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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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terça-feira, 2 de junho de 2020

COVID-19: estatísticas comparáveis, no Brasil e no mundo

Um amigo meu, que é um matemático que conheço há muitos anos e trabalha na administração federal, sempre me abastece com os dados mais recentes e comparáveis. Ele o faz ironicamente: 
"Never trust statistics you didn't manipulate yourself"
As informações foram atualizadas no último domingo (31/05/2020):




Todos os números vêm de dois sites: Johns Hopkins e Worldometers

https://coronavirus.jhu.edu/map.html

https://www.worldometers.info/coronavirus/


Hora de atualizar a tabela para o novo período de quatro dias, de 27/5 a 31/5. Como hoje é domingo, temos duas atualizações, a do crescimento do número total de mortes notificadas por CV19 (Brasil, EUA, Mundo), que procura medir o ritmo da epidemia com duas ou três semanas de atraso (porque as mortes notificadas hoje refletem, possivelmente, o estado do contágio há 2 ou 3 semanas). Fazemos isso a cada quatro dias. 

Em seguida, como todos os domingos, atualizamos a tabela de de mortes notificadas por milhão nos países mais afetados, os com mais de 100 mortes notificadas por milhão de habitantes (0,01% da população), para ter uma idéia da evolução comparativa das famosas "curvas" da epidemia e do impacto em diferentes Estados.

Abril e Maio. Média diária do crescimento do número de mortes notificadas por CV19. 

Total de abril (1/4 a 1/5): Brasil +12% ao dia, EUA +9,5% ao dia, Mundo +6% ao dia.

Primeira quinzena de abril (1/4 a 16/4): Brasil +16% ao dia, EUA +15% ao dia, Mundo +8% ao dia.

Segunda quinzena de abril (16/4 a 1/5): Brasil: +8,5% ao dia, EUA +5% ao dia, Mundo +3% ao dia.

Total de maio (1/5 a 31/5): Brasil +4,9% ao dia, EUA +1,6% ao dia, Mundo +1,5% ao dia. 

Primeira quinzena de maio (1/5 a 16/5): Brasil + 6,3% ao dia, EUA +2,2% ao dia, Mundo +1,9% ao dia. 

Segunda quinzena de maio (16/5 a 31/5): Brasil +4,4% ao dia, EUA +1,1% ao dia, Mundo +1,2% ao dia. 

De 1/4 a 5/4: Brasil +22% por dia, EUA +22% por dia, Mundo +11% por dia.

De 5/4 a 9/4: Brasil +16% por dia, EUA +13% por dia, Mundo +7% por dia.

De 9/4 a 13/4: Brasil +11% dia, EUA +11% por dia, Mundo +7% por dia.

De 13/4 a 17/4: Brasil +11% ao dia, EUA +10% ao dia, Mundo +6% ao dia.

De 17/4 a 21/4: Brasil +7% ao dia, EUA +6% ao dia, Mundo +4% ao dia.

De 21/4 a 25/4: Brasil +9% ao dia, EUA +5% ao dia, Mundo +4% ao dia.

De 25/4 a 29/4: Brasil +8% ao dia, EUA +2% ao dia, Mundo + 2% ao dia.

De 29/4 a 3/5: Brasil +7% ao dia, EUA +2,5% ao dia, Mundo +3% ao dia.

De 3/5 a 7/5: Brasil +6% ao dia, EUA +2,6% ao dia, Mundo +2% ao dia.

De 7/5 a 11/5: Brasil +7% ao dia, EUA +2% ao dia, Mundo +1,8% ao dia.

De 11/5 a 15/5: Brasil +6% ao dia, EUA +2% ao dia, Mundo +1,8% ao dia.

De 15/5 a 19/5: Brasil +4,4% ao dia, EUA +1,2% ao dia, Mundo +1,3% ao dia.

De 19/5 a 23/5: Brasil +5,6% ao dia, EUA +1,6% ao dia, Mundo +1,1% ao dia.

De 23/5 a 27/5: Brasil +3,9% ao dia, EUA +0,9% ao dia, Mundo +0,9% ao dia.

De 27/5 a 31/5: Brasil +4,1% ao dia, EUA +1,0% ao dia, Mundo +1,2% ao dia.

Brasil, média de mortes notificadas por CV19, 7-day rolling average, tomada a cada quatro dias desde o começo de abril. O "efeito fim-de-semana" e os "picos" e "vales" são evitados. 

2/4 a 9/4: 84 / dia

6/4 a 13/4: 112

10/4 a 17/4: 142

14/4 a 21/4: 175

18/4 a 25/4: 215

22/4 a 29/4: 331

26/4 a 3/5: 386

30/4 a 7/5: 438

4/5 a 11/5: 594

8/5 a 15/5: 697

12/5 a 19/5: 738

16/5 a 23/5: 857

20/5 a 27/5: 913

24/5 a 31/5: 974

A média de crescimento diário do número total de mortes notificadas no Brasil, nas quatro quinzenas de abril e maio, evoluiu assim: +16%, +8,5%, +6,3%, +4,4%. Nos EUA: +15%, +5%, +2,2%, +1,1%. No mundo: +8%, +3%, +1,9%, +1,2%. Como se vê, a epidemia cresce mais lentamente (é da natureza das epidemias reduzir o ritmo de crescimento quase desde o começo), mas essa freagem é bem mais lenta no Brasil. Nossa explosão inicial foi menor, mas em compensação passamos mais tempo com um ritmo relativamente alto de crescimento do número de mortes notificadas. Por isso, não atingimos, aparentemente, o teto do número diário de mortes notificadas (o principal indicador a que a mídia presta atenção) na segunda quinzena de maio, como esperávamos (a não ser que caia na semana que vem). Esse número continuou subindo, até atingir 974 na última semana de maio, com vários dias acima do número simbólico de 1000/dia. Fechamos maio, assim, com cerca de 29.000 mortes notificadas totais (não incluídos os números do final do dia de hoje, que entrarão nas nossas contas amanhã, como sempre). Para que se cumpra nossa estimativa (40.000, com mínima de 20.000 e máxima de 80.000 até o final do ano) é preciso que essa média diária comece a cair logo. Senão, entramos em algo mais parecido com o modelo do IHME (126.000 até o começo de agosto; eles não estimam até o final do ano). Veremos. Nos EUA e no mundo como um todo, o ritmo de crescimento está oscilando em torno de 1% ao dia, o que indica uma epidemia razoavelmente sob controle (o que não exclui que ela esteja ainda crescendo em determinados locais).

Hora de atualizar a tabela de mortes notificadas por milhão de habitantes, como todo domingo.

Situação em 31/5, comparada com 24/5. Só considerados países com mais de 100 mortes notificadas por milhão (0,01% da população). Acrescento o aumento em uma semana para dar uma ideia do ritmo semanal de cada um.

1. San Marino - 1.050 / M (1050) - 0
2. Bélgica - 830 / M (814) - +2%
3. Andorra 637 / M (637) - 0
4. Espanha - 580 / M (613) - (-5%) *
5. UK - 579 / M (554) - +4,5%
6. Itália - 553 / M (543) - +1,8%
7. Suécia 435 / M (396) - +9,8%
8. França - 429 / M (423) - +1,4%
9. Holanda - 346 / M (338) - +2,4%
10. Irlanda - 337 / M (328) - +2,7%
11. EUA - 324 / M (303) - +6,9%
12. Suíça - 226 / M (224) - +0,9%
13. Equador 195 / M (181) - +7,7%
14. Canadá 191 / M (172)  - +11%
15. Luxemburgo 183 / M (183) - 0
16. Brasil 141 / M (109) - +29%
17. Portugal 137 / M (128) - +7%
18. Peru 136 / M (105) - +30%
19. Alemanha 104 / M (101) - +3%
20. Mônaco 102 / M (102) - 0

* A Espanha fez uma revisão estatística que resultou na reclassificação de mais de 1.500 óbitos, antes notificados como devidos a CV19, e na redução líquida de 5% da estimativa de mortos por milhão, de uma semana para a seguinte. O que serve para lembrar como a estimativa do número real de mortos por CV19 (e muito mais a de casos médicos, e muito mais a de contágios) não é uma ciência exata, e depende de critérios que variam de país para país.

Mudanças: a Suécia ultrapassou a França, chegando ao 7o lugar. Equador (13o) e Canadá (14o) ultrapassaram Luxemburgo (que caiu para 15o). Brasil (16o) ultrapassou Portugal (17o). Alemanha (19o) ultrapassou Mônaco (20o). O estranho caso da revisão estatística espanhola, explicado acima, fez que Espanha (4o) e UK (5o) ficassem praticamente num empate técnico, levando em conta a margem de erro. Nenhum Estado novo superou os 0,01% de mortes (100 por milhão) nessa semana.

O Brasil passou de 109 para 141 / M, aumento de +29% (menor que os 42%, +48%, +58% e +65% das quatro semanas anteriores, mas demonstrando uma desaceleração muito lenta). 

O mundo passou de 45 para 49 / M, aumento de 8,9% (ritmo um pouco superior aos 7,1% da semana anterior, mas dentro da margem de erro). 

Os quatro menores Estados da lista (S Marino, Andorra, Luxemburgo e Mônaco) não registraram nenhuma morte por CV19.

Entre os países mais afetados, os únicos com crescimento semanal acima de 10% são Peru (+30%), Brasil (+29%) e Canadá (+11%). 

Dentre os demais, os únicos acima de 5% são Suécia (+9,8%), Equador (+7,7%), Portugal (+7%) e EUA (+6,9%).

Sem contar os quatro pequenos, onde não houve mortes notificadas, e o caso da revisão estatística da Espanha, que torna impossível fazer estimativa de variação semanal, 11 dos 20 países mais afetados mostraram redução no ritmo da epidemia. As quatro exceções, todas plausivelmente dentro da margem de erro, são Canadá (de 10% para 11%), Suécia (de 8,8% para 9,8%), Holanda (estável em 2,4%) e França (de 0,7% para 1,4%). A Suíça substitui a França no quadro que recebe a estrelinha de ouro (abaixo de 1%).

A seguir, quadro que permite visualizar a evolução da epidemia nos 17 Estados mais afetados (os 20 da lista acima menos (San Marino, Andorra e Mônaco). É interesse iluminar a curva do Brasil e compará-la com as demais.

https://ourworldindata.org/grapher/daily-covid-deaths-per-million-7-day-average?country=BEL~BRA~CAN~ECU~FRA~DEU~IRL~ITA~LUX~NLD~PER~PRT~ESP~SWE~CHE~GBR~USA

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Comprando um novo iPad: comparando precos no Brasil (1 iPad) e nos EUA (2 iPads)

Pensando em comprar o seu novo iPad?
Comparei os preços no Brasil e nos EUA: entrei nos sites oficiais da Apple em cada país, e coloquei exatamente a mesma configuração para o meu possível próximo iPad.
Conclusão: pelo preço de UM, no Brasil, você compraria DOIS, nos EUA.
Paulo Roberto de Almeida

No Brasil: 
  • Preço do Item:R$ 6.799,00
  • Preço Final: R$ 6.799,00
Número de peça: MPHG2BZ/A

    • Preço do Item:R$ 1.049,00
    • Preço Final: R$ 1.049,00

  • Número de peça: MPTL2BZ/A

    • Preço do Item:R$ 379,00
    • Preço Final: R$ 379,00

  • Número de peça: MQ092ZM/A
     
    Detalhamento do custo total
    Subtotal da sacola R$ 8.227,00
    Frete gratuito R$ 0,00
    Valor do pedido R$ 8.227,00
    Em até 12x de R$ 685,58
    R$ 7.404,30 à vista (10% de desconto)

    Taxa de câmbio em 27 de julho de 2017: R$3,15/US$ 1.-
    Valor em dólar: US$ 2.350 à vista e US$ 2.611 em até 12 vezes.


    Nos EUA:

    Items in Your Bag

    Part number: PPHG2LL/A


    • Item Price:$159.00
    • Line Price: $159.00

  • Part number: MPTL2LL/A

    • Item Price:$49.00
    • Line Price: $49.00

  • Part number: MQ092ZM/A

    Total cost breakdown
    Bag Subtotal $1,087.00
    Free Shipping $0.00
    Estimated Tax
    Total $1,087.00

    Valor equivalente em reais à taxa de 3,15: R$ 3.424
    Valor comprado no Brasil: R$ 7.404,30 à vista
    Diferença: R$ 3.980,30 ou  53% a mais.
    Comparando com a compra nos EUA: US$ 2.350 à vista, ou seja, US$ 1.263 a mais.

    Conclusão: você poderia comprar DOIS iPads, nos EUA, e ainda sobraria quase 200 dólares.
    Ou então VIAJAR a Miami, comprar o seu iPad e voltar ao Brasil.
    Que tal?
    Paulo Roberto de Almeida

    terça-feira, 21 de outubro de 2014

    A pedidos: comparando o Brasil e a Alemanha - Roberto Ellery e Paulo Roberto de Almeida

    O economista Roberto Ellery fez o que a presidente-candidata mandou: em lugar de comparar o Brasil com o Chile, como tinha aventado, entre outros países, o candidato oposicionista, ela disse que o Brasil precisava ser comparado com "economias maiores", com a da Alemanha, por exemplo.
    Indiferente ao absurdo da pretensão -- que só poderia passar na cabeça de quem não entende nada de economia, e muito menos sabe história econômica, ou que jamais consultou estatísticas na vida -- cabe reconhecer que qualquer comparação entre países é válida, mesmo entre os Estados Unidos e a Somália, por exemplo.
    Claro, alguém poderia mostrar, numa perspectiva de longo curso, que o diferencial de renda per capita entre os Estados Unidos recém independentes, digamos em 1790, e a então Somália, ou o que estivesse no seu lugar, fosse, chutando, de vinte vezes "apenas". Dois séculos depois, essa diferença deve ser superior a 100 vezes, se não for mais. Tudo bem, vocês podem argumentar, sempre se pode comparar, e descobrir que os EUA avançaram e a Somália estagnou, ou afundou. Coisas da vida.
    Mas vamos comparar nosso paísinho que parece grande, com os mesmos EUA, grandões de verdade. Cem anos atrás, nós tinhamos uma renda per capita que não ultrapassava 11% da renda dos americanos, já então o povo mais rico do planeta. Avançamos, aos saltos e tropeços, no decorrer do século XX, mas o máximo que conseguimos fazer foi 25% ou 28% do PIB per capita americano, isso no auge do regime militar, quando tivemos taxas de crescimento chinesas, no início dos anos 1970 (bem, os chineses é que exibem agora as taxas "brasileiras" de quase meio século atrás). Atualmente, devemos nos situar abaixo de 20% da renda americana, o que significa que recuamos, ou então, o que é mais provável, eles avançaram mais do que nós (não tiveram hiperinflações, por exemplo).
    Mas, esse tipo de comparação não é a mais significativa: dados brutos, em si, nunca são um indicador satisfatório para o desenvolvimento de um país. Eles podem refletir situações e conjunturas de crescimento -- ou de estagnação, com ou sem inflação, etc. -- mas o desenvolvimento implica em transformações estruturais, com prosperidade social, ou seja, crescimento da renda per capita, certo?
    A esse título, a comparação do Brasil com a Alemanha nos deixa muito mal no retrato, a despeito do que pretende a presidente.
    Mas, ela também recusou a comparação com o Chile, a pretexto de que o Chile é um pequeno país, com uma economia menor do que a do Rio Grande do Sul, disse ela. Outra bobagem, pois a esse título, a Alemanha também é um "pequeno" país em população e território, comparada com o Brasil, mas faz um PIB, total e per capita, várias vezes superior ao do Brasil, certo?
    Mas, por que uma comparação com um "pequeno país" não serviria para esses exercícios de comparação? Só pelo tamanho? Mas isso é uma bobagem monumental. O mundo abriga países grandes, pequenos, médios, gigantes e minúsculos, sem que isso apresente qualquer problema para a prosperidade, ou a miséria, de seu povo. Temos grandes países miseráveis -- a Índia, por exemplo, ou de certo modo ainda a China rural -- e pequenos países riquíssimos, Suíça ou Luxemburgo.
    O que importa, na verdade, é a qualidade das políticas econômicas de um país, de qualquer país, que o habilite a alcançar a prosperidade do seu povo, ou estagnar na decadência durante certo tempo, ou muito tempo. Desse ponto de vista, o Chile também dá de 7 a 1 no Brasil, como constata Roberto Ellery em relação à Alemanha, no trabalho que eu transcrevo aqui abaixo. Saindo de uma posição modesta em PIB per capita, o Chile cresceu muito no decorrer dos últimos 25 anos, ultrapassando o Brasil e sendo admitido como membro da OCDE, uma espécie de clube de países ricos, como se diz frequentemente.O Chile, nos anos 1990, foi um tigre asiático numa América Latina estagnada.
    Isso porque as políticas econômicas do Chile foram muito mais consistentes do que as nossas durante largo tempo. Política fiscal sólida, inflação baixa, câmbio realista, abertura ao comércio e aos investimentos estrangeiros, poucos subsídios a indústrias.  É isso que faz a diferença, e é isso que deve ser comparado.
    Se continuarmos com as políticas econômicas da presidente, estaremos condenando o Brasil a ser, não uma Somália, mas talvez uma Índia ou uma China, durante os dois ou três séculos em que esses gigantes estagnaram na competição pelo desenvolvimento econômico e social. O que o Brasil prefere?
    E então, vamos comparar desempenhos de países?
    Com vocês o texto do Roberto Ellery.
    Paulo Roberto de Almeida

    Brasil e Alemanha: A presidente mandou e eu comparei. 

    Blog do Roberto Ellery, 20/10/2014

    Não me agrada comparar Brasil e Alemanha, somos um país pobre e eles são ricos, isso torna a comparação meio que inócua. Como a maioria dos que trabalham com crescimento econômico creio que comparações entre países só podem ser feitas quando o PIB per capita tem alguma proximidade, seja quando da comparação seja em um passado não tão distante. Mas como a presidente mandou comparar Brasil com a Alemanha no último debate e eu sou um súdito cidadão obediente farei a comparação.
    No formato de nações independentes que conhecemos hoje o Brasil nasceu em 1822 quando D. Pedro I proclamou nossa independência de Portugal e a Alemanha nasceu em 1871 quando o Chanceler Oto von Bismark liderou a unificação alemã. Somos portanto uns cinquenta anos mais velhos que eles. Enquanto tivemos uma história relativamente pacífica com algumas revoltas internas (destaque para a Revolução Farroupilha e a Guerra de Canudos) e uma guerra em nossas fronteiras (Guerra do Paraguai) os alemães foram protagonistas das duas Guerras Mundiais que ocorreram no século XX. Na primeira saíram com a economia destruída, na segunda tiveram o país fisicamente destruído, para piorar após a II Grande Guerra foram divididos em áreas de influência das potências vencedores e assim ficaram até 1989 quando a Alemanha se reunificou. Não apenas somos mais velhos como desfrutamos de um maior período de paz e não tivemos territórios ocupados por potências estrangeiras.
    Mesmo assim somos muito mais pobres que os alemães. Se compararmos o PIB per capita da Alemanha com o do Brasil a diferença é gritante, de acordo com os dados do FMI corrigidos por poder de compra o PIB per capita da Alemanha em 2013 foi de 43.475 dólares internacionais, de acordo com o Banco Mundial foi de 43.332 dólares internacionais, a diferença é explicada por métodos diferentes de ajuste do poder de compra. Para os que não são da área ajuste pelo poder de compra é uma forma de comparar valores em países onde os preços internos são diferentes. No Brasil o PIB per capita foi de 14.987 dólares internacionais pelo FMI e 15,034 pelo Banco Mundial, ou seja, ajustado pelos preços internos, o alemão médio umas três vezes mais que o brasileiro médio. Se não fizermos o ajuste pelo poder de compra o PIB per capita da Alemanha em 2013 foi US$ 45.085 e o do Brasil foi US$ 11.208 (dados do Banco Mundial), por esse critério os alemães são quatro vezes mais ricos que os brasileiros.
    A comparação da renda per capita ficou ruim para o Brasil. Devo dizer que a comparação pode ser injusta com as intenções da presidente afinal PIB per capita não é construído em um governo, depende de toda uma história. É mais provável que a presidente queria saber como cada país cresceu durante o governo dela. Antes de passar aos números faço um alerta. Existem bons motivos para um país pobre (vá lá classe média baixa) como o Brasil crescer mais do que um país rico como a Alemanha. Quem trabalha com modelos neoclássicos imediatamente pensa em rendimentos decrescentes, quem prefere os modelos de crescimento endógeno pode pensar em oportunidades de inovação. Um país rico para crescer precisa descobrir e adotar novas tecnologias, um país em desenvolvimento (ficou melhor que pobre ou classe média baixa) como o Brasil pode apenas adaptar e/ou adotar tecnologias já existentes. Passemos aos números.
    Para evitar problemas com correção por paridade de poder de compra calculei a taxa de crescimento a partir do PIB per capita em valores constates da moeda local de cada país conforme calculado pelo FMI. No período entre 2011 e 2014 o único ano em que o PIB per capita do Brasil cresceu mais que o da Alemanha foi em 2013, no acumulado do período o PIB per capita do Brasil cresceu 2,87% e o da Alemanha cresceu 7,41%. A conclusão é que não apenas os alemães são mais ricos que os brasileiros como ficaram ainda mais ricos durante o período em que Dilma governou o Brasil. A figura acima mostra o crescimento do PIB per capita em cada ano e no acumulado do período para os dois países.
    Outra variável que está sempre no debate econômico é a inflação. Nesse quesito também nos saímos pior que os alemães. Em todos os anos nossa inflação foi maior que a deles, a média das inflações para o Brasil foi de 6,12%, para a Alemanha foi de 1,61%, a maior inflação que tivemos no período foi de 6,5% em 2011, a maior deles foi de 2,28% também em 2011, no acumulado nossa inflação entre 2011 e 2014 foi de 26,84% e a deles foi de 6,6%. A figura ao lado mostra a inflação dos dois países em cada ano e no acumulado, a diferença é gritante. Se no caso do crescimento podemos apelar para transformações de poder de compra para salvar o resultado aqui não tem discussão: nossa inflação é muito maior que a deles.
    Deixemos de falar de inflação e de crescimento, isso é coisa de economista, de acordo com a sabedoria econômica oficial o que importa mesmo é o emprego. Falemos então de emprego, mas antes cabe uma ressalva: um desempregado na Alemanha tem renda maior que um orgulhoso membro da classe média brasileira conforme a definição do governo. Existem duas modalidades de seguro desemprego na Alemanha (link aqui). O primeiro tipo de benefício corresponde a 60% do salário de referência (€ 5.600 em 2013) podendo chegar a 67% se o beneficiário tiver filhos menores de 18 anos, esse benefício é pago por um período de 90 a 360 dias a depender do tempo que a pessoa ficou no último emprego. O segundo tipo de benefício é de € 350 por mês e é destinado a que ultrapassa o tempo de recebimento do primeiro benefício ou que não tem renda suficiente, os que recebem esse benefício são obrigados a participar de programas de treinamento. Tomando os 60% do salário de referências os beneficiários do primeiro tipo recebem pelo câmbio de hoje (3,15) o equivalente a R$ 10.584, ou seja, pelos critérios do nosso governo seria um sujeito rico no Brasil. Os beneficiários do segundo tipo de benefício recebem o equivalente a R$ 1.102,50 por mês, pelos critérios do governo seria de classe média no Brasil. É claro que comparar desemprego em condições tão diferentes quanto as vigentes no Brasil e na Alemanha é um exercício de pouca utilidade, mas não fui quem inventei de comparar Brasil com Alemanha, pelo contrário, avisei que não era uma boa ideia. Feitas as ressalvas passemos para os números. De acordo com o Banco Mundial (link aqui) a taxa de desemprego no Brasil em 2012 era de 6,9%, na Alemanha era de 5,4%. Não me dei por satisfeito e fui procurar números mais recentes (bendita Wikipedia, link aqui). Achei que em novembro de 2013 a taxa de desemprego no Brasil era de 5,4%, em fevereiro de 2014 a taxa de desemprego na Alemanha era de 5,1%. Mais uma vez a Alemanha se saiu melhor que o Brasil, e olha que nem usei os números da PNAD ampliada...
    Estava decidido a não terminar o posto sem que o Brasil ganhasse em algum critério, não que o Brasil saísse de minha comparação pior do que a seleção se saiu no confronto com os alemães. Pensei que pelo menos nosso futuro poderia ser mais promissor que o deles e fui olhar a taxa de investimento nos dois países. A figura à direita mostra a comparação. Começamos na frente, em 2011 nossa taxa de investimento ficou de 19,73% contra míseros 18,51%, mantemos a dianteira nos anos seguintes, mas não teve jeito, após quatro anos de governo Dilma os alemães nos ultrapassaram também nesse quesito, ver figura à direita. A nação rica que está cuidando mais do futuro do que a nação pobre, talvez não por acaso que eles sejam mais ricos.
    Me incomodei com a hipótese que os ricos alemães estejam mais preocupados com o futuro do que os brasileiros, não pode ser, pensei eu, desesperado peguei um daqueles livros do MEC para doutrinar ensinar nossos jovens para ver achava uma resposta. Achei! Alemães são malvados e constroem seu futuro com o sacrifício dos outros povos, passei a pensar como achar uma variável para confirmar a tese do livro do MEC que a esta altura era meu fio de esperança. Resolvi olhar a taxa de poupança, certamente os alemães financiam seus investimentos com dinheiro que pegam no resto do mundo enquanto nó temos que usar nossa poupança para financiar nosso investimento e ainda mandar dinheiro para financiar os alemães. Infelizmente os dados de poupança não confirmam a tese do livro do MEC, não apenas os alemães poupam mais do que nós, ver figura acima, como ainda poupam mais do que investem. Na realidade somos nós que pegamos dinheiro do resto do mundo para financiar nosso investimento, em todos os anos investimento mais do que poupamos. Malditos brasileiros malvados que expropriam os alemães!
    Joguei a toalha. A comparação estava me deixando deprimido. Somos mais velhos (0x1), tivemos mais tempo de paz como nação independente (0x2), eles são muito mais ricos (0x3), eles cresceram mais (0x4), eles têm menos inflação (0x5), a taxa de desemprego deles é menor (0x6), nós investimos menos (0x7) e eles poupam mais (0x8). Decidido a não tomar um vexame maior que a canarinho apelei ao STJD, voltei aos dados do FMI e peguei a taxa de crescimento do PIB real conforme calculada pelo FMI, entre 2011 e 2014 nós crescemos 6,7% e eles cresceram 6,35%, tudo bem que em 2014 eles devem crescer mais de quatro vezes o que vamos crescer, mas quem se importa? Arranquei um ponto deles para nós, igualei a seleção nos 7x1. Não vou dizer que estou satisfeito, mas resolvi parar, vai que eles se invocam e fazem mais um...