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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011
Afro-euro-descendentes? Acho que nao vai "colar"...
Isso destrói, quase completamente, uma das bases legitimadoras da campanha viciosa e viciada de militantes da causa racialista (e racista) negra em favor de políticas de ação afirmativa com base unicamente num corte "racial", ou fenotípico, em favor da comunidade em causa.
Acho que não vai detê-los, pois vão continuar argumentando sobre a dívida histórica, a injustiça da discriminação social, etc.
Mas pelo menos acaba com essa coisa de afrodescendente...
Paulo Roberto de Almeida
DNA de negros e pardos do Brasil é muito europeu
Reinaldo José Lopes
Folha de S.Paulo, 18/02/2011
No Brasil, faz cada vez menos sentido considerar que brancos têm origem europeia e negros são “africanos”. Segundo um novo estudo, mesmo quem se diz “preto” ou “pardo” nos censos nacionais traz forte contribuição da Europa em seu DNA. O trabalho, coordenado por Sérgio Danilo Pena, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), indica ainda que, apesar das diferenças regionais, a ancestralidade dos brasileiros acaba sendo relativamente uniforme. “A grande mensagem do trabalho é que [geneticamente] o Brasil é bem mais homogêneo do que se esperava”, disse Pena à Folha.
De Belém (PA) a Porto Alegre, a ascendência europeia nunca é inferior, em média, a 60%, nem ultrapassa os 80%. Há doses mais ou menos generosas de sangue africano, enquanto a menor contribuição é a indígena, só ultrapassando os 10% na região Norte do Brasil.
QUASE MIL
Além de moradores das capitais paraense e gaúcha, foram estudadas também populações de Ilhéus (BA) e Fortaleza (compondo a amostra nordestina), Rio de Janeiro (correspondendo ao Sudeste) e Joinville (segunda amostra da região Sul). Ao todo, foram 934 pessoas. A comparação completa entre brancos, pardos e pretos (categorias de autoidentificação consagradas nos censos do IBGE) só não foi possível no Ceará, onde não havia pretos na amostra, e em Santa Catarina, onde só havia pretos, frequentadores de um centro comunitário ligado ao movimento negro.
Para analisar o genoma, os geneticistas se valeram de um conjunto de 40 variantes de DNA, os chamados indels (sigla de “inserção e deleção”). São exatamente o que o nome sugere: pequenos trechos de “letras” químicas do genoma que às vezes sobram ou faltam no DNA. Cada região do planeta tem seu próprio conjunto de indels na população -alguns são típicos da África, outros da Europa. Dependendo da combinação deles no genoma de um indivíduo, é possível estimar a proporção de seus ancestrais que vieram de cada continente.
5 comentários:
Danilo Pena e Telma Birchal escreveram artigo publicado na Revista da USP:
"A inexistência biológica versus a existência social de raças humanas: pode a ciência instruir o etos social?"
http://www.usp.br/revistausp/68/02-sergio-telma.pdf
Transcrevo a passagem que apresenta o artigo:
Neste artigo abordaremos aspectos do conflito entre as visões biológica e social de “raça”, inicialmente mostrando as evidências científicas que suportam a tese de que, do ponto de vista biológico, raças humanas não existem (AAA, 1998). Em seguida, examinaremos a situação peculiar dos brasileiros, nos quais a ampla mistura de genes entre três diferentes grupos continentais fundadores – ameríndios, europeus e africanos – produziu uma fraca correlação de cor (um correlato de “raça”) com ancestralidade. Conseqüentemente, no Brasil, a cor, socialmente percebida, tem pouca ou nenhuma relevância biológica. Passaremos, a seguir, à discussão do relacionamento entre ciência e ética e à defesa da seguinte tese: embora a ciência não seja o campo de origem dos mandamentos morais, ela tem um papel importante na instrução da esfera social, pois, ao mostrar “o que não é”, ela liberta, ou seja, tem o poder de afastar erros e preconceitos. A seguir, pensaremos o problema da incorporação, pelo etos da sociedade, dos ensinamentos da genética. Sobre esse ponto, argumentaremos a favor da idéia de que o fato científico da inexistência das “raças” deve ser absorvido pela sociedade e incorporado a suas convicções e atitudes morais, no sentido de reforçar a oposição às afirmações de diferentes formas de hierarquia entre povos ou grupos humanos. Terminamos sugerindo que uma postura coerente e desejável seria a valorização da singularidade de cada indivíduo em substituição à sua identificação como membro de grupos “raciais” ou “de cor”.
Lindo o comentário acima. Mas quando um contratante prefere contratar um branco a um negro para qualquer tarefa, exceto limpar banheiros - esse preconceito é feito baseado na cor, na aparência externa ou fenótipo, não no genótipo. Portanto, independente do que diz a genética, o racismo existe sim, e negros não aparecem na propaganda do Banco na Avenida Paulista nem na propaganda de carro importado, nem nos cargos de direção, e assim por diante.
Rodrigo,
Nenhuma pessoa sensata nega a existência de racismo ou discriminação, não exatamente no Brasil, mas em toda em qualquer sociedade humana que tenha uma determinada dominância "racial" e na qual os "dominantes" expressam reservas quanto aos aspectos fenotípicos da "alteridade". Isso existe na Europa, no Japão, nos EUA, everywhere.
Quanto à propaganda, ouso discordar: ela é feita com base numa determinada percepção dos mercados, segmentados em termos de renda, mas já se pode notar uma presença negra, e mulata, crescente em todas as áreas, até para ser politicamente correto.
Em qualquer hipótese, o "racismo" só vai sobreviver enquanto a sociedade for justamente separada em raças, sendo absolutamente superado numa mistura total de todas as "etnias" da população.
Donde se conclui que a propaganda e a ação racialistas, baseadas na promoção de valores negros, africanos, ou seja lá o que for, é especialmente nefasta para esse ideal de mistura racial.
Quem são os racistas, afinal de contas? A sociedade em geral, ou os promotores do afrobrasileirismo?
Paulo Roberto de Almeida
A questão das cotas para alunos negros está na idéia de seguir o modelo americano de "ação afirmativa", se não me engano, e vincular as verbas educacionais do Estado à manutenção de um número mínimo de estudantes de cada minoria racial. Assim é nos Estados Unidos. No Brasil, cogita-se a criação de cotas apenas para os negros, até onde sei. Se vier a ocorrer, será um grande passo no caminho da americanização do País. Meus amigos esquerdistas me acusam de entreguista, apenas porque me rendo à tentação imperialista do Big Mac de vez em quando, não mais de duas vezes por semana. Mas alguns deles defendem cotas raciais nas universidades - e aí, duvido eu que poderia existir uma medida mais americana. O melhor pensamento racial no Brasil - Gilberto Freyre, Jorge Amado - sempre pregou a indefinição racial através da miscigenação como uma solução para o racismo nacional. Que saudades dos tempos em que os intelectuais brasileiros desfrutavam a autoconfiança necessária para se inspirar na originalidade do seu próprio país. Ao contrário do que ocorre nos Estados Unidos, escreviam, aqui as diferentes raças se gostam, se encontram e se misturam. O racismo que sobra dessa relação é muito menos violento que o americano, sinto muito, e ninguém vai me convencer do contrário. Conheço bem os dois países. Cotas raciais vão na contramão da tradição brasileira, estimulando uma definição racial mais nítida. É preciso determinar a cor de cada aluno em potencial para saber quem deve ser beneficiado pela ação afirmativa, afinal. Essa discussão toda me deu saudades do meu querido guru Richard Morse, que morreu no primeiro semestre do ano. Dr. Morse entendia da história das relações raciais no continente americano como nenhuma outra pessoa que li ou conheci na vida. Assistir a um seminário seu sobre o assunto era sempre um privilégio, para não dizer um tesão. Certa vez ouvi uma história a seu respeito que revela um pouco da sutileza do seu pensamento. No início dos anos 80, na universidade Stanford, na Califórnia, onde lecionava, Morse foi pressionado para aceitar uma jovem de origem mexicana como aluna de pós-graduação na faculdade de história. Ele foi contra, argumentando que a moça não reunia condições para enfrentar a vida acadêmica naquela instituição, que é uma das melhores do mundo. Mas acabou sendo voto vencido. A aceitação da aluna, representante de uma minoria racial, significava financiamento para a instituição e, diante dos dólares do governo federal, o comitê da faculdade resolveu dar-lhe uma chance. Com esse tipo de atitude, Morse ganhava a fama de reacionário na universidade, ou pior, racista (apesar de ser casado com uma negra haitiana, a Emy). Os professores "progressistas" não perdoavam sua heterodoxia. Após um ano de estudos na pós-graduação, a moça de origem mexicana ia mal nos estudos, confirmando a previsão do Morse, e um outro comitê da faculdade determinou que ela fosse convidada a encerrar o curso de doutorado, sem levar o diploma. Nesse momento aconteceu o inesperado. Numa reunião de todos os professores da faculdade, Morse pediu a palavra, subiu ao palco do auditório e desenvolveu uma longa e apaixonada defesa da moça. Lembrou que havia se colocado contra sua admissão desde o início do processo, mas agora que fora convidada a se dedicar aos estudos em Stanford não poderia ser mandada embora daquele jeito, sem mais nem menos. Ela era, afinal, uma pessoa e não um número. E aí Morse passou a insinuar que racistas eram os professores progressistas que tratavam as minorias como se fossem gado, usando-as para preencher suas cotas raciais e descartando-as logo em seguida. Essa posição de Morse trazia embutida muita inspiração brasileira. Foi lendo gente como Gilberto Freyre e, sobretudo, Sérgio Buarque de Hollanda, que o doutor passou a pensar assim e a dar um valor grande para o lado profundo e humano do personalismo.
Continuação: É isso, enfim, que acho das cotas para negros na universidade. Seria uma pena o Brasil abrir mão de sua rica história de pensamento racial em prol de uma solução americana - um dos países mais racistas da história. O grande problema do Brasil não é o racismo, mas a miséria. É justamente o contrário dos Estados Unidos, que combinam riqueza com ódio racial.
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