Notícias do dia 23/08/2016:
WASHINGTON/CARACAS - O secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, disse nesta segunda-feira que a ratificação da condenação contra o opositor venezuelano Leopoldo López foi o "marco" do final da democracia e do Estado de Direito nesse país.
"Nenhum foro regional, ou sub-regional, pode desconhecer a realidade de que, hoje, na Venezuela, não há democracia nem Estado de Direito", escreveu Almagro em uma carta aberta a López, a quem chamou de "amigo". "A princípio, não sabia que você era um preso político. Quando vi a sentença, assimilei palavra após palavra a dimensão do horror político que vive seu país."
Um recurso do líder opositor contra uma sentença de 14 anos de prisão por seu papel nos protestos antigoverno dois anos atrás foi rejeitado na semana passada por um tribunal venezuelano. López estava na vanguarda das manifestações exigindo a renúncia do presidente Nicolás Maduro. Quarenta e três pessoas morreram durante os protestos.
Almagro fala ainda na carta que a ratificação da condenação é "um marco do final da democracia".
Os críticos dizem que seu julgamento foi uma farsa e que López, a quem Maduro chama de criminoso perigoso, foi preso para sufocar a dissidência. Um promotor fugiu do país dizendo que foi pressionado a incrimá-lo. A acusação afirmou que López enviou mensagens subliminares para incitar a violência.
A condenação em 2015 estragou uma breve reaproximação entre Caracas e Washington, meses após os dois lados terem começado discussões para acabar com mais de uma década de discórdia. López se tornou célebre entre os opositores do governo do presidente Nicolás Maduro, que o acusam de violar direitos humanos. O governo dos EUA, as Nações Unidas e grupos de direitos internacionais pediram a libertação do opositor. A Anistia Internacional criticou a decisão da corte, dizendo que López é vítima de "uma caça às bruxas".
Para Almagro, os venezuelanos "são vítima da intimidação", "símbolo de uma gestão ineficaz". Ele ainda apelou pela liberação imediata a um referendo revocatório sobre o mandato de Maduro.
Almagro e Maduro já tiveram algumas discussões acaloradas através de discursos e cartas. Enquanto o chefe da OEA (que foi chanceler do Uruguai sob o governo de José Mujica, presidente aliado de Maduro) chamou o venezuelano de "projeto de ditador", o mandatário o classificou como "lixo" e "escravo do imperialismo" em diferentes ocasiões.
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, determinou a saída, no prazo de 48 horas, de funcionários que ocupam cargos de liderança em cinco ministérios e que tenham assinado em favor do referendo revogatório contra o presidente, alavancado pela oposição.
O dirigente chavista Jorge Rodríguez afirmou nesta segunda (22) que há listas com "os nomes das pessoas (...) que, de forma pública, expressam sua proximidade com a direita venezuelana e que participaram do processo de autorização para a ativação do falido referendo revogatório".
"Há um prazo de 48 horas para que essas pessoas que estão nos chamados cargos de confiança, cargos de liderança, tenham outro destino profissional", disse em coletiva de imprensa.
Apoiadores da oposição ao presidente Nicolás Maduro participam de marcha em maio, em Caracas
A lista dos nomes foi entregue aos ministérios da Alimentação, Indústrias Básicas, Finanças, Trabalho e o gabinete da Presidência, "para estabelecer de forma categórica que não podem ter cargos de liderança (...) pessoas que estão contra a revolução e o presidente Nicolás Maduro", disse Rodríguez.
Agora a oposição se prepara para uma marcha a Caracas, em 1º de setembro, para exigir que o Conselho Nacional Eleitoral estabeleça uma data adequada para o recolhimento de quatro milhões de assinaturas necessárias para a próxima etapa de chamamento do referendo.
A oposição cobra um processo acelerado para o referendo, com conclusão antes de 10 de janeiro, o que permitiria a convocação de novas eleições no caso da perda de Maduro. Após esse prazo, assumiria o atual vice-presidente.
Na semana passada, Maduro prometeu que, em caso de golpe contra seu governo, o país reagiria de maneira mais dura que a Turquia, que sofreu uma tentativa frustrada de golpe em 15 de julho.
"Vocês viram o que aconteceu na Turquia? Erdogan vai parecer um bebê de colo comparado com o que a Revolução Bolivariana fará caso a direita ultrapasse a linha com um golpe", disse Maduro na sexta-feira (19), em pronunciamento na TV.
Lilian Tintori, casada com Leopoldo López, líder antichavista preso em Caracas, diz que marido sofre maus-tratos e tortura psicológica
A opositora venezuelana Lilian Tintori, mulher do líder do partido Voluntad Popular, Leopoldo López, disse ontem que ele foi ameaçado de morte por um dos guardas que o mantêm sob custódia no presídio militar de Ramo Verde, nos arredores de Caracas. Frequentemente Lilian denuncia maus-tratos contra o marido que, segundo ela, também sofre tortura psicológica e é submetido a humilhações pelos carcereiros. “Levaram Leopoldo ao limite. Eles o ameaçaram de morte. Um sargento disse ‘temos de matá- lo’”, declarou Lilian em entrevista à rádio RCR, crítica do chavismo. Segundo ela, o militar que ameaçou Leopoldo, identificado como “Corredor”, pertence à Diretoria de Contrainteligência Militar do Exército. Ainda conforme o relato da opositora, López questionou o militar sobre a ameaça e o sargento teria respondido que ele só cumpria ordens.
Lilian cobrou explicações da cúpula militar, leal ao chavismo, sobre as ameaças. “Por isso temos denunciado que a vida dele está em risco. Quem o ameaça é o carcereiro que o maltrata e o humilha e aponta uma arma em seu peito”, disse Lilian. “Nós, como família, temos de denunciar isso. É urgente que a cúpula militar responda por isso.” Ainda de acordo com a opositora, desde que López se reuniu com o ex-primeiro-ministro espanhol José Luis Rodríguez Zapatero, as condições dele na prisão pioraram bastante. “Todos os dias tiram algo dele e o tratam de maneira ainda pior”, disse. Ela disse que López está isolado e não pode falar com os filhos. As únicas pessoas com acesso a ele são quatro guardas que o monitoram por vídeo o tempo todo.
“A falta de autonomia nos poderes públicos chegou a tal ponto que não se pode interromper esse tipo de ordem (vinda do governo)”, acrescentou Lilian. Ainda ontem, a coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD)voltou a pressionar o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) para acelerar o processo do referendo revogatório do mandato do presidente Nicolás Maduro. Segundo a MUD, o prazo para a formalização da data da nova etapa do coleta de assinaturas acabou no dia 19. O CNE informou que isso ocorreria no fim de outubro, mas sem estipular os dias específicos.
No entendimento do CNE, no entanto, essa definição pode demorar mais duas semanas. “O CNE mais uma vez deixou de cumprir a regulamentação, o que representa um obstáculo para o exercício de participação popular na convocação do referendo”, afirmou a MUD em comunicado. Para que o referendo seja seguido de novas eleições, ele precisa ocorrer ainda este ano, algo que, pelo cronograma do CNE, é improvável. /
Por Andres Schipani |, de Bogotá
Mesmo sem dinheiro e um emprego estável desde que chegou à Colômbia, no começo de julho, Eduardo já recuperou a maior parte do peso que havia perdido em casa, na Venezuela.O engenheiro de sistemas de 44 anos ganhava US$ 18 por mês em sua cidade natal de Barquisimeto, mas isso não era suficiente para ele e o filho se alimentarem, dada a inflação galopante e da falta crônica de alimentos e medicamentos.
Eduardo, que não revela seu verdadeiro nome por ser um imigrante ilegal, diz que trabalha "aqui e ali e um amigo me ajuda" em Bogotá. "Pelo menos consigo encontrar comida aqui. Na Venezuela falta tudo para comer."
Não há muito tempo, a Colômbia experimentou o próprio êxodo. Mas isso foi revertido com a aproximação de um possível acordo de paz com as guerrilhas da Farc, e com a Venezuela mergulhando cada vez mais fundo na desesperança, sob seu impopular presidente Nicolás Maduro.
"Hoje em dia, a maioria das famílias [na Venezuela] espera que um membro vá embora para algum lugar, para depois lhes mandar dinheiro", diz Eduardo.
Sua experiência é parecida com a do contador venezuelano que chegou à Colômbia no último fim de semana e está determinado a ficar, "mesmo que eu tenha de ficar parado em uma esquina o dia inteiro vendendo arepas [iguaria venezuelana à base de milho]".
Um funcionário de alto escalão da imigração colombiana confirma essa tendência: "O número de venezuelanos que estão atravessando a fronteira, legal ou ilegalmente, vem crescendo muito".
Nos últimos dois meses, em cenas que lembram a queda do Muro de Berlim, quase 300 mil venezuelanos atravessaram reaberta fronteira para comprar comida e remédio. Muitos ficaram. Espanha e Panamá também vêm registrando a entrada de venezuelanos, principalmente ricos e de classe média.Quando Hugo Chávez assumiu o governo em 1999, os venezuelanos começaram a partir - primeiro, os trabalhadores do setor de petróleo que perderam o emprego, depois empresários fugindo dos controles cambiais; em seguida, estudantes em busca de melhores oportunidades. Pessoas de todas as camadas da sociedade estão cada vez mais desesperadas para deixar o país, no que observadores vêm descrevendo como uma crise humanitária em formação.
Os que saem, deixam para trás a escassez crônica, a criminalidade em alta acelerada, a inflação desenfreada e a redução das liberdades democráticas. Um venezuelano teria morrido ao tentar chegar à ilha caribenha de Aruba em uma jangada improvisada.
"No pior cenário, uma guerra civil vai explodir e pessoas tentarão deixar o país em botes em grandes números", diz Glenn Sulvaran, membro do parlamento da ilha próxima de Curaçao. "Elas tentarão chegar ao porto seguro econômico mais próximo."
A Venezuela está quase no topo da lista dos pedidos de asilo feitos aos Estados Unidos, ficando atrás apenas da China e do México, segundo o Pew Research Center, sendo que o número de pedidos cresceu 168% desde o ano passado.
A Guiana, um dos países mais pobres da América Latina, está deportando venezuelanos que buscam comida. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados disse que o número de venezuelanos em busca do status de refugiado aumentou de 127 em 2000 para 10.300 no ano passado.
Com a atenção voltada para os migrantes da África, Oriente Médio e América Central, Daniel Pagés, da Associação dos Venezuelanos na Colômbia, diz que o problema de seus compatriotas deveria ser visto como "parte dessa onda".
Tomás Páez Bravo, um professor de sociologia da Universidade Central da Venezuela, diz que cerca de 1,8 milhão de pessoas abandonaram o país nos últimos 17 anos. "A segurança jurídica e pessoal, juntamente com a situação econômica, historicamente sempre foram motivadores para os que saem do país", afirma. "Como esses dois fatores pioraram dramaticamente, uma onda enorme de pessoas está deixando o país."
A queda dos preços do petróleo alimenta a pior crise política, social e econômica de que se tem notícia. "Estou muito preocupado com a situação atual, em que não se encontra artigos básicos e serviços como alimentos, água, itens de cuidados com a saúde e roupas", disse recentemente o secretário-geral da ONU Ban Ki-moon. "Isso desencadeou uma crise humanitária na Venezuela, que foi criada pela instabilidade política."