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quinta-feira, 5 de julho de 2012

Venezuela no Mercosul: ilegalidade - Yves Gandra Martins


Folha de S.Paulo, 05/07/2012

Tendências/Debates: Democracia paraguaia

IVES GANDRA DA SILVA MARTINS
Em 1991, fui convidado pelo Ministro da Justiça do Paraguai, com constitucionalistas de outros países latino-americanos, para proferir palestras sobre a Constituição brasileira. À época, o Paraguai se encontrava em processo constituinte, em vias de promulgar a Constituição que hoje rege os destinos da nação.
Entre os temas que abordei, expliquei que toda a Constituição brasileira fora formatada para um regime parlamentar de governo, só na undécima hora tendo se transformado numa Lei Maior presidencialista.
Talvez por essa razão, o equilíbrio de Poderes foi realçado ao ponto de, apesar de nossas crises políticas --impeachment presidencial, crise do Orçamento, dos anões, superinflação, alternância do poder, mensalão etc.--, jamais alguém ter falado em ruptura institucional.
O cientista político Arend Lijphart, em seu livro "Democracies", de 1984, detectou, em todo o mundo, apenas 20 países em que não houvera ruptura institucional depois da Segunda Guerra.
Desses, 19 eram parlamentaristas. Apenas um, os EUA, era presidencialista. Ulisses Guimarães me pediu o livro emprestado, mas preferi enviar um exemplar --lembrando da advertência de Aliomar Baleeiro, que dizia ter amigos que fizeram sua biblioteca com livros emprestados.
Sou parlamentarista desde os bancos acadêmicos, e sempre vi no parlamentarismo um sistema de "responsabilidade a prazo incerto": eleito um irresponsável para a chefia do governo, ele pode ser afastado, sem traumas, tirando-lhe o Parlamento o voto de confiança.
Já o presidencialismo é um regime de "irresponsabilidade a prazo certo", pois, eleito um irresponsável, ele só pode ser afastado pelo traumático processo de impeachment.
O Paraguai adotou o regime presidencial, mas, no artigo 225 de sua Constituição, escolheu instrumento existente no sistema parlamentar para afastar presidentes que:
a) Tenham mau desempenho;
b) Cometam crimes contra o Poder Público;
c) Cometam crimes comuns.
Tendo recebido um voto na Câmara dos Deputados e quatro no Senado, Lugo foi afastado do governo, no estritos termos da Constituição, por mau desempenho.
É de se lembrar que o Parlamento tem representantes da totalidade da nação (situação e oposição). O Executivo, só da maioria (situação).
Folhapress
Tanto foi tranquilo o processo de afastamento no Paraguai que não existiram manifestações de expressão em defesa do ex-presidente. As Forças Armadas nem precisaram enviar contingentes à rua, e Lugo continuou com toda a liberdade para expressar as suas opiniões e até para montar um governo na sombra.
Processo digno das grandes democracias parlamentares. Mas difícil de ser compreendido pelo histriônico presidente venezuelano, que usa todos os meios possíveis para calar a oposição e a imprensa, pela aprendiz de totalitarismo que é a presidente argentina, que tudo faz para eliminar a imprensa livre em seu país, ou pelos dois semiditadores da Bolívia e do Equador.
O curioso foi o apoio da presidente Dilma a essa "rebelião de aspirantes a ditadores", pisoteando a democracia e a Lei Suprema paraguaia a fim de facilitar a entrada no Mercosul de um país cuja monoeconomia só permitirá a seu conturbado presidente permanecer no poder enquanto o preço do petróleo for elevado.
Decididamente, a ignorância democrática na América Latina tem um passado fantástico e um futuro deslumbrante.
IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, 77, advogado, professor emérito da Universidade Mackenzie, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra, é presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio
*
PARTICIPAÇÃO
Para colaborar, basta enviar e-mail para debates@uol.com.br.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

sábado, 26 de maio de 2012

A Venezuela e o Mercosul: precisoes

Um jornalista, obviamente mal informado, e provavelmente simpático à Venezuela, quando não trabalhando para o governo chavista, me escreve estas palavras num comentário a este post em meu blog (do qual fiz apenas a transcrição, não sendo responsável pelo teor da matéria):

SÁBADO, 12 DE MAIO DE 2012

[Transcrevo:]
É uma vergonha como meia dúzia de políticos da extrema direita radical do Paraguai tenta impedir a integração do nosso continente sul americano. Interesses menores desses políticos do Congresso Paraguai está afetando toda a população venezuelana. A Unasul criou organismos para combater todo o narcotráfico na América do Sul. Os narcotraficantes estão espalhados em toda a América Latina, principalmente no México e Colômbia. Os venezuelanos elegeram Chaves e não podem pagar pelo regime implantado na Venezuela, o da reeleição. Se Chaves fosse um ditador seria expulso da OEA, da ONU e de organizações democráticas internacionais. Argentina, Brasil e Uruguai já aprovaram em seus Congressos, e o Paraguai faz chantagem para aprovar a Venezuela. O povo venezuelano é quem está sendo penalizado. Como sempre o Paraguai é a ovelha negra, o que tem a oferecer ao Mercosul, nada, nem saída para o mar eles tem.Na última cúpula das Américas, em Cartagena, Obama e Hillary Clinton, não fizeram nenhuma objeção quanto a participação da Venezuela nesta reunião, apenas barrarão Cuba. Portanto a Venezuela é reconhecida pelos Estados Unidos como um país de eleições democráticas. É o que fez Lula indicando sua sua sucesso e o povo elegeu Dilma. Já o Paraguai que tem telhado de vidro quer dar uma de politicamente correto. Se não querem a Venezuela, pois que deixem o Mercosul, teremos muito mais a ganhar com a Venezuela com seus barris de petróleo e um dos mais ricos países da América Latina. O Mercosul sairá fortalecido com a Venezuela.

[Fim de transcrição]

Comento agora (PRA): 
A linguagem, obviamente, não é de um jornalista, e se ele fosse, de fato, talvez merecesse demissão de qualquer veículo em que trabalhasse, pela má qualidade da escrita, pela falta total de conhecimento da matéria, pela ausência completa de lógica na argumentação (esta não existe na verdade, senão uma peroração em prol do regime chavista e acusações vergonhosas a outro país soberano). Esse "jornalista" sequer mereceria resposta, já que seu propósito é inteiramente político e militante, não de debate.
Como, no entanto, este blog debate ideias, creio que esta representa uma oportunidade para o esclarecimento dos que não acompanham em detalhe este assunto do ingresso da Venezuela no Mercosul.
Existiram processos democráticos em curso, em todos os parlamentos dos países membros quanto a este ingresso; ele foi concluído e aprovado em três deles -- Argentina, Brasil e Uruguai -- e ainda depende da aprovação do parlamento paraguaio. Independentemente da decisão que se tome -- e os outros membros já tentaram pressionar indevidamente o parlamento paraguaio para que este tome uma decisão rapidamente -- é preciso ficar claro que esse ingresso se dá em condições completamente anômalas no que respeita à institucionalidade interna do Mercosul.
É um FATO que a Venezuela não cumpriu -- e não se sabe quando cumprirá -- os tramites habilitantes para que esse ingresso seja feito na forma devida, ou seja, incorporação da TEC do Mercosul e das demais normas de política comercial que regem o funcionamento do bloco.
Apenas este motivo -- independentemente, portanto, do caráter mais ou menos democrático do regime chavista -- já seria suficiente para questionar a legalidade, a oportunidade e a legitimidade jurídica desse ingresso, que se faz ao arrepio de todo o ordenamento comercial do Mercosul e até do regime multilateral de comércio.
É um fato, por exemplo, que o Mercosul possui um acordo de livre comércio com Israel, país com o qual Chávez decidiu romper relações por razões políticas; como fará a Venezuela, se por acaso for admitida no Mercosul: deixará de honrar esse acordo de livre comércio?
É um fato que os processos decisórios em vigor atualmente na Venezuela não permite visualizar uma normalização de suas relações econômicas externas, o que a levariam, por exemplo, a estabelecer o livre comércio com todos os membros do Mercosul. Seria a Venezuela capaz de fazê-lo?Parece duvidoso. Enfim, existem numerosas razões, de ordem não política, mas puramente jurídica, ou institucional, para que se reconsidere o ingresso, salvo, obviamente, que a intenção seja a de fragilizar ainda mais o Mercosul, converter um bloco comercial em órgão meramente político.
Estas são as questões reais que deveriam estar sendo discutidas no processo de adesão, não as alusões bizarras, surrealistas, mencionadas por esse "jornalista" em seu comentário.

De resto, julgo lamentável transcrever uma mensagem tão mal escrita, tão cheia de erros formais e substantivos, com opiniões tão ridículas quanto ofensivas a um país da região, e não o teria feito se não fosse com o objetivo didático acima exposto.
Lamento constatar, uma vez mais, o nível lamentável de educação linguística e política de quem se pretende jornalista. 
São os ares do tempo, aqui e na região, infelizmente...
Paulo Roberto de Almeida