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quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Como se construiu a Ordem no Brasil Imperial: o trabalho do Regresso – Octávio Tarquínio de Sousa

Os construtores da Ordem Política e de Segurança: Conservadorismo brasileiro

 Bernardo Pereira de Vasconcelos e Paulino Soares de Sousa

 

        A esses dois homens [Bernardo Pereira de Vasconcelos e Paulino Soares de Sousa] se devem talvez mais do que a ninguém a orientação, a doutrina, a legislação da política conservadora do Império, deles foi a reforma do Código de Processo. A um liberal mais puro a lei de 3 de dezembro não poderia deixar de causar escândalo; de arrepiar-lhe a pele, magoando-lhe a sensibilidade delicada. E até um espírito frio, que a examine de ânimo isento, terá os seus motivos de séria inquietação. Mas o que só o romantismo jurídico negará é que a lei de 3 de dezembro de 1841, dando ao Império uma armadura que o defendeu durante quase meio século contra ataques de toda espécie, foi um expediente que se diria genial.

        Do livro 5. das Ordenações, sob certos aspectos ainda tão duro, passaremos para o Código do Processo Criminal de 1832, trabalho sobretudo de Alves Branco, com o seu requintado liberalismo, inspirado em exemplos ingleses e norte-americanos. Diante de juízes de paz eletivos, com atribuições de polícia administrativa, polícia judiciária e atribuições judiciárias propriamente ditas, o governo ficava fraco, pouco valia. Era uma organização em que a autoridade se fragmentava, dividida por quantos juízes de paz havia.

    Em alguns dos dias mais tormentosos da Regência, o Código de 1832 fez a sua prova e a convicção que se formou em toda a gente de bom senso foi que era necessário dar ao governo meios de melhor resguardar a ordem pública, acabando com a intranquilidade, a insegurança, o estado de desordem permanente que se implantara.             Destarte, quando Bernardo de Vasconcelos, depois de ter como ministro da Justiça organizado uma comissão de jurisconsultos para estudar a matéria, apresentou o seu projeto em junho de 1839 ao Senado, não se aventurava a nenhum lance extraordinário, antes propunha uma reforma que, em princípio, se impunha como medida de defesa da autoridade aos olhos de quantos tivessem passado pelo governo, reforma desejada e animada por Honório Hermeto e Aureliano Coutinho desde 1833.

 


Trechos de:

SOUSA, Octávio Tarquínio de (2018). História dos Fundadores do Império do Brasil;  3. vol. Bernardo Pereira de Vasconcelos. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial; edição anterior: Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Universidade de São Paulo, 1988 (disponível: a https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/574685/001134219_Historia_Fundadores_Imperio_Brasil_v.1.pdf?sequence=1&isAllowed=y; acesso: 18 dez. 2020); p. 225-226.


terça-feira, 27 de julho de 2021

Francisco Félix de Sousa: o maior traficante do Brasil colonial e imperial - Wikipedia

 Almas cândidas podem não gostar, mas o fato é que o maior item de exportação dos reinos africanos da Costa dos Escravos na África era... escravos...

Francisco Félix de Sousa

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre. (acesso: 27/07/2021)

Francisco Félix de Sousa
Nascimento4 de outubro de 1754
Salvador
Morte8 de maio de 1849
Uidá
CidadaniaBrasil
Ocupaçãomercador, traficante de escravos

Francisco Félix de Sousa[1] (Salvador, 4 de outubro de 1754 — UidáBenim, 4/8 de maio de 1849) foi o maior traficante de escravos brasileiro e Chachá da atual cidade de Uidá no Benim. É uma figura histórica controversa, tanto pelo poder e riqueza que obteve, quanto pelas suas origens, pois era, provavelmente, um mulato ou mestiço indefinido.[2][3][4]

Biografia

Seus descendentes registraram em seu túmulo que ele nasceu em 4 de outubro de 1754.[5] Entretanto, outros dizem que ele nasceu em 1771.[2] Certa somente é a data de sua morte: 8 de maio de 1849.[4]

Era filho de um português traficante de escravos e de uma índia.[6] Aos 17 anos foi alforriado.[2] Entretanto, seus descendentes o retratam atualmente como se fosse muito branco e louro.[5] O mais provável é que tenha sido um mestiçoindefinido.[4]

Conforme contado pela sua família, Francisco Félix estabeleceu-se em 1788 no atual Benim.[7] Entretanto, é mais provável que Francisco Félix tenha se estabelecido definitivamente na África em 1800, depois de várias viagens, a primeira entre 1792 e 1795.[8]

O litoral da baía de Benim e seus arredores era, nesta época, uma das regiões mais densamente povoadas da África e conhecida internacionalmente como "Costa dos Escravos", devido ser este o seu principal produto de exportação. O rei da cidade de Abomei, também chamada de Abomé, localizada no interior, dominava a região da baía de Benim, embora lá houvesse vários fortes de feitorias europeias, entre os quais a já antiga fortaleza portuguesa de São João Baptista de Ajudá, localizada na atual cidade de Uidá

Pela estrutura econômica do Reino de Daomé, o rei era dono de toda a terra e detinha o monopólio de todo o comércio podendo conceder concessões aos comerciantes. Nesta época, praticamente os únicos produtos exportados era escravos, o que também acontecia nos reinos vizinhos.

Francisco Félix começou a negociar na região atuando como traficante de escravos, a mesma profissão que tinha sido exercida por seu pai. Entretanto, como chegou na África praticamente em estado de miséria, alguns relatos dizem que entrou no negócio de tráfico de escravos levado pelo seu sogro Comalangã, régulo da ilha de Gliji, na localidade de Popó, e pai de sua primeira esposa, Jijibu ou Djidgiabu.[4]

Tudo indica que não teve inicialmente sucesso nos negócios, pois em 1803 empregou-se na Fortaleza de São João Baptista de Ajudá como escrivão e contador. Em 1804, seu irmão Jacinto José de Sousa partiu do Brasil para assumir o cargo de Comandante desta mesma fortaleza em que trabalhava, mas isto foi apenas coincidência.[8]

Em 1805, seu irmão morreu e ele assumiu, sem autorização do governo português, o cargo de 16.º Director da Fortaleza de São João Baptista de Ajudá, em exercício até 1818 e em definitivo até 1844, e desde 7 de Setembro de 1822 até esse ano sob a soberania do Império do Brasil.[7][8] Depois de algum tempo abandonou a função, pois obteve autorização real para comerciar, incluindo traficar escravos que eram comprados diretamente do rei de Daomé, Adanuzam. Os escravos eram pagos com búzios (uma forma de moeda local) ou, como ficou comum depois de certa época, com mercadorias importadas da Europa (tecidos de algodão, veludos, damascos, lãs e sedas, armas de fogo, pólvora, contaria, facas, catanas, manilhas, vasilhame de cobre e latão) ou das Américas (tabaco baiano, cachaça, rum).[4] Mesmo depois da Independência do Brasil, os produtos manufaturados europeus eram contrabandeados do Brasil, uma vez que a Coroa portuguesa não permitia que tais itens fossem transportados em navios brasileiros.

Quando já estava muito rico, Francisco Félix afrontou Adanuzam por não ter recebido os escravos pelos quais pagara adiantadamente com mercadorias. Caiu em desgraça perante o rei e foi preso quando visitava a cidade de Abomei, capital de Daomé. O poder do rei de Daomé sobre os súditos era total: era comum a morte em sacrifícios humanos, a execução de centenas de prisioneiros de guerra ou a venda de milhares como escravos para as Américas. Entretanto, a tradição de sua família conta que o branco era a cor da morte e matar um branco, mesmo um mulato, era tabu. Adanuzam ordenou então que Francisco Félix fosse imergido em tonéis de índigo para que ficasse azul-escuro e nunca mais usasse a cor da pele para afrontar o rei.[4]

Nesta época, conheceu Guapê, um meio-irmão de Adanuzam, tornou-se seu amigo e, com sua influência, conseguiu ser libertado ou fugiu de Abomei para Popó Pequeno,[8] terra de seu primeiro sogro, Comalangã. Francisco Félix e Guapê fizeram um pacto vodum de sangue[4] e começaram a conspirar para depor o Adanuzam. Francisco Félix contrabandeou armas e munições para Guapê que, em 1820,[7] derrubou Adanuzam do poder e tornou-se rei de Daomé, assumindo o nome de Guezô.

Guezô concedeu-lhe, em 1821, o cargo de primeiro conselheiro[9] e o título de Chachá.[10] A origem do nome do título é desconhecida. Possivelmente era seu apelido,[8] originado do modo com que Francisco Félix costumava apressar os negócios dizendo "já, já".[4] Não é correto que o título de Chachá conferisse poderes de vice-rei e "chefe dos brancos". Estes poderes eram conferidos com o título de Iovogã que esteve com um daomeano chamado Daba durante a maior parte da vida de Francisco Félix em Uidá. Um estrangeiro que chegasse na cidade tinha que falar com o Iovogã antes de se encontrar com o Chachá.[8] Francisco Félix, como todo traficante rico do reino, tinha o título de "cabeceira" do reino e a obrigação de fornecer soldados armados para o rei. Portanto, suas atividades eram mais comerciais do que políticas.[8]

A fortaleza de São João Baptista de Ajudá tinha sido abandonada pelos portugueses. Francisco Félix continuou a comandá-la e, por extensão, governava a cidade de Uidá que se desenvolveu nos seus arredores. A cidade transformou-se em um dos mais ativos entrepostos de embarque de escravos de toda a África para as Américas, principalmente para o Brasil e Cuba.

Guezô concedeu-lhe também o total controle do comércio exterior do Reino de Daomé.[5] Atuava como agente do rei, gozando do privilégio real da primeira opção: "os outros comerciantes só podiam transacionar com aquilo que ele não desejava".[8] Devido ao grande crescimento do tráfico de escravos para o Brasil que ocorria na época, Francisco Félix acumulou uma fortuna gigantesca. Além do virtual monopólio do comércio de escravos sediado em Uidá, também exportava azeite de dendê, noz-cola e outros produtos do reino. Importava tecidos, tabaco, aguardente, armas de fogo, pólvora e utensílios de metal, produtos utilizados no escambo para aquisição de escravos.[4] Teve vários sócios no Brasil como o banqueiro Joaquim Pereira Marinho, que recebeu os seus filhos que viajaram para estudar. Francisco, príncipe de Joinville considerava-o um dos três homens mais ricos de seu tempo.[7]

Depois da Independência do Brasil, ofereceu, em nome de Guezô, o protetorado do Reino de Daomé e a posse da fortaleza de São João Baptista de Ajudá ao imperador Pedro I do Brasil[11] O acordo não prosperou e, a partir de então, Francisco Félix vai passar a dizer-se cidadão português, talvez porque isto lhe conferia vantagens jurídicas, oriundas de acordos internacionais, quando seus navios eram apresados pela frota britânica.[8]

Quando os ex-escravos alforriados no Brasil ou seus descendentes voltavam para o Benim, encontravam em Francisco Félix um ponto de referência da cultura afro-brasileira na região. Ao mesmo tempo, Francisco Félix agia como um protetor local daqueles que, contraditoriamente, poderiam ter sido enviados por ele como escravos para o Brasil. Assim, em torno da rica residência do traficante de escravos formou-se um bairro de Agudás (descendentes de escravos do Brasil que retornaram para África), atualmente chamado Brasil (em francêsBrésil; em fomBlezin).[4]

Por volta de 1845, Francisco Félix estava arruinado e devendo dinheiro ao rei. A causa mais provável do seu declínio foram os enormes prejuízos que a frota britânica causava ao passar a apreender seus navios negreiros. Com seu empobrecimento, Guezô deixou de considerá-lo como o único agente real para o comércio exterior, mas ainda o manteve como um funcionário coletor de taxas por escravo exportado e emprestava dinheiro para ele.[8] Nesse mesmo ano foi o 2.º Governador da Fortaleza de São João Baptista de Ajudá até à sua morte a 4/8 de Maio de 1849.

Seus descendentes contam que morreu com 94 anos.[7] Deixou viúvas 53 mulheres, mais de 80 filhos homens e 2 mil escravos. Guezô concedeu-lhe um funeral de grande chefe daomeano, no qual, apesar dos protestos de seus filhos, houve até a oferenda de sacrifícios humanos, honra conferida somente aos enterros reais.[8] Foi enterrado no mesmo quarto onde dormia e seu túmulo é até hoje reverenciado pelos seus descendentes e pelos Agudás.[7]

Alguns de seus filhos homens mais velhos estudaram no Brasil, alguns dos mais novos em Portugal.[4] Depois de uma disputa feroz entre os três filhos mais ricos, um deles, Isidoro Félix de Sousa, foi escolhido por Guezô para sucedê-lo com o título de Chachá II,[8] que então passou a ser hereditário, o qual em 1851 foi o 26.º Governador Subalterno da Fortaleza de São João Baptista de Ajudá, cargo que ocupou até 8 de maio de 1858 tendo, nesse mesmo ano, seu filho Francisco Félix de Sousa, Chachá III, sido nomeado 29.º Governador. Os seus descendentes, a família Souza, têm até hoje uma grande importância política e social em Benim, sendo líderes da comunidade de Agudás. Também podem ser encontrados descendentes em toda a região do centro-oeste africano, especialmente no país vizinho Togo.[12] Um descendente direto, Honoré Feliciano Julião Francisco de Souza, é o oitavo Chachá, um título de nobreza sem poder político, mas que confere grande prestígio social. Nos dias de festas da comunidade dos Agudás, Chachá VIII comparece paramentado com vestes reais e acompanhado de nobres e rainhas locais. Cada novo Chachá assume o título com uma visita obrigatória ao rei de Daomé, hoje sem poder político, mas ainda reverenciado como líder religioso. Nesta visita são reforçados os antigos laços de união entre a família Souza e a família real daomeana.[13]

Ver também

Bibliografia

Referências

  • Tiago Carrasco, Até Lá Abaixo
  • OLTRAMANI, Alexandre (10 de dezembro de 2003). «Veja, edição 1832»Veja. Consultado em 30 de agosto de 2008
  • Dolores Cantus. Fernando Poo (1778-1900). «Una Aventura Colonial Española en el África Occidental» (PDF). Tesisenxarxa.net. p. 195. Consultado em 30 de agosto de 2008. Arquivado do original (PDF) em 24 de julho de 2011
  • SILVA, Alberto da Costa e. Francisco Félix de Souza, mercador de escravos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira/EdUERJ, 2004
  • «Os Retornados - O Brasil na África». Osretornados.globolog.com.br. Consultado em 20 de agosto de 2008
  • O Poderoso Chefão - Guia do Estudante
  • «De Souza - Benim». Cartasdafrica.com. Consultado em 20 de agosto de 2008
  • LAW, Robin (1800-1849)). «A carreira de Francisco Félix de Souza na África Ocidental» (PDF). Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Consultado em 30 de agosto de 2008 Verifique data em: |ano= (ajuda)[ligação inativa]
  • VIALLARD, Monique. «La communauté afro-brésilienne du Golfe du Bénin» (PDF). Revues-plurielles.org. Consultado em 30 de agosto de 2008
  • «Gana». Cartasdafrica.com. Consultado em 20 de agosto de 2008. Arquivado do original em 10 de março de 2008
  • SILVA, Alberto da Costa e (Junho de 1995). «Brasil, Africa y el Atlántico en el Siglo XIX» (PDF). America Negra, Bogotá: Pontifícia Universidad Javeariana. Javeriana.edu.co. p. 151. Consultado em 30 de agosto de 2008
  • SCHAUMLOEFFEL, Marco Aurélio. «Informações sobre os Tabom e o Durbar por eles organizado» (PDF). Schaumloeffel.net. Consultado em 30 de agosto de 2008
    1. «Agudás — de africanos no Brasil a 'brasileiros' na África». Scielo.br. Consultado em 20 de agosto de 2008

    Ligações externas

    • Os Retornados - O Brasil na África (visitado em 20 de agosto de 2008) - Fotos do túmulo e dos descendentes de Francisco Félix de Sousa com suas reminiscências e tradições.

    sábado, 21 de outubro de 2017

    Nesta data, em 1889, morria o Visconde de Maua, Irineu Evangelista de Souza


    NESTA DATA

    Morre o Visconde de Mauá

    No dia 21 de outubro de 1889, morre Irineu Evangelista de Sousa, o Visconde de Mauá

    Morre Visconde de Mauá
    Desde muito cedo, Irineu mostrava talento para negócios (Foto: Wikimedia)
    Grande impulsionador da indústria brasileira, o empresário brasileiro Irineu Evangelista de Sousa, Visconde de Mauá, foi o maior empreendedor que o Brasil já teve. Morreu em Petrópolis, Rio de Janeiro, no dia 21 de outubro de 1889.
    Irineu nasceu em 28 de dezembro de 1813 no Rio Grande do Sul. Aos cinco anos perdeu o pai. Quando tinha nove, sua mãe se casou de novo e uma condição do novo marido era não ter os filhos de casamento anterior morando com eles. A solução foi rapidamente achar um marido para a filha de 12 e mandar o menino de nove para o Rio de Janeiro, levado por um tio que conseguiria um emprego para ele.
    Irineu passou a trabalhar e morar na casa de um comerciante onde rapidamente aprendeu tudo, tornando-se pessoa de confiança do patrão. Em 1829 Irineu foi trabalhar com o importador e exportador inglês Richard Carruthers, que lhe ensinou inglês, contabilidade e a arte de comerciar.
    Irineu adquiriu o hábito das leituras sérias, lendo no original o clássico “A riqueza das nações”, de Adam Smith. No final de 1835, quando o jovem tinha acabado de completar 22 anos, o chefe reuniu todos os funcionários e comunicou que ia se aposentar e voltar para a Inglaterra e que Irineu seria o novo acionista controlador. Aos 27 anos, viajou até a Inglaterra visitando fábricas, fundições de ferro e conheceu a ferrovia, a coqueluche do meio empresarial e político do momento. Essa visão do país mais moderno do mundo abriu os olhos de Mauá para aquilo que ele gostaria que o Brasil fosse: uma nação adiantada. Desde então seu sonho quase obsessivo foi criar no Brasil indústria e infra-estrutura modernas.
    Em 1845, Irineu tomou sozinho a frente do ousado empreendimento de construir os estaleiros da Companhia Ponta da Areia, com que iniciou a indústria naval brasileira. Em plena ascensão como homem de negócios, forneceu os recursos financeiros necessários à defesa de Montevidéu, quando o governo imperial decidiu intervir nas questões do Prata, em 1850. Da Ponta da Areia saíram os navios para as lutas contra Oribe, Rosas e Lopes.
    Tendo obtido junto ao governo imperial brasileiro a concessão do fornecimento de tubos de ferro para a canalização do rio Maracanã, na cidade do Rio de Janeiro (1845), liquidou os interesses da Casa Carruthers e, no ano seguinte, adquiriu uma pequena fundição situada na Ponta da Areia, em Niterói, na então Província do Rio de Janeiro. Imprimindo-lhe nova dinâmica empresarial, transformou-a em um estaleiro de construções navais.
    No ano seguinte, o Estabelecimento de Fundição e Companhia Estaleiro da Ponta da Areia já multiplicara por quatro o seu patrimônio inicial, tornando-se o maior empreendimento industrial do país, empregando mais de mil operários e produzindo navios, caldeiras para máquinas a vapor, engenhos de açúcar, guindastes, prensas, além de artilharia, postes para iluminação e canos de ferro para águas e gás. Deste complexo saíram mais de setenta e dois navios em onze anos, entre os quais as embarcações brasileiras utilizadas nas intervenções platinas e as embarcações para o tráfego no rio Amazonas.
    No final da década de 1850, o visconde funda o Banco Mauá, MacGregor & Cia., com filiais em várias capitais brasileiras e em Londres, Nova York, Buenos Aires e Montevidéu.O estaleiro foi destruído por um incêndio em 1857, mas é reconstruído. Acaba-se de vez em 1863 quando a lei isenta de direitos a entrada de navios construídos fora do país. Isso leva a empresa à falência, mas não afeta os outros negócios do empresário. A partir de então, dividiu-se entre as atividades de industrial e banqueiro. Devem-se a Mauá a iluminação a gás da cidade do Rio de Janeiro (1851), a primeira estrada de ferro, da Raiz da Serra à cidade de Petrópolis RJ (1854), o assentamento do primeiro cabo submarino telegráfico entre o Brasil e a Europa (1874) e muitas outras iniciativas.
    Em 1856, Mauá recebeu a concessão para construir a ferrovia Santos-Jundiaí. Seria um empreendimento grandioso que escoaria a crescente produção de café de São Paulo para o porto de Santos. Até então o café descia a Serra do Mar em lombo de burro. A nova empresa tinha sócios ingleses e lançou ações na bolsa de Londres, com a honra de o Barão Rothschild, o maior banqueiro do mundo, ser o primeiro subscritor de ações. A obra andaria devagar, por falta de dinheiro e aos poucos o banco de Mauá se tornou seu maior financiador. Mauá acabou vendendo suas ações, mas continuou a emprestar fundos para terminar a obra. Em 1867, a ferrovia, que outrora Mauá chamara de a menina de meus olhos, foi inaugurada e imediatamente começou a operar lucrativamente. Mas o visconde não conseguiu receber seus créditos e isso provavelmente foi a maior causa de sua ruína.
    Em 1875, viu-se obrigado a pedir moratória, a que se seguiu longa demanda judicial, derradeiro capítulo da biografia de grande empreendedor. Doente, minado pelo diabetes, só descansou depois de pagar todas as dívidas. Ao longo da vida recebeu os títulos de barão (1854) e visconde com grandeza (1874) de Mauá.
    O Visconde de Mauá morreu em Petrópolis, Rio de Janeiro, no dia 21 de outubro de 1889.