Um ano e meio
Paulo Roberto de Almeida
Um ano e meio completo, com tudo o que Dante não colocou em sua trajetória literária: crises, mais crises, anomia, assombrações, sobressaltos, surpresas desagradáveis, revelações escandalosas, deterioração de instituições, ignorância, egocentrismo, mudança de regras (para pior), mais crises, xingamentos, provocações gratuitas, mediocridade nas nomeações, palavrões, armamentismo, ofensas a dirigentes estrangeiros, destruição dos recursos naturais, mais xingamentos, humilhações, autoritarismo, autismo político, indecisões, dúvidas, tergiversações, malversações, falcatruas, lapsos freudianos, fixações anais, erros banais, incorreções verbais, novas crises, outros xingamentos, descaminhos, pecados mortais, veniais, digitais, animais, caos, sombras, pragas e raios, chuvas e trovoadas, terremotos administrativos, loucuras corporativas, irresponsabilidade orçamentária, evasão fiscal, egoísmo, ódio visceral, inveja, todos os outros pecados, mentiras a granel, grosseria, breguice, mau gosto, incitação à violência, desprezo pela vida, gozo com o sofrimento alheio, alucinações repetidas, desrespeito, calhordice, manual de imoralidades, código de má conduta, boletim de mau comportamento, afundamento da ética, falácias recorrentes, novas crises, ofensas escabrosas, traições, palavrões em série, corrente de enganações, despreparo total, linguajar estropiado, imersão no lodo, chafurdando no pântano, imersão no esgoto, concorrência a Satanás, imitação da Máfia, instintos primitivos, ética de quadrilha, animosidade à verdade, rejeição ao trabalho, obsessões pornográficas, cenas de desonestidade explícitas, atração pelo crime, adoração da maldade, uso aético da religião, perversidade doentia, etc., etc., etcetera e tal.
Esqueci alguma coisa?
Um ano e meio, dezoito meses, quinhentos e quarenta e sete dias e meio de puro egocentrismo rastaquera, de retrocessos contínuos na indignidade e na vergonha.
Desculpe, Dante, mas não tem nada de divino, nem de comédia, em nossa tragédia de um ano e meio em direção do inferno.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de julho de 2020
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