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terça-feira, 23 de janeiro de 2024

A irracionalidade da luta contra as desigualdades - Fernando Schüler (Veja)

 Soma variável

Fernando Schüler

Veja (20/01/2024)


“Ninguém deveria ter 1 bilhão de reais!”, leio de um ativista. Achei curioso. De onde vem uma ideia dessas? Conheço uma empreendedora que abriu uma empresa, investiu, muita gente apostou, conquistou uma clientela enorme, e em poucos anos suas ações valiam mais de 1 bilhão. O que ela deveria fazer? Vender tudo que passasse da quota de 1 bilhão? Se ela ficasse com o dinheiro, não ia adiantar. Ela poderia doar. O valor das ações passou de 1 bilhão, ela vende e doa o dinheiro. Ou alguém do governo vai lá e confisca. A pergunta previsível, neste caso, seria “mas então por que eu iria continuar trabalhando, correndo risco?”. Por esporte? E se as ações caírem, depois do confisco? Deixa pra lá…

Em um desses “relatórios” sobre a desigualdade, li coisas interessantes. Uma era a “denúncia” de que a riqueza dos cinco mais ricos do mundo “dobrou desde 2020”. Malandragem estatística escolher exatamente o ano de queda abrupta dos mercados, com a pandemia. Mas ok. Um desses ricos malvados é o Jeff Bezos. O self-made man que trocou um bom emprego para abrir a Amazon. Sou um de seus clientes. Não pela cor dos seus olhos, que aliás desconheço. Compro lá porque a Amazon me vende livros a bom preço e entrega rapidinho. Porque a empresa do Bezos torna minha vida mais fácil. Aumenta minha “produtividade”, se alguém quiser um termo mais elegante. Os investidores sabem disso. E é por isso que o “patrimônio” do Bezos dobrou, desde a baixa de 2020. Assim como ele melhora a minha vida, ele faz isso com milhões de pessoas, do sacrossanto ponto de vista de cada um.

Não há nenhum jogo de soma zero funcionando aí. A soma é variável: ele ganha porque seus clientes e investidores também ganham. Valendo o mesmo para as incontáveis ONGs que a MacKenzie Scott, ex-­esposa de Bezos, ajuda, distribuindo incríveis doações. E é precisamente isso que parece não entrar na cabeça de nossos ativistas.

Me lembro quando li O Capital no Século XXI, de Thomas Piketty. Em um certo momento, ele diz que “as desigualdades, a partir de um certo ponto, ameaçam os valores básicos da democracia”. Fiquei curioso para saber qual seria exatamente aquele “ponto”. Seria quando o 1% abocanhasse 25% da riqueza? (De “quem”, exatamente?) Ou quem sabe 20%? Ou 30%? À época, adquiri o hábito de perguntar às pessoas qual era a distribuição da riqueza favorita de cada um. Até colecionava os números, que iam da “igualdade total”, ao “padrão nenhum”. Depois desisti. Agora voltei a ler coisas assim. De um economista, li que era um “absurdo” que nosso top 5% “concentrasse” um terço da renda. Inútil perguntar qual seria sua distribuição “não absurda”. Sugestão mais objetiva tive do Joseph Stiglitz, cuja distribuição favorita seria “os 10% mais ricos não podem ter mais do que os 40% mais pobres”. Só Deus sabe qual a “ciência” usada aí. Nossos ativistas embarcaram: “Ganhou o Nobel, sabe das coisas”, devem ter pensado. Me fez lembrar da turma correndo atrás do Forrest Gump. Mas isso é outra história.

Em qualquer matéria sobre “desigualdade”, o que oferece consistência ética ao problema é o fato da pobreza. Ninguém perde uma hora de sono preocupado com a diferença entre o que chamamos de “classe média alta”, que na verdade são os 5 ou 7% de maior renda, e os mais ricos. O que efetivamente nos toca é o fato de que 90% da população disponha de uma renda mensal inferior a 3 208 reais (dados do IBGE). A pobreza, no Brasil, é um oceano. E é nisso que deveríamos focar. Na pobreza que atinge 49% das crianças de 0 a 14 anos, danificando suas chances de vida. Tudo isso é sabido. Mas mobiliza muito pouco o ativismo ideológico e a política profissional. Por que isso? Por que achamos tão mais excitante falar mal do valor das ações do Jeff Bezos do que focar em como melhorar a vida real dos mais pobres? A maior razão, intuo, é política. A retórica em torno da desigualdade é uma pauta de “combate”. É discurso “contra” essa gente da lista da Forbes. O foco na pobreza supõe um discurso “a favor”. É chato, exige buscar eficiência em políticas públicas, demanda soluções de mercado, com resultados de longo prazo. E dá menos ibope. Bom mesmo é “denunciar as desigualdades”, jogar isso na cara daqueles bilionários, em Davos, entre um e outro jantar bacana.

Indermit Gill, do Banco Mundial, tem uma sugestão simples, se queremos mudar o disco: aprender com as economias mais bem-sucedidas na redução da pobreza. Países asiáticos, como a Coreia do Sul, Singapura, Tailândia, Malásia, China, Indonésia e Vietnã. Todos contam a mesma história: sucesso capitalista e forte investimento em educação. Rigorosamente nada a ver com “combater os bilionários”. Ao contrário. A pobreza foi de 28% para 8,5%, no plano global, desde 2000, enquanto o número de bilionários saltou de 400 para 2 600. O país que mais ganhou bilionários foi exatamente aquele que mais reduziu a pobreza: a China. Logo atrás, a Índia. E isso não acontece porque “bilionários reduzem a pobreza”. Acontece porque a redução da pobreza e o aumento da riqueza são duas faces da mesma moeda: o crescimento econômico combinado a instituições “inclusivas”. Abertura de mercado, aumento da produtividade, capacitação de pessoas, ética pública, racionalidade no gasto governamental, bom ambiente de negócios. Caminho perfeitamente inverso ao da Venezuela, que conseguiu levar a pobreza a 90% da população e expulsar os poucos bilionários que havia por lá.

Há 35 anos, o prestigiado IMD, International Institute for Management Development, avalia o grau de competitividade, ou “ambiente de negócios”, em escala global. Ano passado, em um ranking de 64 países, o Brasil ficou na 60ª posição. Só à frente de países como a Venezuela e a Argentina (antes do Milei). Detalhe: em “eficiência governamental”, ficamos na 62ª posição. Se alguém estiver mesmo interessado em reduzir a pobreza, é nisso que deveria prestar atenção. Qual educação estamos oferecendo, nas últimas posições no Pisa? Que vias de inclusão ao mercado abrimos aos dependentes do Bolsa Família? Qual a qualidade do gasto público? O que significa 4,5% do PIB em incentivos fiscais, sem avaliar seriamente a relação custo-benefício? E os 5 bilhões de reais no “fundão eleitoral”? A Justiça e o Legislativo entre os mais caros do mundo, enquanto os espertos pedem mais carga tributária? E o que se passa quando abrimos mão de reformas cruciais? Não precisamos ir longe, aqui. Mario Covas nos falou sobre um “choque de capitalismo”, na campanha de 1989, mas nunca conseguimos produzir um consenso em torno disso, no Brasil. E talvez seja este, ano após ano, nosso desafio.

Fernando Schüler é cientista político e professor do Insper.

sábado, 5 de agosto de 2023

Justiça pode estar matando a democracia em nome da defesa da democracia - Fernando Schüler (Veja)

 Anatomia de um instante

Fernando Schüler, Revista Veja (05/08/2023)

Ninguém está acima dos direitos inscritos na Constituição

Sempre gostei das histórias malditas, dos personagens improváveis, que por alguma razão se perdem por aí. Um desses personagens é um comediante chamado Bismark Fugazza, e sua história nos dá um flash do transe brasileiro atual. Fugazza e um colega haviam denunciado o ministro Alexandre de Moraes à Corte Interamericana de Direitos Humanos, por violar os “direitos de liberdade de expressão” no país, com “várias prisões” e “multas desproporcionais” sem o devido processo legal. Foi preso no Paraguai, com direito a uma operação internacional e a fechar por alguns minutos a Ponte da Amizade, e passou três meses em cana. O motivo é o de sempre, as “ameaças à democracia” e coisas afins. Na cobertura do caso, quase nenhuma, o carimbo “influenciador bolsonarista” parece resumir a questão. O relatório da Polícia Federal sobre o seu caso foi taxativo: “Não foi possível evidenciar, de maneira minimamente razoável, que Fugazza tenha promovido atos atentatórios às instituições democráticas no 8 de Janeiro”.

Casos como este se tornaram a mais perfeita banalidade por aqui. Um dos mais curiosos foi o do youtuber Monark, banido das redes sociais por espalhar “desinformação” sobre o processo eleitoral. “A gente vê o TSE censurando gente”, disse ele, “e impedindo a transparência das urnas? Você fica desconfiado. Que maracutaia está acontecendo nas urnas ali?”. Foi banido, e logicamente é inútil perguntar se há alguma lei no país tipificando um crime de “desconfiança”. Monark simplesmente deu sua opinião, na forma de uma pergunta perdida em meio a uma conversa fiada, ademais perfeitamente irrelevante, com a qual cada um pode ou não concordar.

Não faço ideia se alguém seriamente acredita que reprimir essas pessoas atende a algum imperativo de “defesa da democracia”. Desconfio que não. As eleições já vão longe, há um certo cansaço disso tudo, e de certa forma o ministro Barroso matou a charada naquele discurso sem muitos rodeios, no Congresso da UNE. “Derrotamos o bolsonarismo.” Ponto. Difícil ir mais longe nesta análise. A esta altura do jogo, não acho que valha muito a pena fazer longas considerações sobre o sentido do estado de direito, sobre o quanto é absurdo e inaceitável que a Justiça tome partido, que direitos individuais sejam tão escrachadamente violados, que a censura prévia seja banalizada, e tudo o que todos estão cansados de saber. Ainda por estes dias lia um belo texto referindo-se à visão do grande Isaiah Berlin sobre o sentido da liberdade, no mundo político. A ideia de que “só ela era capaz de respeitar nossas almas divididas e o conflito sem fim entre nossos objetivos e valores”. Berlin fala do aprendizado moderno que vem de Montaigne, de John Locke, e cuja síntese é: não concordamos com as ideias uns dos outros, nossos deuses se opõem e nossos valores são frequentemente incompatíveis entre si. E, apesar disso, precisamos viver juntos. O que só é possível se a regra do jogo for dada pela liberdade, pelo respeito à regra imparcial, pelo mais amplo direito à expressão. Do contrário, resta a violência. Resta ficar prendendo comediantes e palpiteiros por aí, como em uma máquina que subitamente ganha vida própria.

Diante do estado de coisas a que chegamos, há diferentes atitudes. A primeira é dos entusiastas. A turma que saliva por entre os caninos a cada inimigo banido, preso, seja o que for. Dias atrás li um desses. “Não é hora de recuar”, berrava, abusando dos pontos de exclamação. É difícil saber o tamanho exato dessa turma, mas ela parece majoritária, nos meios de opinião. Para essas pessoas, coisas como “estado de direito” ou “tipificação legal” não passam de conversa pra boi dormir, como escutei de um ativista, em um dia nervoso. Desde que o mundo é mundo, a paixão militante soube justificar qualquer coisa. Não conheço um só episódio, na história, em que se praticou a censura em nome da censura. Os motivos sempre foram os melhores. A nação, a liberdade, a própria democracia. Não há propriamente originalidade no caso brasileiro.

A segunda atitude é a do medo. Quando um deputado é banido das redes, por uma decisão de ofício, qual o efeito que isso produz em seus pares? Quando os constituintes criaram o estatuto da imunidade parlamentar, era exatamente para que um deputado pudesse falar sem medo. Vale o mesmo para o jornalismo, e para qualquer cidadão, que ganhou o poder de palpitar em uma rede social. Nos tornamos a democracia do chilling effect, o “efeito inibidor”. O jurista ilustre para quem você liga lhe dá uma visão bastante crítica sobre todos esses temas, mas ao final diz, algo constrangido, “só não me cite, por favor”.

Ainda outra atitude, cada vez mais comum: a indiferença. A agressão a direitos, em um primeiro momento, causa indignação. Sua repetição, porém, nem tanto. Torna-se status quo, e vamos nos ajustando. Isso é comum em longas ditaduras. Alguém por acaso dá bola para presos políticos cubanos? Acompanho seu drama, em sites precários, aos quais ninguém mais presta muita atenção. Em democracias que deslizam para o iliberalismo, isto não é muito diferente. Baniram o Guilherme Fiuza? Aquele que escreveu Meu Nome Não É Johnny? E daí? Pois é. Isto tem lá sua racionalidade. Bancar o herói, numa época difícil, pode ser uma atitude de risco. Melhor ficar escondido, por aí, nos grupos de WhatsApp, mudando de assunto, apostando em alguma forma de autoengano.

Há ainda uma última atitude, dada pela insistência calma em certos princípios. Não é preciso ser nenhum herói para fazer isso. Basta fica de pé. Resistir ao frenesi militante e suas bizarrices, e a toda forma de abuso de poder. Sobre isso há uma lição magistral de Javier Cercas, em seu Anatomia de um Instante, que durante bom tempo foi meu livro de cabeceira. O livro é uma crônica da política espanhola dos anos 1980, época de transição, depois da ditadura franquista. Em um dado momento, há uma tentativa de golpe. Seu líder é o coronel Antonio Tejero, um tipo que parece saído de uma novela de Vargas Llosa. Ele invade o parlamento e mantém sua pantomima por uma madrugada inteira, até se entregar, no dia seguinte. Cercas escreve seu livro a partir de uma fotografia feita no exato instante em que Tejero invade o parlamento e abre fogo contra os deputados. A imensa maioria se esconde embaixo das cadeiras. Permanecem imóveis apenas três parlamentares, entre eles Adolfo Suárez, sentado, calmo e impassível, na primeira fila. “Não achei que ficaria bem para um líder de governo atirar-se para baixo de uma cadeira”, ele diria, depois, recusando-se a atribuir a si qualquer traço de heroísmo.

É uma boa metáfora para o Brasil de hoje. Tanto lá, como aqui, não precisamos de heroísmo algum, apenas de pessoas que se disponham a ficar no mesmo lugar. Permanecer impassíveis, em meio ao transe coletivo, nos lembrando que a lei deve ser preservada, que a opinião, detestável que seja, deve ser livre, que ninguém está acima dos direitos inscritos na Constituição, que o juiz não pode entrar em campo para derrotar este ou aquele lado do jogo. Coisas elementares que definem uma boa democracia, e das quais definitivamente não deveríamos abrir mão.

terça-feira, 1 de agosto de 2023

República dos compadres - Fernando Schüler (Veja)

PAÍS DOS COMPADRES

Por Fernando Schüler, na Veja nº 2852, de 2 de agosto de 2023

DIAS ATRÁS lia o artigo de um jornalista cuja síntese era a seguinte: é preciso haver mais impostos. O texto era meio obsessivo. Em coisa de duas páginas, o sujeito repetia umas seis vezes que “é preciso aumentar impostos”. O curioso foi ler, na mesma semana, uma pesquisa feita pelo UOL mostrando que metade dos juízes brasileiros, isto é, mais de 12 000 magistrados, recebe mais do que os 41 600 reais, que é o vencimento dos ministros do Supremo e teto do funcionalismo. Ou ao menos deveria ser. Achei engraçado. Duas matérias que dão a síntese da falência brasileira. De um lado, o Estado esbanjador, forrado de privilégios, com a maior carga tributária da América Latina, 4,5% do PIB em benefícios fiscais; de outro, nossa intelligentsia clamando por mais impostos. De outro jornalista li que sacar mais do “topo da pirâmide” faria melhorar nossa “distribuição de renda”. Ele parece achar que drenar mais dinheiro dos contribuintes para a máquina estatal produzirá justiça. Que o país tenha o judiciário mais caro, que sejamos o país que mais distribui dinheiro para políticos, com 34 bilhões de reais em emendas parlamentares alocados à moda “dinheiro pelo ventilador”. Ou que nossos parlamentares custem 528 vezes a renda média do brasileiro comum, tudo parece perfeitamente irrelevante. Precisamos adicionar mais 1% ou 2% a nossa carga tributária que já vai a 34% do PIB. Reformar o Estado? Cortar privilégios, aprovar coisas como a “PEC dos Penduricalhos”, que obriga a respeitar o teto constitucional? Besteira. Talvez tenhamos cansado. Trocamos a lógica de fazer perguntas difíceis sobre a racionalidade do gasto público pela lógica fácil do Estado caça-níqueis.

Por que cargas d’água o governo e o Congresso resolveram colocar na conta do contribuinte perto de 4 bilhões de reais, até 2026, em incentivos fiscais para o setor aéreo? Me lembrei disso quando paguei quase 3 000 reais para ir e voltar de Porto Alegre, enquanto lia, no aeroporto, que aquela generosidade toda deve aumentar em 40 ou 50 milhões de reais ao mês o lucro das maiores empresas aéreas. Achei legal, sempre tento celebrar o sucesso alheio. Só me ficou uma pergunta: qual a lógica? O governo já tinha dado meio bilhão de reais à indústria automotiva, vinculado a um descontinho para nossa alegre classe média comprar seu carro zero. Nesse caso, nada. Posso estar enganado, e até sugiro que os leitores deem uma passada no balcão da sua companhia, perguntando se há algum cupom ou promoção, por conta da medida aprovada no Congresso. Pensei em fazer isso, naquele dia, mas achei que o funcionário iria me achar com cara de maluco. E com razão. Vale o mesmo para o mundo do funcionalismo público.

“Vai ter uma nova leva de concursos”, diz a ministra da Gestão, Esther Dweck. “Mais umas 8000a10000 vagas”, afirma ela, que já mandou abrir8 146 vagas neste ano.

“Os ministérios estão vazios”, reclamou Lula, segundo a ministra, lamentando que “alguns deles sequer tem um secretário-executivo adjunto”. Não deixa de ser curioso. O Tesouro atualiza o déficit para 145 bilhões de reais, neste ano, e o governo, nos seis primeiros meses, autoriza mais concursos do que nos cinco anos anteriores. Tudo em um país que já gasta 13,2% do PIB em funcionalismo, acima de países como a Alemanha, e seu welfare state. E que na verdade entrega muito pouco, ocupando a vergonhosa 122ª posição no “índice de efetividade governamental”, do Banco Mundial, atrás de países como Peru e Senegal. Algum sinal de regulamentação da avaliação de desempenho dos servidores, determinada pela Constituição? Zero. Sinal da reforma administrativa, que Arthur Lira diz estar “pronta para votar”? A agenda de reformas foi substituída pela agenda de crescimento da máquina pública, aumento de impostos e concessão de benefícios setoriais. Algo que leva ao “cansaço das velhas fórmulas”, na expressão que escutei. Raspando um pouco a camada de tinta da exasperação política de todos os dias, é este o sentido da época em que vivemos: na epiderme, a “vitória da democracia”; um pouco abaixo, o velho e bom populismo a fogo brando.

Sobre nossa dificuldade com o “espírito de reforma”, me vem à mente as palavras duras de Maquiavel, em O Príncipe. “Nada mais difícil”, ele diz, “do que a instituição de uma nova ordem”. Pois quem o tenta irá receber “a inimizade de todos os beneficiados pela velha ordem, e será defendido apenas timidamente pelos que ganham com a nova ordem”. A sentença sempre me soou como um presságio da condição brasileira. Ainda me lembro de FHC saindo de seu governo politicamente derrotado, e amaldiçoado nos livros didáticos, após a ousadia de um ciclo positivo de reformas, nos anos 1990. No caso brasileiro, Marcos Mendes fez um esforço para entender o porquê de nossa dificuldade com as reformas. Elas seriam mais complicadas em países grandes, menos interessados na abertura externa, com elites numerosas orbitando em torno do Estado, em uma economia fechada como a nossa. Tudo isso em um quadro de dispersão partidária, que dificulta consensos, e numa sociedade marcada pela baixa confiança interpessoal. De minha parte, gosto de pensar no crescimento da máquina estatal e seus privilégios como um processo de retroalimentação. A lógica foi amplamente desenvolvida por Buchanan e os teóricos da Teoria da Escolha Pública, e funciona mais ou menos assim: em algum momento dos anos 1950, alguém tem a ideia de criar a Zona Franca de Manaus. Junto com ela, forma-se imediatamente uma coalizão de grupos de interesse. Empresas com benefícios fiscais, fornecedores, sindicatos e políticos eleitos para sua defesa. Resultado? A Zona Franca imune à reforma tributária e prorrogada até 2073. O Brasil está forrado desses exemplos. De uma estatal ineficiente como a Ceitec, resgatada às vésperas da privatização, até as férias de sessenta dias de nossos magistrados. Uma vez criado o benefício, ele será defendido bravamente pelos que dele se beneficiam. E por aí viramos o país dos compadres. E quando alguém disser que aumentar ainda mais os impostos “reduzirá a desigualdade” ou promoverá a “justiça”, lembre dos exemplos mencionados aqui, que são apenas a ponta de um imenso iceberg.

“É possível mudar este quadro?”, me perguntam. “É claro”, respondo. Em última instância, são “escolhas da sociedade”, como diz meu amigo Samuel Pessoa. No dia a dia da política, são escolhas de quem comanda o jogo, em Brasília. Dos “donos do poder”, na expressão de Raymundo Faoro. Na hora de votar outra exceção, na reforma tributária, ou enfiar numa gaveta a reforma administrativa, quem manda não são os contribuintes ou usuários do SUS, mas as corporações de dentro e fora da máquina estatal. Mas, em última instância, a chancela é da sociedade. Dos cidadãos, nas redes, do mundo da opinião, da sociedade civil e dos eleitores, a cada quatro anos. E por aí estamos dançando. Por quanto tempo? Não faço a menor ideia.


quarta-feira, 1 de junho de 2022

O Paradoxo do Merito - Fernando Schüler

 Estudo a fundo, trabalho intenso, aproveitamento das oportunidades, focar a utilidade da cada ação que se empreende, reconhecer talentos alheios, incorporar as boas ideias disponíveis e agradecer a todos que lhe ajudam na caminhada; acredito que pode ser uma boa fórmula para o sucesso.

Paulo Roberto de Almeida 

O Paradoxo do Merito

Fernando Schüler

Dias atrás li uma entrevista de Michael Sandel, filósofo de Harvard, sugerindo que Messi e Cristiano Ronaldo deveriam estar em “dívida”, em vez de celebrar seu sucesso como resultado de algum tipo de mérito pessoal. Sandel escreveu um best-seller, A Tirania do Mérito, atacando o que chama de “retórica da ascensão”. Critica Bill Gates por associar a ideia de “ganhar mais” com “estudar mais” e coisas do tipo. Sugere substituir a competição por vagas nas universidades, a partir do conhecimento de cada um, por sorteios. Seria uma forma de mostrar a força do acaso, e não de coisas como o preparo e o estudo, na vida das pessoas. Sempre admirei Sandel. Até trabalhamos juntos, em algum momento, mas suspeito que exista alguma coisa mal colocada em seu argumento.

“A ideia meritocrática fez o mundo moderno”, diz Adrian Wooldridge, editor da The Economist e autor do belíssimo livro The Aristocracy of Talent. A obra mostra como a ideia das “carreiras abertas ao talento” desempenhou um papel-chave na ruptura com as velhas estruturas da Europa aristocrática, em que o sucesso dependia essencialmente do nascimento e do pertencimento social. A noção de que qualquer um poderia ocupar a posição que quisesse, “sem outra distinção que não suas virtudes e talentos”, estava lá, inscrita na Declaração dos Direitos Humanos, da Revolução Francesa. Essa foi uma ideia central na grande tradição iluminista. Ela esteve na base da gradativa universalização do acesso à educação, no mundo moderno, e serviu de pavimento para a enorme transformação econômica, na era industrial, assim como para a lenta afirmação de nossas democracias.

O radicalismo antimeritocrático atual se organiza sobre uma espécie de falácia do espantalho, que consiste em “denunciar a ideia fraudulenta de que vivemos em sociedades meritocráticas”. O truque é fazer acreditar que de fato alguém defenda a ideia esdrúxula de que, em uma economia de mercado, o sucesso é definido pelo mérito pessoal. Isso é uma bobagem. Não há uma régua para definir ou medir o que significa mérito individual. O mercado remunera o valor, não o mérito. As pessoas compram celulares da Apple não por reconhecer o talento de Steve Jobs, mas pela boa relação custo-benefício de seus produtos. No mais, é perfeitamente plausível que alguém faça sucesso, ou fique milionário, simplesmente por um lance de sorte. O sujeito pode ganhar na loteria, por exemplo, ou herdar 1 milhão de dólares de uma tia distante. Simplesmente não há como separar o que é resultado do esforço ou do acaso.

Isso não significa que o esforço, a disciplina e a capacidade de renúncia não sejam decisivos para o sucesso. Reside aí o paradoxo do mérito. Tyler Cowen e Daniel Gross observam que nos EUA, de 1980 a 2000, o grau de escolaridade explicava 75% da desigualdade de salários; nas últimas duas décadas, esse porcentual caiu para 38%. As diferenças de ganhos surgem majoritariamente dentro dos grupos de mesmo padrão educacional. O que vai fazendo a diferença são precisamente aspectos ligados ao mérito e ao talento. A capacidade de alguém apresentar uma performance superior, pela capacidade de inovar ou de trabalhar duro, mesmo competindo com pessoas com a mesma base educacional. Há algo associado ao fator humano, à “capacidade de perseverar em objetivos de longo prazo”, como define a psicóloga Angela Duckworth, fazendo a diferença na vida das pessoas. E é simplesmente um erro fazer de conta que essas coisas não existem, quem sabe para não destoar da multidão barulhenta.

O desafio é cultivar uma visão inclusiva do mérito. Em vez de renunciar ao princípio das “carreiras abertas ao talento”, crucial na formação moderna, deveríamos andar para a frente. Assegurar que cada um tenha direito a uma base de oportunidades iguais. A igualdade pura e simples de oportunidades não passa de uma miragem. Seria preciso separar os filhos das famílias, impor a todos a mesma educação e, por fim, equalizar a sorte e o azar. O segredo é focar no que Harry Frankfurt chamou de “suficiente”. Isso pode significar muitas coisas, mas todos concordariam com o pacote básico, que inclui uma sociedade aberta, feita de direitos iguais e uma boa educação. Educação que realmente faça a diferença, colocando alunos de menor renda nas mesmas escolas, ou ao menos em escolas similares, onde estudam os alunos de maior renda. Curiosamente, o que nossa elite atrasada não quer nem ouvir falar.

Assegurado o básico, são as escolhas de cada um que devem fazer a diferença. Na prática, a famosa frase de Obama: “Se você tentar, você pode conseguir”. Meu amigo Sandel achou a frase um insulto. Acha que ela é ofensiva para os que não conseguiram chegar lá. Fico com Obama. Se alguém falhou (e quem nunca?), deve ter a chance de aprender e voltar ao jogo. Essa ideia contém um claro sentido ético: desejamos não apenas ter sucesso, mas saber que somos autores do caminho pelo qual trilhamos. E talvez seja por aí que se mova uma boa sociedade. Aquela que não trate as pessoas como “vítimas das circunstâncias”, como diz Wooldridge.

Para uma visão inclusiva do mérito, sugiro prestar atenção à hipótese de Howard Gardner, psicólogo de Harvard, de que a inteligência humana é múltipla. Ele identificou nove grandes campos, que vão da inteligência lógico-matemática à inteligência interpessoal. Neymar pode não se interessar muito por filosofia, mas sua capacidade corporal-cinestésica é constrangedoramente melhor que a minha. A tese de Gardner recupera a velha ideia iluminista de que todos somos capazes. E que é preciso acreditar um pouco mais nas pessoas. Apostar que, recebendo a chance devida, as pessoas saberão voar muito mais alto do que nossos preconceitos permitem imaginar.

É o que diz Ken Robinson, o grande educador inglês. Ele conta a história de uma “menina-problema” na Inglaterra elitista dos anos 1930. Uma daquelas alunas dispersivas, que não param no lugar e terminam por irritar os mais pacientes professores. A guria ia ser mandada para uma escola de “alunos-problema”, mas sua mãe pediu uma última chance. Foi a um psicólogo, que a deixou por algum tempo sozinha, em uma sala, com uma música ao fundo. Minutos depois, a menina dançava pela sala. O psicólogo chamou a mãe dela e, quando ambos observavam aquela cena, vaticinou: sua filha não é um problema, é uma bailarina.

Essa história sempre mexeu comigo. Qualquer um de nós poderia ser aquela menina. O que ela recebeu não foi muito. Foi uma chance básica de fazer a diferença no mundo. Seu nome era Gillian Lynne. Ela se tornou uma estrela do Royal Ballet, mas essa é apenas a sua história. A vida é feita de infinitas histórias. Todas elas nos dizem para acreditar nas pessoas e no melhor que cada um pode ser. Isso está lá, no coração do projeto moderno, e diz respeito a valores dos quais não deveríamos abrir mão.

Fernando Schüler é cientista político e professor do Insper

sábado, 29 de janeiro de 2022

A grande perda de tempo na internet: fomos capturados pelo buraco negro da atenção? - Fernando Schüler (Veja)

 Fernando Schuler: “Há uma epidemia: uma indústria inteira querendo capturar nosso tempo”


A era da dispersão

Há uma indústria inteira focada em capturar aquilo que cada um de nós tem de mais importante: nosso tempo e nossa atenção


Por Fernando Schüler  Veja, 27 jan 2022 - Publicado em 22 jan 2022

O perigo chegou de mansinho. Você precisa entregar aquele projeto, na empresa, e quando menos percebe está assistindo a vídeos sobre tsunamis no YouTube. Você decide fazer aquela pós-­graduação que planejava há muito tempo, mas na sexta-feira à noite, no meio da aula, está perdido checando mensagens, no Whats­App, ou bisbilhotando a vida de um monte de gente que você mal conhece, no Instagram.

Leio que nós, brasileiros, gastamos três horas e 42 minutos todos os dias nas redes sociais. Pouco mais de dez horas na internet, sendo metade disso em um telefone celular. Achei incrível isso. Gastamos mais de vinte horas por mês só no TikTok, e a coisa vem crescendo. Fui somando tudo com o que as pessoas presumivelmente fazem desconectadas (dormir, por exemplo, ou quem sabe ler alguma coisa) e a conta não fecha. Será que as pessoas transam checando o último bate-boca no Twitter? A última novidade parece ser o metaverso. Vejo um especialista animado dizendo “você poderá ser qualquer coisa por lá, um gato, um coelho, ou mesmo um Elvis Presley”, e garante que será a rede dominante no futuro próximo.

Há quem diga que não vê nenhum problema nisso. A sobrecarga de informação é um fato do nosso tempo e é natural que percamos um pouco do dia separando o joio do trigo. Há quem vá mais longe e diga que a dispersão no mundo digital pode ser mesmo um modo de vida. Conheço uma senhora que passa o dia no YouTube, e parece que está tudo bem. De vez em quando ela faz um comentário do tipo: “Viram a última gafe do Faustão?”. A psicanalista Élisabeth Roudinesco vai nessa direção. Ela diz que “estar o tempo todo conectado é melhor do que usar drogas”. Achei fraco o argumento. Sou dos que desconfiam que há um problema bastante grave aí, que em geral costumamos empurrar para debaixo do tapete.

Talvez eu ache isso porque sou professor. Percebo o efeito destruidor sobre a atenção dos alunos pela simples presença de um celular em sala de aula. Um estudo feito na Universidade Carnegie Mellon mostrou que o desempenho de alunos com seus aparelhos ligados, em testes padronizados, é 20% menor do que o de alunos inteiramente focados. Outra pesquisa mostra que levamos até 23 minutos para retomar a atenção quando somos interrompidos. Se fossem dez ou quinze minutos, isso não faria lá grande diferença. Esse não é o ponto central.

O ponto é que andamos em meio a uma guerra. Quem faz o alerta é um ex-estrategista do Google, James Williams, que lança agora no Brasil seu livro Liberdade e Resistência na Economia da Atenção (clique para comprar). Williams trabalhava no Google exatamente na área de “programação persuasiva”. Era pago para criar estratégias de “captura” da atenção das pessoas. Em um dado momento, percebeu que ele mesmo havia perdido o controle. Não era a primeira vez que tinha acontecido isso. No ensino médio se meteu com games digitais e quase dançou. Depois fez uma carreira de sucesso, na indústria da tecnologia, focado em “fidelizar” usuários, até perceber que ele mesmo havia sido fisgado. A partir daí, deu um tempo. Foi estudar em Oxford e tentar decifrar o problema.

Ele diz que vivemos uma epidemia. Que há uma indústria inteira focada em capturar aquilo que cada um de nós tem de mais importante: nosso tempo e nossa atenção. Captura voluntária, feita com técnicas sofisticadas de inteligência artificial, uso de cookies, de clickbaits, aqueles conteúdos “caça-­cliques” com títulos do tipo “Dez vídeos que vão fazer você chorar”, e coisas do tipo. O tempo de atenção de cada indivíduo passou a ser milimetricamente monitorado. Se tornou, ele mesmo, o produto. Há um velho conceito de “liberdade como autodomínio” em jogo aí, e é precisamente isso, a retomada do controle sobre nossa própria atenção, que Williams enxerga como o “grande desafio da nossa época”.

A informação foi, no passado, um bem escasso. Em Relatos do Mundo, Tom Hanks faz o papel de um veterano da Guerra Civil que ganha a vida lendo notícias de jornal em teatros e igrejas nas pequenas cidades do Velho Oeste. A atenção, à época, era abundante, diante da informação rarefeita. A coisa hoje se inverteu. A informação se tornou abundante e a atenção, um recurso escasso. Acessamos muito mais informação do que precisamos. Ela vem de maneira caótica, em boa parte mesquinha, feita de qualquer besteira capaz de capturar nossa atenção.

“Há uma epidemia: uma indústria inteira querendo capturar nosso tempo”

Sempre me surpreendo com o oceano de informação irrelevante que toma conta do debate público. O acidente de moto do general Pazuello, a “quentinha” do Wagner Moura com os sem-teto, a última treta do Zé de Abreu com não sei quem. A lista dos trend topics do Twitter é um bom mostruário do besteirol infinito, mas está longe de ser o único. O resultado está aí. A política transformada em um exercício permanente de incomunicabilidade, em que cada um tem a sensação de ganhar alguma coisa, no curtíssimo prazo, e todos perdem, coletivamente.

O primeiro resultado da dispersão crônica é a perda do sentido de potência e realização pessoal. Tenho um amigo escritor que a cada dois anos passa um tempo numa pousada, no interior, escrevendo seus livros. Ele guarda o celular em um cofre e desliga seu acesso à internet. Ele entra em flow. Um estado de completa imersão no que está fazendo. Isso lhe dá um sentido de autodomínio e a sensação de que realmente está fazendo o que havia decidido fazer. O modo dispersivo dos meios digitais poderia tirar tudo isso dele. Em troca, lhe daria uma sucessão de recompensas de curto prazo, em geral inúteis.

Outro resultado são as microafetações de humor. Há uma tonelada de estudos que mostram a conexão direta entre o uso intensivo de redes sociais e o aumento da ansiedade e do estresse. A permanente comparação de sua vida real com a vida “editada”, dos outros; a raiva que dá, todas as manhãs, ao checar as opiniões do político que você odeia e dos queridos amigos que gostam dele. Um grupo de pesquisadores da Universidade de Pittsburgh conduziu um amplo estudo identificando “uma significativa associação entre o uso das mídias sociais e o aumento da depressão”. Eu me lembrei da definição algo poética de Tim Wu sobre a liberdade: a possibilidade de “viver sem ansiedade”. No fundo é isso que está em jogo.

Sou vivido demais para acreditar que produziremos uma “solução coletiva” para esse problema todo. Que iremos disciplinar as redes sociais, que as big techs ajustarão seus algoritmos, ou que algum cometa cairá sobre a Terra e desligará a internet por duas ou três gerações. O mercado e o avanço tecnológico tratarão de despejar mais e mais informação sobre a nossa cabeça.

De modo que me permito deixar um conselho neste ainda quase início de ano: larguem um pouco a internet. Em especial, as mídias sociais. Há quem ganhe dinheiro com isso, mas não são muitos. A maioria só perde seu bem mais precioso: o tempo. Esse bem fugidio, que apenas vai escorregando, sem que a gente perceba, e cujo preço, no final, vem na conta de uma tristeza morna por tudo aquilo que deixamos de viver.

Fernando Schüler é cientista político e professor do Insper

Publicado em VEJA de 26 de janeiro de 2022, edição nº 2773