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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

sexta-feira, 30 de abril de 2021

Censo do IBGE: onde conseguir o dinheiro para realizá-lo? - Paulo Rabello de Castro, Ricardo Bergamini

 O Brasil é um asilo de lunáticos onde os pacientes assumiram o controle (Paulo Francis).

 

Parabéns ao amigo Paulo Rabello de Castro pela lucidez.

 

O custo do Censo seria de R$ 3,4 bilhões, correspondente a 3,00% dos gastos com 1,2 milhões de vagabundos (assessores parlamentares, não concursados), conforme abaixo: 

 

Existem em torno de 1,2 milhões de assessores parlamentares (fontes primárias de peculato) que poderiam ser dispensados sem restrições constitucionais. 

 

São amigos, parentes e aliados dos políticos, não são concursados, não têm direitos adquiridos, não têm estabilidade de emprego, não é garantido pelas cláusulas pétreas da Constituição, além de representarem um contingente correspondente a três vezes o efetivo ativo das FFAA.   

 

Extinção imediata desses parasitas, que considerando um salário médio de R$ 8.000,00 mensais, daria uma economia permanente em torno de R$ 113,3 bilhões ao ano. 


Ricardo Bergamini

 

 

Censo pode ser um auxílio emergencial para a economia, diz Rabello de Castro

 

ROSANA HESSEL

Correio Braziliense, 29/04/2021

 

A decisão do decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Marco Aurélio Mello, acatando o pedido feito pelo estado do Maranhão para obrigar o governo a fazer o Censo neste ano foi elogiada pelo economista e consultor e ex-presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Paulo Rabello de Castro. Segundo ele, o Censo, além de necessário para o mapeamento da sociedade brasileira, poderá ter um efeito positivo para a economia e ser uma espécie de auxílio emergencial, embora que temporariamente, para os jovens que estão desempregados.

 

“O Censo virou um auxílio emergencial e poderia entrar na conta desse benefício, porque vai sair praticamente de graça”, afirmou Rabello de Castro, em entrevista ao Blog. Ele lembrou que, em geral, os recenseadores são jovens sem renda prévia e que poderiam se enquadrar em uma categoria especial do auxílio, mas com uma remuneração ao trabalharem temporariamente para o IBGE. “O Censo começa com uma atividade social relevante, porque poderão empregar mais de 200 mil jovens recenseadores. Ainda que o governo jogasse os dados fora, o Censo é positivo pela movimentação de riqueza que terá como atividade produtiva”, complementou.

 

No ano passado, o Censo não foi realizado por conta da pandemia da covid-19 e, neste ano, foi cancelado durante a aprovação do Orçamento. A pesquisa é realizada a cada 10 anos para fazer um raio X da sociedade brasileira e é importante para os governos federal e regionais, pois ajuda na elaboração de políticas públicas. Sem o Censo, especialistas alertam para vários “apagões estatísticos” do país, que pode ter efeitos negativos no mapeamento dessas políticas. Além disso, o cancelamento do Censo suspenderá a contratação de 206 profissionais que trabalhariam na coleta de dados para o levantamento em todo o país.

 

“A decisão foi do ministro Marco Aurélio foi correta, porque recompõe a necessidade da realização do Censo”, afirmou Rabello de Castro, acrescentando que, como estamos no mês de abril, ainda dá tempo de o IBGE se organizar para contratação dos profissionais e treinamento para que o Censo seja realizado no segundo semestre.

 

De acordo com o economista, o IBGE poderá ampliar a pesquisa, acrescentando no questionário do Censo duas ou três perguntas para averiguação da sociedade inteira durante a pandemia. “Hoje, só dispomos desses dados via veículos de imprensa. Ou seja, o Censo poderá ser quase um três em um, com várias utilidades”, complementou.

 

“Custo módico” 

 

O recurso que era exigido para a realização do Censo, de R$ 3,4 bilhões, ainda é pouco pelo grande retorno que o Censo dará não apenas à sociedade, mas também para os governos na hora de preparar políticas públicas. “Os Estados Unidos gastaram US$ 15 bilhões, cerca de R$ 80 bilhões. Logo, o Censo brasileiro é muito barato, porque o custo do recenseador é módico”, comparou.

 

“Esse dinheiro é troco. Qualquer lagosta a menos que se compre pagará o Censo”, afirmou, em referência a um dos itens mais comprados nos banquetes do Judiciário, que paga os maiores salários do funcionalismo, muitas vezes, acima do teto constitucional, de R$ 33,7 mil, por conta dos penduricalhos e jetons.  Ele lembrou que os gastos com o Censo também poderiam ser facilmente acomodados nos gastos com a Saúde que foi repassada para os estados e municípios, pois ajudaria o Ministério da Saúde a fazer um controle maior sobre os repasses. “Agora, em época da CPI da Pandemia, todos os questionamentos que serão feitos não seriam necessários”, pontuou.

 

Vale lembrar que apenas no auxílio emergencial, conforme os dados do Tribunal de Contas da União (TCU) houve quase R$ 55 bilhões de desvio de dinheiro público em fraudes, ou seja, mais do que os R$ 44 bilhões previstos para os quatro meses da nova rodada do benefício.

 

Na avaliação de Rabello de Castro, encontrar R$ 2 bilhões para o Censo no Orçamento não é difícil. Além disso, não fazer o Censo poderá custar mais caro ao país, porque não será possível atualizar o mapeamento da população brasileira nos estados brasileiros de forma mais concreta e isso prejudica, inclusive, a composição das cadeiras dos deputados no Congresso. “Do ponto de vista financeiro, o dinheiro para o Censo é troco e pode aparecer em um Orçamento de R$ 1,5 trilhão facilmente. E tem a questão legal. Está na lei e, portanto, o governo tem que fazer”, pontuou.

 

O ex-presidente do IBGE ainda criticou os argumentos do ministro da Economia, Paulo Guedes, que afirmou que o governo acatou o argumento do Congresso para o corte dos recursos do Censo, uma vez que a visita dos recenseadores às casas das famílias “poderia espalhar a covid-19”.

 

“O Censo não se trata de aglomeração. Tenho certeza de que 10 entre 10 infectologistas vão considerar esse argumento (do ministro Paulo Guedes) pura desculpa sem base científica. Imagine uma casa de repouso. Qual a diferença desse recenseador e do entregador de verdura, de uma enfermeira que está indo e vindo para casa e de um sujeito que for consertar o telhado?”, argumentou. O ex-presidente do IBGE destacou que os profissionais serão treinados para tomarem todas as medidas necessárias para a prevenção social, além do uso da máscara e do álcool em gel, para realizarem a pesquisa. O ministro Paulo Guedes se tornou um ser ridículo e tem que ir para a China”,  completou.

Coleção Novos Estudos de História Econômica do Brasil, "História de Empresas no Brasil" - Alcides Goularti Filho e Alexandre Macchione Saes (orgs.)

Recebido da Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica e de Empresas: 

Informamos que já encontra-se disponível o volume 3 da Coleção Novos Estudos de História Econômica do Brasil, "História de Empresas no Brasil", organizado pelos colegas Alcides Goularti Filho e Alexandre Macchione Saes. 


Aproveitamos também a oportunidade para informar que nos próximos dias os três volumes da coleção estão à venda com desconto no combo da Hucitec, disponível no link: 





quinta-feira, 29 de abril de 2021

A paranoia anti-China alcança um dos melhores jornalistas americanos: Thomas Friedman (NYT)

 Normal entre os generais do Pentágono, a obsessão por um conflito direto entre os EUA e a China contaminou os acadêmicos e agora atinge também um dos melhores jornalistas americanos: Tom Friedman. Abastecido por informações dos próprios militares, ele entrou na onda da paranoia que pretende que a China pretende alcançar hegemonia mundial — um objetivo que é exatamente o dos EUA, que já o exerce de maneira arrogante — pela via militar.

Paulo Roberto de Almeida

The New York Times – 28/04/2021

Is There a War Coming Between China and the U.S.?

Thomas L. Friedman

 

If you’re looking for a compelling beach read this summer, I recommend the novel “2034,” by James Stavridis, a retired admiral, and Elliot Ackerman, a former Marine and intelligence officer. The book is about how China and America go to war in 2034beginning with a naval battle near Taiwan and with China acting in a tacit alliance with Iran and Russia.

I’m not giving it all away to say China and the U.S. end up in a nuclear shootout and incinerate a few of each other’s cities, and the result is that neutral India becomes the dominant world power. (Hey, it’s a novel!)

What made the book unnerving, though, was that when I’d put it down and pick up the day’s newspaper I’d read much of what it was predicting for 13 years from now:

Iran and China just signed a 25-year cooperation agreement. Vladimir Putin just massed troops on the border of Ukraine while warning the U.S. that anyone who threatens Russia “will regret their deeds more than they have regretted anything in a long time.” As fleets of Chinese fighter jets, armed with electronic warfare technology, now regularly buzz Taiwan, China’s top foreign affairs policymaker just declared that the U.S. “does not have the qualification … to speak to China from a position of strength.”

Yikes, that’s life imitating art a little too closely for comfort. Why now?

The answer can be found, in part, in a book I have written about before: Michael Mandelbaum’s “The Rise and Fall of Peace on Earth.” It tracks how we went from a world defined by the Cold War between American democracy and Soviet communism — 1945 to 1989 — to a singularly peaceful quarter century without big power conflict, buttressed by spreading democracy and global economic interdependence — 1989 to about 2015 — to our current, much more dangerous era in which China, Iran and Russia are each deflecting the pressures of democracy and the need to deliver constant economic growth by offering their people aggressive hypernationalism instead.

What has made this return of Chinese, Iranian and Russian aggressive nationalism even more dangerous is that, in each country, it is married to state-led industries — particularly military industries — and it’s emerging at a time when America’s democracy is weakening.

Our debilitating political and cultural civil war, inflamed by social networks, is hobbling Americans’ ability to act in unison and for Washington to be a global stabilizer and institution builder, as the United States was after World War II.

Our foolish decision to expand NATO into Russia’s face — after the fall of the Soviet Union — hardened post-Communist Russia into an enemy instead of a potential partner, creating the ideal conditions for an anti-Western autocrat like Putin to emerge. (Imagine if Russia, a country with which we have zero trade or border disputes, were OUR ally today vis-à-vis China and Iran and not THEIR ally in disputes with us.)

Meanwhile, the failure of the U.S. interventions in Afghanistan and Iraq to produce the pluralism and decency hoped for after 9/11, coupled with the 2008 economic crisis and the current pandemic — together with the general hollowing out of America’s manufacturing base — has weakened both American self-confidence and the world’s confidence in America.

The result? Right when China, Russia and Iran are challenging the post-World War II order more aggressively than ever, many wonder whether the United States has the energy, allies and resources for a new geopolitical brawl.

 “Just because communism is gone — and we don’t have two political and economic systems that claim universal legitimacy competing to govern every country — doesn’t mean that ideological considerations have disappeared from international politics,” Mandelbaum argued to me.

Regimes like those in China, Iran and Russia feel much more threatened — more than we think — by democracy, Mandelbaum added. During the first decade of the 21st century, these regimes were able to generate sufficient public support through economic progress. But after that proved more difficult in the second decade of the 21st century, “the leaders of these countries need to find a substitute, and the one they have chosen is hypernationalism.”

Are we up to the challenge? I’m pretty sure we can keep a more aggressive, nationalistic Russia and Iran deterred at a reasonable cost, and with the help of our traditional allies.

But China is another question. So we’d better understand where our strengths and weaknesses lie, as well as China’s.

China is now a true peer competitor in the military, technological and economic realms, except — except in one critical field: designing and manufacturing the most advanced microprocessors and logic and memory chips that are the base layer for artificial intelligence, machine learning, high-performance computing, electric vehicles, telecommunications — i.e., the whole digital economy that we’re moving into.

China’s massive, state-led effort to develop its own vertically integrated microchip industry has so far largely failed to master the physics and hardware to manipulate matter at the nano-scale, a skill required to mass produce super-sophisticated microprocessors.

However, just a few miles away from China sits the largest and most sophisticated contract chip maker in the world: Taiwan Semiconductor Manufacturing Company. According to the Congressional Research Service, TSMC is one of only three manufacturers in the world that fabricate the most advanced semiconductor chips — and by far the biggest. The second and third are Samsung and Intel.

Most chip designers, like IBM, Qualcomm, Nvidia, AMD (and even Intel to some extent) now use TSMC and Samsung to make the microprocessors they design.

But, just as important, three of the five companies that make the super-sophisticated lithography machines, tools and software used by TSMC and others to actually make the microchips — Applied Materials, Lam Research Corporation and KLA Corporation — are based in the United States. (The other two are Dutch and Japanese.) China largely lacks this expertise.

As such, the American government has the leverage to restrict TSMC from making advanced chips for Chinese companies. Indeed, just two weeks ago, the U.S. made TSMC suspend new orders from seven Chinese supercomputing centers suspected of assisting in the country’s weapons development.

The South China Morning Post quoted Francis Lau, a University of Hong Kong computer scientist, as saying: “The sanctions would definitely affect China’s ability to keep to its leading position in supercomputing,” because all of its current supercomputers mostly use processors from Intel or designed by AMD and IBM and manufactured by TSMC. Although there are Korean and Japanese alternatives, Lau added, they are not as powerful.

China, though, is doubling down on research in the physics, nanotechnology and material sciences that will drive the next generation of chips and chip-making equipment. But it could take China a decade or more to reach the cutting edge.

That’s why — today — as much as China wants Taiwan for reasons of ideology, it wants TSMC in the pocket of Chinese military industries for reasons of strategy. And as much as U.S. strategists are committed to preserving Taiwan’s democracy, they are even more committed to ensuring that TSMC doesn’t fall into China’s hands for reasons of strategy. (TSMC is now building a new semiconductor factory in Phoenix.) Because, in a digitizing world, he who controls the best chip maker will control … a lot.

Just read “2034.” In the novel, China gains the technological edge with superior A.I.-driven cybercloaking, satellite spoofing and stealth materials. It’s then able to launch a successful surprise attack on the U.S. Pacific Fleet.

And the first thing China does is seize Taiwan.

Let’s make sure that stays the stuff of fiction.

 


FOMC: como trabalha o “Copom” americano - Federal Reserve Board, Boston Globe

 Federal Reserve Board, Washington DC – 28.4.2021

Federal Reserve issues FOMC statement

 

The Federal Reserve is committed to using its full range of tools to support the U.S. economy in this challenging time, thereby promoting its maximum employment and price stability goals.

The COVID-19 pandemic is causing tremendous human and economic hardship across the United States and around the world. Amid progress on vaccinations and strong policy support, indicators of economic activity and employment have strengthened. The sectors most adversely affected by the pandemic remain weak but have shown improvement. Inflation has risen, largely reflecting transitory factors. Overall financial conditions remain accommodative, in part reflecting policy measures to support the economy and the flow of credit to U.S. households and businesses.

The path of the economy will depend significantly on the course of the virus, including progress on vaccinations. The ongoing public health crisis continues to weigh on the economy, and risks to the economic outlook remain.

The Committee seeks to achieve maximum employment and inflation at the rate of 2 percent over the longer run. With inflation running persistently below this longer-run goal, the Committee will aim to achieve inflation moderately above 2 percent for some time so that inflation averages 2 percent over time and longer‑term inflation expectations remain well anchored at 2 percent. The Committee expects to maintain an accommodative stance of monetary policy until these outcomes are achieved. The Committee decided to keep the target range for the federal funds rate at 0 to 1/4 percent and expects it will be appropriate to maintain this target range until labor market conditions have reached levels consistent with the Committee's assessments of maximum employment and inflation has risen to 2 percent and is on track to moderately exceed 2 percent for some timeIn addition, the Federal Reserve will continue to increase its holdings of Treasury securities by at least $80 billion per month and of agency mortgage‑backed securities by at least $40 billion per month until substantial further progress has been made toward the Committee's maximum employment and price stability goals. These asset purchases help foster smooth market functioning and accommodative financial conditions, thereby supporting the flow of credit to households and businesses.

In assessing the appropriate stance of monetary policy, the Committee will continue to monitor the implications of incoming information for the economic outlook. The Committee would be prepared to adjust the stance of monetary policy as appropriate if risks emerge that could impede the attainment of the Committee's goals. The Committee's assessments will take into account a wide range of information, including readings on public health, labor market conditions, inflation pressures and inflation expectations, and financial and international developments.

Voting for the monetary policy action were Jerome H. Powell, Chair; John C. Williams, Vice Chair; Thomas I. Barkin; Raphael W. Bostic; Michelle W. Bowman; Lael Brainard; Richard H. Clarida; Mary C. Daly; Charles L. Evans; Randal K. Quarles; and Christopher J. Waller.

 

*

 

Boston Globe,29.4.2021

Fed Upgrades View of Economy While Keeping Rates Near Zero

Craig Torres and  Catarina Saraiva

 

Federal Reserve officials strengthened their assessment of the economy on Wednesday and signaled that risks have diminished while leaving their key interest rate near zero and maintaining a $120 billion monthly pace of asset purchases.

“Amid progress on vaccinations and strong policy support, indicators of economic activity and employment have strengthened,” the Federal Open Market Committee said in a statement following the conclusion of its two-day policy meeting. “The sectors most adversely affected by the pandemic remain weak but have shown improvement. Inflation has risen, largely reflecting transitory factors.”

Marking a clear improvement since the pandemic took hold more than a year ago, the Fed said that “risks to the economic outlook remain,” softening previous language that referred to the virus posing “considerable risks.” The statement also noted that sectors hit hardest by the Covid-19 pandemic had “shown improvement.”

Ten-year treasury yields rose to its high of the day before paring back, while inflation expectations over the decade held near their highest since April 2013. The dollar moved toward its lows of the day and the S&P 500 moved higher.

Powell and his colleagues met amid growing optimism for the U.S. recovery, helped by widening vaccinations and aggressive monetary and fiscal support. President Joe Biden will unveil a sweeping $1.8 trillion plan to expand educational opportunities and child care when he addresses a joint session of Congress later on Wednesday, while highlighting his $2.25 trillion infrastructure proposal and the $1.9 trillion pandemic relief package he signed into law last month.

At the same time, a rise in coronavirus cases in some regions around the world casts a shadow over global growth prospects, giving policy makers reason to remain patient on withdrawing support. Fed officials have also been largely dismissive of inflation risks for the time being, saying a jump in consumer prices last month was distorted by a pandemic-related decline in prices in March 2020.

 

Wednesday’s FOMC decision was unanimous.

 

Fed Chair Jerome Powell told a post-meeting press conference that the recovery has been faster than expected but “it remains uneven and far from complete” and the economy “is a long way from our goals.”

U.S. central bankers repeated they would not change the pace of bond buying until “substantial further progress” is made on their employment and inflation goals. The target range of the benchmark federal funds rate was kept at zero to 0.25%, where it’s been since March 2020.

Powell said that it was not yet time to discuss scaling back asset purchases and “it will take some time before we see substantial further progress.”

Economic Growth

Forecasters surveyed by Bloomberg expect the U.S. economy this year to expand at the fastest pace in more than three decades, with the Fed expected to announce in late 2021 that it will start slowing the pace of asset purchases.

U.S. central bankers have backed expansive fiscal policy, noting that millions of Americans are still unemployed and run the risk of remaining jobless for the long-term if they don’t find work soon.

Since their March meeting, officials have seen the S&P 500 stock index continue to rally while yields on the government 10-year note, after a sharp move up in the first quarter, have traded in a range around 1.6%. The labor market in March added the most jobs in seven months as improvements across regions around the world casts a shadow over global growth prospects, giving policy makers reason to remain patient on withdrawing support. Fed officials have also been largely dismissive of inflation risks for the time being, saying a jump in consumer prices last month was distorted by a pandemic-related decline in prices in March 2020.

Wednesday’s FOMC decision was unanimous.

Fed Chair Jerome Powell told a post-meeting press conference that the recovery has been faster than expected but “it remains uneven and far from complete” and the economy “is a long way from our goals.”

U.S. central bankers repeated they would not change the pace of bond buying until “substantial further progress” is made on their employment and inflation goals. The target range of the benchmark federal funds rate was kept at zero to 0.25%, where it’s been since March 2020.

Powell said that it was not yet time to discuss scaling back asset purchases and “it will take some time before we see substantial further progress.”

Economic Growth

Forecasters surveyed by Bloomberg expect the U.S. economy this year to expand at the fastest pace in more than three decades, with the Fed expected to announce in late 2021 that it will start slowing the pace of asset purchases.

U.S. central bankers have backed expansive fiscal policy, noting that millions of Americans are still unemployed and run the risk of remaining jobless for the long-term if they don’t find work soon.

Since their March meeting, officials have seen the S&P 500 stock index continue to rally while yields on the government 10-year note, after a sharp move up in the first quarter, have traded in a range around 1.6%. The labor market in March added the most jobs in seven months as improvements across most industries boosted nonfarm payrolls by 916,000.

Officials have also said policy changes will be based on outcomes, not a forecast, meaning a string of powerful monthly labor market gains would be needed to merit “substantial further progress.” (Bloomberg)

 

*

Pandemias e a economia mundial - Norman Gall (Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial)

 

Caros amigos,
 
Em março de 2020, no começo da pandemia do Covid-19, estava preso em casa pela quarentena, pensando o que fazer com todo esse tempo disponível. Resolvi começar uma abordagem sintética do desenvolvimento da pandemia de forma acessível para os membros de nosso Instituto e para o nosso público. A pandemia está indo muito além do previsto. Sigo acompanhando os acontecimentos diariamente, com suas muitas novidades, para produzir uma abordagem atual e abrangente. Por isso, dividimos esse ensaio em várias partes, a ser publicadas quinzenalmente na internet.

Aguardamos seus comentários e sugestões.

Norman Gall

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O Brasil ameaçado: Bolsonaro tem roteiro definido para uma ruptura institucional - Marcos Rolim, Monika Dowbor, Ana Severo (El País)

 O Brasil ameaçado

Bolsonaro tem roteiro definido para uma ruptura institucional. É preciso saber se as instituições e a sociedade civil irão se mobilizar e mostrar seu desacordo com as políticas do Governo Federal.

Marcos Rolim|Monika Dowbor|Ana Severo

Há períodos na história onde pedaços inteiros de futuro desaparecem. Cada pessoa é ela e suas possibilidades, assim como cada nação, povo e instituição. Em situações extremas, como as guerras por exemplo, a morte precoce de milhares ou mesmo de milhões de pessoas é um resultado possível, assim como a destruição de nações, instituições e povos. Esses resultados eliminam possibilidades históricas, abatem do futuro infinitas trajetórias humanas, assentando a dor e o desespero nos vazios que se multiplicam.
Por conta do sofrimento pressuposto, as guerras são um mal a ser evitado. Em nossa época, desde o fim da II GuerraMundial, os confrontos militares foram substancialmente reduzidos, inaugurando-se o período cunhado por John Lewis Gaddis como “a Grande Paz”. Isso se fez, basicamente, pela construção e pelo fortalecimento das democracias liberais e pelo processo de globalização que afirmou um mercado mundial e meios internacionais de regulação e dissuasão de conflitos. Ditaduras foram, historicamente, muito mais inclinadas à guerra porque elas se fundam em um discurso proponente da violência. Toda ditadura, de direita ou de esquerda, precisa de um inimigo para mobilizar sua base e legitimar as barbaridades que irá cometer. Por isso, a gramática dos ditadores e daqueles vocacionados à ditadura sempre exalta a violência.
As estimativas históricas compiladas por Steven Pinker mostram que as guerras mataram um número de combatentes no século XX que equivale a 0,7% da população mundial. Se acrescentarmos às baixas militares todos os demais mortos pela fome e pelas doenças causadas pelas guerras, mais as vítimas do Genocídio Armênio, do Holocausto, do massacre de Ruanda, chegaremos a 3% do total das mortes ao longo do século XX. Esses números servem para destacar a gravidade da pandemia em curso, vez que a taxa de mortalidade entre os casos confirmados de covid-19 no Brasil é de 2,6%, uma das mais altas no mundo. A referência a uma realidade de guerra para descrever a atual crise sanitária no Brasil não é, então, apenas uma figura de linguagem. A morte carrega também as marcas das desigualdades históricas no Brasil. Pesquisas mostram que os negros morrem mais que os brancos: são 250 óbitos pela doença a cada 100.000 habitantes. Entre os brancos, são 157 mortes a cada 100.000.
A covid-19 no Brasil, como a guerra, também fragiliza a sociedade nos bastidores, ao agravar as condições sociais, econômicas e psíquicas decorrentes da ausência de políticas públicas adequadas para a contenção da doença. Entre elas estão as mulheres, sobrecarregadas pelas tarefas de cuidado que se multiplicam nos tempos da pandemia, mas não cuidadas pelo Poder Público. As mulheres pobres, negras e moradoras de periferias são ainda mais fortemente afetadas pela pandemia, o que reforça as desigualdades pré-existentes.
Estamos nos aproximando rapidamente da marca de 400.000 mortos sem que o país disponha de uma política unificada de enfrentamento à pandemia. Ao invés de um discurso, uma orientação e uma só agenda de saúde pública, temos uma estratégia de necropolítica no nível federal e, nas demais esferas de governo, uma miríade de iniciativas desencontradas. A ausência de uma coordenação nacional ampliou os espaços para narrativas que divergem em aspectos centrais sobre praticamente todos os temas, desde a prevenção, o uso de máscaras, o distanciamento social, a importância da proteção social, as abordagens terapêuticas e a vacinação. O que sempre foi domínio da Ciência, temas que em qualquer democracia no mundo foram abordados com o criterioso amparo de evidências de estudos clínicos e revisões sistemáticas passaram a ser tratadas por conspiradores com milhares de seguidores no YouTube e por relatos anônimos de testemunhas e sábios de botequim. O processo, como se sabe, não teve geração espontânea. Ele se formou com a sistemática produção de conteúdos manipulatórios dirigidos aos potencialmente influenciáveis por mensagens preconceituosas que estimulam o ódio a adversários políticos e a instituições.
Há vários elementos totalmente novos nesse processo, mas destacamos dois deles: a) o enfraquecimento radical da esfera pública, como ambiente solar onde todos os argumentos podem ser expostos e contraditados sob a vista dos interessados; o que se deu pelo deslocamento do discurso político ao mundo sublunar dos espaços privados, onde os aficionados compartilham mensagens produzidas com incrível eficácia e b) a possibilidade de customização de mensagens para os indivíduos a partir da descoberta daquilo que Shoshana Zuboff chamou de “superávit comportamental”, vale dizer a infinidade de dados a respeito dos hábitos, ações, preferências, convicções de cada um de nós, entre outras informações privadas hoje de domínio das grandes corporações do mundo digital, que tornaram possível, a partir dos recursos de big data, o estabelecimento de um mercado de comportamentos futuros e, também, por óbvio, a fabricação de opções político-eleitorais.
No Brasil, a disseminação de conteúdos falsos e beligerantes, técnica amplamente empregadas nas eleições de 2018, se vinculou, desde o início, à proposição do golpe militar, apresentado com o mantra da intervenção militar como se a figura tivesse guarida na ordem constitucional. Na pandemia, o fenômeno caracterizado pela Organização Mundial de Saúde(OMS) como infodemia, tem revelado um potencial ainda mais destrutivo com a disseminação de fake news negacionistas, de sentido antivacina e a favor de medicações contra a covid-19 sem amparo em evidências (Lópes-Medina; Lópes; Hurtado et al, 2021; World Health Organization, 2021; The Recovery Collaborative Group, 2021; Mainoli, Machado & Duarte, 2021). Tal situação, assinale-se, é ainda mais grave pelos possíveis efeitos iatrogênicos já observados e pela evidente redução de cuidados preventivos que costuma se associar à crença em remédios milagrosos.
As palavras costumam indicar movimentos mais profundos e não há violência política que se efetive sem ser anunciada com antecedência. O discurso violento é, por isso, sempre uma promessa e, em muitos casos, aquilo que Robert K. Merton chamou de “profecia que se auto cumpre” (self-fulfilling prophecy). O Holocausto não seria possível sem a ampliação do antissemitismo por um discurso que associava os judeus a insetos; o Gulag não seria realidade sem a ideia, proferida milhares de vezes, de que os dissidentes eram “inimigos do povo” ou “gusanos” (vermes) como prefere a ditadura cubana; tampouco o massacre de Ruanda ocorreria sem que os Tutsi fossem chamados de “baratas” pelos Hutus durante décadas.
Nunca em nossa história, um presidente foi capaz de produzir um discurso com tamanha intolerância e ódio quanto o tem feito Jair Bolsonaro. Esse fato, por si só, já seria temerário, mas há uma situação muito mais preocupante sintetizada, recentemente, pelo ministro Edson Fachin nos termos de sete ameaças à democracia: 1) a remilitarização do governo civil, 2) as intimidações e proposições de fechamento dos demais Poderes; 3) declarações acintosas de depreciação do voto; 4) atentados à liberdade de imprensa; 5) incentivo ao armamento geral; 6) recusa antecipada do resultado eleitoral e 7) naturalização da corrupção dos agentes administrativos.
O ponto central a discutir é que essas ameaças não decorrem da saúde, mas de um projeto político que não guarda com a democracia qualquer laço de pertinência, ainda que surja por dentro dela. Parece que estamos diante do fenômeno da erosão incremental da democracia conforme assinala Adam Przeworski analisando países como Turquia, Polônia, Hungria e Venezuela aos quais o Brasil sob Bolsonaro é frequentemente comparado. No caso brasileiro, as ameaças atingem a democracia e já significam o retrocesso em diversos direitos que o país ampliou como a inserção de mulheres no mercado de trabalho, proteção ambiental e educação entre outros. Perdem-se décadas de avanços que buscavam corrigir as injustiças e desigualdades históricas e uma noite ou mais noites de obscurantismo e violência voltam a assombrar nosso futuro próximo.

O agravamento da pandemia no Brasil é marcado pela posição negacionista do presidente e por sua determinação em permitir que o vírus circulasse amplamente para, assim, se alcançar a imunidade de rebanho. Essa estratégia infame foi demonstrada pelo estudo do Centro de Pesquisas e Estudos de Direito Sanitário da Faculdade de Saúde Pública da USP e da Conectas que analisou mais de 3.000 atos normativos do Governo Federal durante a pandemia. Nesse trágico caminho, chegamos ao ponto do risco de não retorno em termos de possibilidades futuras.

Além de tudo o que já perdemos pela negligência, despreparo, irresponsabilidade e estratégia do gestor federal e de muitos outros governantes e políticos que se comportam zelando tão somente por suas perspectivas eleitorais, corremos agora o risco de tornarmos a covid-19 endêmica, com mais de 90 cepas do coronavírus já identificadas no país; o que, somado à destruição do sistema de proteção ambiental, consolidará a imagem do Brasil como uma ameaça ao planeta. Os impactos desse processo na economia aumentam os riscos de produção do caos social e de ações violentas, o que poderá ser utilizado para a justificativa de medidas de exceção e para inviabilizar as próximas eleições presidenciais.

Esse parece ser um roteiro definido para uma ruptura institucional. É preciso saber se as instituições democráticas serão capazes de barrá-la; se a sociedade civil irá se mobilizar de modo a sublinhar seu desacordo com as políticas do Governo Federal e defender os direitos fundamentais; se os partidos políticos comprometidos com valores democráticos conseguirão, diante da gravidade das ameaças, relevar suas diferenças e se portar responsavelmente e se saberemos construir uma saída para a crise sanitária e econômica com base na Ciência.

Marcos Rolim é doutor em Sociologia (UFRGS) e professor do programa de pós graduação em Direitos Humanos da UniRitter (RS). Monika Dowbor é doutora em Ciência Política (USP), coordenadora do programa de pós graduação em Ciências Sociais da Unisinos (RS). Ana Severo é economista, consultora em gestão de políticas públicas.


quarta-feira, 28 de abril de 2021

O desmonte do Estado brasileiro - Felipe Salto

Destaco um trecho: "Mais um exemplo da situação crítica das despesas de custeio e manutenção da máquina e de programas essenciais está no Ministério das Relações Exteriores. Após os cortes e bloqueios, o Itamaraty contará com despesas discricionárias de R$ 551 milhões. Em 2016, o orçamento foi quase três vezes maior (R$ 1,5 bilhão)."

A verdade é que o MRE, para o governo, vale menos que o aluguel de carros para a presidência e as benesses para a família presidencial.

Paulo Roberto de Almeida

 O desmonte do Estado brasileiro

Felipe Salto

O Estado de S. Paulo, Espaço Aberto, 27 de abril de 2021

Reduz-se cada vez mais a despesa essencial para o funcionamento da máquina pública


É sintomático que o Orçamento de 2021 tenha sido sancionado em bases irrealistas. Os cortes promovidos pelo Poder Executivo devem permitir o cumprimento do teto, mas ao preço de desmontar o Estado brasileiro. Na ausência de mudanças estruturais no gasto obrigatório, reduz-se cada vez mais a despesa essencial para o funcionamento da máquina pública.

O chamado shutdown não acontece da noite para o dia. Na verdade, políticas públicas essenciais estão sendo desidratadas ao longo dos últimos anos. Dada a opção pelo teto de gastos, mas sem avanços para conter a despesa mandatória, a fatura vai recaindo sobre o gasto discricionário (mais exposto à tesoura).

Em 2021, o caso do censo demográfico é emblemático. Em pleno ano de pandemia, quando se processam mudanças sociais e econômicas profundas, o Ministério da Economia anunciou que a pesquisa não será realizada. Motivo? Falta de orçamento.

O último censo realizado foi em 2010 e custou R$ 1,1 bilhão. Atualizado pelo IPCA e pelo aumento do número de domicílios, o orçamento do programa deveria ser de R$ 2,8 bilhões em 2021. O censo fundamenta a análise, o planejamento e a formulação de uma miríade de políticas sociais, econômicas, educacionais, etc. Os cortes anunciados levaram o orçamento dessa pesquisa a cerca de R$ 53 milhões. Na verdade, esse gasto não será sequer suficiente para preparar a realização do censo em 2022.

As despesas discricionárias do Executivo estão orçadas em R$ 74,6 bilhões para 2021. É o menor nível da série. O Ministério da Educação ficou com R$ 8,9 bilhões. Somando as emendas de relator-geral, vai a cerca de R$ 10 bilhões. Em 2016 as despesas discricionárias executadas nessa área totalizaram R$ 21,8 bilhões. Isto é, o valor de 2021 corresponde à metade do observado cinco anos atrás. Isso sem considerar a inflação do período. Isto é, uma redução brutal.

Na pasta da Saúde, as discricionárias do Executivo ficaram em R$ 15,5 bilhões, apenas meio bilhão acima do valor observado em 2016. Somando as emendas de relator-geral remanescentes (após os cortes do presidente da República), esse valor sobe para R$ 23,3 bilhões. Ainda assim, é um patamar muito baixo, sobretudo quando comparado a 2020 (o dobro), que também foi um ano de pandemia.

O governo argumenta que os recursos adicionais necessários à saúde serão executados por meio dos chamados créditos extraordinários, que de fato estão sendo autorizados por medidas provisórias. Aliás, alterou-se o texto da Lei de Diretrizes Orçamentárias para deixar essas e outras despesas novas de fora da meta fiscal de déficit primário fixada em lei (receitas menos despesas, exceto juros da dívida).

Em benefício da transparência, o ideal seria ter mudado a meta de déficit (R$ 247,1 bilhões). A outra regra fiscal, o teto de gastos, já estaria resolvida, porque todo crédito extraordinário - desde que justificadas a imprevisibilidade e a urgência â não é contabilizado nas despesas sujeitas ao limite constitucional. Estimo, preliminarmente, que o déficit primário efetivo, o que afeta a dívida pública, poderá ficar em torno de R$ 290 bilhões neste ano.

Mais um exemplo da situação crítica das despesas de custeio e manutenção da máquina e de programas essenciais está no Ministério das Relações Exteriores. Após os cortes e bloqueios, o Itamaraty contará com despesas discricionárias de R$ 551 milhões. Em 2016, o orçamento foi quase três vezes maior (R$ 1,5 bilhão).

Na verdade, o remanejamento de verbas promovido via vetos ao Orçamento e bloqueios de despesas por decreto promoveu um corte geral de cerca de R$ 29 bilhões. Esse valor é próximo das contas feitas pela Instituição Fiscal Independente (IFI), R$ 31,9 bilhões, em março. No início da semana passada o governo soltou na imprensa que R$ 20 bilhões seriam suficientes para cumprir o teto de gastos. Errou.

Os cortes realizados mantiveram um orçamento elevado para áreas como Desenvolvimento Regional, cuja discricionária total (Executivo) será de R$ 1,5 bilhão mais R$ 6 bilhões em emendas de relator-geral não atingidas pelos vetos presidenciais. Em 2016 gastou-se R$ 1,3 bilhão e em 2020, R$ 4,4 bilhões.

Se o risco de paralisação de políticas essenciais se materializar, como é provável que continue a ocorrer, o governo sofrerá pressões para desbloquear o que foi tesourado por decreto. Os vetos, vale dizer, só poderiam ser revertidos pelo Congresso. Esses cortes deverão preservar o teto, mas de maneira perigosa e ineficiente.

No ano passado o governo não planejou o Orçamento público de 2021 para um cenário de recrudescimento da crise pandêmica. O plano deveria ser realista e coerente com a responsabilidade fiscal. Já se sabia das dificuldades a serem enfrentadas neste ano, dos riscos de novas ondas da covid19 e da precariedade social, econômica e fiscal.

O "deixa como está para ver como é que fica" custou caro. Após os cortes, pode-se até cumprir o teto, mas não sem um desmonte do Estado brasileiro. Ou isso ou vão acumular uma montanha de contas a pagar para 2022.

*

DIRETOR EXECUTIVO DA INSTITUIÇÃO FISCAL INDEPENDENTE (IFI)

Bolsonaro faz Brasil perder dinheiro internacional para Amazônia, diz analista Natalie Unterstell - João Fellet (BBC Brasil)

 Bolsonaro faz Brasil perder dinheiro internacional para Amazônia, diz analista

João Fellet - @joaofellet

Da BBC News Brasil em São Paulo

A postura do governo Jair Bolsonaro em relação ao meio ambiente está fazendo com que o Brasil perca espaço e recursos em negociações internacionais sobre o clima, diz à BBC News Brasil Natalie Unterstell, fundadora e diretora do think tank (centro de pesquisas e debates) Talanoa, voltado a políticas ambientais e climáticas.

Já países como Colômbia e Indonésia, segundo ela, estão aproveitando as oportunidades que se abrem para nações com grandes florestas tropicais — cuja preservação é considerada crucial para o combate à mudança do clima.

"Se o Brasil deixar, e o Brasil está deixando, esse espaço será ocupado por outros países", afirma Unterstell em entrevista à BBC News Brasil.

As negociações globais sobre a proteção de florestas ganharam um impulso com a posse de Joe Biden como presidente dos EUA, em janeiro. Na campanha, Biden propôs que países ricos se reúnam para fornecer US$ 20 bilhões para a preservação da Amazônia.

O americano convocou na semana passada uma reunião virtual sobre as mudanças climáticas com líderes de 40 países, entre os quais o Brasil. No encontro, foi anunciada uma iniciativa entre EUA, Reino Unido, Noruega e empresas privadas para canalizar doações voltadas à preservação de florestas mundo afora.

A iniciativa, que já conta com US$ 1 bilhão, foi comparada ao Fundo Amazônia — mecanismo paralisado no governo Bolsonaro e que tinha o Brasil como único beneficiário. Agora, se quiser participar da nova iniciativa, o Brasil terá de concorrer com outras nações.

Unterstell afirma ainda que, embora o governo federal cobre recursos internacionais para a preservação da Amazônia, há hoje cerca de R$ 3,4 bilhões em caixa que poderiam ser usados para esse fim.

O valor é a soma de recursos do Fundo Amazônia (R$ 2,9 bilhões) e do Fundo Verde do Clima (R$ 522 milhões) que foram doados ao Brasil, mas jamais gastos.

Até que os impasses que travam os pagamentos sejam sanados, diz ela, é improvável que o país receba novas doações.

Formada em administração de empresas pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), Unterstell acompanhou como observadora da sociedade civil a negociação do acordo que criou o Fundo Amazônia, em 2008.

Abastecido principalmente pela Noruega (93,8%) e Alemanha (5,7%), o fundo busca estimular ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento na Amazônia brasileira.

Os doadores suspenderam o funcionamento do fundo quando o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, tentou reduzir o papel da sociedade civil no conselho que gere os repasses.

Unterstell trabalhou ainda no governo do Amazonas e, entre 2011 e 2013, foi negociadora do Ministério do Meio Ambiente em debates internacionais sobre a proteção de florestas. Em 2018, candidatou-se a deputada federal pelo Podemos, mas não se elegeu.

Neste ano, Unterstell se candidatou outra vez — agora a uma vaga no conselho de supervisores (Board of Overseers) da Universidade Harvard, onde fez mestrado em Administração Pública entre 2015 e 2016.

Formado por ex-alunos, o conselho é responsável por aprovar a escolha do presidente da universidade e seus dirigentes.

Unterstell integra um movimento que cobra a universidade a deixar de investir em empresas de combustíveis fósseis.

Uma das mais renomadas universidades do mundo, Harvard tem cerca de US$ 41 bilhões em investimentos, usados para financiar a instituição. A eleição se encerra em 18 de maio.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

BBC News Brasil - Qual o saldo para o mundo do evento sobre o clima convocado por Biden?

Natalie Unterstell - Segundo a Convenção-Quadro da ONU sobre Clima, estamos em uma rota que nos levará a um aumento de 3,6 graus da temperatura até o final do século.

Seria um cenário catastrófico, em que todos os recifes de corais ficariam esbranquiçados, haveria degelo da calota polar e uma grande instabilidade climática.

Essa cúpula foi marcada pra tentar melhorar as ofertas dos grandes emissores. Dos 18 maiores emissores, só dois tinham colocado metas mais progressistas na mesa: o Reino Unido e a União Europeia.

Foi um bom começo principalmente porque os EUA colocam uma meta muito, muito ambiciosa — de reduzir entre 50 e 52% suas emissões até 2030 (em relação a 2005). E isso fez o ponteiro mexer, criou-se uma efeito dominó positivo.

O Japão melhorou de 26% para 46% a sua oferta de redução de emissões para 2030. O Canadá também melhorou.

Os EUA muito habilmente colocaram sua diplomacia para trabalhar com os países que mais dependem de carvão: Japão, China, Índia, Coreia do Sul. E foram bem sucedidos.

A Coreia do Sul anunciou que não vai mais financiar a extração de carvão no exterior. A própria China disse que vai reduzir o consumo de carvão. Então acho que se começou a asfixiar realmente essa tecnologia decadente.

BBC News Brasil - Os anúncios são suficientes para evitarmos o aumento de 3,6 graus?

Unterstell - Não. Dados preliminares do Climate Action Tracker (organização de cientistas que calcula o impacto das metas de emissões dos países) mostram que as novas metas reduziram em 12% a 14% a previsão de emissões globais até 2030.

É insuficiente. Vamos precisar de novas rodadas até o final do ano para que países que não colocaram novidades na mesa, como a China e a Índia, melhorem suas metas.

BBC News Brasil - Biden diz que o combate às mudanças climáticas será um dos eixos de seu governo. Qual o impacto disso para o resto do mundo?

Unterstell - Um é a mobilização do setor privado americano para a transição energética (rumo a fontes menos poluentes). Isso gera novos padrões e tem um efeito cascata para o resto do mundo.

Os EUA estão usando o setor privado para conversar com os outros países. Com a Índia, por exemplo, estão tentando mobilizar investidores e financiadores privados americanos para a transição energética naquele país. Poucos países têm uma alavanca com essa dimensão e capilaridade.

O outro ponto é em relação a comércio. Em seu plano de governo, Biden disse que levaria em conta riscos climáticos ao estabelecer acordos comerciais. Eles estão numa via de alinhamento com a União Europeia nesse sentido.

Vamos começar a ver uma convergência de padrões tanto de investimento quanto de comércio levando em conta a questão da mudança do clima. Isso muda tudo.

BBC News Brasil - E qual foi o saldo para o Brasil do evento de Biden?

Unterstell - O saldo não é positivo. Bolsonaro claramente mudou o tom — aquele tom mais ofensivo que existiu, por exemplo, nas últimas assembleias gerais da ONU — para um tom bastante defensivo.

Mas não apresentou nenhuma meta nova para 2030. Vários países firmaram acordos bilaterais com os Estados Unidos na agenda de clima. O Brasil não firmou nada bilateral, isso também é notável.

Outro ponto é que a conferência anunciou um mecanismo global para florestas, indicando que a gente perdeu a oportunidade de ter um mecanismo só para a gente.

BBC News Brasil - Você se refere à LEAF (sigla em inglês para "diminuindo o desmatamento por meio da aceleração do financiamento florestal", iniciativa anunciada por EUA, Noruega, Reino Unido e empresas privadas). O que achou do mecanismo?

Unterstell - Vejo-o com muitos bons olhos porque ele vai buscar recursos privados para fazer um pagamento por resultado. A ideia foi concebida aqui no Brasil (no Fundo Amazônia).

Tem várias grandes empresas envolvidas, como Amazon, Nestlé e Airbnb. Isso vai possibilitar que jurisdições que consigam demonstrar resultados de redução do desmatamento recebam recompensas.

Também acho muito interessante que a LEAF não mire só governos nacionais, mas também governos subnacionais, como estados e municípios.

A gente ainda não sabe quem vai operar o mecanismo, há muitos detalhes a serem esclarecidos, mas me parece um novo boost de energia para a questão da redução do desmatamento.

BBC News Brasil- Governadores de Estados amazônicos têm tentado sem sucesso destravar os repasses do Fundo Amazônia. O LEAF poderia ser uma alternativa para eles?

Unterstell - Acho que essa é a melhor chance de acessarmos o LEAF. Vinte e quatro governos estaduais — exceto Rondônia, Roraima e Santa Catarina — enviaram uma carta ao Biden indicando sua disposição e interesse em atrair investimentos diretamente para zerar as emissões e zerar o desmatamento.

Acho bastante positivo. Porém, esses governos não têm jurisdição total sobre seus territórios. Há neles terras que são de competência da União, como terras indígenas, parques nacionais e terras devolutas federais.

Mesmo que existam recursos para esses governos estaduais, eles não vão poder resolver o problema nas terras federais, então a gente não pode esquecer da responsabilidade da União em fazer a lição de casa.

BBC News Brasil - Por mais que estejam se mobilizando para atrair recursos, vários Estados amazônicos estão hoje sob forte influência de políticos que defendem reduzir unidades de conservação, privatizar terras públicas e anistiar grileiros. Qual a chance de prevalecer a visão conservacionista?

Unterstell - De fato tem um jogo de forças, e estamos vendo esse jogo pender para o desmatamento em regiões que antes eram conservadas, como o sul do Amazonas.

É muito preocupante. Isso diz respeito a algo que ainda precisa ser melhor elaborado na sociedade brasileira, que é a tradução das oportunidades de conservação no local.

Isso ainda não está claro em todos os lugares, e acho que esse é o grande desafio que a gente tem agora. Vamos imaginar que venham recursos vultuosos para governos subnacionais na Amazônia no próximo ano. Como que isso vai fazer com que o jogo vire localmente?

Sou relativamente otimista porque no passado a gente já viu esse jogo acontecer. A gente teve momentos de enfrentamento dessas forças e, por algum tempo, foi possível que forças mais reformistas e pró-conservação vencessem. Então é uma questão de equilibrar o jogo, que hoje está muito balanceado para o lado da destruição.

Também é sempre bom lembrar que o resto do mundo está adotando novos padrões de comércio e de investimento. Fala-se de um mundo livre de desmatamento. Isso cada vez mais vai fazer pressão no âmbito nacional, cada vez vai percolar mais e vai chegar mais na ponta. E aí acho que algumas dessas forças vão ser moderadas.

BBC News Brasil - Há outros países ocupando hoje o espaço que o Brasil já ocupou nos debates sobre a proteção das florestas?

Unterstell - Com certeza. Países vizinhos, como a Colômbia, estão percebendo a oportunidade e um vácuo que o Brasil está deixando em relação à proteção da Amazônia e se posicionando super bem para estabelecer acordos bilaterais para participar de vários mecanismos.

Lá fora, a Indonésia tem muitos problemas, mas está muito ciente das oportunidades que existem. Não à toa, tem feito inúmeros projetos para captar recursos públicos internacionais para a questão de clima e tentado criar mecanismos privados.

Se o Brasil deixar, e o Brasil está deixando, esse espaço será ocupado por outros países.

BBC News Brasil - O governo federal diz que o Brasil deve ser pago pela comunidade internacional por resultados já alcançados no passado. Qual sua opinião?

Unterstell - Essa é uma polêmica que foi instalada pelo próprio governo federal. Sim, existe um mecanismo para ser pago por resultados, o Green Climate Fund (Fundo Verde do Clima).

O Brasil pegou US$ 96 milhões desse mecanismo, e só não pegou mais porque não executou o recurso.

O governo federal diz que temos resultados do passado a receber, e temos, mas a gente só não recebeu ainda porque não gastamos o que já recebemos.

Isso é bastante contraditório com o discurso do governo atual. E tem uma outra questão também, que é a do próprio Fundo Amazônia continuar travado há dois anos. A governança foi desestabelecida.

A gente não tem mais o Comitê Orientador do Fundo Amazônia e, com isso, existem R$ 2,9 bilhões parados no fundo.

O sinal que isso gera para qualquer outro potencial parceiro internacional é muito ruim. Primeiro porque não há confiança na governança. Não se tem certeza se o Brasil, se entrar num acordo, não vai quebrá-lo como fez com a Noruega e a Alemanha no caso do Fundo Amazônia.

E se o Brasil tem R$ 2,9 bilhões parados, por que grandes empresas e outros governos vão priorizar dar recursos ao Brasil? Esse fechamento do espaço é baseado em evidências muito concretas de que o Brasil não está a fim, está mal posicionado nesse jogo.

Não é que esteja faltando recurso. Tem novas promessas vindo aí, o Biden disse que vai colocar aquilo que tinha prometido, a França dobrou sua contribuição. Então as perspectivas são de que quem chegar com bons projetos, com boas justificativas vai conseguir levar.

BBC News Brasil - Muito se fala sobre a necessidade de remunerar as pessoas na ponta que preservam a floresta. Há discussões internacionais sobre esse tema?

Unterstell - Elas nunca chegam nesse nível, porque isso tem a ver com a soberania nacional de cada país. Cada país é livre para estabelecer seus mecanismos.

Mas eu acho que cada vez mais se vê isso como um serviço que precisa ser pago. Afinal, existe um trabalho em torno de manter uma floresta em pé além do que está na lei, cuidar de terra indígena, garantir vigilância. Tudo isso tem um valor para a sociedade brasileira e global.

Estamos começando a pensar nisso como empregos. Tem uma coisa muito legal no plano do Biden que poderia nos inspirar. É a ideia de ter o que eles se chamam de Civilian Conservation Corps (brigadas civis de conservação).

Foi assim que o (ex-presidente Franklin Delano) Roosevelt, lá no New Deal (1933-1937), conseguiu empregar 3 milhões de pessoas nos Estados Unidos fazendo-os restaurar a vegetação e cuidar de parques.

Biden colocou isso no programa dele, e essa seria uma discussão superinteressante aqui, e prática.

Digamos que existam recursos — e existem — para a gente captar a cooperação internacional. Para onde vai isso? Por que não pensar, por exemplo, que o Pantanal precisa ser restaurado?

Isso geraria emprego na ponta, faria as pessoas serem pagas por um serviço, por alguma entrega concreta. Mas infelizmente o nosso nível de discussão no Brasil está muito opaco, a gente ainda não consegue nem pensar em sair da pandemia.

BBC News Brasil - O que achou do programa Floresta +, lançado recentemente pelo governo Bolsonaro, e que também prevê remunerar quem preserva o meio ambiente?

Unterstell - Pode ser um programa interessante, mas ainda tem pouca informação pública a respeito dele — sobre sua governança, por exemplo.

A gente precisaria entender com mais clareza quem está de fato o guiando, e se a sociedade participa. Por exemplo: eles falam em pagar povos indígenas. Quem são os povos indígenas que estão sendo chamados para essa conversa?

BBC News Brasil - Temos visto muitas grandes empresas anunciando medidas contra as mudanças climáticas. O quanto disso é marketing, e o quanto isso realmente muda o jogo?

Unterstell - Tem as duas coisas. Alguns segmentos estão sob muita pressão — o dos frigoríficos, por exemplo. E ele sabem muito bem que não vai bastar fazer um serviço de relações públicas. Não é à toa que uma grande empresa do setor anunciou recentemente o compromisso de chegar ao net zero (equilíbrio entre emissão e absorção de carbono em suas atividades) em 2040.

Depois uma concorrente anunciou a mesma coisa, e outra foi mais ambiciosa e puxou a meta para 2035.

Há razões muito concretas para essa corrida, que é o acesso a mercados internacionais, a questão da reputação, e também motivos financeiros. O desinvestimento (retirada de recursos por parte de investidores) já é um risco material para alguns desses setores.

Metas anunciadas em conferência climática foram ambiciosas, mas será preciso mais para evitar catástrofe, diz analista; acima, protesto em Washington por ações contra mudanças climáticas

Mas isso precisa ser para valer. Precisamos pensar no Brasil na accountability, no monitoramento desses compromissos.

O grande risco que eu vejo hoje é que tem uma corrida para o net zero no mundo inteiro, mas no Brasil muitos acham que basta fazer a conta de emissões e comprar créditos para compensar.

Só que os créditos foram criados para serem transitórios. É preciso investir para trocar tecnologias e zerar as emissões.

BBC News Brasil - O que acha do movimento de grandes empresas brasileiras que, diante da alta no desmatamento na Amazônia, têm se manifestado publicamente e cobrado o governo a agir? Isso é novo?

Unterstell - É bem novo. Me chamou muito a atenção que, em agosto de 2019, 230 investidores e asset managers (administradores de fundos de investimento) globais, incluindo dois brasileiros, tenham mandado uma carta ao presidente da República sobre controlar as queimadas.

Nunca tinha visto uma carta de investidores endereçada ao chefe de Estado, e depois dessa arrancada começou uma onda de ativismo corporativo aqui no Brasil bastante relevante. A gente vê uma mobilização, e isso elevou bastante a percepção de que a pauta ambiental também é econômica.

O empresariado já se ligou que a gente está vivendo num mundo em que meio ambiente, a mudança do clima impõem riscos financeiros, não só reputacionais. É positivo.

Agora, isso vai controlar o desmatamento? Não. Se a gente não tiver ação de Estado para regular e fazer cobrança das empresas, pode ser que tudo isso só fique no plano retórico.

BBC News Brasil- O clima e o meio ambiente são hoje temas centrais na política da Europa e dos EUA. Como compara esse cenário ao da política no Brasil?

Unterstell - O que vem acontecendo nesses países é uma espécie de insurgência verde para além dos partidos verdes. Nos EUA, a questão ambiental se conectou com demandas de saúde e com demandas de emprego locais.

Não é à toa que Biden se elege prometendo criar empregos na transição climática, porque é isso que as pessoas querem, empregos de boa qualidade.

No Brasil, não estamos ainda formando um pipeline de políticos e de partidos com capacidade de disputar espaço com essa mesma leitura.

A gente produziu uma Constituinte nos anos 80 com um capítulo de meio ambiente e um capítulo de povos indígenas. Houve uma construção superbonita em relação à democracia, à participação, então a nossa democracia conseguiu produzir uma coisa fantástica lá atrás.

Mas a gente até hoje não viu de nenhum partido qualquer proposta de Green New Deal (plano de investimentos governamentais focado em tecnologias verdes; o termo é inspirado no New Deal, programa que tirou os EUA da grande recessão de 1929).

E, mesmo com todos os desafios que a gente teve nesses últimos dois anos, como Brumadinho, o vazamento de óleo no Nordeste, as queimadas na Amazônia e no Pantanal, a gente não viu uma produção legislativa para dar resposta.

É preocupante. Não vejo o mesmo nível de interesse e de compreensão sobre o tema entre os políticos brasileiros.

BBC News Brasil- Nem na esquerda?

Unterstell - Nem na direita, nem na esquerda. Seria muito importante que o PT, que possivelmente vai ter um candidato majoritário na próxima eleição, olhasse a questão do pré-sal e a questão do petróleo à luz dos desafios da mudança do clima.

Essa discussão precisa ser feita, já que o partido e seu maior expoente continuam falando desse mundo e apostando nele, sem reconhecer os desafios que a gente tem na pauta climática.

E a Petrobrás precisa ter uma visão estratégica em relação à transição, de como ela vai voltar a investir em fontes renováveis — os investimentos dela hoje são pífios nessa área.

Pensar qual é a vida útil dessas reservas e como o país pode melhor utilizar esses recursos. Como as regiões hoje dependentes das arrecadações do petróleo vão ficar? Esses planos de transição são inevitáveis.

https://www.bbc.com/portuguese/institutional-56906691