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quarta-feira, 29 de julho de 2020

A pouco nobre arte de enganar com os números - Paulo Roberto de Almeida

Da arte pouco nobre de enganar com os números


Paulo Roberto de Almeida
[ObjetivoComentário crítico sobre distorção de dadosfinalidadeesclarecimento público]


Jornalistas estão reproduzindo mais uma das “pegadinhas” desonestas da Oxfam: a de que a riqueza “financeira” dos megarricos teria crescido ainda mais na pandemia, o que se “consegue” selecionando dois períodos arbitrários num índice de bolsa de valores, com números que “provam” que os mais ricos ficaram ainda mais ricos, aos passo que os mais pobres afundaram ainda mais. 
Fica parecendo que os primeiros ficaram mais ricos às custas dos segundos, o que absolutamente não é verdade.
Jornalistas — e o público em geral — não deveriam cair nesse tipo de mentira conveniente, sem investigar as fontes de informação e a “metodologia” aplicada aos números, um exercício de estatística elementar que muitas vezes escapa de mentes mais apressadas, ou pouco preparadas para interpretar corretamente dados primários.
‪De certa forma, a Oxfam, em sua desonestidade subintelequitual contumaz reproduz a tristemente famosa “teoria do Intercâmbio desigual”: basta pegar as commodities num pico de alta numa série histórica, e depois comparar com preços não deflacionados de manufaturas mais adiante: pimba! “provou”!
Se tem uma coisa que eu não suporto mesmo – bem mais do que a “burrice” daqueles que têm todas as informações à mão, mas preferem insistir em erros primários, simplificando as coisas – é a desonestidade intelectual, que eu chamo de subintelequitual.
Isso ocorre muito entre militantes de certas causas, que tendem a possuir teses prontas, e que depois vão “torturar” os números para que eles “revelem” aquelas teses pré-fabricadas.
Por isso eu tenho muito pouco respeito pelo economista Thomas Piketty e suas “teses” sobre a concentração de renda, apelando para um título de duvidoso gosto marxiano: o “capital no século XXI”, e isto independentemente dos dados aparentemente corretos do crescimento da riqueza financeira ao longo das últimas décadas, depois de um longo período de “desconcentração” no século XX.
Primeiro, a seleção dos dados “financeiros”, como se ela fosse a única forma de riqueza possível, quando existem outras formas de riqueza intangível, mais difíceis de se medir, mas não menos reais.
Depois, essa outra arbitrariedade de seguir essa “marcha do capital” ao longo das décadas, como se os mesmos ricos continuassem abocanhando a riqueza geral da sociedade, em detrimento dos mais pobres, que “ficaram com uma parte menor” daquela riqueza medida unicamente pelo seu lado financeiro, que é chamado de capital. 
Ora, isso é de uma desonestidade tipicamente marxiana e marxista, que “consegue” provar as teses pré-fabricadas da concentração de renda, da “pauperização” dos mais pobres, enfim, da divisão da sociedade em classes antagônicas e, finalmente, a de que os mais ricos estão impedindo as classes médias e os mais pobres de prosperar. 
Isso não é nem teoria, nem economia aplicada: é simplesmente mistificação econômica, uma espécie de “metafísica hegeliana do capital”, que apenas segue a riqueza na sua forma exclusivamente financeira, pairando na superestrutura da sociedade, como se a riqueza geral permanecesse a mesma ao longo dos tempos, aliás apropriada pelas mesmas “classes” e pelos mesmos indivíduos ou famílias (o que pode realmente ocorrer, pois os mais ricos tendem a defender a sua riqueza, multiplicá-la e passar aos seus descendentes).
Em terceiro lugar, a “conclusão” de que a riqueza do capital financeiro é uma coisa malévola em si, e que ela é causa das desigualdades, e portanto da infelicidade atual do nosso tempo, já que a humanidade em geral ainda possui muitos pobres e miseráveis, ao mesmo tempo em que os superricos, os megabilionários se multiplicam e ficam cada vez mais ricos, aparentemente às custas de todos os demais. 
Daí a concluir que a sua riqueza é ilegítima, indevida e perversa para a felicidade geral da sociedade é apenas um passo, como faz a Oxfam e os simplistas que seguem suas mistificações. 
Daí também as teses para taxar mais os ricos e “distribuir” esse estoque de riqueza entre os mais pobres, como se os fluxos de criação de novas riquezas se mantivessem inapelavelmente constantes, como se a economia fosse uma cornucópia infinita, suportando os novos Robin Wood da extração estatal, apoiados em economistas bonzinhos, pela eternidade.
Isso é Rousseau, isso é Marx, isso é Piketty, e todos os partidários da tese de que a propriedade é um roubo, e de que o mais importante é a desigualdade entre as pessoas, e não a capacidade de gerar riquezas através do trabalho inteligente, o skilled labour de que falava Adam Smith, ou o quarto fator produtivo, a inteligência, de que falava Cairu, depois da terra, do trabalho e do capital. 
Por fim, considero que a mais nobre missão do economista seja enriquecer os mais pobres, ao passo que economistas que se entregam à pouco nobre missão de empobrecer os mais ricos, como Piketty, não deveriam merecer esse título.
O maior problema da humanidade NÃO É a desigualdade, inerente a todas as épocas e formações sociais, uma vez que ela é inerente a todos os seres humanos, inapelavelmente sempre únicos e originais, e supostamente dotados de consciência, racionalidade e responsabilidade sobre suas vidas, a partir de certo ponto de suas vidas. 
Todos os seres humanos partem de um marco zero, e serão mais pobres ou mais ricos, mais felizes ou infelizes, a partir de certa dotação natural de fatores, nas sobretudo a partir do ambiente social, cultural e patrimonial no qual foram criados e se desenvolveram (ou não).
Daí que uma nova “teoria dos sentimentos morais” deveria assegurar que todos os seres humanos pudessem ser dotados das mesmas condições igualitárias de partida para que pudessem florescer ao longo da vida, o que se obtém basicamente através da educação e de um mínimo de condições infraestruturais para colocar suas dotações adquiridas a serviço de uma vida útil e benéfica a si e aos descendentes.
A chamada “renda básica” não pode ser nada além de um ajutório temporário para que a pessoa possa se ajudar a si própria.
Daí que a educação é o maior bem da humanidade, um patrimônio inter-geracional que precisa ser mantido em condições ótimas de realimentação e de acumulação social e societal (de preferência pela solidariedade universal, ou globalista).
A educação é um problema “técnico”, portanto “solucionável” com os devidos investimentos sociais.
Sociedades que possuem elites predatórias (como as nossas, na AL e e outras partes do mundo também) são pouco propensas a redistribuir riquezas por meio da educação, uma vez que a riqueza dessas elites pode efetivamente ser feita através da extração da riqueza alheia, por meio da concentração de poder (original ou adquirido). 
Ou seja, não existe uma solução fácil á concentração de renda, à má distribuição de riquezas, à desigualdade entre is homens.
Apenas não creio que o maior problema da humanidade esteja na desigualdade, e sim na pobreza. E esta se combate com mais liberdades econômicas e políticas, e alguma solidariedade social.
Um pouco de sorte também ajuda. 
Certos povos têm mais “sorte” do que outros. O Brasil, aparentemente, ainda não tropeçou com essa “sorte”.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 3726, 29 de julho de 2020

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