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domingo, 25 de agosto de 2024

Construtores da Nação: projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior - Paulo Roberto de Almeida


Paulo Roberto de Almeida: 

Construtores da Nação: projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior

(São Paulo: LVM, 2022)

Trechos da Introdução

Da construção do Estado à construção da Democracia

 

Obrigado de minha curiosidade fiz, por espaço de dezessete anos que residi no Estado do Brasil, muitas lembranças por escrito do que me pareceu digno de notar, as quais tirei a limpo nesta corte, enquanto a dilação de meus requerimentos me deu para isso lugar; ao que me dispus entendendo convir ao serviço de El Rei nosso Senhor, e compadecendo-me da pouca notícia que nestes reinos se tem das grandezas e estranhezas desta província, no que anteparei algumas vezes movido do conhecimento de mim mesmo, e entendendo que as obras que se escrevem têm mais valor que o da reputação dos autores delas.

Como minha intenção não foi escrever história que deleitasse com estilo e boa linguagem, não espero tirar louvor desta escritura e breve relação (em que se contém o que pude alcançar da cosmografia e descrição deste Estado), que a V.S. ofereço; e me fará mercê aceitá-la, como está merecendo a vontade com que a ofereço; passando pelos desconcertos dela, pois a confiança disso me fez suave o trabalho e o tempo que em a escrever gastei: de cuja substância se podem fazer muitas lembranças a S.M. para que folgue de as ter deste seu Estado, a que V.S. faça dar a valia que lhe é devida.

 

Gabriel Soares de Souza, Tratado Descritivo do Brasil em 1587. “Edição castigada pelo estudo e exame de muitos códices manuscritos existentes no Brasil, em Portugal, Espanha e França, e acrescentada de alguns comentários à obra”, por Francisco Adolfo de Varnhagen, sob a responsabilidade do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Tipografia Universal de Laemmert, 1851, p. x-xi.

 

 

Como se pode depreender pela descrição inicial que desta terra fez, para os seus soberanos, um dos primeiros habitantes do Estado do Brasil, os projetos para se construir uma nova nação, nesta parte do território da América do Sul, não são exatamente novos. Gabriel Soares de Souza (1540-1591) foi um observador atento e perspicaz, que se empenhou em tomar da pluma para discorrer sobre tudo o que viu, o que ouviu e coletou ao longo dos 17 anos em que se exerceu, como senhor de engenho, nestas paragens ermas, ainda repletas de selvícolas, cujos hábitos ele procurou relatar com exatidão e até espanto (o canibalismo, por exemplo, e a “luxúria” de seus hábitos sexuais). A obra permaneceu praticamente incógnita dos habitantes do Estado do Brasil até meados do século XIX, quando o historiador Francisco Adolfo de Varnhagen conseguiu retirá-la de um injusto anonimato para enfim divulgá-la a seus compatriotas.

Exatos quarenta anos depois, Frei Vicente do Salvador (1564-1636) terminava uma primeira História do Brasil(1627), que, como sua predecessora de 1587, permaneceu incógnita por 260 anos, tendo sido consultada por Varnhagen, na Biblioteca das Necessidades, em Lisboa, mas publicada apenas no final do século XIX, numa edição anotada por Capistrano de Abreu (1856-1927), pela Biblioteca Nacional (1889). Para José Honório Rodrigues (1913-1987), a História do Brasil “é um dos livros mais saborosos do Brasil seiscentista, pela simplicidade do estilo, natural, sem artifícios, pela ingenuidade da narrativa, entremeada de estórias populares e ditos pitorescos” (1979, p. 490).

Mas, Frei Vicente do Salvador – que recebeu a alcunha de “Heródoto brasileiro”, ou o “Pai da História” no Brasil – também reclama, logo no capítulo segundo do livro, da situação de abandono a que foi relegado o “Estado do Brasil”:

... ao nome do Brasil ajuntaram o de Estado, e lhe chamam Estado do Brasil, ficou ele tão pouco estável que, com não haver hoje cem anos, quando isto escrevo, que se começou a povoar, já se hão despovoado alguns lugares, e sendo a terra tão grande, e fértil, nem por isso vai em aumento, antes em diminuição.

Disto dão alguns a culpa aos Reys de Portugal, outros aos povoadores; aos Reys pelo pouco caso que hão feito deste tão grande Estado, que nem o título quiseram dele; pois intitulando-se Senhores de Guiné por uma caravelinha que lá vai, e vem, como disse o rei do Congo, do Brasil não se quiseram intitular, nem depois da morte de El-Rey dom João terceiro, que o mandou povoar, e soube estimá-lo, houve outro que dele curasse, senão para colher suas rendas e direitos; e deste mesmo modo se hão os povoadores, os quais, por mais arraigados que na terra estejam, e mais ricos que sejam, tudo pretendem levar a Portugal... (..) Porque tudo querem para lá, e isto não tem só os que de lá vieram, mas ainda os que cá nasceram, que uns e outros usam da Terra não como senhores, mas como usufrutuários, só para a desfrutarem e deixarem destruída.

Donde nasce também, que nenhum homem nessa terra é repúblico, nem zela ou trata do bem comum, senão cada um do bem particular. (...)

Estas são as razões, porque alguns, como muito dizem, que nem permanece o Brasil nem vai em crescimento; e a estas se pode ajuntar a que atrás tocamos de lhe haverem chamado Estado do Brasil, tirando-lhe o de Santa Cruz com que pudera ser Estado, e ter estabilidade e firmeza. (SALVADOR, 1889, p. 6-7).

 

Um novo relato sobre as riquezas da terra, Cultura e Opulência do Brasil por suas drogas e minas, feito quase um século depois por um outro observador atento, André João Antonil – pseudônimo do jesuíta italiano João Antonio Andreoni (1649-1716), trazido ao Brasil em 1681 pelo padre Antonio Vieira (1608-1697) –, foi retirado de circulação seis dias depois de aprovado para imprimir e distribuir pela própria censura do Reino, em 1711, e assim permaneceu desconhecido durante mais de um século, tendo sido redescoberto somente depois da independência (RODRIGUES, 1979, p. 403). Segundo relata uma estudiosa dessa obra:

As razões para o confisco da obra... foram evitar exposição das riquezas da colônia à cobiça de outras nações, responsáveis por saques constantes na costa brasileira. Naquele momento, falar em açúcar, ouro e tabaco era inadequado e perigoso, podendo aguçar a cobiça da França, Holanda e Inglaterra, interessadas em participar do mercado internacional. (SILVA, 1999, p. 57)

 

Antonil defendia em sua obra (1982) a proposta de que seria justo, “tanto para Fazenda real quanto para o bem público, favorecer a conquista e o desenvolvimento econômico do Brasil” (SILVA, 1999, p. 73). Com isso, evidentemente, não concordaram os censores do Reino, numa atitude que, mutatis mutandis, continuou a ser imitada durante largo tempo, talvez ainda atualmente, quando se continua a falar das fabulosas riquezas do Brasil, sempre cobiçadas por potências estrangeiras.

 

Ao revelar a riqueza potencial da nova terra, os cronistas dos primeiros tempos cumpriam, portanto, mesmo indiretamente, um papel de promotores da prosperidade da colônia, ainda que a exploração dos recursos estivesse mais destinada a enriquecer a própria metrópole. Os projetos tentativos de se fazer da terra uma nação próspera passaram a adquirir maior consistência a partir do desembarque da Corte dos Braganças na colônia que já era, no quadro do imenso império marítimo lusitano, a principal fonte de recursos para o Tesouro do Reino. Tem início, em 1808, a administração dos negócios desse império desde o Rio de Janeiro.

(...)

Disponível na Amazon

quarta-feira, 3 de maio de 2023

Construtores da Nação: projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior - livro de Paulo Roberto de Almeida (LVM)

Lançamento, finalmente, nesta quinta-feira, 4/05/2023, 19hs, na Travessa do Casa Park-Brasília, deste meu livro sobre duas dezenas de grandes pensadores e promotores de reformas no Brasil.

Construtores da Nação: projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior - Paulo Roberto de Almeida (LVM)

1467. Construtores da Nação: projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior (São Paulo: LVM Editora, 2022, 304 p.; ISBN: ISBN: 978-65-5052-036-6; prefácio de Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy, p. 11-17). Relação de Originais n. 4187.  

                            Sumário 


Prefácio

       Arnaldo Godoy, 11

Apresentação

Nos ombros dos verdadeiros estadistas, Paulo Roberto de Almeida, 19

 

Introdução

Da construção do Estado à construção da Democracia, 25

 

Primeira parte: a construção do Estado

     O Estado antes da Ordem e da própria Nação, 35

1.  As vantagens comparativas de José da Silva Lisboa (Cairu), 43

2.  Por uma monarquia constitucional liberal: Hipólito da Costa, 52

3.  Civilizar os índios, eliminar o tráfico: José Bonifácio de Andrada e Silva, 66

4.  Um Memorial para reformar a nação: Francisco Adolfo de Varnhagen, 77

 

Segunda parte: a construção da Ordem

     Uma Ordem patrimonialista e oligárquica, 97

5.  Os liberais conservadores: Bernardo, Paulino e Paranhos, 99

6.  Um aristocrata radical: Joaquim Nabuco, 111

7.  Bases conceituais da diplomacia: o paradigma Rio Branco, 119

8.  O defensor do Estado de Direito: Rui Barbosa, 128

 

Terceira parte: a construção do Progresso

     O Progresso pelo Estado, com o Estado, para o Estado, 141

9.  Um empreendedor liberal numa terra de estatistas: Mauá, 150

10. Um inglês imaginário e o nacionalista do petróleo: Monteiro Lobato, 158

11. O revolucionário modernizador: Oswaldo Aranha, 170

12. Duas almas pouco gêmeas: Roberto Simonsen e Eugenio Gudin, 181

 

Quarta parte: a construção da Democracia

     A Democracia carente de união nacional, 193

13. Em busca de uma esquerda democrática: San Tiago Dantas, 196

14. O militante do parlamentarismo: Afonso Arinos de Melo Franco, 209

15. As oportunidades perdidas do Brasil: Roberto Campos, 219

16. O liberalismo social de José Guilherme Merquior, 230

 

A construção da Nação: um itinerário de 200 anos de história, 253

 

Posfácio

O que a intelligentsia brasileira construiu em dois séculos de ideias e ações?  261

 

Referências Bibliográficas para os Construtores da Nação, 269

Nota sobre o autor, 301

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Trechos do Prefácio de Arnaldo Godoy: 

Paulo Roberto de Almeida impressiona, entre outros motivos, por sua determinação para fazer, em sua vida intelectual, nada que afete ou que ameace a sua independência. Essa imagem, que tomei de Antonio Candido em referência a Anatol Rosenfeld, cabe perfeitamente na definição de Paulo Roberto, um pensador que vem vivenciando em seu campo, vasto (porque é um polímata) metamorfoses e transformações. 

Renomado pesquisador de nossa historiografia diplomática (a Formação da Diplomacia Econômica do Brasil é o meu predileto), Paulo Roberto tem também se interessado pelas várias nuances que substancializam um pensamento brasileiro, orientado para compreensão de Brasil, menos como metafísica, ainda que muito como uma ideia. O seu livro sobre os Construtores do Brasil, que define como um “ensaio de síntese histórica e de exposição argumentativa” é um “tour de force” em torno de ideias e pensadores que tentam explicar nossa condição. 

O livro enfrenta quatro grandes temas: o Estado, Ordem, Progresso e a Democracia. É um enfrentamento aos tempos presentes. Vivenciamos a democracia corroída, o progresso em forma de retrocesso, a ordem pautada pelo deboche e o Estado com um butim. O que fazer? Teorizar é também uma forma de militância. Paulo Roberto, nesse sentido, é um militante. 

(...)

Construtores da Nação pode ser compreendido como um curso sobre o pensamento brasileiro, na tradição de Antonio Paim (História das Ideias no Brasil), de João Cruz Costa (História das Ideias no Brasil), de Vamireh Chacon (História das Ideias Socialistas no Brasil), de Paulo Mercadante (A Consciência Conservadora no Brasil) e de Fernando Azevedo (A Cultura Brasileira), autores que sempre se interessaram por grandes sínteses. Pode ser lido como um manual, a exemplo de Mariza Veloso e Angélica Madeira (Leituras Brasileiras). Pode ser lido também como um guia de leitura, como se lê Nelson Werneck Sodré (O que se deve ler para conhecer o Brasil). 

(...)

Paulo Roberto valeu-se de fontes primárias, lendo diretamente todos os autores que estudou: Cairu, Hipólito, Bonifácio, Varnhagen, Bernardo Vasconcelos, Paulino de Sousa, Paranhos (pai e filho), Nabuco, Rui, Monteiro Lobato, Afonso Arinos, San Tiago Dantas, Merquior, Roberto Campos. Há também a presença de fortíssima literatura secundária e explicativa: José Murilo de Carvalho, Vianna Moog, Emília Viotti da Costa, Antonio Cândido, Arno Wehling, João Camilo de Oliveira Torres, João de Scantinburgo e muitos outros. Há também a oportuna presença do historiador inglês Leslie Bethel, que tanto nos estudou. 

Construtores da Nação é um livro de história econômica, de história de nossa política externa, de historiografia crítica, de história política e de história sociológica. O autor quebra os limites entre várias disciplinas. (...)


Em Construtores da Nação há todo um panorama que fixa o pano de fundo e ao mesmo as bases de nossa condição brasileira. É um livro sobre pensadores brasileiros, que pensaram o Brasil, na compreensão de um brasileiro que também pensa o Brasil, com independência e firmeza de convicções. Em tempos de crise (e parece-me que a crise é de todos os tempos) fundamental que pensemos a crise em que estamos, na perspectiva daqueles que de certo modo sempre nos ensinaram como vencê-las, ou pelo menos como suportá-las. 

O problema, e creio essa a grande lição do livro de Paulo Roberto de Almeida, é que não aprendemos, por deficiência intelectual nossa, ou por preguiça também intelectual nossa, ou por desinteresse, ou por inaptidão para compreensão. É o que nos faz tão próximos daquele herói sem nenhum caráter, criado por Mário de Andrade, aquele que era 300, e que era 350, e que um dia toparia consigo mesmo. É o que ocorre no País hoje. 

 

Brasília, julho de 2022.

 

Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy

Livre-docente em Teoria Geral do Estado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo-USP



 Trechos do Apresentação do Autor: 

Nos ombros dos verdadeiros estadistas

 

Paulo Roberto de Almeida

 

 

Este livro trata, como indicado em seu título, de alguns dos construtores da nação brasileira. Ao abrigo desse conceito pretendi apresentar, ainda que de maneira breve, a vida, um esboço do pensamento e uma parte da obra daqueles que muito contribuíram, nem sempre com efeitos práticos ou resultados plenos, para a propositura de programas de governo, bem como de projetos para reformas estruturais nas instituições de Estado e nos mecanismos de governança do país, ao longo de quase duzentos anos de nosso itinerário como nação independente. Contudo, entre esses “construtores” não figuram aqueles indicados nos livros de história como tendo sido “dirigentes do Brasil” ou ocupado cargos de chefia de Estado: por exemplo, não receberam alguma menção especial qualquer um dos presidentes – e foram várias dezenas – ao longo dos mais de 130 anos de regime republicano; nem foram aqui contemplados qualquer um dos regentes no período intermediário entre um e outro dos dois reinados no período monárquico do século XIX. Quanto aos dois imperadores, que se exerceram, cada qual ao seu estilo, ao longo dos 67 de regime monárquico, eles merecem considerações mais específicas ao papel mais relevante que cada um deles desempenhou em suas épocas respectivas, D. Pedro I (1798-1834) como construtor do Estado, seu filho, D. Pedro II (1825-1891), como impulsionador do progresso da nação, de conformidade ao seu espírito sempre atento às mais recentes descobertas e invenções da ciência e da tecnologia. 


Mas aqui estão vários que poderiam ter sido mandatários do Estado, assim como alguns outros poucos que, de fato, exerceram funções de “primeiros-ministros”, como o “patriarca da Independência”, José Bonifácio de Andrada e Silva (1763-1838), assim como José Maria da Silva Paranhos, o Visconde do Rio Branco (1819-1880), na função de presidente de um dos gabinetes imperiais. Outros quase chegaram lá, como Rui Barbosa (1849-1923) – candidato duas vezes à presidência –, ou San Tiago Dantas (1911-1964), recusado como primeiro-ministro de um dos gabinetes durante a breve experiência parlamentarista republicana. Oswaldo Aranha (1894-1960) poderia ter sido um grande presidente, numa das várias oportunidades da chamada “era Vargas”, mas foi sabotado pelo próprio caudilho. Alguns outros, que aqui figuram, exerceram funções ministeriais, como Paulino José Soares de Sousa, o Visconde do Uruguai (1807-1866), o próprio Rui Barbosa, ministro “inaugural” da Fazenda sob a República, Juca Paranhos, o Barão do Rio Branco (1845-1912), e Oswaldo Aranha, como chanceleres de grande envergadura na primeira metade do século XX, ou ainda o próprio Afonso Arinos de Melo Franco (1905-1990) e também San Tiago Dantas, ambos por breves períodos, nas conturbadas presidências de Jânio Quadros (1917-1992) e João Goulart (1919-1976). Eugênio Gudin (1886-1986) e Roberto Campos (1917-2001) se exerceram na área econômica partilhando das mesmas ideias liberais, embora eles o fizessem numa conjuntura de enorme preeminência e de ascensão do Estado empreendedor. Alguns tiveram projeção na academia, ou no setor privado, ou ainda no próprio Estado, com impactos diferenciados sobre as políticas públicas, mas com influência decisiva sobre as ideias em cada época, ou talvez ainda hoje, pois que permanecem na história nacional como grandes pensadores que foram, ou promotores de reformas que poderiam ter arrancado o Brasil de sua letargia para projetá-lo entre as nações avançadas do século XX.

No conjunto de seus ensaios de caráter historiográfico, este livro se esforça por examinar diferentes projetos para a construção da nação brasileira desde a Independência, nas esferas da organização do Estado, da garantia da Ordem, da busca do Progresso e no estabelecimento da Democracia, que são as quatro partes nas quais estão distribuídas curtas biografias intelectuais dos construtores da nação por mim selecionados.

    (...)


segunda-feira, 15 de agosto de 2022

Construtores da Nação: projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior: capa, sumário e apresentação - Paulo Roberto de Almeida

Paulo Roberto de Almeida:

Construtores da Nação: projetos para o Brasil, de Cairu a Merquior

São Paulo: LVM Editora, 2022


Índice

Prefácio   Arnaldo Godoy 

Apresentação

Nos ombros dos verdadeiros estadistas, Paulo Roberto de Almeida 

 

Introdução

Da construção do Estado à construção da Democracia 

 

Primeira parte: a construção do Estado

     O Estado antes da Ordem e da própria Nação 

1.  As vantagens comparativas de José da Silva Lisboa (Cairu)

2.  Por uma monarquia constitucional liberal: Hipólito da Costa  

3.  Civilizar os índios, eliminar o tráfico: José Bonifácio de Andrada e Silva

4.  Um Memorial para reformar a nação: Francisco Adolfo de Varnhagen

 

Segunda parte: a construção da Ordem

     Uma Ordem patrimonialista e oligárquica 

5.  Os liberais conservadores: Bernardo, Paulino e Paranhos

6.  Um aristocrata radical: Joaquim Nabuco 

7.  Bases conceituais da diplomacia: o paradigma Rio Branco

8.  O defensor do Estado de Direito: Rui Barbosa 

 

Terceira parte: a construção do Progresso

     O Progresso pelo Estado, com o Estado, para o Estado 

9.  Um empreendedor liberal numa terra de estatistas: Mauá

10. Um inglês imaginário e o nacionalista do petróleo: Monteiro Lobato

11. O revolucionário modernizador: Oswaldo Aranha

12. Duas almas pouco gêmeas: Roberto Simonsen e Eugenio Gudin 

 

Quarta parte: a construção da Democracia

     A Democracia carente de união nacional 

13. Em busca de uma esquerda democrática: San Tiago Dantas

14. O militante do parlamentarismo: Afonso Arinos de Melo Franco

15. As oportunidades perdidas do Brasil: Roberto Campos 

16. O liberalismo social de José Guilherme Merquior

 

A construção da Nação: um itinerário de 200 anos de história

 

Posfácio

O que a intelligentsia brasileira construiu em dois séculos de ideias e ações? 

 

Referências Bibliográficas para os Construtores da Nação 

Nota sobre o autor  

 

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Apresentação


Nos ombros dos verdadeiros estadistas

 

Paulo Roberto de Almeida 

 

Este livro trata, como indicado em seu título, de alguns dos construtores da nação brasileira. Ao abrigo desse conceito pretendi apresentar, ainda que de maneira breve, a vida, um esboço do pensamento e uma parte da obra daqueles que muito contribuíram, nem sempre com efeitos práticos ou resultados plenos, para a propositura de programas de governo, bem como de projetos para reformas estruturais nas instituições de Estado e nos mecanismos de governança do país, ao longo de quase duzentos anos de nosso itinerário como nação independente. Contudo, entre esses “construtores” não figuram aqueles indicados nos livros de história como tendo sido “dirigentes do Brasil” ou ocupado cargos de chefia de Estado: por exemplo, não foram aqui contemplados nem um, nem outro dos dois imperadores, que se exerceram, cada qual ao seu estilo, durante os 67 de regime monárquico, nem qualquer um dos regentes no período intermediário entre um e outro; tampouco receberam alguma menção especial qualquer um dos presidentes – e foram várias dezenas – ao longo dos mais de 130 anos de regime republicano. 

Mas aqui estão vários que poderiam ter sido mandatários do Estado, assim como alguns outros poucos que, de fato, exerceram funções de “primeiros-ministros”, como o “patriarca da Independência”, José Bonifácio de Andrada e Silva, assim como José Maria da Silva Paranhos, o Visconde do Rio Branco, na função de presidente de um dos gabinetes imperiais. Outros quase chegaram lá, como Rui Barbosa – candidato duas vezes à presidência –, ou San Tiago Dantas, recusado como primeiro-ministro de um dos gabinetes durante a breve experiência parlamentarista republicana. Oswaldo Aranha poderia ter sido um grande presidente, numa das várias oportunidades da chamada “era Vargas”, mas foi sabotado pelo próprio caudilho. Alguns outros, que aqui figuram, exerceram funções ministeriais, como Paulino, o Visconde do Uruguai, o próprio Rui Barbosa, ministro “inaugural” da Fazenda sob a República, Juca Paranhos, o Barão do Rio Branco, e Oswaldo Aranha, como chanceleres de grande envergadura na primeira metade do século XX, ou ainda o próprio Afonso Arinos de Melo Franco e também San Tiago Dantas, ambos por breves períodos, nas conturbadas presidências de Jânio Quadros e João Goulart. Eugênio Gudin e Roberto Campos se exerceram na área econômica partilhando das mesmas ideias liberais, embora eles o fizeram numa conjuntura de enorme preeminência e ascensão do Estado empreendedor. Alguns tiveram projeção na academia, ou na vida privada, ou ainda no próprio Estado, com impactos diferenciados sobre as políticas públicas, mas com influência decisiva sobre as ideias em cada época, ou talvez ainda hoje, pois que permanecem na história nacional como grandes pensadores que foram ou promotores de reformas que poderiam ter arrancado o Brasil de sua letargia para projetá-lo entre as nações avançadas do século XX. 

No conjunto de seus ensaios de caráter historiográfico, este livro se esforça por examinar diferentes projetos para a construção da nação brasileira desde a Independência, nas esferas da organização do Estado, da garantia da Ordem, da busca do Progresso e no estabelecimento da Democracia, que são as quatro partes nas quais estão distribuídas curtas biografias intelectuais dos construtores da nação por mim selecionados. Faltam muitos outros, é verdade, que poderão ser contemplados numa continuidade desta primeira coleção de pequenos “retratos” de alguns grandes estadistas da nação. Minha metodologia consistiu num exame individualizado, mas contextualizado, da vida, da obra, do pensamento e das contribuições respectivas de vinte personalidades atuantes na História do Brasil, em diferentes dimensões – governo, economia, relações internacionais, educação e cultura – nos últimos duzentos anos. Cada uma dessas personalidades – José da Silva Lisboa, Hipólito José da Costa, José Bonifácio de Andrada e Silva, Francisco Adolfo de Varnhagen, Bernardo Pereira de Vasconcelos, Paulino José Soares de Sousa, José Maria da Silva Paranhos, Joaquim Nabuco, José Maria da Silva Paranhos Jr., Rui Barbosa, Irineu Evangelista de Sousa, José Bento Monteiro Lobato, Oswaldo Aranha, Roberto Simonsen, Eugênio Gudin, Fernando de Azevedo, San Tiago Dantas, Afonso Arinos de Melo Franco, Roberto Campos e José Guilherme Merquior – recebe um curto perfil biográfico, seguido de breve descrição de suas atividades e obras ou ações conduzidas ao longo da vida, com um exame interpretativo de suas contribuições à construção da nação, naquelas dimensões, e uma avaliação do impacto de suas propostas. As referências bibliográficas ao final são individualizadas para cada um dos personagens, para melhor aferir a produção própria, assim como os trabalhos analíticos e biográficos em torno deles, complementadas por uma lista de obras gerais podendo servir a diferentes personalidades ou processos históricos cobrindo temáticas ou períodos mais amplos. 

Ao início e ao final do ensaio, assim como antecedendo cada uma das quatro partes, cobrindo os quatro conceitos que formam os elementos da construção da nação, figuram textos relativamente sintéticos contextualizando os períodos, as grandes questões em jogo, assim como o ambiente no qual atuavam cada uma das duas dezenas de personagens históricas. Ao longo de uma vida de estudos e pesquisas, ou de breves “convivências” com alguns deles, li muitos dos escritos que eles nos deixaram, percorri seus escritos em arquivos ou até dialoguei com um ou outro, mais indiretamente do que pessoalmente. Monteiro Lobato, por exemplo, “percorreu” toda a minha infância e primeira adolescência, e com ele, ou através dele, obtive minha primeira formação em história, mitologia, fantasia, para mais adiante tomar conhecimento dos grandes problemas do Brasil, do petróleo, do ferro, dos transportes. Hipólito e Bonifácio me ofereceram os primeiros “projetos de nação”, que infelizmente se perderam na mesquinhez do tráfico e na desgraça da escravatura. Mauá foi o empreendedor liberal de um Brasil que não conseguiu se desvencilhar das amarras da grande propriedade para se lançar num processo de industrialização dinâmico, também tentado pelo mesmo Monteiro Lobato, por Roberto Simonsen e também por Roberto Campos, inclusive na perspectiva de sua inserção na economia global, o que ainda não se realizou. Outros foram mestres na doutrina democrática e na diplomacia, como Rui Barbosa, os dois Rio Branco, Oswaldo Aranha, Afonso Arinos e San Tiago. Um último, finalmente, poderia ter sido um chanceler como nenhum outro tivemos, um intelectual de estatura mundial, como foi José Guilherme Merquior. 

Com todos eles aprendi muitas coisas, praticamente tudo o que sei sobre o Brasil e seus problemas, e também aprendi que nem todos os grandes projetos de construção da nação podem ser exitosos no próprio momento de sua concepção e proposição. Este ensaio constitui uma singela homenagem a esses gigantes do pensamento brasileiro, estadistas do saber, que, independentemente do maior ou menor sucesso na realização de suas ideias e propostas, realmente contribuíram para a construção da nação, em duzentos anos de história. 

 

No prelo, publicação prevista para setembro.