O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Across the Empire (4): de North Platte, Nebraska, a Denver, Colorado


Crossing the Empire, 2014 (4)
de North Platte, Nebraska, a Denver, Colorado


            Nada de extraordinário na viagem em si, ou seja, o percurso de estrada, mas sim no início e no final. Começamos por passar uma excelente noite neste hotel de “beira de estrada”, na verdade o maior da cidade (pequena) e da região (condado de Lincoln, como existem dezenas, centenas em todos os estados dos EUA). Carmen Lícia adotou os Quality Inns, como padrão para etapas de estrada, com razão.
            Os Quality Inns têm se revelado uma excelente surpresa, um preço camarada para uma qualidade excelente, pelo preço, mas desta vez fizemos um upgrade: uma suite de luxo, com jacuzzi (aliás não usada, pois não podia ser mais brega, em pleno living, ao lado da cozinha; deve ser coisa de gays). Pedimos salmão no quarto e duas taças de vinho, pois estávamos cansados da viagem do dia anterior. A despeito disso fui até de madrugada, terminando a informação sobre Des Moines e Omaha.
            Como não podia deixar de ser, o Hotel também homenageia o herói da região (junto com John Wayne, nascido bem perto), Buffalo Bill, por meio deste tapete, junto ao qual também apareço numa foto tirada por Carmen Lícia.
 
            Pela manhã, fomos à grande atração da cidade, o Trading Post Fort Cody, que tem tudo para figurar na coleção de breguices americanas imortalizadas por Umberto Eco no seu Viagens na Irrealidade Cotidiana (que li antes de conhecer os EUA, e achava que o autor estava exagerando, para depois descobrir que não: o kitsch é absolutamente normal neste país, e ele vai muito bem de saúde e de vigor, ainda que com muitos “made in China” em substituição aos antigos “made in America”).
            Na entrada, o painel com o matador de bisões e de índios (antes que ele se tornasse o primeiro show man americano e planetário, com seus espetáculos juntando índios, cavalaria e ele próprio, como o grande desbravador do oeste americano.
 Os politicamente corretos que lerem o que está no cartaz da parte de baixo não vão gostar: o homem se orgulhava de ter matado 4.280 bisões em oito meses.

           
            Não seja por isso, o interior do forte, e do trading post, é um pequeno museu em homenagem ao espírito desbravador dos americanos, com muita coisa de época, inclusive cartas e fotos do próprio William F. Cody (e de sua mulher, que sobreviveu cinco anos à sua morte em 1917), e muitas outras maquetes. No interior do forte, em tamanho real, peças típicas da época, como esta carroça, ilustrada pela presença de Carmen Lícia. 
            Eu fiquei ao lado de um bisão varonil, perfeitamente pintado e resinado para resistir às chuvas que pegamos ontem, com pedras de gelo e ventania.
            Feitas as compras no “trading post” (cartões, bijouteria, camisetas, magnets, e outros gadgets), saímos para as 260 milhas que nos separavam de Denver, nossa primeira grande parada. Aqui escolhemos um Residence Inn, da cadeia Marriot, também super confortável, com cozinha completa e em pleno centro da cidade. Andamos um pouco pela cidade e passamos num supermercado para as compras da noite: salmão, salada, arroz, frutas, e mais um vinho francês na loja em frente ao supermercado (que vende cerveja, mas não vinho). Carmen Lícia preparou um excelente jantar, e depois eu ainda andei em volta do hotel para espairecer pela noite.
            Nesta segunda, Labor Day, tudo estava fechado, obviamente, menos os sindicatos, protestando em favor de um mínimo de 15 dólares a hora.
            Amanhã, terça-feira, dia 2/09, começa verdadeiramente nossos passeios pela cidade. Além dos museus mais famosos, e do túmulo do Buffalo Bill (sacré bonhomme), vamos ao jardim botânico, mas não para ver plantas, e sim as esculturas em vidro do Chihuly, artista famoso, com obras em todas as partes, como esta aqui que fotografei no museu Joslyn, de Omaha.

Boa noite.
Denver, 1 de setembro de 2014


Guerra do Paraguai: entrevista com Francisco Doratioto (Cafe Historia)

Este pequeno site de história (que está ficando grande) traz uma excelente entrevista com o historiador, professor da UnB e do IRBr, de quem já resenhei alguns livros, nas não o mais importante.
Paulo Roberto de Almeida

Nova História da Guerra do Paraguai
Entrevistamos o historiador Francisco Doratioto, professor da Universidade de Brasília. Doratioto é um dos principais expoentes da chamada “Nova História da Guerra do Paraguai”. Em 2014, o conflito sul-americano completa 150 anos de seu início.
Com um trabalho baseado em farta documentação, Francisco Doratioto, professor da Universidade Nacional de Brasília e do Instituto Rio Branco, se tornou um dos principais especialistas em História da Guerra do Paraguai. Mais do que batalhas e personagens, suas pesquisa trazem o lado humano, social e político do conflito. Em 2002, Doratioto lançou pela Companhia das Letras o livro “Maldita Guerra”, que rapidamente se tornou um livro de referência na área, especialmente daquilo que convencionou chamar de “nova história da Guerra do Paraguai”. Se você ainda acha que o Brasil foi forçado a fazer a guerra pelo imperialismo britânico ou que o Paraguai era uma ilha de prosperidade que ameaçava ingleses na América do Sul, você vai se surpreender.
Bruno Leal: Professor, em abril de 1863, no Uruguai, o Partido Colorado, apoiado pelo Brasil Imperial e pela Argentina de Bartolomeu Mitre, se rebelou contra o Partido Blanco, eleito em 1860. Acuados, os blancos, então, foram atrás do apoio de Solano López, presidente do Paraguai. Um ano depois começava a Guerra do Paraguai, conflito que durou seis anos e que neste ano de 2014 completa 150 anos de seu início. Por que o Paraguai (Solano López) apoiou os blancos contra oponentes tão poderosos? Até que ponto esta decisão se deu pela oportunidade do Paraguai conquistar acesso ao mar e/ou pelo medo de um provável desmantelamento das nações menores do Cone Sul, oriundo de uma aliança entre Brasil e Argentina?
Francisco Doratioto: Não se tem certeza sobre a motivação do Francisco Solano López em envolver-se na questão uruguaia; não temos documento escrito ou testemunho que permita dar uma resposta taxativa. No entanto, há uma concordância de que interessava a López a manutenção dos blancos no poder em Montevidéu, de modo a utilizar este porto para o comércio externo paraguaio, de modo a dar continuidade à inserção do Paraguai no comércio internacional iniciada no governo de Carlos Antonio López. Os blancos procuraram, é verdade, convencer López de que a Argentina e o Brasil pretendiam pôr fim à independência do Uruguai, dividindo entre si o território uruguaio e, depois, se voltariam contra o Paraguai. Teria ele acreditado nisso? Possivelmente não, mas com certeza se deu conta que a derrota dos blancos uruguaios fragilizaria o Paraguai frente à Argentina e ao Império, que passariam a atuar coordenadamente no Prata em lugar de rivalizarem-se e isso quando ambos tinham litígio de fronteiras com o país guarani.
Bruno Leal: Nas décadas de 1960 e 1970, uma certa leitura historiográfica obteve bastante êxito ao explicar a Guerra do Paraguai como fruto imperialismo inglês na região do Cone Sul, como se o Brasil tivesse sido arrastado para a guerra por uma Inglaterra temerosa com o crescimento econômico do Paraguai na região. O senhor é bastante crítico desta teoria, não? Qual foi exatamente o papel da Inglaterra no conflito e porque essa teoria teve e ainda tem tanto sucesso?
Francisco Doratioto: Não sou eu que sou crítico a essa explicação mas, sim, os fatos. Não existe lógica e nem um fiapo de prova nesse sentido. Ademais, não sou o único que afirma isso; outros colegas no Brasil e em outros países também criticam essa explicação. Quanto à Inglaterra, há que se distinguir o seu governo de seus banqueiros. O governo inglês manteve-se neutro no conflito – aliás, foi ele que tornou público o Tratado da Tríplice Aliança, que era secreto -, enquanto seus diplomatas no Rio da Prata eram antipáticos à Solano López, pelas características da ditadura que ele impunha ao Paraguai. Já os banqueiros ingleses fizeram o que todo banqueiro faz: tentaram ganhar dinheiro com a guerra. Assim, emprestaram dinheiro para aqueles governos que tivessem condições de pagar os empréstimos, ou seja, para o Império e para a Argentina, mas não para o Paraguai. Registre-se, porém, que apenas uns 12% dos gastos brasileiros com a guerra foram financiados por esses empréstimos, enquanto o restante foi obtido internamente por meio de impostos, empréstimos, desvio de recursos do orçamento público, etc.
Bruno Leal: Professor, é bastante conhecida a participação de negros, ex-escravos ou não, na Guerra do Paraguai. Na historiografia sobre o tema, no entanto, parece não haver um consenso quanto ao número de soldados negros na frente de batalha. Como o senhor avalia a participação desse contingente na Guerra do Paraguai? A vitória do exército brasileiro na guerra impactou na forma como o negro ou mesmo a escravidão era vista pelas elites do país?
Francisco Doratioto: A falta de consenso não é somente quanto ao número de soldados negros na guerra, mas quanto ao número de brasileiros que foram para a guerra. Se fala de 100.000 até 150.000; também não sabemos ao certo qual foi o número de mortos brasileiros, com os estudiosos citando algo entre 50.000 e 100.000, uma enormidade se considerarmos que o Império tinha 9.000.000 de habitantes (cerca de um terço da população escrava). O Conde d’Eu elogiou o valor da participação dos “zuavos” na guerra, enquanto Caxias e outros chefes militares, em suas correspondências privadas, criticaram os negros. Suspeito que negros e brancos não se diferenciaram muito: a guerra foi duríssima, as condições do teatro de operações eram terríveis e, a partir do final de 1866, o desalento era geral, independente da cor da pele do soldado brasileiro.
Bruno Leal: Quando o assunto é Paraguai, fala-se muito na destruição do país após os anos de conflito, desde a destruição completa de cidades até a morte de boa parte de sua população, passando por operações que hoje, talvez, poderia ser classificadas como “crimes de guerra”. O que há de exagero e o que há de real nessas imagens de terra arrasada?
Francisco Doratioto: Seria um anacronismo falar em “crimes de guerra”. Esse é um conceito desenvolvido no século XX; no século XIX era comum o saque, os abusos contra mulheres e civis em geral, a morte do prisioneiro ou seu uso em trabalho forçado. Os paraguaios saquearam Corumbá e Uruguaiana, perpetraram violências contra os civis e, ainda, contra prisioneiros. As forças brasileiras saquearam Assunção e também fizeram violências prisioneiros e civis. Após 6 anos de guerra o Paraguai ficou, de fato, arrasado. Há polêmica sobre qual seria o número de habitantes do país no pré-guerra, mas há concordância percentual, ou seja, de que o país perdeu mais de metade da população e mais de 2/3 dos homens. No entanto, tal qual ocorreu entre as forças Aliadas, a maior parte da mortandade paraguaia foi causada por doenças ou fome, esta decorrente da migração imposta por López que obrigava a população a ir para o interior do país, na medida em que as forças aliadas avançadas. Era uma política de terra arrasada, ou seja, de esvaziar o território paraguaio de recursos humanos e alimentícios para que os soldados aliados que avançavam não os utilizassem no esforço de guerra.
Bruno Leal: Embora a guerra tenha terminado em 1870, O Brasil manteve um efetivo de aproximadamente 2 mil soldados no país por seis anos. Esse é um dado que nem todos conhecem. Professor, o senhor pode falar mais um pouco dessa ocupação? Quer dizer, porque um período tão longo? O Paraguai perdeu sua autonomia política neste período? Qual era a missão das forças brasileiras em solo paraguaio no pós-guerra?
Francisco Doratioto: Entre 1870 e 1876, o Paraguai foi praticamente um protetorado brasileiro. O governo imperial agiu para evitar que se instalasse no país um governo que fosse composto por homens favoráveis ao fim de sua independência, mediante a incorporação à Argentina. Os governantes brasileiros estavam convencidos de que esse era o plano do governo argentino e nesse período agiu para conter a influência argentina no Paraguai. Além de uma eficiente ação diplomática nesse sentido, o Império se respaldava em uma Divisão de Ocupação, aquartelada a poucos quilômetros de Assunção. Para o governo imperial essa tropa, um instrumento de manter a ordem política em Assunção, favorável ao Brasil, e, ainda, para impedir uma eventual ação sustentada pela Argentina no sentido de impor pela força um governo paraguaio com homens que fossem favoráveis a ela.
Bruno Leal: Geralmente, conflitos contra países estrangeiros produzem sentimentos nacionalistas, criam comunidades imaginadas, enfim, geram sentimentos de unidade. A Guerra do Paraguai gerou esse tipo de sentimento no Brasil?
Francisco Doratioto: Não vejo que isso tenha ocorrido de forma significativa, inclusive porque a guerra tornou-se impopular e, a partir de 1868, todos eram favoráveis a uma solução negociada, inclusive Caxias. No entanto, Pedro II exigiu que a guerra terminasse somente quando fosse cumprido o que estabelecia o Tratado da Tríplice Aliança, ou seja, a saída de Solano López do poder.
Bruno Leal: Professor, quais eram as principais leituras historiográficas sobre a Guerra do Paraguai quando o senhor começou a pesquisar o tema? Em que medida os seus trabalhos divergem destas leituras?
Francisco Doratioto: Na realidade, minha única leitura era a que eu tinha feito no curso de graduação em História, no final dos anos 1970: a guerra tinha sido causada pelo imperialismo britânico e Brasil e Argentina tinham sido marionetes dos interesses ingleses. Eu dei aula no 2º. Grau, em São Paulo, apresentando essa explicação! Posteriormente, fui fazer meu Mestrado na Universidade de Brasília e o tema que propus inicialmente era sobre as relações entre o Brasil e o Paraguai no pós-guerra pois, pensava eu então, o que ocorrera na guerra já se sabia. No entanto, ao ir às fontes primárias (documentação diplomática brasileira e argentina) percebi que eu tinha de entender qual tinha sido o relacionamento entre Brasil e Argentina durante a guerra, para poder compreender a origem e a lógica da disputa entre os dois países pela influência sobre o Paraguai no pós-guerra. Fui, então, ler a documentação sobre a guerra e seu contexto e ela desmentia o que revisionismo brasileiro afirmava, quer quanto ao suposto imperialismo inglês, quer quanto à leitura maniqueísta de que Francisco Solano López tinha sido um governante progressista, quase socialista, vítima de seus dois poderosos vizinhos. Esse revisionismo, em sua versão mais maniqueísta, apresenta a guerra quase como uma disputa entre um “mocinho”, López, e bandidos, a Argentina e o Brasil.
Bruno Leal: Em geral, conhecemos o que a produção historiográfica brasileira produz sobre a Guerra do Paraguai. Como o tema é tratado, de uma forma geral, atualmente, pela historiografia de países como Argentina, Uruguai e Paraguai? Há grandes diferenças de abordagem em comparação com o Brasil?
Francisco Doratioto: No Brasil, no meio acadêmico, há consenso entre historiadores que se dedicam ao estudo da guerra de que suas origens se encontram no próprio processo histórico regional e não no imperialismo inglês. Na Argentina, no Uruguai e no Paraguai essa interpretação também está presente entre os maiores estudiosos do conflito, mas há personagens influentes, nem sempre historiadores, que persistem na explicação imperialista. Para tanto há, inclusive, motivos políticos, como é o caso do governo argentino que estimula a interpretação revisionista por ser antiliberal quando o peronismo também o é. O mesmo ocorre no Paraguai, onde a mistificação da figura de López, de sua ditadura e de seu papel na guerra, tornou-se ideologia oficial da ditadura de Alfredo Stroessner. Um ditador buscou legitimidade em outro... A redemocratização paraguaia alterou um pouco essa situação, mas, afinal, Solano López foi construído como herói nacional nos governos de três militares: Rafael Franco, em 1936; Higino Morínigo (1941-1948) e Alfredo Stroessner (1954-1989).
Bruno Leal: Professor, sabemos que há uma defasagem significativa entre aquilo que é produzido em âmbito acadêmico e aquilo que está nas salas de aula. Que leituras tradicionalistas ou já questionadas por pesquisas acadêmicas sobre a Guerra do Paraguai ainda sobrevivem no ensino de história?
Francisco Doratioto: Não tenho acompanhado diretamente essa questão; sei dela por meio de meus ex-estudantes, que hoje são professores, e alunos que fazem estágio nas escolas de primeiro e segundo grau. Noto que há, crescentemente, o abandono da explicação imperialista e um ou outro livro didático que ainda a sustenta. Na realidade, há uma grande defasagem cronológica do que é produzido pela historiografia acadêmica ser incorporado no ensino fundamental e secundário. Em parte isso se explica pela dificuldade que o professor desses níveis de ensino tem para atualizar-se. Esse professor é um verdadeiro herói, pois para sobreviver tem de dar uma enormidade quantidade de aulas semanais, não lhe restando tempo para fazer cursos de atualização ou recursos financeiros para comprar livros com os avanços historiográficos. Vejo, porém, que as novas gerações de professores já tiveram acesso, nas Universidades, a esses avanços e, mais, estes já estão incorporados no conteúdo dos vestibulares em todo o país.
Bruno Leal: Ano passado, o Museu Imperial, em Petrópolis, região serrada do Rio de Janeiro, fez um levantamento de mais de 3 mil documentos sobre a Guerra do Paraguai, muitos dos quais desconhecidos por boa parte dos historiadores. Entre o material, por exemplo, estão várias cartas de Solano López e um diário do Conde d’Eu. Professor, em que medida essa documentação pode acrescentar ou até mesmo mudar nossos conhecimentos sobre a história do conflito?
Francisco Doratioto: Toda documentação inédita e, mesmo, a releitura daquela já pesquisada pode trazer novas informações e, portanto, ampliar nosso conhecimento sobre a história da Guerra do Paraguai. Há vários aspectos dela a serem melhor estudados: estatísticos; financeiros; tecnologia do armamento empregado; processos decisórios; o papel dos negros, dos índios; questões de gênero, etc. Acredito que a nova geração de historiadores que hoje está fazendo Mestrado ou Doutorado produzirão trabalhos que avançarão no conhecimento sobre a guerra. Veja bem que utilizo a palavra “avançarão”, ou seja, não retornaremos à explicação imperialista e, menos ainda, à explicação “patriótica” que havia predominado antes. No entanto, por questão de justiça, quero ressaltar que mesmo no início do século XX, tivemos trabalhos muito cuidadosos sobre o tema como, por exemplo, o admirável “História da Guerra entre a Tríplice Aliança e o Paraguai”, do general Tasso Fragoso, ou as memórias do barão de Jaceguai.
Bruno Leal: E sobre a polêmica envolvendo a desclassificação de documentos sigilosos no Brasil sobre a Guerra do Paraguai? O senhor acha que medidas como essas são diplomaticamente delicadas ou deve-se mesmo tornar acessível todo tipo de material sobre a questão?
Francisco Doratioto: Essa é uma “lenda urbana”. Não existe um arquivo secreto “Guerra do Paraguai” no Arquivo Histórico do Itamaraty, mas isso é afirmado e reafirmado por aqueles que não são estudiosos do assunto. De todo modo, como historiador e cidadão sou favorável ao acesso a todos os documentos públicos, exceto aqueles que tratam de assuntos do presente que podem ocasionar graves danos à sociedade brasileira. É normal que seja sigilosa por algum tempo a documentação diplomática e aquelas referentes a negociações econômicas internacionais e à segurança do país. Nossa Lei de Acesso à Informação não encontra equivalente nos países vizinhos.
Bruno Leal: Professor, chegamos ao fim de nossa conversa. Para finalizar, voltemos a um dos motivos que nos motivou a procura-lo para a conversa: os 150 anos da Guerra do Paraguai. Que eventos importantes a respeito ocorreram ou ainda vão ocorrer este ano, tanto no âmbito acadêmico quanto fora dele? Como o senhor avalia esse momento de lembrança? A historiografia ainda pode revelar muito mais coisas sobre a guerra?
Francisco Doratioto: Há vários seminários sendo feitos no Brasil e a TV Escola, do MEC, apresentou um excelente documentário, em três episódios, sobre a guerra, com pesquisas realizadas em todos os países envolvidos na guerra. Sei que também está sendo produzido um documentário sobre o tema para o History Channel. Este momento e os próximos anos, até 2020, quando então teremos os 150 anos do fim da guerra, devem ser motivo de reflexão e de encontro dos países que participaram da guerra. Penso no que ocorreu na Europa, onde Alemanha e França preocuparam-se em entender a I e da II Guerra Mundial a partir da metodologia histórica e não de um nacionalismo pernicioso, mostrando o sofrimento de suas populações e seus soldados e as consequências dessas guerras. Essa postura favoreceu a integração europeia, a construção de um espaço de paz em um continente que, até então, vivenciara guerras seguidas desde a criação do Estado Nação. Também para nós, na América Meridional, a Guerra do Paraguai deve ser motivo de reflexão que permita-nos superar preconceitos e avançar no processo de conhecimento mútuo e de integração regional.

Francisco Doratioto: Possui graduação em História pela Universidade de São Paulo (1979), graduação em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (1982), mestrado em História pela Universidade de Brasília (1988) e doutorado em História pela Universidade de Brasília (1997). É Professor Adjunto, de História da América, no Departamento de História da Universidade de Brasília; atua no programa de Pós-Graduação em História da mesma instituição e leciona História das Relações Internacionais do Brasil e História da América do Sul no curso de formação de diplomatas do Instituto Rio Branco (Ministério das Relações Exteriores). Trabalha com História do Rio da Prata; História das Relações Internacionais do Brasil, com ênfase nas relações com os países da América Meridional, e com História Militar do Brasil. É membro correspondente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro; da Academia Paraguaya de la Historia, Paraguai, e da Academia Nacional de la Historia, Argentina, e do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil.

Brasil: um avestruz protecionista - Gustavo Franco

Sim, o Brasil é protecionista, isso já sabemos. E as multinacionais aqui instaladas acabam se dobrando às deformações das nossas políticas econômicas, introvertidas e orgulhosas de sê-lo. Basta ouvir a soberana repetir que vai defender os empregos aqui dentro.
Idiotas desse tipo atrasam o Brasil e acabam justamente destruindo os empregos.
Paulo Roberto de Almeida 

Por que o ‘Brazil’ exporta pouco?

A produção industrial vem se tornando um fenômeno cada vez mais internacional, assunto que tem trazido um misto de contrariedade e excitação quanto às suas vastas consequências. Trata-se aqui de um dos capítulos mais intrincados da globalização, tanto que apenas pode ser descrito, infelizmente, com palavras em inglês capazes de embaralhar as falas mais amestradas, além de sacudir os brios dos nacionalistas do idioma: offshoring e outsourcing.
Não há uma tradução para isso, como frequentemente ocorre com novos e complexos processos relativos à economia global, o leitor deve olhar para esses vocábulos como ideogramas, ou talvez deixar-se embriagar pela sua sonoridade, pela associação com coisas referentes à alta tecnologia ou com relações internacionais. Talvez um dia entrem para o vernáculo, como o abajur, o bonde e a manicure.
Preferimos investir em parcerias “Sul-Sul” em vez de entrar para a OCDE e em acordos comerciais que nos colocam no mapa da produção internacional
Concretamente, trata-se de processo pelo qual a produção industrial se desagrega em etapas que vão sendo implantadas ou transferidas para diversos países, conforme a vantagem locacional, e de sorte a reduzir a exposição a variações cambiais e otimizar a cadeia, ou mais propriamente, a rede internacional de valor.
Pense no seu smartphone (que já está quase entrando no dicionário) e repare que a fabricação pode se dar na China, com componentes vindos de diversos países, com peças e software de outros, e o desenvolvimento, o branding e o marketing em outros. Ou pense num call center nos EUA onde os atendentes estão na Índia ou na Bahia e os data centers na nuvem. A globalização, às vezes, parece propaganda de um curso de inglês, não é mesmo?
A história desses processos tem muito a ver com outro fenômeno que outrora pareceu perturbador: a empresa multinacional. Nos anos 1950 e 1960 as grandes empresas, sobretudo americanas, começaram a abrir filiais no exterior, em muitos casos apenas para atender os desejos de “substituição de importações”, ou de “produção local”, em países clientes que se tornaram mais protecionistas. Com o tempo, o número e o volume de produção e vendas do conjunto das filiais no exterior foi crescendo a ponto de mudar a natureza dessas organizações, que deixaram de ser federações de réplicas da mãe, e foram assumindo uma personalidade distintamente transnacional. A divisão internacional do trabalho se aprofundou dentro da empresa, e com isso explodiu o fenômeno do “comércio intrafirma” (entre partes relacionadas) que já nos anos 1990 tinha ultrapassado 1/3 do comércio mundial.
Em tempos mais recentes, o processo se acelerou ainda mais diante da ascensão industrial da China, e o Brasil poderia estar na crista da onda desse vendaval de transformações, pois a presença de multinacionais no país é imensa. Em 2010, tínhamos 16.844 empresas estrangeiras no país. Como eram 6.322 em 1995, pode-se dizer que foram duas novas a cada dia ao longo desses 15 anos. Essas empresas tinham ativos de R$ 2,4 trilhões e faturamento de R$ 1,6 trilhão e eram responsáveis por 38% das exportações totais do país e 43% das importações em 2010.
É possível estimar que esse conjunto de empresas tenha sido responsável pela geração de cerca de um quarto do PIB brasileiro em 2010, ou seja, esse PIB “estrangeiro” dentro do Brasil seria próximo de US$ 523 bilhões, o que colocaria este “país” (chamemos de “Brazil”) como o vigésimo segundo PIB deste planeta, entre Suécia (US$ 560 bilhões) e Polônia (US$ 516 bilhões).
Entretanto, a despeito da contribuição do “Brazil” para as exportações brasileiras, é importante observar que as empresas estrangeiras no Brasil exportam muito pouco, especialmente quando comparado: (i) ao Brasil, pois o “Brazil” exporta algo como 17% de seu PIB (cerca de US$ 87 bilhões), não muito mais que o Brasil (10,5%); (ii) a países “comparáveis”, Polônia e Suécia, que exportam 39% e 32% de seus respectivos PIBs; e (iii) às filiais de multinacionais estabelecidas pelo mundo, cuja propensão a exportar, segundo dados da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), deve ser superior a 45%.
Essas contas servem para mostrar que as empresas estrangeiras estabelecidas no Brasil, que respondem por 40% do comércio exterior do país, poderiam estar exportando o dobro ou o triplo, o mesmo valendo para a importação, se estivessem se comportando de modo minimamente parecido com o que fazem, em média, em outros países. Se o “Brazil” estivesse exportando na faixa de 45% de seu PIB suas vendas no exterior teriam sido cerca de US$ 150 bilhões maiores do que foram em 2010.
A pergunta que não quer calar é muito simples: por que então as multinacionais estabelecidas no Brasil exportam tão pouco?
É claro que a resposta começa pelo fato de que todas as razões que levam o Brasil a exportar pouco, sobretudo em manufaturas, valem para o “Brazil”. O intrigante é que, no “Brazil”, há bastante mais competitividade, a julgar pelos níveis de produtividade, que são cerca de dez vezes maiores relativamente ao Brasil. E isso serve para afastar o câmbio da discussão, pois a “sobrevalorização”, essa doença crônica, estaria em 20%, segundo a “The Economist” e sua métrica de big macs, de modo que não seria tão relevante. As organizações globais das multinacionais se formam, entre outros motivos, para diluir o risco cambial.
Sendo assim, por que então as multinacionais localizadas no Brasil não plugam mais intensamente as suas operações no Brasil com suas cadeias internacionais de valor?
Pode-se dizer que há um problema de nascença, pois essas empresas vieram para o Brasil pensando no mercado interno, em contraste com o que se passou na Ásia, e o período de hiperinflação nos subtraiu ainda mais da globalização. Com a passagem do tempo, todavia, o “Brazil” deveria ficar mais exportador (e a Ásia menos), e, de fato, considerando uma amostra mais restrita de filiais americanas, a razão exportações/PIB, que estava em 14% em 1995 (para as filiais no Brasil, contra 63% para as filiais na Ásia e 42% para a média mundial) sobe para 32% em 2005 (contra 52% para a Ásia e 46% para a o mundo), mas despenca para 22% em 2012 mercê do aumento substancial do protecionismo e dos “requisitos de conteúdo local”.
Nada pode ser mais prejudicial à ideia de elevar as exportações do “Brazil”, e a enriquecer os laços do Brasil com o resto do mundo, que esse protecionismo velho, que confunde soberania com autarquia e que privilegia a balança comercial em vez da corrente de comércio. Sem importar, não se exporta.
E mais: preferimos investir em parcerias “Sul-Sul” em vez de entrar para a OCDE e em acordos comerciais que nos colocam no mapa da produção internacional.
Estamos perdendo tempo com políticas comerciais e industriais mercantilistas e obsoletas, que parecem combater e contestar a globalização (e os estrangeirismos), quando ela já está firmemente absorvida dentro de casa e nos oferece oportunidades que fingimos não enxergar.
Fonte: O Globo, 31/08/2014.

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SOBRE GUSTAVO H. B. FRANCO



Gustavo H. B. Franco

Gustavo H.B. Franco é bacharel e mestre em economia pela PUC do Rio de Janeiro e Ph.D (1986) pela Harvard University. É estrategista-chefe da Rio Bravo e presidente do Instituto Millenium. Foi presidente do Banco Central do Brasil, e também diretor da Área Internacional do Banco Central e Secretário Adjunto de Política Econômica do Ministério da Fazenda, entre 1993 e 1999. Gustavo Franco participa de diversos conselhos consultivos e de administração e escreve regularmente para jornais e revistas. É professor do Departamento de Economia da PUC desde 1986. Tem 14 livros publicados e mais de uma centena de artigos em revistas acadêmicas.

Eleicoes 2014: companheiros em pleno ataque de nervos (coitados, foram tao arrogantes...)

Os companheiros até alguns dias atrás estavam à beira de um ataque de nervos, com as primeiras revelações das pesquisas eleitorais.
Esperavam ainda que a situação amainasse ou até revertesse, mas ela só se agrava, para eles, claro...
Coitadinhos nada: foram bastante arrogantes, ao querer transformar estas eleições em um novo confronto com os tucanos, insistindo em comparar seus resultados com a situação deixada pelos tucanos, 12 anos atrás, como se eles não mentissem sobre aquela herança e mentissem ainda mais sobre os seus próprios resultados.
Agora eles vão precisar inventar muitas maldades, falsidades e revelações escandalosas sobre a beata da floresta, para ver se conseguem desmantelar sua irresistível ascensão.
Correm o risco de dar mais uma vez errado, e a vítima posar de vítima justamente, e eles de algozes mentirosos, como aliás são, justamente.
Justamente, os companheiros já estão em pleno ataque de nervos, e imagino que as reuniões de planejamento eleitoral sejam curiosas, cada um propondo uma maldade maior do que a outra para expelir, por meio do exército de mercenários que controlam e pagam para justamente fazer esse tipo de maldade.
Os companheiros são cheios de justamente, e de maldades.
Como é mesmo aquele dito cristão? O Bem com o Bem se paga? Pois é, a maldade também...
Paulo Roberto de Almeida

Marina será eleita presidente, dizem grandes consultorias
Fabio Alves
O Estado de S.Paulo, 1/09/2014

Arko Advice, uma das maiories consultorias do País, diz que candidata do PSB tem 60% de chance de vencer. Para a Tendências, probabilidade de vitória de Marina é de 50%, contra 40% de Dilma e 10% de Aécio.

A Arko Advice e a Tendências – duas importantes consultorias com uma carteira grande de clientes no setor privado, em particular no mercado financeiro – acabaram de mudar suas apostas em relação ao resultado da eleição presidencial e agora preveem a vitória da candidata do PSB, Marina Silva.

Em relatório enviado na noite de domingo aos seus clientes, a Arko Advice agora atribui 60% de probabilidade de vitória de Marina num eventual segundo turno com a presidente Dilma Rousseff. Até a trágica morte de Eduardo Campos, no dia 13 de agosto, a Arko Advice dizia aos seus clientes que Dilma tinha 60% de probabilidade de ser reeleita.

Já a Tendências Consultoria Integradas enviou um relatório aos seus clientes na sexta-feira prevendo a vitória de Marina num eventual segundo turno com a candidata do PT. A Tendências atribui 50% de probabilidade da eleição de Marina à Presidência da República, contra 40% de chances de Dilma e 10% de chances do tucano Aécio Neves.

Até a quinta-feira passada, antes da divulgação da pesquisa Datafolha que mostrou Marina e Dilma empatadas tecnicamente no primeiro turno e a vitória da ex-ministra do meio ambiente no segundo turno com dez pontos porcentuais de vantagem, a Tendências atribuía 55% de probabilidade de reeleição de Dilma num eventual segundo turno com Aécio.

Segundo o sócio e chefe do Departamento de Análise Política da Arko Advice, Cristiano Noronha, a mudança na sua aposta para o desfecho da eleição presidencial de outubro foi baseada em três fatores: elevado índice de rejeição de Dilma Rousseff junto aos eleitores; a nova queda na aprovação do governo Dilma na última pesquisa de opinião; e a alta elasticidade de Marina nas intenções de voto, indicando uma capacidade da candidata do PSB de atrair a migração de votos de outros candidatos na passagem do primeiro para o segundo turno.

“Apesar de uma recuperação da aprovação do governo nas pesquisas anteriores, uma nova piora no último levantamento do Datafolha mostrou que aquela melhora não representou uma tendência, mas sim algo pontual”, explicou Noronha.

Sobre a elasticidade de Marina nas intenções de voto, Noronha argumenta que isso ficou evidente no forte crescimento da candidata do PSB – 13 pontos porcentuais em apenas duas semanas entre as recentes pesquisas do Datafolha. “Essa elasticidade não é percebida em relação à intenção de voto de Dilma e isso é importante por apontar até onde uma candidata pode eventualmente conseguir chegar na passagem do primeiro para o segundo turno”.

Já o cientista político da Tendências, Rafael Cortez, argumenta que Marina capta com maior facilidade o eleitorado decepcionado com o desempenho do governo Dilma. “Assim, ela quebra a polarização PT-PSDB ao tomar o protagonismo oposicionista dos tucanos”, explicou Cortez, em relatório a clientes. “A corrida eleitoral pode reservar novas surpresas, mas na ausência de choque negativo, a figura de Marina deve confirmar a troca do partido presidencial.”

Segundo Cortez, o cenário anterior, de favoritismo de Dilma, com 55% de chances de vitória, tinha como pressuposto o crescimento da popularidade do governo ao longo da campanha e a manutenção do segundo turno entre PT e PSDB.

E qual a probabilidade de Aécio ainda conseguir reverter a sua forte queda nas intenções de voto e ir ao segundo turno?

Na opinião de Cristiano Noronha, da Arko Advice, com base nas últimas pesquisas de opinião, o candidato tucano provavelmente ficará de fora de um segundo turno.

Todavia, lembra Noronha, isso pode depender de qual será o desgaste, se houver, de assuntos polêmicos envolvendo a candidatura de Marina, tirando-lhe eventualmente apoio entre eleitores.

Ele cita, entre esses fatos, as acusações de caixa dois envolvendo o jato que transportava Eduardo Campos; as erratas no programa de governo de Marina, em particular nos trechos afetando os direitos do movimento LGBT; e as explicações sobre os ganhos da candidata do PSB com palestras nos últimos três anos.

“Mesmo que houver um estrago na imagem dela, é preciso ver a magnitude disso, isto é, se será na mesma magnitude do ganho avassalador que Marina teve nas pesquisas”, afirmou.

As teses da Arko Advice e da Tendências poderão ser comprovadas ou não na próxima pesquisa Ibope de intenção de voto para presidente da República, de abrangência nacional, que será divulgada às 18 horas da quarta-feira, dia 3.

* Fábio Alves é jornalista do Broadcast

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Reflexao do dia: Quo vadis, Brasil?

Um aliado no Brics invade o território de um país com o qual temos relações diplomáticas normais, e não soltamos uma única e miserável nota a respeito, como se tudo fosse normal, como se os países saíssem por aí a invadir os outros, ao arrepio das convenções e do direito internacional, com a arrogância típica dos impérios em construção...
Outro aliado começa a restringir os direitos democráticos, que ainda existem, na sua província especial, ex-colônia britânica, que teve a sorte de ter todas as liberdades democráticas da metrópole-mãe, e mais liberdades econômicas do que a própria metrópole, que derivou para o fabianismo e foi para uma gloriosa decadência, antes de ser recuperada por uma estadista clarividente. Agora, o mais velho império do mundo pretende estabelecer a tirania que já existe em sua própria jurisdição. Que aliado adequado, não é?
Um outro aliado regional começa a implantar uma cartela biométrica de racionamente, só diferente da cubana pela metodologia informática, mas tão restrita quanto a cubana, uma cartela vagabunda de papel. Isso não nos impede de manter as melhores relações com a ditadura já instalada, mesmo se ela não paga pelas suas importações e serviços feitos com financiamento brasileiro.
Claro, e apoiamos mais ainda uma das mais velhas ditaduras do planeta, só mais "jovem" do que um Gulag nas antípodas...
Estamos bem de relações e de amizades, ao que parece...
Paulo Roberto de Almeida
North Platte, 1/09/2014

Crossing the Empire: de Hartford a North Platte, via Des Moines e Omaha (síntese)


Tendo feito quatro postagens iniciais da viagem através dos Estados Unidos, sintetizo aqui, dando apenas os links respectivos, sem quaisquer fotos ou textos preparados para descrição das etapas, as postagens efetuadas até o momento.

2662. “Crossing the Empire: de Hartford a North Platte, via Des Moines e Omaha”, Hartford, Milesburg, Davenport e North Platte, de 28 agosto a 1 setembro 2014, 15 p. Primeiras quatro postagens da viagem, começando por 0, descrição do périplo, e cobrindo os primeiros três dias, antes de Denver. 
Postado no Diplomatizzando, nos seguintes links: 

Amanhã (ou melhor, hoje), começa uma nova etapa, a partir de Denver, onde paramos dois ou três dias (a ver).
Paulo Roberto de Almeida  
North Platte, 1/09/2014

Across the Empire (3): Des Moines, Omaha e o caminho dos pioneiros...

Prosseguindo a série:

Across the Empire (3): Des Moines e o caminho dos pioneiros...
            Como antecipado no sábado – mais exatamente, na madrugada deste domingo, que já passou -- Carmen Lícia e eu retomamos nosso caminho para Denver, no Colorado (ainda muito distante), visitando duas cidades no caminho da I-80W: Des Moines, basicamente o Des Moines Arts Center (www.desmoinesartscenter.org), a cidade mais importante do milharal que responde pelo nome de Iowa, e Omaha, no limite de Nebraska com Iowa, terra do Buffalo Bill (mas ele está em todas as partes, inclusive na cidade que escolhemos para pernoitar: North Platte).
            O Arts Center de Des Moines não é um simples museu, e sim um monumento arquitetural e artístico, em si e por si: muito functional, em todas as suas salas e espaços abertos, inclusive com um restaurante, que infelizmente estava fechado, quando chegamos justamente em torno das 12hs deste domingo, famintos e desejosos de comer outra coisa que sanduíches fast food. Não preciso descrever todas as maravilhas em termos de obras de arte, de todas as épocas mais importantes da arte ocidental (e alguns poucos exemplares de arte africana, e poucos japoneses e chineses na mostra, entre estes últimos Wei Wei, o artista dissidente). Uma consulta ao site pode revelar o que existe.
            Interessei-me pela mostra permanente logo na entrada: pinturas e texto de Henri Matisse para um “pochoir en papier”, um livro ilustrado, feito inteiramente pelo artista francês, em 1947, e tirado unicamente em 100 exemplares. Fotografei a placa VIII, um Ícaro figurativo, e retirei do catálogo a ilustração da página completa; mas livro tem muitos outros exemplos ilustrações retiradas da mitologia grega e de histórias da literatura universal.
           


            Passando a outras salas, comecei a contemplar a arquitetura do centro de artes, dois edifícios que se complementam, com muitas aberturas, diversos níveis e espaços amplos para as obras de arte contemporânea, que apreciei menos. Mas um pátio interno, com espelho d’água, revelou uma lindíssima escultura do artista sueco Carl Milles, ativo nos Estados Unidos (morto em 1955), representando o cavalo Pégaso e um cavaleiro sobre ele, chamada simplesmente Pegasus and the Man. Segundo informação do catálogo do centro, existem outras cinco esculturas iguais, espalhadas pelo mundo, numa cidade da Suécia, em Dallas, no museu aberto de esculturas de Middleheim, em Antuérpia (justamente onde morei, e conheço bem esse parque), e em Jakarta, na Indonésia.

            Também figura no centro de Des Moines o famoso painel de Andy Warhol com um retrato de Mao Tsé-tung em diversas colorações, para mim apenas um ícone a mais da coleção kitsch desse artista americana que era mais competente em chocar os incautos (épater le bourgeois, alguns diriam) do que propriamente em pintar.

            De Des Moines retomamos a I-80 em direção a Denver, mas paramos em Omaha, a primeira cidade do Nebraska, onde já tínhamos estado no ano passado, numa incursão não prevista (pois tivemos de desviarmos, a partir de Kansas City, de Denver, tomada por chuvas torrenciais que devastaram várias estradas no Colorado). Fomos direto ao Joslyn Art Musem, chegando justa a tempo de visitar o que eu mais queria ver: os cadernos de viagem de Maximilien de Wied, com as ilustrações feitas pelo suíço Karl Bodmer. 

O museu é um enorme edifício moderno, grandioso, com uma bela escultura em bronze de um guerreiro indígena em seu cavalo, no jardim da frente: minha foto talvez não dê uma ideia da monumentalidade da escultura, aliás, maior do que o Pégaso de Carl Milles.

            Na própria exposição, que tivemos de visitar muito rapidamente (pois o museu fechava às 4hs da tarde, em lugar das 5hs habituais, o que já acho um absurdo), tirei algumas fotos, Carmen Lícia outras, e reproduzo aqui as mais bonitas.




            No total da viagem, fizemos 577 milhas, incluindo as duas paradas (Des Moines e Omaha), um pouco menos das 600 milhas previstas inicialmente, mas já estamos avançados no planejamento inicial, pois faltam apenas 240 milhas para fazer até Denver, quando segundo meu caderno de viagem eu tinha reservado 474 para completar o trajeto até o Colorado, na segunda-feira, 1 de Setembro (isto é, hoje). Além das duas paradas culturais (que poderiam facilmente ter sido estendidas se o primeiro museu tivesse comida, e o segundo não fechasse às 4hs), enfrentamos várias tempestades no caminho, mais no Nebraska do que em Iowa, com direito até a pedras de gelo.
            Chegamos a North Platte, uma simpática cidadezinha do Oregon Trail, que cultiva, como tantas outras nesta região, Buffalo Bill. Bem em frente do nosso hotel existe um Fort Cody, um simples trade post na origem, que serviu de ponto de apoio aos novos colonizadores do oeste americano. Amanhã, ou melhor, nesta segunda, pela manhã, antes de deixar a cidade, vamos visitar o museu que existe dentro do forte de madeira, uma réplica exata do original, construído pouco depois da guerra civil. Tem outras coisas por aqui, mas a mania mesmo é Buffalo Bill: Buffalo Bill Ranch State Historical Park, além do Lincoln County Historical Museum, na Buffalo Bill Avenue, claro…
            Reproduzo novamente o mapa do Google que havia postado ao final da postagem do sábado, reproduzindo o nosso caminho. North Plate está quase no final do Nebraska, e daqui sairemos da I-80W para tomar a I-97S, em direção a Denver.
Uma pequena jornada nesta segunda, de menos de 250 milhas, o que é quase uma corrida de taxi para nós, sem querer ofender os taxistas, claro...

Encerro esta postagem, e retomarei em Denver, uma primeira parada mais longa neste périplo cultural de 8 mil milhas.
            Até lá,
Paulo Roberto de Almeida
North Platte, Nebraska, 31/08 – 1/09/2014