Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
quarta-feira, 13 de julho de 2016
Mercosul e Venezuela, uma equacao dificil - Ministro de Estado Jose Serra (O Globo)
Quando o Mercosul fez 25 anos, em março passado, eu escrevi um:
2947. “O Mercosul aos 25 anos: minibiografia não autorizada”, Brasília, 24 março 2016, 8 p. Publicado em Mundorama - Revista de Divulgação Científica em Relações Internacionais (IRel-UnB; n. 103; 27/03/2016; ISSN: 2175-2052; link: http://www.mundorama.net/2016/03/27/o-mercosul-aos-25-anos-minibiografia-nao-autorizada-por-paulo-roberto-de-almeida/). Postado no blog Diplomatizzando (http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/03/o-mercosul-faz-25-anos-uma-biografia.html),
que pode ser lido em paralelo.
Paulo Roberto de Almeida
Vinte e cinco anos e muito por fazer
Ministro José Serra *
O Globo, 10/07/2016
O Mercosul faz 25 anos, em meio a bons resultados agregados, ao lado de algum ceticismos em relação ao período recente e ao futuro próximo. Tem pela frente o grande desafio da renovação e da adaptação a um cenário internacional cada vez mais competitivo e instável. A crise que atingiu a região nos últimos anos não diminui a importância do projeto de integração. Ao contrário, torna urgente recuperar o dinamismo perdido, com vistas ao nosso desenvolvimento e projeção externa. É no contexto desses desafios que abordamos a questão da transmissão da presidência pro tempore do Mercosul para a Venezuela.
A presidência do bloco, atualmente a cargo do Uruguai, é exercida semestralmente, em sequência alfabética. Ocorre que as circunstâncias políticas na Venezuela, bem como o estágio em que se encontra o cumprimento por esse país das obrigações que assumiu ao aderir ao Mercosul, levaram o Brasil a sugerir a postergação da próxima transmissão, que seria em julho, até o próximo mês de agosto. Todos nós acompanhamos com preocupação os desdobramentos da crise política, econômica e humanitária na Venezuela. O debate sobre o funcionamento de sua democracia reflete uma realidade de polarização e acirramento retórico de difícil superação. O conflito entre Executivo e Congresso paralisa o país, e a ação do Judiciário é objeto de sério questionamento.
Evidências de que setores ligados ao governo querem o fechamento da Assembléia Nacional dão a medida da turbulência. Há denúncias de prisões arbitrárias, crescente violência nas ruas e uma gravíssima crise de desabastecimento de alimentos e remédios, que vem castigando duramente a população, sobretudo a mais pobre. O Brasil aposta no diálogo entre as principais forças políticas venezuelanas para o encaminhamento dos impasses. Mas é forçoso reconhecer que, hoje, o cenário é de grande instabilidade e de falta de vontade política para levar adiante a construção de pontes para uma saída democrática da crise.
Ao Mercosul e a seu funcionamento institucional, incluindo o exercício da Presidência, interessa também o efeito das indefinições e pendências no processo de incorporação de normas pela Venezuela. A entrada do país nesse bloco, em julho de 2012, deu-se em circunstâncias exóticas que, agora, quatro anos depois, cobram sua fatura. O ingresso de um novo membro exige consenso, mas o Paraguai se opunha à entrada da Venezuela, alegando, com razão, falta de cumprimento de requisitos prévios. Então, sob pretexto de que a demissão do então chefe de governo paraguaio, Fernando Lugo, embora seguindo normas constitucionais, fôra antidemocrática, os demais membros decidiram suspender o Paraguai, artifício que permitiu a adoção precipitada e com base em critérios político- ideológicos, do protocolo que viria a reger a adesão da Venezuela.
Esse protocolo, ao contrário do que seria correto, autorizou a entrada imediata da Venezuela, deixando para quatro anos depois a obrigação de incorporar o acervo legal do Mercosul. Esse prazo de carência vence no próximo dia 12 de agosto. Estamos falando de um conjunto de mais de 1.100 normas e cerca de 50 tratados negociados no âmbito do bloco. São regras que definem a identidade, a forma e o funcionamento do Mercosul. Não é um tema menor. Antes, é o que confere ao bloco conteúdo e identidade. Até o momento, a Venezuela incorporou pouco mais da metade dessas normas.
Ou seja, falta ainda um expressivo conjunto incluindo aí documentos essenciais, como o “Protocolo de Assunção sobre o Compromisso com a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos no Mercosul (2005)”, o “Acordo de Residência do Mercosul (2002)” e o “Acordo de Complementação Econômica n. 18, no âmbito da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi)”.
Esse último, no qual estão refletidas as principais disciplinas comerciais do bloco, constitui a espinha dorsal do Mercosul comercial. A não incorporação dessas normas faz da Venezuela um sócio incompleto, inadimplente em relação a deveres que são fundamentais, como regras de origem, que definem se um produto pode ingressar nos demais parceiros sem pagar imposto de importação, cooperação judicial e regulamentos técnicos sobre meio ambiente, alimentos, direitos do consumidor e requisitos fitossanitários, entre outros. No momento em que os países da região, e o Mercosul com eles, voltam a conferir o devido valor à previsibilidade e à segurança jurídica, a expectativa de que a Venezuela cumpra com as obrigações assumidas é exigência lógica e requisito incontornável.
Ao propor a postergação da transferência da Presidência, o Brasil age com prudência, abrindo espaço e tempo para avaliar com serenidade o melhor caminho a seguir. O Mercosul não se pode deixar paralisar. Ao lado dos demais sócios, estamos determinados a modernizar o bloco, a derrubar os entraves que ainda impedem o total livre fluxo de comércio dentro do próprio bloco, a negociar matérias pendentes como investimentos e compras governamentais, a concluir novos acordos com parceiros extrarregionais e integrar-nos de maneira cada vez mais competitiva e proveitosa com o resto do mundo.
A Venezuela é um parceiro importante nesse processo. As potencialidades do país são imensas. Mas as bases para o nosso desenvolvimento conjunto precisam ser lastreadas em instituições respeitadas, comportamento previsível e regras claras. O futuro do Mercosul depende disso.
* José Serra é ministro das Relações Exteriores.
sábado, 21 de maio de 2016
Rubens Ricupero: entrevista sobre a nova política externa -- BBC
'Não adianta ter embaixada sem água e telefone', diz Ricupero
Ex-ministro e amigo de Serra defende fechamento de representações diplomáticas brasileiras e diz que legitimidade do governo lá fora dependerá de êxito no combate a crise
"Procuramos - eu e (o ex-ministro do Desenvolvimento) Sergio Amaral - dar a ele (Serra) um pouco de nossa percepção da situação (das relações exteriores brasileiras)", diz o diplomata aposentado.
"É um pouco aquilo que se diz em inglês, 'Nothing succeeds like success' (Nada tem mais sucesso do que o sucesso). Se o governo tiver êxito vai ser aplaudido. Se não tiver, vai ser muito criticado."
Confira a entrevista que Ricupero concedeu à BBC Brasil, por telefone, da casa de uma de suas filhas, na França.
BBC Brasil: Serra prometeu "desideologizar" as relações exteriores, mas em seu primeiro discurso também falou na aproximação em países politicamente mais alinhados ao atual governo brasileiro, como Argentina e México. Isso não é uma contradição?
Rubens Ricupero: Não há contradição porque uma coisa é você apoiar uma ideologia clara, como era o bolivarianismo, com a qual o PT tem certa identidade. Outra muito diferente é reconhecer realisticamente que o Brasil precisa manter uma relação mais estreita com os dois grandes países latino-americanos que são comparáveis a nós em tamanho, economia e influência - o México, no norte, e a Argentina, no sul.
Isso não significa que haja menosprezo pelos outros. Os países (da Aliança) do Pacífico e mesmo Venezuela, Bolívia e Equador, todos são parceiros. Mas (ter como foco a Argentina) é uma atitude realista, da mesma forma que para a Franca a relação especial é com a Alemanha. Ninguém aqui imaginaria que essa é uma opção ideológica - é uma imposição da realidade.
Ideologia é postular uma relação especial com países distantes, com os quais temos pouco em comum até na vida econômica, como Cuba e Nicarágua, apenas porque eles fazem parte da aliança bolivariana.
BBC Brasil: Mas se a Argentina tivesse um governo kirchnerista a aposta não seria a mesma, seria?
Ricupero: Seria, porque, como disse, isso é uma imposição da própria vizinhança, da realidade. Agora, não há dúvida que facilita (a relação), como o ministro disse no discurso, o fato de Argentina e Brasil estarem sintonizados, passando por momentos semelhantes, com problemas graves de natureza econômica e com o mesmo tipo de transição. Também com novos governos que têm uma visão parecida sobre a necessidade de uma inserção internacional mais aberta. Isso facilita enormemente para que se comece a mudar o panorama do Mercosul.
Uma coisa é um Mercosul em que o Brasil quer negociar com outros países acordos de comércio e a Argentina faz corpo mole, como até poucos meses atrás. Outra é ter um parceiro que quer tanto quanto nós negociar ativamente com a União Europeia e outros países. Há uma atitude diferente.
México, Colômbia, Peru, Chile. Todos esses países querem se integrar no mundo, abrir-se ao comércio e ao investimento - mesma linha que o Brasil segue agora. Então é natural que você tenha mais afinidade com esses países.
BBC Brasil: A diplomacia de Lula foi marcada por uma expansão do ativismo do Brasil lá fora e um aumento do número de embaixadas e consulados. Serra pediu que fosse calculado quanto custaria fechar algumas dessas representações. Fará uma diplomacia mais contida?
Ricupero: A diplomacia de Lula e do chanceler Celso Amorim refletiu um grande momento positivo vivido pelo Brasil, inclusive na economia. Havia um contexto mundial favorável, com crescimento acelerado da China e alto preço das commododities. Agora, a situação mudou muito. Essa redução do ativismo já foi perceptível no governo Dilma.
BBC Brasil: A expansão de embaixadas foi um erro?
Ricupero: Talvez menos que erro. Foi um entusiasmo precipitado. Julgou-se que aquele período de bonança duraria para sempre. E não só na política externa. Havia essa atitude com relação a todos os gastos do governo. Por isso eles se expandiram tanto.
BBC Brasil: O tom das notas emitidas em resposta a governos como Cuba, Nicarágua e Venezuela (que condenaram o impeachment da presidente Dilma Rousseff) causou polêmica e dividiu o Itamaraty. Para alguns, elas seriam muito incisivas, políticas.
Ricupero: Não concordo. A surpresa seria se não houvesse reação. Porque as notas dos outros é que foram de uma agressividade inacreditável na convivência diplomática. A nota da Venezuela, por exemplo, é umas sete vezes mais longa que a nota de resposta. A do Brasil é enérgica, mas está dentro do formato diplomático tradicional. Não há nenhum juízo sobre o que está acontecendo na Venezuela ou Cuba, sobre como são as eleições nesses países. Nada que atente contra o princípio de não intervenção. Quem interveio no Brasil foram eles. Apenas respondemos a uma agressão.
BBC Brasil: O que esperar da diplomacia de Serra?
Ricupero: Uma diplomacia realista, pragmática e sóbria, comprometida com a ampliação de nossas exportações e atração de investimentos para ajudar o país a sair da crise. No momento o comércio exterior, o setor externo é um dos poucos setores da economia que está começando a apresentar bons resultados. É verdade que por razões negativas - as importações caíram muito. Mas há a expectativa de se ampliar as exportações, e, com isso, criar empregos no Brasil.
BBC Brasil: O atual governo não pode ter dificuldades para garantir sua legitimidade lá fora?
Ricupero: Não se pode dar muita importância a essas coisas. No começo, sempre há esse tipo de estranheza, porque obviamente aconteceu uma coisa (processo de impeachment) que não é trivial e é preciso explicar (isso lá fora). Mas o que tenho visto na imprensa internacional é uma descrição se não positiva, ao menos bem informada (do que está ocorrendo no Brasil). Os artigos que vi no New York Times, Financial Times, Economist, Le Monde refletem a complexidade do que está se passando.
No fundo, a reputação que este governo vai ter fora e dentro do Brasil dependerá de como ele vai enfrentar os problemas da economia e outras áreas. Ou seja, se vai acertar ou não. É um pouco aquilo que se diz em inglês "Nothing succeeds like success" (Nada tem mais sucesso do que o sucesso). Se o governo tiver êxito vai ser aplaudido. Se não tiver, vai ser muito criticado. Protesto na Venezuela: para alguns analistas, país estaria à beira de um colapso.
Temos no debate no exterior a mesma divisão que no Brasil. Há quem seja favorável e quem seja contra (o impeachment). Afinal, vivemos (com o impeachment) um dilema no sentido estrito, do dicionário: uma situação em que uma pessoa é obrigada a escolher entre duas alternativas ruins - tanto a continuação como a mudança (eram ruins). E aí foi preciso ver marginalmente qual oferecia uma esperança de melhora.
BBC Brasil: A crise política e econômica da Venezuela se aprofundou. Alguns analistas dizem que o país está à beira de um colapso. Como o Brasil deve se posicionar?
Ricupero: Quando era diplomata cuidei de Venezuela por muitos anos. Não sei qual a opinião do ministro (Serra) sobre isso, mas acredito que a gente deve se manter dentro do princípio de não intervenção. Sei que a situação está muito tensa e se agrava dia a dia, mas não vejo outra possibilidade. Os países têm de encontrar seus caminhos por seus próprios meios e os outros podem ajudar se forem solicitados. Os resultados que vimos no mundo de ações que violam esse principio de não ingerência - por exemplo, a invasão do Iraque, a derrubada do regime da Líbia - foram todos desastrosos, ainda que tenham vindo embrulhados nas melhores intenções.
BBC Brasil: Serra deu indicações de que deve apostar nas negociações de acordos bilaterais. As dificuldades econômicas não podem ser um empecilho para atrair o interesse de outros países? Quais os acordos mais prováveis?
Ricupero: Esses acordos já estão em andamento. Eu soube que (um acordo) com o Peru está praticamente concluído. Imagino que vai ser mais fácil com esses países que se mostram mais abertos, Peru, Chile, México, espero que a Colômbia também.No caso dos EUA, é possível que se encontre uma maneira de continuar o esforço que o (ex-)ministro Armando Monteiro estava fazendo para examinar todas as barreiras não-tarifárias. Com a União Europeia eu diria que vai ser prioridade máxima, porque em conjunto a UE é de longe o maior parceiro comercial do Brasil e a maior fonte de investimentos para o país. A China também deve receber atenção especial.
BBC Brasil: O Mercosul pode deixar de ser uma união aduaneira para virar área de livre comércio?
Ricupero: Não acho que isso seja uma decisão (do ministro), não está no discurso dele. Essa ideia de deixar a união aduaneira é complexa, precisaria ser analisada em todas as suas implicações. Há setores importantíssimos tanto no Brasil quanto na Argentina que teriam dificuldade se não houvesse a união aduaneira, como o automobilístico.
"É um pouco aquilo que se diz em inglês, 'Nothing succeeds like success' (Nada tem mais sucesso do que o sucesso). Se o governo tiver êxito vai ser aplaudido. Se não tiver, vai ser muito criticado."
Confira a entrevista que Ricupero concedeu à BBC Brasil, por telefone, da casa de uma de suas filhas, na França.
BBC Brasil: Serra prometeu "desideologizar" as relações exteriores, mas em seu primeiro discurso também falou na aproximação em países politicamente mais alinhados ao atual governo brasileiro, como Argentina e México. Isso não é uma contradição?
Rubens Ricupero: Não há contradição porque uma coisa é você apoiar uma ideologia clara, como era o bolivarianismo, com a qual o PT tem certa identidade. Outra muito diferente é reconhecer realisticamente que o Brasil precisa manter uma relação mais estreita com os dois grandes países latino-americanos que são comparáveis a nós em tamanho, economia e influência - o México, no norte, e a Argentina, no sul.
Isso não significa que haja menosprezo pelos outros. Os países (da Aliança) do Pacífico e mesmo Venezuela, Bolívia e Equador, todos são parceiros. Mas (ter como foco a Argentina) é uma atitude realista, da mesma forma que para a Franca a relação especial é com a Alemanha. Ninguém aqui imaginaria que essa é uma opção ideológica - é uma imposição da realidade.
Ideologia é postular uma relação especial com países distantes, com os quais temos pouco em comum até na vida econômica, como Cuba e Nicarágua, apenas porque eles fazem parte da aliança bolivariana.
BBC Brasil: Mas se a Argentina tivesse um governo kirchnerista a aposta não seria a mesma, seria?
Ricupero: Seria, porque, como disse, isso é uma imposição da própria vizinhança, da realidade. Agora, não há dúvida que facilita (a relação), como o ministro disse no discurso, o fato de Argentina e Brasil estarem sintonizados, passando por momentos semelhantes, com problemas graves de natureza econômica e com o mesmo tipo de transição. Também com novos governos que têm uma visão parecida sobre a necessidade de uma inserção internacional mais aberta. Isso facilita enormemente para que se comece a mudar o panorama do Mercosul.
Uma coisa é um Mercosul em que o Brasil quer negociar com outros países acordos de comércio e a Argentina faz corpo mole, como até poucos meses atrás. Outra é ter um parceiro que quer tanto quanto nós negociar ativamente com a União Europeia e outros países. Há uma atitude diferente.
México, Colômbia, Peru, Chile. Todos esses países querem se integrar no mundo, abrir-se ao comércio e ao investimento - mesma linha que o Brasil segue agora. Então é natural que você tenha mais afinidade com esses países.
Leia também: Maioria de brasileiros aprova entrada de refugiados no país, mas não na própria cidade ou casa, diz pesquisa
BBC Brasil: A diplomacia de Lula foi marcada por uma expansão do ativismo do Brasil lá fora e um aumento do número de embaixadas e consulados. Serra pediu que fosse calculado quanto custaria fechar algumas dessas representações. Fará uma diplomacia mais contida?
Ricupero: A diplomacia de Lula e do chanceler Celso Amorim refletiu um grande momento positivo vivido pelo Brasil, inclusive na economia. Havia um contexto mundial favorável, com crescimento acelerado da China e alto preço das commododities. Agora, a situação mudou muito. Essa redução do ativismo já foi perceptível no governo Dilma.
BBC Brasil: A expansão de embaixadas foi um erro?
Ricupero: Talvez menos que erro. Foi um entusiasmo precipitado. Julgou-se que aquele período de bonança duraria para sempre. E não só na política externa. Havia essa atitude com relação a todos os gastos do governo. Por isso eles se expandiram tanto.
BBC Brasil: O tom das notas emitidas em resposta a governos como Cuba, Nicarágua e Venezuela (que condenaram o impeachment da presidente Dilma Rousseff) causou polêmica e dividiu o Itamaraty. Para alguns, elas seriam muito incisivas, políticas.
Ricupero: Não concordo. A surpresa seria se não houvesse reação. Porque as notas dos outros é que foram de uma agressividade inacreditável na convivência diplomática. A nota da Venezuela, por exemplo, é umas sete vezes mais longa que a nota de resposta. A do Brasil é enérgica, mas está dentro do formato diplomático tradicional. Não há nenhum juízo sobre o que está acontecendo na Venezuela ou Cuba, sobre como são as eleições nesses países. Nada que atente contra o princípio de não intervenção. Quem interveio no Brasil foram eles. Apenas respondemos a uma agressão.
BBC Brasil: O que esperar da diplomacia de Serra?
Ricupero: Uma diplomacia realista, pragmática e sóbria, comprometida com a ampliação de nossas exportações e atração de investimentos para ajudar o país a sair da crise. No momento o comércio exterior, o setor externo é um dos poucos setores da economia que está começando a apresentar bons resultados. É verdade que por razões negativas - as importações caíram muito. Mas há a expectativa de se ampliar as exportações, e, com isso, criar empregos no Brasil.
BBC Brasil: O atual governo não pode ter dificuldades para garantir sua legitimidade lá fora?
Ricupero: Não se pode dar muita importância a essas coisas. No começo, sempre há esse tipo de estranheza, porque obviamente aconteceu uma coisa (processo de impeachment) que não é trivial e é preciso explicar (isso lá fora). Mas o que tenho visto na imprensa internacional é uma descrição se não positiva, ao menos bem informada (do que está ocorrendo no Brasil). Os artigos que vi no New York Times, Financial Times, Economist, Le Monde refletem a complexidade do que está se passando.
No fundo, a reputação que este governo vai ter fora e dentro do Brasil dependerá de como ele vai enfrentar os problemas da economia e outras áreas. Ou seja, se vai acertar ou não. É um pouco aquilo que se diz em inglês "Nothing succeeds like success" (Nada tem mais sucesso do que o sucesso). Se o governo tiver êxito vai ser aplaudido. Se não tiver, vai ser muito criticado. Protesto na Venezuela: para alguns analistas, país estaria à beira de um colapso.
Temos no debate no exterior a mesma divisão que no Brasil. Há quem seja favorável e quem seja contra (o impeachment). Afinal, vivemos (com o impeachment) um dilema no sentido estrito, do dicionário: uma situação em que uma pessoa é obrigada a escolher entre duas alternativas ruins - tanto a continuação como a mudança (eram ruins). E aí foi preciso ver marginalmente qual oferecia uma esperança de melhora.
BBC Brasil: A crise política e econômica da Venezuela se aprofundou. Alguns analistas dizem que o país está à beira de um colapso. Como o Brasil deve se posicionar?
Ricupero: Quando era diplomata cuidei de Venezuela por muitos anos. Não sei qual a opinião do ministro (Serra) sobre isso, mas acredito que a gente deve se manter dentro do princípio de não intervenção. Sei que a situação está muito tensa e se agrava dia a dia, mas não vejo outra possibilidade. Os países têm de encontrar seus caminhos por seus próprios meios e os outros podem ajudar se forem solicitados. Os resultados que vimos no mundo de ações que violam esse principio de não ingerência - por exemplo, a invasão do Iraque, a derrubada do regime da Líbia - foram todos desastrosos, ainda que tenham vindo embrulhados nas melhores intenções.
BBC Brasil: Serra deu indicações de que deve apostar nas negociações de acordos bilaterais. As dificuldades econômicas não podem ser um empecilho para atrair o interesse de outros países? Quais os acordos mais prováveis?
Ricupero: Esses acordos já estão em andamento. Eu soube que (um acordo) com o Peru está praticamente concluído. Imagino que vai ser mais fácil com esses países que se mostram mais abertos, Peru, Chile, México, espero que a Colômbia também.No caso dos EUA, é possível que se encontre uma maneira de continuar o esforço que o (ex-)ministro Armando Monteiro estava fazendo para examinar todas as barreiras não-tarifárias. Com a União Europeia eu diria que vai ser prioridade máxima, porque em conjunto a UE é de longe o maior parceiro comercial do Brasil e a maior fonte de investimentos para o país. A China também deve receber atenção especial.
BBC Brasil: O Mercosul pode deixar de ser uma união aduaneira para virar área de livre comércio?
Ricupero: Não acho que isso seja uma decisão (do ministro), não está no discurso dele. Essa ideia de deixar a união aduaneira é complexa, precisaria ser analisada em todas as suas implicações. Há setores importantíssimos tanto no Brasil quanto na Argentina que teriam dificuldade se não houvesse a união aduaneira, como o automobilístico.
quarta-feira, 18 de maio de 2016
Politica externa de Serra demole lulopetismo diplomatico - FSP
PATRÍCIA CAMPOS MELLO
DE SÃO PAULO
Folha de S.Paulo, 18/05/2016
Não sobrou pedra sobre pedra.
Em discurso de cerca de 15 minutos durante a cerimônia de transmissão de cargo, o novo ministro das Relações Exteriores, José Serra, demoliu os principais princípios da política externa dos últimos 13 anos, dos governos Lula e Dilma.
Abaixo, alguns dos pontos abordados, o contexto e as entrelinhas:
1. "A diplomacia voltará a refletir de modo transparente e intransigente os legítimos valores da sociedade brasileira e os interesses de sua economia, a serviço do Brasil como um todo e não mais das conveniências e preferências ideológicas de um partido político e de seus aliados no exterior"
A oposição a Dilma e Lula constantemente acusava a política externa brasileira de ser "ideologizada", por causa da proximidade da administração e, principalmente, do assessor internacional Marco Aurelio Garcia com governos de esquerda. Já em sua primeira diretriz, o novo chanceler disse que a política externa não estará a serviço de uma ideologia, de um partido.
2. "Estaremos atentos à defesa da democracia, das liberdades e dos direitos humanos em qualquer país"
Recado direto para países bolivarianos, como Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador e Nicarágua, que questionaram a legalidade do afastamento da presidente Dilma Rousseff.
O Itamaraty sob Serra já emitiu notas rechaçando os comentários. A diretriz traduz para termos mais diplomáticos a frase recente do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado: "Imagine ouvir calado países como Cuba e Venezuela darem lições de democracia?"
3. _"O Brasil assumirá a especial responsabilidade que lhe cabe em matéria ambiental.... a fim de desempenhar papel proativo e pioneiro nas negociações sobre mudança do clima"
Serra e seus colaboradores próximos defendem que o país se descole de nações em desenvolvimento "protecionistas" nas negociações do clima e seja mais ambicioso nas ofertas.
O discurso teve grande colaboração do ex-ministro Rubens Ricupero, que é muito próximo a Serra, e de Sergio Amaral.
Depois de ser ministro da Fazenda, Ricupero foi ministro do Meio Ambiente e propõe que o Brasil seja muito mais audacioso nas negociações do clima. Amaral foi ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior no segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso e porta-voz da Presidência no primeiro mandato do tucano. Terá cargo na gestão Serra.
Outros "discípulos" de Ricupero, como Marcos Galvão, atualmente representante do Brasil junto à Organização Mundial do Comércio (OMC), e Roberto Jaguaribe, embaixador na China, devem voltar ao Brasil para assumir cargos —Galvão seria um segundo secretário-geral na nova estrutura do Itamaraty, e Jaguaribe deve ir para a Apex.
4. "Na ONU e em todos os foros globais e regionais a que pertence, o governo brasileiro desenvolverá ação construtiva em favor de soluções pacíficas e negociadas para os conflitos internacionais e de uma adequação de suas estruturas às novas realidades e desafios internacionais"
A luta pelas reformas das instituições internacionais como a ONU, FMI e Banco Mundial para que melhor reflitam a nova ordem mundial, uma bandeira das administrações petistas, é mencionada apenas indiretamente como "adequação de suas estruturas às novas realidades".
Nenhuma menção à reforma do Conselho de Segurança da ONU, obsessão no governo Lula que já havia sido posta de lado no governo Dilma.
5. "O Brasil não mais restringirá sua liberdade e latitude de iniciativa por uma adesão exclusiva e paralisadora aos esforços multilaterais no âmbito da Organização Mundial do Comércio, como aconteceu desde a década passada, em detrimento dos interesses do país.
O multilateralismo que não aconteceu prejudicou o bilateralismo que aconteceu em todo o mundo. Quase todo mundo investiu nessa multiplicação, menos nós. Precisamos e vamos vencer esse atraso e recuperar oportunidades perdidas"
Serra fez um ataque frontal à aposta do governo brasileiro nas negociações multilaterais da OMC, que, na prática, morreram. Reflete a percepção da oposição de que o Brasil perdeu tempo apostando na OMC em vez de fechar mais acordos bilaterais. Ele faz a ressalva de que a OMC é a única via para ganhos no setor agrícola, mas diz que não se pode apostar nisso em detrimento de acordos bilaterais. Deve ser aplaudido por empresários, que vinham pressionando para a busca de mais acordos.
6. "Por isso mesmo, daremos início, juntamente com o Ministério da Indústria, Comércio e Serviços, com a cobertura da Camex (Câmara de Comércio Exterior) e em intensa consulta com diferentes setores produtivos, a um acelerado processo de negociações comerciais, para abrir mercados para as nossas exportações e criar empregos para os nossos trabalhadores"
Serra mostra que reforçar o comércio exterior deve ser um dos principais objetivos do ministério e aproxima o Itamaraty do centro decisório da política econômica do novo governo - que era a ambição inicial do ministro.
7. "Um dos principais focos de nossa ação diplomática em curto prazo será a parceria com a Argentina, com a qual passamos a compartilhar referências semelhantes para a reorganização da política e da economia.
Precisamos renovar o Mercosul, para corrigir o que precisa ser corrigido, com o objetivo de fortalecê-lo, e continuar a construir pontes, em vez de aprofundar diferenças, em relação à Aliança para o Pacifico, que envolve três países sul-americanos, Chile, Peru e Colômbia"
Muitos críticos da política externa dos últimos governos, como o ex-embaixador em Washington Rubens Barbosa, pedem a flexibilização do Mercosul para que se transforme apenas em área de livre comércio, em vez de união aduaneira. Dessa maneira, o Brasil estaria livre para negociar acordos comerciais sem chancela dos outros membros do Mercosul.
Mas a fala de Serra mostra que o novo chanceler não deve ser tão radical.
Ricupero, em entrevista à Folha neste mês, afirmou: "Não se sabe se transformar o Mercosul em área de livre comercio traria benefícios, e a Argentina agora tem um presidente, Mauricio Macri, que não seria obstáculo a negociações comerciais", diz. É exatamente esta a linha adotada por Serra, ao sublinhar que a relação com a Argentina será prioridade, agora que Brasil e o vizinho passaram a "compartilhar referências semelhantes" —ou seja, Cristina Kirchner, alinhada com os governos petistas, foi sucedida por Macri.
A aproximação com a Aliança do Pacífico já está em curso por meio de diversos acordos de investimentos e serviços. Vem do raciocínio de que o Brasil estava alinhado com os países que menos crescem no continente, como Venezuela, Argentina e Equador, e alienado dos mais dinâmicos, que são os da Aliança do Pacífico.
8. "Vamos ampliar o intercâmbio com parceiros tradicionais, como a Europa, os EUA e o Japão. Com os EUA, nós confiamos em soluções práticas de curto prazo para a remoção de barreiras não tarifárias, que são, no mundo de hoje, as essenciais"
Voltar a dar atenção ás relações com países ricos e não apenas nos concentrar Sul-Sul, essa é a mensagem. Com EUA, a meta é "desideologizar" a relação. Voltar a aspectos práticos que atingem os empresários e o país, como as barreiras não tarifárias a produtos.
9. "Será prioritária a relação com parceiros novos na Ásia, em particular a China. Estaremos empenhados igualmente em atualizar o intercâmbio com a África, o grande vizinho do outro lado do Atlântico.
Não pode esta relação restringir-se a laços fraternos do passado e às correspondências culturais, mas, sobretudo, forjar parcerias concretas no presente e para o futuro.
Ao contrário do que se procurou difundir entre nós, a África moderna não pede compaixão, mas espera um efetivo intercâmbio econômico, tecnológico e de investimentos. Essa é a estratégia Sul-Sul correta, não a que chegou a ser praticada com finalidades publicitárias, escassos benefícios econômicos e grandes investimentos diplomáticos"
Critica a política de aproximação com a África, marca do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que abriu 17 embaixadas e fez inúmeras viagens a países africanos. Ao dizer a "África moderna não pede compaixão", remete ao perdão da dívida de países africanos durante o governo Dilma.
Ao dizer "Essa é a estratégia Sul-Sul correta, não a que chegou a ser praticada com finalidades publicitárias, escassos benefícios econômicos e grandes investimentos diplomáticos", aponta para a discussão sobre fechamento de embaixadas em países africanos e do Caribe que foram abertas nos governos petistas.
A Folha revelou que Serra pediu um estudo para analisar o custo e a utilidade dos postos diplomáticos abertos nos governos Lula (2003-2010) e Dilma Rousseff para, eventualmente, pedir o fechamento de alguns deles
10. "Nas políticas de comércio exterior, o governo terá sempre presente a advertência que vem da boa análise econômica, apoiada em ampla e sólida consulta com os setores produtivos. É ilusório supor que acordos de livre comércio signifiquem necessariamente a ampliação automática e sustentada das exportações.
Só há um fator que garante esse aumento de forma duradoura: o aumento constante da produtividade e da competitividade. Se alguém acha que basta fazer um acordo e abrir, que isso é condição necessária suficiente, está enganado. É preciso investir no aumento constante da competitividade e da produtividade"
De novo, Serra reforça o viés econômico que terá o ministério sob seu comando.
Última diretriz: "Eu citaria uma que temos que cumprir, colaborando com os ministérios da Justiça, da Defesa e da Fazenda, no que se refere à Receita Federal: a proteção das fronteiras, hoje o lugar geométrico do desenvolvimento do crime organizado no Brasil, vamos ter isso claro, que se alimenta do contrabando de armas, contrabando de mercadorias, que é monumental, e do tráfico de drogas.
Em especial, nos empenharemos em mobilizar a cooperação dos países vizinhos para uma ação conjunta contra essas práticas criminosas que tanto dano trazem ao nosso povo e à nossa economia"
Serra tem especial preocupação com a segurança das fronteiras. Em sua campanha presidencial de 2010, ele afirmou que o governo boliviano era "cúmplice do tráfico", dizendo que as quadrilhas de traficantes que atuam a partir do país vizinho eram responsáveis pelo envio de até 90% da cocaína produzida no país para ser consumida no Brasil.
Itamaraty: "Quero progressivamente retirar o Itamaraty da penúria de recursos em que foi deixado pela irresponsabilidade fiscal que dominou a economia brasileira nesta década. E no governo do Presidente Temer, o Itamaraty volta ao núcleo central do governo"
O Itamaraty sofreu com sucessivos cortes e contingenciamento de gastos nos últimos anos. A participação do Itamaraty no Orçamento total do Executivo, que já era pequena, caiu a quase a um quarto em 2015 em relação a 2003 —de 0,5% para 0,13%. Muitos diplomatas estão com o pagamento de seus aluguéis atrasado. Embaixadas chegaram a ficar sem recursos para pagar a conta de luz, no ano passado.
Quando diz que o Itamaraty vai voltar ao núcleo central do governo, trata-se de uma crítica à presidente Dilma Rousseff, que teria negligenciado a política externa, por falta de interesse, o que teria resultado no enfraquecimento do ministério e sucessivos ministros.
domingo, 1 de maio de 2016
Itamaraty: Senador Jose Serra assume o ministerio - Patricia Campos Mello (FSP)
Patricia Campos
DE SÃO PAULO
Folha de São Paulo, 30/04/2016
A perspectiva de ter o senador José Serra (PSDB-SP) como próximo chanceler anima o Itamaraty, segundo apurou a Folha. Ter como ministro um político de estatura em vez de um diplomata de carreira fortaleceria o ministério em um momento de fragilidade. Com Serra, o Itamaraty voltaria a ter o peso que não tinha desde a saída do chanceler Celso Amorim, em 2010, acreditam diplomatas.
Mas a possibilidade de transferir a área de comércio exterior para o ministério é alvo de fortes críticas. Um Itamaraty "turbinado" incluiria toda área de comércio exterior, ou somente a Apex, agência que faz promoção comercial. O primeiro cenário gera pânico no Ministério do Desenvolvimento e profundo desagrado no Itamaraty.
"Seria como misturar vinho com azeite", diz uma fonte. São duas carreiras muito diferentes –a política externa segue uma visão de Estado enquanto a política comercial precisa abrir mercados e vender produtos. "É preciso ter um órgão que receba demandas do setor privado, como defesa comercial, e o Itamaraty não pode ser esse órgão, porque vai priorizar as relações diplomáticas com outros países", diz uma fonte do Desenvolvimento. União Europeia, EUA, China e Japão têm ministérios separados para lidar com comércio exterior e diplomacia.
Além disso, a incorporação da área de comércio exterior tomaria muito tempo e talvez nem estivesse pronta até o fim do governo Temer, em 2018.
Pessoas próximas a Temer afirmam que o vice fez a proposta a Serra sem pensar exatamente em como esse Itamaraty "turbinado" sairia do papel, tentando emplacar um "ministério fortalecido" em vez das pastas da Fazenda ou Planejamento, que o tucano preferia.
De qualquer maneira, diplomatas já comemoram a possibilidade de um ministro Serra. "Seria um ministro com acesso ao presidente e ao Ministério do Planejamento, que lidera os cortes de verbas do Itamaraty", diz um diplomata. Entre as mudanças esperadas estariam o fechamento de postos na África, menos ênfase no relacionamento Sul-Sul e uma guinada no Mercosul.
Mas o embaixador Rubens Ricupero, ex-ministro da Fazenda que é muito próximo de Serra, com quem conversa regularmente, não acredita em mudanças dramáticas na política para o Mercosul. "Não se sabe se transformar o Mercosul em área de livre comercio traria benefícios e a Argentina agora tem um presidente, Mauricio Macri, que não seria obstáculo a negociações comerciais", diz. Matias Spektor, professor de Relações Internacionais da FGV e colunista da Folha, concorda. "Fazer reformas no Mercosul e no comércio exterior é muito complexo e geraria muitos inimigos", diz.
Em relação à personalidade difícil do senador, um diplomata é pragmático: "Depois de tanto tempo trabalhando com a Dilma, o Serra não seria um problema."
Entre os diplomatas com bom trânsito com o senador tucano estão Sergio Danese, atual secretário-geral do Itamaraty; Santiago Mourão, embaixador em Teerã, Mário Vilalva, embaixador em Lisboa, Marcos Galvão, embaixador junto à OMC, e Roberto Jaguaribe, embaixador em Pequim.
Se o chanceler for mesmo um político, o assessor internacional da presidência, cargo hoje ocupado por Marco Aurelio Garcia, poderia ser um diplomata de carreira, e o nome de Danese surge com força. Segundo um interlocutor de Temer, o vice já teve várias audiências com Danese e a "química foi boa".