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segunda-feira, 8 de julho de 2019

Acordo Mercosul-União Europeia - Rubens Barbosa (OESP, 9/07/2019)

ASSOCIAÇÃO MERCOSUL E UNIÃO EUROPEIA

Rubens Barbosa
O Estado de S. Paulo, 9 de julho de 2019

            Em 28 de junho, o Mercosul e a União Europeia (UE) concluíram a negociação de um ambicioso acordo de Associação, que inclui três vertentes: a política, a de cooperação e a do livre comércio.

          Aguarda-se a divulgação dos termos desse Acordo de Associação que estabelece a maneira como se desenvolverá o diálogo político, inclusive multilateral, e a cooperação para conhecer seu alcance e como os interesses nacionais foram tratados. 

         O acordo de livre comércio - parte integral desse acordo mais amplo -  pretende consolidar, em dez anos, uma parceria econômica e criar oportunidades para o crescimento sustentável nos dois lados, respeitando setores econômicos sensíveis, o meio ambiente e preservando os interesses dos consumidores. O acordo é composto por capítulos e anexos relativos aos seguintes temas: acesso tarifário ao mercado de bens (compromissos de desgravação tarifária); regras de origem; medidas sanitárias e fitossanitárias; barreiras técnicas ao comércio (anexo automotivo); defesa comercial; salvaguardas bilaterais; defesa da concorrência; facilitação de comércio e cooperação aduaneira; serviços e estabelecimento (compromissos em matéria de acesso); compras governamentais (compromissos em matéria de acesso); propriedade intelectual (indicações geográficas); integração regional; diálogos; empresas estatais; subsídios; pequenas e médias empresas; comércio e desenvolvimento sustentável; anexo de vinhos e destilados; transparência; temas institucionais, legais e horizontais; e solução de controvérsias.

Cabe ressaltar a inclusão de regras, como o princípio da precaução, para garantir segurança alimentar e preservação da floresta amazônica e a de proteção do meio ambiente, mudança do clima (observância do Acordo de Paris), que precisam ser melhor explicitadas.

Não resta dúvida sobre a importância do acordo com a UE, nosso segundo parceiro comercial do grupo e o primeiro em investimentos. As informações divulgadas até aqui dão uma ideia geral do arcabouço e das principais diretivas do acordo de livre comércio entre as duas regiões, mas não permitem ainda uma análise objetiva sobre o resultado das negociações porque não foram divulgadas nem as listas de produtos e seu cronograma de redução das tarifas ao longo de dez anos.,  nem o small print, ou seja, os detalhes relevantes da negociação. 

O acordo põe fim a um longo período de mais de 20 anos de isolamento do Mercosul e do Brasil nas negociações de acordos comerciais. Enquanto, nesse período, o Mercosul assinou apenas três acordos (Egito, Israel e Autoridade Palestina), segundo a OMC, foram assinados mais de 250 acordos comerciais no mundo. Isolado, o Brasil perdeu espaço nos fluxos dinâmicos do comércio internacional e participa de forma menor nas cadeias de valor global no intercâmbio entre empresas. Com a assinatura do acordo, na contramão do movimento global que tende ao protecionismo e às restrições ao livre comércio, o Mercosul volta a ter visibilidade e deve acelerar as negociações com a EFTA (área de livre comércio da Europa), o Canadá, Coreia e Cingapura.

Sem a divulgação completa do acordo, surgem dúvidas quanto à forma e rapidez com que o atual governo conduzirá o processo de abertura da economia.

Para aproveitar as preferências tarifárias recebidas e para manter a participação no mercado interno, os produtos industriais deverão melhorar significativamente sua competitividade e passar a receber um tratamento isonômico em relação ao produzido em outros países. Sem que isso ocorra, será difícil competir no mercado europeu com a importação de outras áreas.

Não se pode esperar dez anos para colocar a casa em ordem e aprovar reformas, como a da previdência, a tributária, a da estrutura tarifária interna. Faz-se necessário um amplo programa de desburocratização, de simplificação e facilitação de negócios e de melhoria na logística (portos, estradas, ferrovias) a fim de reduzir o chamado custo Brasil. Esse ônus para as empresas chega a mais de 30% e torna o produto nacional pouco competitivo. Em paralelo, um eficiente programa de inovação por parte da empresa e de políticas públicas ajudaria a modernizar a operação das companhias que produzem para o mercado doméstico e também exportam. Medidas recentes, inclusive portaria sobre a possibilidade de importação com tarifa zero para produtos sem produção local (também para produtos usados), no momento da divulgação do acordo com a UE, geram insegurança e incerteza pela falta de diálogo com o setor produtivo. 

Será importante que governo e setor privado atuem conjuntamente pois é objetivo comum gerar a confiança para a volta do investimento, o que  traria crescimento da economia e redução do desemprego. O acordo com a UE, assim como a entrada na OCDE, forçará governo e setor privado a trabalhar com o Congresso Nacional para a aprovação da legislação de forma a tirar o Brasil do atraso em que se encontra, sobretudo em termos tecnológicos.

Com visão de futuro e cumprida a agenda doméstica de recuperação da competitividade, ademais da conclusão dos acordos em negociação, o próximo passo poderia ser uma aproximação maior não com os EUA, como mencionado por Bolsonaro e Macri, de difícil concretização pelas políticas de Trump, mas com os países da Ásia, o polo dinâmico do comércio internacional. Seria importante sinalizar aos países membros da Parceria Trans-Pacífica (CCTPP), uma intenção nossa e do Mercosul em juntar-se ao grupo de 11 países que atualmente inclui Japão, sete países asiáticos, mais México, Chile e Peru. 

O acordo Mercosul-UE pode ser o elemento catalizador de todo um programa interno e de negociação externa que permitirá a expansão do comércio exterior brasileiro.

Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comercio Exterior (IRICE)

segunda-feira, 1 de julho de 2019

O custo dos negocios no Brasil - Rubens Barbosa (OESP)

COMO MELHORAR O AMBIENTE DE NEGÓCIOS

Rubens Barbosa
O Estado de S. Paulo, 25/06/2019

Sabemos todos que no Brasil são prioridades imediatas e urgentes a volta do crescimento e a queda do desemprego. Os dados do primeiro trimestre, porém, não são encorajadores do ponto de vista do setor privado.
O retorno da confiança no governo e o melhor desempenho da economia passam pela aprovação no Congresso de reformas estruturais, em especial a da previdência social, que ajudará a estancar a sangria do déficit público, e pela reforma tributária, que reduzirá o custo Brasil para o setor produtivo. Caso sejam aprovadas, o Ministério da Economia poderá liberar medidas para a abertura da economia, para a desburocratização e para a negociação de acordos comerciais com terceiros países para fazer crescer o comércio exterior e incentivar a retomada dos investimentos públicos e privados.
Nesse contexto, não se pode ignorar também um fator psicológico, muito relevante quando se examina a questão do investimento: o ambiente de negócios. Nesse sentido, a credibilidade dos contratos e a segurança jurídica das regras para a correta implementação das transações comerciais e financeiras são elementos que aqui ainda precisam ser aperfeiçoados para a volta sustentável dos investimentos das empresas nacionais e, sobretudo, internacionais. A corrupção e o descumprimento de compromissos assumidos devem ser enfrentados e a força da lei deve prevalecer sobre os interesses de grupos ou corporações.
Poderiam ser lembrados aqui vários exemplos, alguns dos quais vieram a público, para tornar concretos os comentários sobre a necessidade de melhoria no ambiente de negócios no Brasil.
Pelo seu volume, importância e visibilidade, poderia ser lembrado o conflito em curso sobre a segunda maior operação comercial que ocorreu no Brasil, envolvendo a aquisição, da ordem de R$ 16 bilhões, de uma empresa brasileira por um grupo internacional - a primeira foi a disputa entre o Grupo Pão de Açúcar e a empresa francesa Casino.
Os problemas surgiram nas tratativas de aquisição da empresa de celulose Eldorado, pertencente a J&F, pela Paper Excellence (PE), um dos maiores produtores de celulose do mundo. Segundo se noticiou, depois do acordo de leniência firmado com o Ministério Público por conta de problemas com a Lava Jato, a J&F decidiu vender a Eldorado, que cresceu favorecida por empréstimos do BNDES. A transação correu normalmente na primeira etapa, em 2017. A companhia PE, com sede na Holanda, pagou cerca de R$3,8 bi por 49% da Eldorado. O contrato previa opção de compra da totalidade da empresa brasileira, mais o passivo de dívidas. Para concluir a operação, a J&F deveria cooperar para a liberação de garantias do Grupo J&F em contratos financeiros da Eldorado até setembro passado, após o que a PE perderia a opção de compra. A PE, percebendo a obstrução da J&F, buscou a justiça brasileira e acionou o processo de arbitragem.
O que ocorreu a partir daí tem implicação com o ambiente de negócios e a segurança jurídica dos contratos, como acima referido. Desde a assinatura do contrato, o cenário micro e macroeconômico teve uma forte influência sobre o valor da empresa brasileira: a desvalorização do dólar, o salto da EBTIDA (74%) e o aumento significativo do preço da celulose no mercado internacional (41%). Diante disso, a J&F e a Eldorado alteraram seu posicionamento, atuando – segundo a PE - para impedir a conclusão da transação, apesar de todos os recursos para finalizar a transação (cerca de R$ 11 bi) estarem disponíveis no Brasil. As divergências continuam a ampliar-se com a tentativa de emissão de US$500 milhões em bônus da Eldorado, com a oposição da PE e bloqueada pela Justiça. O assunto está hoje submetido à arbitragem na ICC, na Áustria e em Cingapura para dirimir o conflito pelo descumprimento, segundo a visão da PE, de compromissos assumidos pela J&F e levará ainda algum tempo para ser resolvido. Os recursos alocados para a compra da Eldorado em parte estão imobilizados e novos investimentos foram suspensos.
O custo envolvido com advogados, consultores e assessoria de imprensa para oferecer informações ao público em geral passa a representar um ônus adicional para empresas que queiram participar do mercado brasileiro.
O Brasil é um grande produtor e exportador de celulose e foi uma estratégia normal da empresa estrangeira decidir investir no país e ampliar seus negócios globais na América do Sul. Casos como esse repercutem negativamente na mídia e prejudicam a credibilidade e o ambiente de negócios no Brasil. Hoje grande parte dos conflitos empresariais, tanto como o que ocorre entre a J&F e a PE, quanto em decorrência de problemas societários, são resolvidos por arbitragem em função da maior rapidez para se obter uma solução. De qualquer forma, nada se resolve antes de dois a três anos. A demora para obter uma decisão na justiça ou em cortes nacionais e internacionais de arbitragem contribuem para aumentar a insegurança e a desconfiança de potenciais investidores. 
Assuntos dessa natureza são de interesse do setor privado, mas o governo poder facilitar a rápida resolução dos conflitos por meio de negociações de acordos bilaterais de investimentos. Esses acordos regem disputas entre empresas privadas estrangeiras e os governos e companhias privadas, e representaram uma experiência exitosa nos últimos anos no âmbito da Comunidade Europeia, por exemplo. 
No final de 2018, o Banco Mundial divulgou um ranking de ambiente de negócios, que avalia 190 países. Embora melhorando em relação a 2017, o levantamento coloca o Brasil na 109ª posição e em último lugar entre os países membros do BRICS. Para alterar esse quadro, será necessária uma mudança cultural e de atitude de parte do setor privado, que passa inclusive pela lisura no cumprimento do livremente acordado e na relação com o governo. 

Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE)

segunda-feira, 10 de junho de 2019

Guerra cibernetica - Rubens Barbosa (OESP, 11/06/2019)


GUERRA CIBERNÉTICA

Rubens Barbosa
O Estado de S. Paulo, 11/06/2019

No século XXI, a tecnologia está definindo novas formas de emprego bélico nas guerras tradicionais. A inteligência artificial está abrindo espaço para armas e sistemas autônomos letaisrobôs autônomos letais, ou ainda, robôs assassinos. Definidas como qualquer sistema de arma com autonomia em suas funções, essas armas podem selecionar (isto é, procurar ou detectar, identificar, rastrear, selecionar) e atacar (isto é, usar força bruta contra, causar dano ou destruir) alvos, sem intervenção humana.
Em paralelo a esses desenvolvimentos tecnológicos - que terão impacto na guerra como entendida até aqui - a cibernética está inovando nas técnicas de enfrentamento sem o uso da força convencional As ameaças globais nos dias de hoje estão se transformando rapidamente: operações on line para influência e interferência em eleições, armas de destruição em massa e sua proliferação, terrorismo, contra-inteligência,  e tecnologias destrutivas, ameaças à competitividade econômica, espaço e armamento no espaço, crime transnacional (armas e drogas), entre outras.
Na definição do teórico Clausewitz, “guerra é um ato de violência destinado a forçar o adversário a executar nossa vontade”. A violência tem como objetivo controlar. O chinês Sun Tzu acrescenta que “a maior proeza militar é vencer sem combater”: a astúcia e a manipulação apresentam mais vantagens do que a agressividade para impor sua vontade sobre os outros.
Já chegamos a essa fase de sofisticação bélica. A guerra cibernética, definida com a utilização de meios numéricos para desenvolver a função de controlar outros ou empresas, transforma radicalmente os três componentes históricos da guerra: a espionagem, a sabotagem e a guerra da informação, na linha observada por Sun Tzu.
Multiplicam-se informações sobre o uso da capacidade cibernética – inclusive na espionagem, ataque e influência com o objetivo de conseguir vantagem política, econômica e militar. Segundo se noticia, de um lado a China, Rússia, Irã, Coreia do Norte, e de outro EUA, Israel, Reino Unido e França, dispõem de meios cada vez mais sofisticados para obter informações de governos e de empresas, para influir na vida das pessoas e destruir a infraestrutura e objetivos estratégicos.
Na última década esses países desenvolveram e experimentaram, com crescente capacitação, técnicas para alterar informações e sistemas em outros países. Por anos, conduziram espionagem cibernética para recolher inteligência e colocar em risco a infraestrutura de outras nações. Mais recentemente, novos tipos de ataque cibernético foram desenvolvidos e a mídia social passou a ser usada para alterar o pensamento, o comportamento e as decisões, como ocorreu nas eleições americanas pela ação da Cambridge Analytica-facebook. A medida em que bilhões de novos instrumentos digitais são conectados e integrados na vida cotidiana e nos negócios, competidores e adversários ganharão maior conhecimento para acesso às informações protegidas pelos governos e empresas.
O mundo entrou em uma fase de guerra permanente: sem frente de batalha e sem regras de engajamento. Em 2016, agentes de inteligência da China conseguiram capturar instrumentos de espionagem da NSA e os reposicionaram para atacar aliados dos EUA e empresas privadas da Europa e Ásia.
A guerra cibernética se assemelha à guerra insurrecional, com a diferença de poder planejar e executar a ação à distância, longe do inimigo. A utilização de algoritmos de inteligência artificial multiplicará o impacto das ações e criará no adversário novas vulnerabilidades. Será mais difícil a identificação de seus autores, pela utilização dos robots para autorizar a difusão de falsas informações nas redes sociais ou para a disponibilização com livre acesso de algoritmos permitindo incluir  pessoas em qualquer vídeo e de colocar em sua boca o que se deseje que ele diga. É possível que já estejam acontecendo  operações de  espionagem cibernética, de sabotagem ou de influência comandadas de maneira completamente autónoma, necessitando apenas do sinal verde de alguém.
Essa nova forma de ver as rivalidades e as estratégias adotadas pelas grandes potências globais está tratada de forma simples e direta no recente livro “Cyber: a guerra permanente”, de Jean Louis Gergorin e Leo-Isac-Dognin. O trabalho procura responder como a emergência do instrumento cibernético  se instalou no centro da Guerra permanente e quais são as consequências dessa nova relação de forças.
             O entendimento de que a tecnologia 5G possa ser explorada para espionagem e sabotagem de instalações de infraestrutura, rede de comunicação e centros financeiros passou a ser uma nova preocupação e está na raiz da proibição da compra de produtos da Huawei para as redes 5G públicas ou privadas nos EUA. A nova guerra fria entre os EUA e a China começou com o comércio, mas deve se deslocar rapidamente para a tecnologia, onde a China dá mostras de estar a frente de Washington nos avanços da aplicação da ultima geração 5G.
No Brasil, nos últimos anos, instituições públicas e empresas tem sido objeto de ataques por hackers e por organizações no exterior. Em 2013 Edward Snowden, ex-contratado da NSA, tornou públicos detalhes do programa de espionagem da NSA, que espionava vários países, inclusive o Brasil.  A vulnerabilidade do governo brasileiro foi admitida pelo então ministro da defesa, como mencionei neste espaço em 2015 (Segurança Cibernética). Recentemente o Itamaraty ficou paralisado por alguns dias, possivelmente depois de um ataque cibernético. Espera-se que o Centro de Defesa Cibernética do Ministério da Defesa tenha recursos adequados para desempenhar plenamente suas funções e tentar proteger governo e empresas dessa nova forma de guerra que está ai para ficar. O assunto é urgente.

Rubens  Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE)


terça-feira, 12 de março de 2019

Sergio Correa da Costa, 100 anos do nascimento - Rubens Barbosa

Rubens Barbosa, O Estado de S. Paulo, 12/03/2019

                                    SERGIO CORREA DA COSTA

O centenário de nascimento do embaixador Sérgio Corrêa da Costa, em 19 de fevereiro, nos permite rememorar algumas das facetas de um dos mais importantes representantes de uma geração de diplomatas que marcou de forma indelével sua passagem pelo Itamaraty. Correa da Costa, junto com Roberto Campos, Azeredo da Silveira, Ramiro Saraiva Guerreiro, Gibson Barbosa, Vasco Leitão da Cunha, Jorge Carvalho e Silva, Mozart Gurgel Valente, Miguel Ozorio, Antonio Correa do Lago, entre outros, deram sua contribuição para que a Chancelaria brasileira se afirmasse como uma instituição a serviço do Estado, acima de partidos ou de ideologias.
Diplomata de carreira, mas com interesses que iam além das atividades como servidor público exemplar, atuou como consultor no setor privado e tornou-se respeitado como intelectual e historiador.
Conheci Correa da Costa quando chegou a Londres em 1968 para chefiar a embaixada junto a Corte de Saint James, onde eu começara a servir no exterior com o embaixador Jaime Chermont. O novo embaixador chegava do Brasil tendo deixado a Secretaria Geral do Itamaraty.
Estávamos no governo Costa e Silva e o Ministro era Magalhães Pinto.  Como Secretario Geral, Corrêa da Costa ousou ser avançado para o seu tempo, onde os radicalismos internos e externos em tempos de Guerra Fria, deixavam pouco espaço para posições independentes. Na defesa do interesse brasileiro, superou facciosismos políticos internos e articulou a volta de cientistas que se exilaram no exterior. Entre outras iniciativas, foi um pioneiro na defesa do interesse brasileiro na energia nuclear e seu grande estimular   Deu grande ênfase ao planejamento diplomático com o apoio de brilhantes diplomatas como Paulo Nogueira Batista e Ovidio de Andrade Melo.
Depois de Londres, serviu como embaixador do Brasil nas Nações Unidas e Washington, onde também deixou sua marca. Aposentou-se em Washington em 1986. Aí passou a  trabalhar na empresa de consultoria de Henry Kissinger - Kissinger Associates  e deu aulas de História do Brasil na Universidade da Carolina do Norte. Posteriormente foi viver em Paris, onde trabalhou como advogado internacional no escritório Coudert-Freres e atuou como árbitro, em litígios submetidos à apreciação da Câmara de Comércio Internacional.
A designação do diplomata, no inicio de sua carreira, em 1940 para trabalhar no Arquivo histórico do Itamaraty foi um fator acidental que teve grande influência na sua formação e pelo seu gusto pela história, Ali instalou, como ele mesmo dizia, uma 'tenda de trabalho'. Sua pesquisa nos arquivos do Itamaraty resultaram em intensa produção intelectual. As Quatro Coroas de D. Pedro I (1940) e D. Pedro I e Metternich (1942), A Diplomacia Brasileira na Questão de Letícia (1942), sobre o diferendo entre a Colômbia e o Peru e A Diplomacia do Marechal - Intervenção estrangeira na revolta da Armada foram escritos nesse período.
Correa da Costa sempre atuou guiado pelo que Machado de Assis chamou de “instinto de nacionalidade”. Não apenas contribuiu para dar conteúdo e sentido à temática nacional, mas, sobretudo, viveu intensamente a sua época. Tanto na diplomacia, como na cultura e na história.
Em Paris, na veia de historiador, publicou Brasil, Segredo de Estado (2001) e Crônica de uma Guerra Secreta: Nazismo na América (2005). Ao mesmo tempo, dedicou-se a uma pesquisa original sobre a presença de palavras estrangeiras em diferentes idiomas. Esse trabalho trouxe um novo elemento a esse debate sem precedentes: o estudo da globalização lexical, filão até então pouco examinado. No final de 1999, foi publicado na França, e depois no Brasil, Mots sans Frontières  - Palavras sem fronteiras. Pela originalidade e por mostrar até aquele momento a força do idioma francês, o trabalho recebeu, por indicação do Instituto de França e da Academia Francesa, o grande prêmio da Fundação Príncipe Louis de Polignac, do Principado de Mônaco.
Na diplomacia, a palavra tem um significado muito sutil e delicado. É um instrumento de trabalho refinado e com muitas implicações para o entendimento entre as nações, para a paz e para as disputas politica, comerciais e bélicas. Correa da Costa foi um militante da globalização da palavra. Depois de ser apresentada na Academia Brasileira de Letras (ABL) no Rio de Janeiro e no Museu da Língua Portuguesa em São Paulo, a exposição Palavras sem Fronteiras foi acolhida no Itamaraty em 2018 e saudada pelo Ministro Aloysio Nunes Ferreira.
Em agosto de 1983 foi eleito para a cadeira número sete da ABL, que tem por patrono Castro Alves.  Em seu discurso de posse, não se esqueceu do Itamaraty, lembrando que a “tradição da Chancelaria consiste em identificar em cada momento histórico os interesses nacionais a defender. A constante preocupação com o Brasil perante o mundo e a busca permanente de meios para bem cumprir sua missão valeram justamente ao Itamarati a qualificação de “estado-maior civil da Nação”.
Em Paris, seu apartamento se transformou em um ponto de reuniões entre intelectuais brasileiros e franceses. Durante mais de uma década, Sérgio Corrêa da Costa acabou sendo, na pratica, o representante da Academia Brasileira de Letras junto à sua congênere francesa,. Tornou-se amigo de Maurice Druon, secretário perpétuo da Academia Francesa, que tinha, como ele, raízes maranhense, de Helène Carrère d´Encausse, sua sucessora e também de Philippe Rossillon, o secretário-geral da União Latina. 
Homem do mundo, Correa da Costa, servidor do Estado, é um exemplo para as novas gerações de diplomatas que deveriam também reafirmar sempre seu “instinto da nacionalidade“, em uma instituição de excelência, como o Itamaraty.


Rubens Barbosa, ex-embaixador do Brasil em Londres e Washington