremediável. Mas existem outros freando o crescimento de nossa economia.
Sem dúvida, a carga tributária excessiva é um obstáculo a um maior crescimento. Caberia aos empresários comprovar que uma redução de impostos levaria a uma melhoria da situação. A desoneração do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre carros e produtos da linha branca permitiu o aumento das vendas domésticas de produtos com grande conteúdo de bens importados, porém não das exportações. Nem favoreceu uma melhoria da inovação desses bens.
Na realidade, falta à nossa indústria investimentos em pesquisa para oferecer inovações que reduzam o custo da produção e atraiam os consumidores estrangeiros, objetivos alcançáveis com melhoria da produtividade e do processo de produção, além dos gastos em pesquisa.
Não se pode negar que as empresas encontram, interna e externamente, sério obstáculo no custo do transporte terrestre e portuário. Mauricio Cárdenas reconhece essa dificuldade e sugere que o Brasil dê mais atenção aos mercados dos EUA e da Europa. Neste caso, caberia à iniciativa privada dar sua colaboração.
A valorização do real parece resultar da melhor situação do Brasil, e à indústria cabe conviver com ela, compensando-a com melhora da produtividade.
A comparação com a China e a Índia é oportuna: em 2009, pelas últimas previsões, o PIB brasileiro deve ficar em -0,8%, ante +7,8% na China e +5% na Índia. Os dados disponíveis do 1º trimestre de 2009 são de -14,8% na produção de manufaturados, ante +28,6% e +6,4%, respectivamente, nos dois outros países. E o conteúdo de manufaturados nas exportações, em 2008, foi, respectivamente, de 5,9%, 7,5% e 8,1%. São números que dão o que pensar.
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