Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
quarta-feira, 27 de abril de 2011
De volta a uma moeda verdadeira ? - Klauber Cristofen Pires
Os bancos centrais, que detêm o monopólio emissionista nos últimos duzentos anos, assim como os governos que os secundam, que os criaram, que os deformaram, e que abusam de sua capacidade de empurrar o prejuízo para o público pagante -- ou seja, todos nós, reféns da moeda inflacionada e depreciada que eles nos empurram --, essas duas entidades absolutamente irresponsáveis -- algumas mais do que outras, claro -- não vão renunciar à faculdade criar papel pintado e de pretender nos fazer acreditar que isso é valor real.
Infelizmente, o fiat money veio para ficar e não acredito que seja possível voltar ao padrão-ouro ou adotar qualquer novo padrão que tenha algum lastro metálico em sua composição.
Simplesmente não é prático, não é economicamente credível, não é politicamente aceito pelos políticos que nos governam.
Acredito, ao contrário, que a globalização trará maiores opções em termos de moedas mais ou menos credíveis (todas papel, infelizmente, embora possa haver algum governo suficientemente "maluco" para prover lastro-ouro às suas expensas), opções que serão usadas por cidadãos suficientemente espertos para, ou em capacidade de, fugir ao monopólio abusivo -- muitas vezes arbitrário e irresponsável -- de bancos centrais e/ou governos deletérios.
Por outro lado, a globalização poderá também oferecer novas oportunidades para uma saudável competição entre "paraísos fiscais" e contas off-shore (mas teria de ser em alguma moeda nacional, por enquanto), para que os cidadãos também escapem, pelo menos parcialmente, dos privilégios abusivos que os governos se arrogam sobre seus ativos pessoais.
O dinheiro eletrônico em contas off shore será o padrão monetário do futuro, mas como disse, ele terá de ser baseado, no futuro previsível, em alguma moeda nacional.
Não sei se veremos esse tipo de fuga do monopólio no futuro previsível.
Enquanto isso não ocorre, esse tipo de tentativa -- estados americanos reconhecerem como moeda metais considerados de reserva, ouro ou prata -- me parece apenas parcial e paliativo, pois mesmo esses governos terão de dizer quanto vale o ouro ou a prata em circulação legal. Vão eles cotar pelos mercados spot? Vão estabelecer um valor fixo, mas qual? Uma banda? O quê, exatamente?
Se eu consulto o site da Bloomberg, constato que hoje, 27/04/2011, o ouro (gold spot) está cotado em US$ 1.507 (estava em 1.517 ainda ontem). e o platinum spot em US$ 1.810. Como as pessoas vão fazer? Carregar os seus lingotes de ouro por aí? Pagar um cofre em banco, um corretor para administrar esses ativos? As transações "externas", ou seja, não metálicas, terão de ter uma taxa de câmbio, portanto, uma comissão pela intermediação, e terão, de toda forma de ser cotadas pelo seu equivalente em alguma moeda papel.
O "papel exorbitante" do dólar -- como classificou Barry Eichengreen -- ainda vai continuar por muito tempo, e na verdade só é um pouco mais exorbitante do que outras moedas, que também têm esse direito abusivo de roubar valor aos particulares, sendo que os EUA apenas roubam um pouco do resto do mundo. Quem é grande e forte, geralmente faz isso, e na verdade o "papel exorbitante" do dólar não foi imposto aos outros; os outros é que fizeram bobagens suficientes para desqualificarem totalmente suas moedas.
O debate está aberto...
Paulo Roberto de Almeida
O dinheiro de verdade está voltando!
Por Klauber Cristofen Pires
Libertatum, 26 April 2011
A notícia econômica que promete ser a mais bombástica do século XXI simplesmente tem sido ignorada pelo mainstream jornalístico brasileiro. Refiro-me ao fato de que atualmente em treze estados norte-americanos tramitam projetos de lei com a finalidade de reconhecer os metais preciosos como o dólar e a prata como moedas legítimas. Em Utah, falta tão somente a assinatura do governador para a promulgação da lei. Além do Utah, em diferentes estágios de processo legislativo se encontram os estados do Colorado, Georgia, Montana, Missouri, Indiana, Iowa, New Hampshire, Oklahoma, Carolina do Sul, Tennessee, Vermont e Washington.
Um assunto de tamanha importância já deveria ter sido matéria veiculada pelos jornais e telejornais ao grande público, a transitar abertamente pelas bocas nos bares entre as rodas de chope, nas corridas de táxi, nos churrascos de domingo e nas barbearias. Ainda assim, a despeito de todo este silêncio sobre o assunto, decidi efetuar uma busca mais profunda na internet e só para confirmar o que eu já desconfiava, não encontrei sequer uma vírgula, fosse das Sras Mirian Leitão, Cladia Safatle, Raquel Landim, Dora Kramer, Tereza Cruvinel e Mônica Waldvogel, ou dos Srs Luís Nassif, Alberto Tamer, Sergio Leo, Joelmir Betting e outros que me perdoem pelo olvido de seus brilhantes nomes.
A razão pela qual esses estados estão tomando tal providência não é tão difícil de adivinhar: após quase oitenta anos de corridas quase ininterruptas de desvalorizações cambiais, o modelo keynesiano de moeda abstrata está virando farelo, e agora num passo acelerado. O processo contínuo de endividamento estatal adiado ao máximo pela possibilidade desimpedida de imprimir papel moeda a partir do literalmente nada está por encerrar um ciclo de empobrecimento mundial generalizado, com os estados e municípios totalmente quebrados e já sem condições de oferecer com uma qualidade minimamente aceitável os serviços públicos mais básicos, como a educação, a polícia e os bombeiros. Ei, estou falando aqui dos Estados Unidos! Do Brasil todos estamos fartos deste filme.
A despeito da fama de alguns indivíduos criminosos comuns, uma parte consideravelmente maior das emissões fraudulentas de papel-moeda, estas sim, realmente massivas, têm sido mesmo feitas por países tais como a China e a Rússia (esta tanto no anterior quanto posteriormente à queda do regime soviético). A suposta vítima, os E.U.A., por sua vez, não têm lá muita moral para reclamar: ao avaliarmos corretamente o seu “direito” próprio de emitir dinheiro, hoje em dia bastando-lhe para tanto alguns comandos eletrônicos como alguém que inocentemente efetua um saque em um caixa eletrônico, este país é justamente o maior falsário do seu sistema monetário.
Bail-out é o termo em inglês utilizado para definir o socorro que o governo norte-americano tem prestado a grandes instituições corporativas do seu país, com ênfase para a indústria automobilística, os bancos e as instituições de crédito imobiliárias. Este socorro tem sido prestado mediante uma combinação de concessões de crédito sob condições privilegiadas e muita, mas muita impressão de papel (ou de forma mais ecologicamente correta - se isto importa - pela digitação de uma numerosa quantidade de zeros). Seja como for, não se esconde a insatisfação de uma parcela significativa da população norte-americana, que por mais ajuizada que a brasileira, rapidamente tem entendido que seriam os seus cidadãos a pagar a conta pela má gestão destas instituições e das políticas falaciosas de seu governo central.
Todavia, o maior emblema do século da mentira não termina aí: como se não bastassem os governos dos diferentes países por décadas terem fulminado o valor representativo da riqueza das moedas, tenha sido por conta própria ou por ação malevolente dos demais, também as instituições bancárias têm multiplicado de forma absolutamente estelionatária a multiplicação de operações de créditos e a emissão de títulos representativos de propriedade de ouro e prata, de uma forma que, para a compreensão mais fácil, assemelha-se, em escala bastante reduzida, ao overbooking praticado pelas empresas aéreas ou às “linhas compartilhadas” que algumas estatais telefônicas no Brasil faziam quando vendiam uma mesma linha telefônica para mais de um cliente.
O que aparenta dar liga nesta cola é a mera prerrogativa que os bancos têm de não lhe entregar o bem físico em espécie, mas apenas o valor em dinheiro, isto é, em papel pintado, segundo a cotação do dia do precioso metal. Se eventualmente houver falta de cédulas e preciso for, estas serão providenciadas mediante encomenda do governo da hora. Moral: o cidadão comum é sempre o enganado. E os bancos se quedam cada vez não somente mais ricos, mas também mais poderosos, mancomunados que estão com os governos dos países nesta pirâmide-da-fortuna da qual formamos a base que os sustenta.
Garry Garret relata em seu livro The American Story como se deu a complexa operação em quatro passos conduzida pelo presidente Roosevelt que deu origem ao dinheiro sem lastro: primeiramente, foi decretado o fechamento dos bancos, bem como qualquer negociação em moeda estrangeira e transferência de capital para o exterior. Logo após, uma lei de iniciativa do governo foi baixada legalizando o fechamento dos bancos que havia sido imposto até então por decreto, e além disso, dispôs que nenhum banco no Sistema do Federal Reserve poderia reabrir senão sob licença do governo; em terceiro lugar, ela deu ao Presidente poder absoluto sob o câmbio externo, e em quarto, autorizou o Presidente a convocar os proprietários privados de ouro a abrir mão dele. Em seguida, mediante o apelo ao patriotismo e usando de todo o seu carisma político, os cidadãos e empresas foram convocados para depositarem os seus haveres em ouro no Federal Reserve em troca do papel-moeda que até então era 100% conversível.
Quando, enfim, todo o ouro já estava trancado nas caixas fortes no Banco da Reserva Federal, foi tornado crime para uma pessoa particular ter em sua posse tanto quanto uma moeda de ouro de cinco dólares. Para cortar a fita de inauguração do papel-moeda de curso forçado, uma lei posterior veio para autorizar o Presidente a: 1) desvalorizar o dólar por meio da redução de sua equivalência em ouro pela metade; 2) entrar no mercado financeiro e adquirir três bilhões de título do governo com papel-moeda; 3) emitir três bilhões de papel moeda fiduciário, garantido por nada, e torná-lo moeda corrente; 4) cunhar uma quantidade ilimitada de dólares de prata; 5) emitir uma quantidade ilimitada de certificados de prata em papel; e 6) fixar os valores do ouro e da prata em relação uma com a outra.
No Brasil, o governo federal possui a competência privativa para legislar sobre sistema monetário e de medidas, títulos e garantias dos metais (CF/88, art. 22, VI), o que coloca os nossos estados e municípios em uma posição extremamente vulnerável aos humores do governo central, sendo que este, por sua vez, irresponsavelmente nada está fazendo para evitar ou pelo menos minorar um grave processo de estagflação que já está dando os seus primeiros sinais de eclosão.
Para piorar, do muito pouco que se tem falado sobre o assunto, quando muito para comentar a sugestão meramente hipotética, principalmente por parte do falastrão Sarkozy, toda a abordagem dos sedizentes “especialistas” versa sobre a defesa mesma do papel-moeda de curso forçado, este impostor, o que não representa surpresa alguma, como se insistir em algo fundamentalmente errado pudesse por milagre resultar em algo correto.
O que seus adeptos pretendem é legitimar seus argumentos com base em especulações sobre o efeito deflacionário generalizado que o ouro alegadamente poderia impor à economia, o que não passa, na melhor das hipóteses, de uma tosca confusão mental. É claro que o agigantamento da produção de bens e serviços pode fazer com que o ouro se valorize, mas e daí? Isto já ocorre mesmo com o papel-moeda inconversível. Por volta dos anos quarenta, um agricultor brasileiro produzia, em média, para dezoito pessoas, e hoje, para mais de duzentas! Certa vez, meu pai quis transferir-me um consórcio sobre um aparelho de DVD, por não conseguir manter em dia as prestações, mas atualmente, um aparelho destes pode ser comprado por um valor que representa apenas uma única mensalidade daqueles idos anos! Há cerca de sete anos, adquiri um aparelho de tv de 29” por cerca de aproximadamente R$ 1.300,00, enquanto hoje assisto nos comerciais serem ofertados por menos de quinhentos reais! Na verdade, praticamente todos os produtos e serviços estão se barateando com o passar do tempo, devido à tecnologia crescente e aos repetidos aumentos de produtividade. Será que isto é necessariamente um problema?
O embaralhamento mental destas pessoas consiste em identificar um possível natural processo de valorização do ouro devido ao gradual aumento da oferta de bens e serviços com a ressaca resultante de políticas públicas falaciosas assentadas justamente em expansão artificial de crédito e manipulação dos juros a manter na marra baixas taxas. Ora, incutir ao ouro a conseqüência da incúria dos governantes é o mesmo que culpar o termômetro pela febre.
Além disso, sustentam que a adoção do ouro possivelmente resultaria em entesouramento especulativo. Isto é o que eles pensam, segundo os termos com que entendem o fenômeno natural que prefiro chamar de poupança. Com efeito, aos que reclamaram das ações do governo norte-americano de desatrelar o dólar do ouro, o governo da casa Branca respondeu: “- dinheiro é para circular”. Na verdade, o que eles estavam querendo dizer era “dinheiro é para se gastar”, o que refletia o pensamento inconseqüente e imprevidente da doutrina keynesianista em seus primeiros momentos de glória, a começar a gerar um progressivo e estratosférico endividamento tanto dos poderes públicos quanto dos particulares, quanto até o fim do padrão-ouro ambos eram - acreditem – absolutamente superavitários! Foi assim que queimaram - ou melhor, queimamos, porque estamos juntos nessa canoa furada - o futuro das gerações seguintes, por termos dado crédito para um sujeito por cujo comportamento pessoal pouco lhe importava sobre preocupar-se com futuros longínquos e proles.
Os processos inflacionários são decorrentes quase que exclusivamente por expansão monetária, e esta por sua vez, consiste em um efetivo meio arrecadatório. Imagine que uma indústria de laticínios decida retirar algo como 100ml de cada litro de leite a ser oferecido aos consumidores, substituindo-o por água. Com tal medida fraudulenta, ela colherá o lucro adicional de um litro de leite a cada dez unidades vendidas. Isto lhe permitiria até mesmo diminuir em parte o preço de cada litro como estratégia de marketing, claro, em um valor inferior ao que pagaria os 100ml surrupiados, o que deixaria muitos consumidores bocós satisfeitos. O mesmo fenômeno se dá com a moeda. Há algum tempo atrás, uma reportagem televisiva demonstrou que o dinheiro brasileiro suficiente para comprar um Fusca nos anos 70 não seria suficiente hoje sequer para comprar uma mera caixa de fósforos. Em termos de leite, o que o governo fez ao longo dos anos foi adulterá-lo cada vez mais e mais, de modo que atualmente um consumidor levaria para casa um litro de uma mistura na qual contivesse, quando muito, uma gota de leite. Eis a razão porque os governos centrais dos países opõem-se a aceitar o retorno ao padrão-ouro.
Concluindo, é difícil encontrar uma solução para o quadro brasileiro. Por um lado, temos os governos estaduais e municipais impedidos de reconhecer legalmente a aceitação dos metais como moeda corrente, e por outro lado, temos um governo central ímprobo e pródigo que não enxerga que está nos levando de encontro ao iceberg (ou enxerga sim e deseja justamente este resultado). Qualquer solução de grande porte há de vir por influência estrangeira, como a que está germinando nos EUA, e o máximo que pudermos fazer para evitar o pior desta catástrofe será adotarmos o metalismo como solução individual.
segunda-feira, 14 de março de 2011
Das paginas da Historia: Padrao-ouro nos EUA: 14/03/1900
Isto não está dito na matéria, mas eu me permito chutar, o curso estabelecido então deve ter ficado em torno de 24 dólares por onça de ouro, valor que só seria reajustado, no sentido da desvalorização (de praticamente 50%), 33 anos depois, pelo presidente Roosevelt, em 1933.
Diga-se de passagem que o valor então fixado, de 35 dólares a onça de ouro, permaneceu em vigor durante mais 4 décadas, aproximadamente, atravessando toda a guerra e o sistema de Bretton Woods, para ser denunciado, finalmente, por Richard Nixon, em 1971, terminando assim a ilusão da garantia dos dólares em ouro.
Não é preciso dizer que o preço do ouro disparou, desde então, o dólar conheceu uma trajetória oscilante de paridades instáveis com as principais moedas conversíveis, e entramos, para todos os efeitos, num "não-sistema monetário", com flutuação generalizada de moedas, onde estamos ainda hoje.
Paulo Roberto de Almeida
Gold Now the Standard
President McKinley Signs the Financial Bill
The New York Times, March 14, 1900
HE USES A NEW GOLD PEN
Secretary Gage at Once Prepares to Proceed Under the Bond Refunding Clause of the Act
Washington, March 14 -- At fourteen minutes before 1 o'clock this afternoon the President affixed his signature to the Financial bill, thus making it a law of the land. Mr. Overstreet of Indiana, who had the bill in charge, arrived at the White House about five minutes before that time, and was shown into the Cabinet room, where he was joined by the President, who after inquiring if the bill had been compared with care affixed his signature to it.
At the same time he recalled to those who stood by the fact that many of the important financial bills which had been passed by Congress had been approved on the 14th of the month. He spoke of the Sherman act, the Resumption act, and now the bill which was before him. In signing the bill the President used a new gold pen and holder, which Mr. Overstreet had brought with him for the purpose.