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quarta-feira, 4 de agosto de 2021

Acordo Mercosul-UE: sem a menor chance de ser aprovado, por causa da política antiambiental de Bolsonaro - Janaina Figueiredo (Globo)

 Desde junho de 2019, quando o acordo foi assinado em caráter preliminar, que eu afirmo que ele não tem qualquer condição de entrar em vigor, exclusivamente devido às políticas de DESTRUIÇÃO ambiental de Bolsonaro.

A situação, na verdade, continua piorando, com o projeto de “Lei da Grilagem”. A UE vai bloquear o acordo.

Paulo Roberto de Almeida 


Comissão Europeia indica que mudança em regras ambientais no Brasil prejudicará acordo UE-Mercosul
Janaina Figueiredo
O Globo, 04/08/2021 

RIO - Com o processo de ratificação do acordo para a criação de uma zona de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia (UE) paralisado, a pressão da esquerda europeia para impedir que o entendimento saia do papel é cada vez mais intensa.

Na última segunda-feira, a Comissão Europeia, que tem a prerrogativa de submeter ou não o acordo ao Conselho Europeu e ao Parlamento para sua eventual confirmação e assinatura, indicou que o avanço do projeto que altera as regras do licenciamento ambiental no Brasil avançar no Legislativo brasileiro pesará em sua decisão.

A manifestação foi uma resposta a uma consulta do eurodeputado Miguel Urbán, líder do Anticapitalistas e membro destacado da bancada de esquerda no Parlamento da UE.

O órgão da UE assegurou que, se o Projeto de Lei 3.729/2004 for aprovado e "tiver um impacto negativo na proteção do meio ambiente", como denunciam diversas ONGs, antes da entrada em vigência do acordo, "isso poderia influenciar a avaliação da Comissão sobre as condições adequadas para a apresentação do acordo para sua ratificação".

Ou seja, se o projeto já aprovado na Câmara obtiver sinal verde do Senado brasileiro antes da assinatura do acordo entre Mercosul e UE, cenário mais provável, a Comissão Europeia deixou claro que seria criado mais um impedimento para o acordo avançar.

Na noite desta terça-feira, o texto-base de um outro projeto de lei que é muito criticado por ambientalistas foi aprovado na Câmara. É o PL 2.633/2020, que flexibiliza a regularização fundiária em terras da União.

Segundo ambientalistas, o "PL da grilagem", como é conhecida a proposta, servirá como anistia a invasores de terra, já que autoriza o aumento de propriedades passíveis de regulamentação sem vistoria prévia, bastando a análise de documentos e a declaração de seu ocupante de que segue a legislação. O texto segue agora para o Senado.

Desde que as negociações entre Mercosul e UE foram concluídas, em junho de 2019, a política ambiental do governo de Jair Bolsonaro se tornou a principal pedra no sapato do acordo comercial.

Em recente entrevista ao GLOBO, o embaixador da UE no Brasil, Ignacio Ybáñez, afirmou que o Brasil "precisa reconstruir a confiança com resultados concretos em matéria de desmatamento".

Projeto enfraquece licenciamento ambiental
O projeto flexibiliza o licenciamento ambiental e simplifica processos. Na visão de críticos da iniciativa, em discussão há 17 anos, o projeto pode aumentar a destruição de biomas, colocar em risco populações tradicionais, como os indígenas, e piorar ainda mais a imagem do Brasil no exterior.

Também se questiona o fato de que a fiscalização continuará sendo executada por órgãos enfraquecidos pelo governo, como o Ibama.

— Se esta lei for aprovada, desastres ambientais como Brumadinho serão a norma e não a exceção — disse Urbán ao GLOBO.

Segundo o eurodeputado, que fez recentemente duríssimas críticas ao governo Bolsonaro sobre a administração da pandemia, o PL "contradiz as cláusulas sobre meio ambiente do acordo entre Mercosul e UE".

— As políticas do governo Bolsonaro contra o meio ambiente, os povos originários e os direitos humanos demonstram o que estamos denunciando há algum tempo. Com genocidas do meio ambiente, o que chamamos de ecocidas, como Bolsonaro não há nada a ser negociado — assegurou o eurodeputado.

Diplomacia brasileira vê dificuldades em 2022

Entre diplomatas brasileiros, existem baixíssimas expectativas de que o acordo entre Mercosul e UE seja ratificado antes de 2023. A explicação para traçar esse panorama de médio prazo é política: com eleições na Alemanha este ano e na França no começo de 2022, o crescimento dos partidos verdes é um claríssimo complicador para qualquer tipo de avanço.

Depois virão as eleições brasileiras e, em palavras de uma fonte diplomática, "nenhum europeu vai querer assinar um acordo que seria usado por Bolsonaro na campanha".

A criticada política ambiental brasileira, disse outra fonte diplomática, "caiu omo uma luva para os interesses dos setores protecionistas europeus, que nunca quiseram o acordo".

Para vizinhos, Bolsonaro dá desculpa perfeita a UE
Nas chancelarias de Argentina, Uruguai e Paraguai predomina a certeza de que o entendimento com a UE continuará hibernando até que passem as eleições europeias e brasileiras. O protecionismo europeu é visto como o maior obstáculo, e a política ambiental de Bolsonaro a desculpa perfeita para travar o processo.

Existe na UE um debate interno sobre a possibilidade de se fatiar o acordo, para permitir um avanço mais rápido.

Haveria um acordo comercial e outro político (o que seria mais difícil de ser ratificado, porque envolveria questões como meio ambiente e direitos humanos), que poderiam entrar em vigência separadamente, após sua assinatura. Mas as conversas não estão progredindo, tampouco a elaboração de um documento paralelo, uma espécie de adendo ao acordo, no qual o Mercosul assumiria compromissos mais firmes sobre diversos aspectos, entre eles a proteção ambiental.

 O que levou à não assinatura do acordo (com a UE) foi o comportamento do governo brasileiro, que foi acumulando empecilhos políticos para que se pudesse avançar. Temos um presidente que toma atitudes sobre agendas prioritárias para a Europa que vão na contramão do que a Europa está fazendo — avalia Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima.

Na última terça-feira, Astrini se reuniu em Brasília com representantes de outras ONGs atentas à questão ambiental no Brasil. Entre os presentes estava Alok Sharma, presidente da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas de 2021, que também terá um encontro com o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite.

Astrini menciona o projeto que legaliza posse de terras, apontado como favorável a grileiros, como outro complicador:

— Existe uma reação de investidores, empresários, boicotes a produtos brasileiros em países como Alemanha e Reino Unido.A Europa acaba de anunciar um plano para cortar 55% de suas emissões até 2030. Eles estão taxando carbono e nosso governo enviando projetos que favorecem o desmatamento — aponta o especialista.

As razões para que o acordo entre Mercosul e UE, peça central do programa de abertura comercial do ministro Paulo Guedes, não se torne realidade no atual governo acumulam-se cada vez mais. Se não fosse a política ambiental brasileira e a péssima imagem do país na Europa, concluiu uma fonte diplomática, "o centrão europeu apoiaria o entendimento, apesar das pressões dos setores protecionistas".

https://oglobo.globo.com/economia/comissao-europeia-indica-que-mudanca-em-regras-ambientais-no-brasil-prejudicara-acordo-ue-mercosul-25138946

terça-feira, 12 de maio de 2020

Desafios do acordo Mercosul-União Europeia - Rubens Barbosa (OESP)

A situação do acordo entre o Mercosul e União Europeia independe da posição da Argentina, pois ele está de toda forma condenado: Bolsonaro se tornou um sujeito intragável para os europeus, apenas isso. Não tem como aprovar no Parlamento europeu ou nos nacionais. 
Paulo Roberto de Almeida

DESAFIOS DO ACORDO MERCOSUL E UNIÃO EUROPÉIA

Rubens Barbosa
O Estado de S. Paulo, 12/05/2020

Um fato novo complica o entendimento entre os países do Mercosul. Em abril, a Argentina informou que não mais acompanharia Brasil, Paraguai e Uruguai nas negociações em curso do Mercosul com outros países, como Canadá, Cingapura, Coreia do Sul, Líbano e Índia. Mas que manteria sua participação nos acordos, já concluídos e não assinados, com a União Europeia (UE) e com a Área de Livre Comércio da Europa (EFTA). Na semana passada, o governo argentino voltou atrás, num confuso comunicado, no qual ressalta que decidiu manter-se nas negociações conjuntamente, mas sempre levando em conta as sensibilidades dos setores menos competitivos (industriais). Embora querendo participar de todos os trabalhos e demandando a inclusão de cláusulas que resguardem os interesses argentinos futuros, Buenos Aires não se compromete com a conclusão das negociações em curso. O Chanceler Felipe Sola diz favorecer um regime de dupla velocidade, no qual a Argentina não fica fora dos acordos, mas quer ter a palavra final sobre como e quando passaria a fazer parte deles. Até meados do ano, o acordo Mercosul-UE deverá ser assinado. Como o governo argentino reagirá durante o processo de ratificação, se forem solicitadas modificações no texto do acordo, como ocorreu no caso do tratado UE-Canadá? Nuestros hermanos querem um Mercosul à la carte, o que aumenta a incerteza para todos, pela insegurança jurídica na aplicação dos compromissos assumidos. Flexibilização, se houver, tem de ser para todos.
Além dessa incerteza, menciono duas questões do lado brasileiro para o acesso ao mercado europeu: competitividade e meio ambiente.
Para aproveitar as preferências tarifárias, os produtos industriais deverão melhorar significativamente sua competitividade e passar a receber um tratamento isonômico em relação ao produzido em outros países. Sem que isso ocorra, apesar de a UE abrir seu mercado com tarifa zero de imediato para 75% de suas importações, será difícil competir no mercado europeu com produtos importados de outras áreas, como EUA, China e Coreia. A aprovação da reforma trabalhista e a da previdência social foram avanços importantes no caminho da modernização do Estado brasileiro. De modo a que o custo Brasil seja reduzido, é imperativo que sejam aprovadas a reforma tributária, a reforma do Estado e um amplo programa de desburocratização, simplificação e facilitação de negócios e de melhoria na logística (portos, estradas, ferrovias). Em paralelo, um eficiente programa de inovação por parte das empresas e de políticas públicas ajudaria a modernizar a operação das companhias que produzem para o mercado doméstico e também exportam. Estudo recente da Fiesp, mostra que a indústria nacional, antes da pandemia, estava lenta na busca para alcançar o nível de 4.0. (1,3% tinham investimento em 4.0 (em faturamento) 
O segundo desafio são os compromissos na área de meio ambiente que o Brasil deverá cumprir. O capítulo de desenvolvimento sustentável, incluído no acordo, talvez seja o mais desafiador, em vista da atual política de meio ambiente e mudança de clima do governo brasileiro. A crescente força política dos partidos verdes nos parlamentos dos países europeus poderá representar um obstáculo para a ratificação do acordo caso a atual política ambiental brasileira não se modifique, como exemplificado pela crise em relação ao Fundo Amazônico, que resultou na suspensão de recursos financeiros recebidos da Alemanha e Noruega. Os compromissos assumidos pelos países membros no tocante ao desenvolvimento sustentável estão incluídos em 18 artigos que cobrem acordos relacionados a comércio e meio ambiente, comércio e biodiversidade, comércio e preservação de florestas, da ONU, além de regras da Organização Internacional do Trabalho, inclusive a Resolução 169, que trata a exploração de terras indígenas. O descumprimento dos dispositivos dos acordos poderá acarretar boicotes e mesmo restrição de importação de produtos agrícola do Mercosul. São mencionados explicitamente os principais acordos internacionais como os derivados da Conferência da ONU sobre meio ambiente e desenvolvimento, Conferência Quadro da ONU sobre mudança do clima, Convenção sobre diversidade Biológica, Convenção da ONU de combate à desertificação, o Acordo de Paris de 2015, regras da OMC e Resoluções de outros organismos internacionais. Além disso, por insistência da UE, foi aprovado o princípio da precaução, pelo qual o não cumprimento de acordos de meio ambiente, energia ou trabalho forçado ou infantil, poderia acarretar restrição à importação de determinado produto.
O mundo mudou e as preocupações com o meio ambiente, a mudança do clima, a preservação das florestas entraram definitivamente na agenda global. A falta de informação interna objetiva dos compromissos internacionais assumidos pelos diferentes governos nas últimas décadas e a crescente percepção externa negativa sobre as políticas ambientais criam uma incerteza adicional para o setor produtivo, em especial o do agronegócio. Com o fim do COVID 19, as questões ambientais vão ressurgir com toda força e os governos do Mercosul não poderão ignorar essa agenda incluída no acordo com a UE.

Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE)