Não tenho certeza de que o Brasil virou um pária internacional, mas no caso de Bolsonaro isso é evidente.
Minhas respostas à consulta de um jornalista a propósito da cúpula do G20:
O Brasil à deriva: sua desimportância para o mundo
Paulo Roberto de Almeida
Diplomata, professor
(http://www.pralmeida.org; http://diplomatizzando.blogspot.com)
1) Qual é a importância do G20 para o Brasil? Como avalia a passagem de Bolsonaro pela Itália?
PRA: O G20 é menos efetivo do que foi o G7 para a coordenação das questões de equilíbrio macroeconômico mundial, pelo menos quando o capitalismo ocidental dominava mais da metade da economia global. Sua diversidade não ajuda, e até complica o debate e a adoção de soluções concretas para desafios conjunturais. Pelo menos servia, até a chegada de Bolsonaro ao poder, para que o Brasil integrasse o que se chama de inner core do processo decisório dos países economicamente relevantes no debate em torno da agenda econômica e financeira mundial. Agora nem isso, ou muito pior do que isso, pois o Brasil se tornou globalmente insignificante, não só para o debate sobre essa agenda, como também para aplicar uma agenda racional para a própria política econômica doméstica. O termo “passagem pela Itália” é totalmente apropriado, pois jamais se poderia falar de uma “participação de Bolsonaro” nesta reunião do G20: esta foi nula, inexistente, absolutamente medíocre, pois só leu um discurso preparado, além de tudo mentiroso.
[Fiz uma versão mais realista do que ele teria dito, por si próprio neste texto: 4005. “O discurso do mentiroso no G20: um texto alternativo, mais condizente”, Brasília, 30 outubro 2021, 2 p. Uma nova versão para o discurso do Bozo na reunião do G20 em Roma, em 30/10/2021. Divulgado no blog Diplomatizzando (link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2021/10/o-discurso-do-mentiroso-no-g20-um-texto.html).]
2) Quais efeitos concretos o isolamento do presidente em grandes eventos refletem para o país?
PRA: Bolsonaro sempre envergonhou o Brasil, desde sua primeira incursão externa, no Foro Econômico Mundial de janeiro de 2019, em Davos, quando tentou interessar o ex-vice-presidente Al Gore (que aparentemente desconhecia quem fosse) numa “exploração conjunta” das “riquezas da Amazônia”. Depois envergonhou o país em visitas bilaterais, quando elogiou ditadores como Pinochet e Stroessner, e novamente na sua primeira “passagem” pela abertura dos debates na AGNU de 2019, quando fez um discurso para o público interno, centrado na salvação do Brasil do “socialismo”. Continuou assim, nas duas AGNUs seguintes, sempre falando para a sua tribo de admiradores ignaros. A cada vez, ele aprofunda o isolamento e a desimportância concreta do Brasil para o mundo. Os efeitos não se resumem na diminuição da nossa imagem externa, mas impactam diretamente o atrativo do Brasil para o mundo que conta: os investidores internacionais (fundos financeiros ou empresas interessadas em investimentos diretos) e até as possibilidades de cooperação em diversas áreas. Sua agressividade antiambiental afastou milhões da Noruega e da Alemanha do Fundo Amazônia, assim como praticamente o conjunto da UE no tocante à entrada em vigor do acordo Mercosul-UE. Em resumo, o Brasil de Bolsonaro deixou de existir para interlocutores do G20, da COP, do Mercosul e até do BRICS.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 1 novembro 2021, 2 p.