domingo, 10 de novembro de 2024

Trump ‘não quer construir pontes’ e desafia diplomacia econômica brasileira, diz ex-ministro Celso Lafer - Leonardo Rodrigues (Istoé)

Trump ‘não quer construir pontes’ e desafia diplomacia econômica brasileira, diz ex-ministro Celso Lafer

Leonardo Rodriguesi

https://istoe.com.br/autor/leonardo-rodrigues/ 

Istoé, 10/11/2024

https://istoe.com.br/trump-nao-quer-construir-pontes-e-desafia-diplomacia-economica-brasileira-diz-ex-ministro-celso-lafer/

+Distância entre Lula e Trump não afetará proximidade do Brasil com os EUA, diz ex-chanceler

Depois que Donald Trump foi eleito para a Presidência dos Estados Unidos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tem um histórico de declarações críticas ao republicano, não tardou a parabenizá-lo pelo resultado da eleição.

O gesto refletiu a preocupação do petista em preservar relações com o segundo maior parceiro comercial brasileiro, cujo mandatário eleito prometeu adotar uma agenda de conservadorismo político e protecionismo comercial. “Trump ressuscitou a corrente de isolacionismo dos EUA, movida por desconfiança no comércio internacional e nos engajamentos internacionais”, afirmou Celso Lafer, ex-ministro das Relações Exteriores, ao site IstoÉ.

Lafer chefiou o Itamaraty quando Fernando Collor (PRN) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB) eram presidentes e ainda foi ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, em períodos que tinham políticos de diferentes orientações na Casa Branca. Nesta entrevista ao site IstoÉ, o ex-chanceler analisou os desafios impostos por Trump para a diplomacia brasileira e, dada a influência do país que governará, para as relações globais de poder.

Leia a seguir a íntegra:

IstoÉ O presidente Lula tem um histórico de manifestações críticas a Donald Trump. O senhor acredita que as divergências podem impactar as relações políticas e diplomáticas entre Brasil e Estados Unidos?

Celso Lafer O presidente Lula não exerceu o realismo da prudência democrática ao manifestar publicamente simpatia pela candidatura de Kamala Harris. Sua manifestação é, no entanto, compreensível, e não apenas em função da sua identidade política, mas da existência de um terreno comum com o governo Biden, em matéria dos desafios da agenda global do meio ambiente, da transição energética e da importância atribuída à democracia e aos direitos humanos. Na campanha deste ano, Trump se contrapôs a esses itens de forma ainda mais incisiva do que no seu primeiro mandato.

Objetivamente, porém, é com o futuro governo Trump que a diplomacia de Lula precisará conviver, da melhor maneira possível, tendo em vista a relevância dos EUA no mundo. Daí a pronta clareza realista com a qual Lula transmitiu os seus cumprimentos a Trump, por uma eleição que teve o inequívoco respaldo do eleitorado americano.

“Havia um terreno em comum entre os governos de Lula e de Biden”.

A diplomacia americana comporta muitas facetas, o que dificulta a identificação de um foco privilegiado de atenção ao Brasil na próxima presidência de Trump — o que deve dar ao governo Lula uma margem de calibração para a moldura das relações entre os dois países. Nessa calibração, o presidente contará com os quadros do Itamaraty e sua capacidade de desdramatizar o potencial de tensões.

IstoÉ Tendo em perspectiva as diferentes experiências que o senhor teve no Itamaraty, qual é sua avaliação da postura diplomática do governo Lula 3?

Celso Lafer Fui ministro das Relações Exteriores em um momento distinto da sociedade brasileira, que não se caracterizava pelos atuais conflitos de polarização e por um movimento internacional de ascensão política autoritária da direita. Havia mais abertura à cooperação, mais condições para o exercício do nosso “soft-power” e, consequentemente, para a elevação do patamar de presença do Brasil no mundo.

O mundo com o qual o Lula 3 se confronta é permeado por tensões regionais e internacionais de poder, que propiciam o retorno do papel da geopolítica, das securitizações das economias nacionais e do impacto da geografia das paixões.

No meu período de Itamaraty e mesmo nos mandatos anteriores de Lula, não havia uma tensão de hegemonia como a que existe entre EUA e China e nem conflitos bélicos de alcance geral, como os que acontecem na Ucrânia e na Palestina.

“A sociedade brasileira não atravessava os conflitos da polarização e um movimento internacional de ascensão política autoritária da direita”.

A América do Sul, por sua vez, é mais fragmentada e heterogênea, e menos propícia a uma onda positiva verificada nos mandatos anteriores do presidente, o que aliás também caracterizou, em outros moldes, minha experiência como ministro.

Dito isso, concluo que o desafio diplomático de Lula 3 é calibrar a presença do Brasil no mundo, navegando sem intensificar conflitos entre próximos e distantes, e sem esbarrar nos rochedos subjacentes de um “Mar de Sargaços”. Essa calibração pressupõe equilíbrio e, igualmente, a constante melhoria da governança interna, cujo aprimoramento é sempre fonte de prestígio internacional.

IstoÉ Quanto a Trump, quais são os sinais dados pelo presidente eleito americano em relação à postura diplomática e às relações com outras nações para seu novo mandato?

Celso Lafer Neste contexto de um mundo crescentemente perigoso, Trump agrega a imprevisibilidade de seu modo de ser, um amplo controle sobre Washington que a amplitude de sua eleição lhe assegurou e a consequente erosão dos tradicionais freios e contrapesos do sistema político americano. A isto, se somam os novos perigos de alcance do relacionamento entre dinheiro e poder que a relação Elon Musk-Trump tem condição de propiciar.

Tudo isso tende a aumentar o desafio da gestão das independências e suas externalidades, criando novos obstáculos à construção de consensos internacionais. Esses foram sempre uma nota de atuação da competência diplomática brasileira, cujo espaço de permissibilidade está reduzido.

IstoÉ Trump manifestou, durante a campanha, a intenção de adotar políticas comerciais mais protecionistas e enrijecer políticas anti-imigração. Em que medida essa agenda afeta as relações com o Itamaraty?

Celso Lafer Lema de Trump, o “Make America Great Again” (“Faça a América Grande Novamente”, em português) é uma explicita condenação do internacionalismo americano, que teve um papel na construção da ordem mundial do pós-guerra e o respaldo de governos democratas e republicanos.

Essa condenação se viabilizou com as mudanças tecnológicas e a fragmentação das mídias que ensejaram as distorções e notícias falsas, que ensejaram notícias falsas e alcançaram setores da sociedade que se sentiam marginalizados pelas mensagens do Partido Democrata. Trump ressuscitou assim, em novos moldes, a corrente do isolacionismo dos EUA, movida por desconfiança no comércio internacional e nos engajamentos internacionais de todo tipo.

“Trump ressuscitou a corrente de isolacionismo dos EUA”.

Trump impulsionou a hostilidade em relação à imigração, aguçada pelo ímpeto que declaradamente dará a deportação de milhões que estão — ilegalmente — habitando o território americano. O republicano não quer construir pontes, mas vai se dedicar a construir muros com a ideia de colocar seu lema em prática.

No plano econômico, a elevação de tarifas é o instrumento de ação preferida para alcançar isso, o que abrirá espaço para guerras comerciais. Ao mesmo tempo, em seu governo haverá um esforço de contenção da penetração da economia chinesa no mundo, o que impactará todos os parceiros comerciais dos EUA, inclusive o Brasil, que é um importante exportador de produtos para a economia americana. Esse acesso será dificultado pela agenda de Trump, o que exigirá empenho redobrado na promoção competitiva e ajustes para a diversificação de nossas exportações. Em síntese, há um novo desafio para a diplomacia econômica brasileira.


Ao pé da lareira- Simon Schwartzman (O Estado de São Paulo)

Ao pé da lareira

By Simon Schwartzman on Nov 08, 2024 04:17 pm

(Publicado em O Estado de São Paulo, 8 de novembro, 2024) 

Quando Gustavo Capanema quis fundar a Universidade do Brasil, na década de 1930, ele abriu um concurso internacional para construir a Cidade Universitária. Ganhou Marcelo Piacentini, o arquiteto de Mussolini. Os perdedores, o grupo de Lúcio Costa associado ao francês Le Corbusier, protestaram, e acabaram recebendo como compensação o projeto do edifício do Ministério da Educação. Com a guerra, a universidade de Piacentini nunca passou da maquete. O Edifício do Ministério da Educação ainda resiste, meio abandonado no caos urbano do centro do Rio de Janeiro.  Aprendi isso quando pesquisava os arquivos de Capanema, e me fazia lembrar a  frase de que uma universidade começa com uma conversa informal ao pé de uma lareira, que havia lido nos papeis que descreviam a fundação, cem anos antes, da Universidade da California em Berkeley, onde estive para meus estudos de doutorado.

A ideia de que universidades são feitas por comunidades de pessoas, e só depois por leis e edifícios, foi o fio condutor de uma série de estudos  em que participei ao longo dos anos. Claro, elas precisam de prédios, equipamentos, pessoal administrativo,  e atender às expectativas dos estudantes, da sociedade e das profissões. Mas seu principal capital, que faz a diferença, é o talento de seus professores e uma cultura de valorização do estudo, da pesquisa, da independência intelectual e da competência técnica, que desenvolvem e transmitem a seus alunos e a toda sociedade. Se isto é verdade, então os professores universitários formariam uma espécie de profissão das profissões, uma comunidade cuja identidade central seriam estes valores, que transcenderiam outras identidades institucionais, profissionais e mesmo nacionais.

Existe, no entanto, outra visão, a de que o ideal das profissões autônomas é um mito, que elas na prática são ou acabam sendo controladas pelas grandes burocracias públicas e privadas. Os profissionais autônomos se transformariam em empregados, e as comunidades profissionais, em sindicatos de um proletariado letrado.  Quando, na década de 90, fizemos uma pesquisa sobre os professores universitários no Brasil, constatamos que havia, no país, um pequeno grupo de professores de alta formação, pesquisadores, que compartilhavam os valores de autonomia e liderança intelectual da comunidade acadêmica; um grupo bem maior, de formação intermediária, funcionários das universidades públicas, em que prevalecia a identidade corporativa e sindical; e um terceiro grupo fragmentado, sem identidade própria, trabalhando de forma precária para o mercado de ensino superior privado.

O que aconteceu com os professores universitários brasileiros desde então? Olhando os dados, algumas coisas chamam a atenção. Entre 2010 e 2023, o número de estudantes universitários passou de 6 para 10 milhões, mas o número de professores permaneceu praticamente o mesmo, cerca de 350 mil, metade no setor público, metade no privado. A razão é que o sistema público cresceu pouco, e o sistema privado aumentou sua eficiência pelo uso mais intensivo de seus professores, sobretudo através do ensino à distância. O número de alunos por professor no setor privado subiu de 22 para 40, enquanto, no setor público, permaneceu entre 10 e 12. Desapareceu, praticamente, a figura do professor horista no setor privado, substituído pelos contratos em tempo parcial.

Depois, os professores ficaram mais velhos e mais qualificados. Esta é a tendência geral, mas existem grandes diferenças por setor. No setor privado, a proporção de professores de 40 anos ou menos passou de 46% para 35%. Nas universidades federais, de 37% para 26%; e nas universidades paulistas, de 16% para 9%. A proporção de professores com doutorado passou de 56% para 75% no sistema federal, de 15% para 33% no sistema privado, e permaneceu acima de 95% no sistema paulista.

Ao mesmo tempo,  as vantagens relativas dos professores universitários, em termos salariais, pioraram. Em 2012, ter um diploma universitário significava ganhar 253% da média do país,  duas vezes e meia a mais.  Ser professor universitário do sistema privado significava ganhar 300%; e, do setor público, 400%. Em 2023, estas proporções haviam caído para 202%, 268% e 357%, respectivamente, pelos dados da PNAD.

Só com estes dados não dá para dizer quanto ainda persiste, entre eles, o modelo das comunidades profissionais autônomas, das corporações profissionais ou dos sindicatos. Mas temos indicações, por  outros lados, que o prestígio dos professores tem caído e sua autoridade, e da ciência que incorporam, contestada. No setor privado há um processo de profissionalização fragmentada que parece se consolidar: os professores trabalham mais, ganham menos, não têm estabilidade no trabalho,  e formam um “precariado” que não consegue se organizar para defender seus interesses. No setor público, com a maior qualificação, envelhecimento e a perda relativa de vantagens, podemos entender que prevaleça entre muitos uma atitude defensiva e de ressentimento, mais do que a de uma profissão autônoma e altiva. E mal temos lareiras para nos sentarmos a seu pé para conversar.


Du groupe des BRICS aux « BRICS+ » - DiploWeb (AB Pictoris)

Comentário inicial PRA:

Certas personalidades prometedoras na primeira infância se convertem em personagens menos atrativos, quando chegam na adolescência ou na idade adulta. Hitler, por exemplo, poderia ter sido um pintor razoável, ou até mediocre, e poderia ter estacionado por aí, caso não fosse barrado na Academia de Viena. Frustrado, aderiu à política na pior tradição do racismo e do nacionalismo alemão, agregando depois um antissemismo doentio. O BRIC poderia ter sido um foro econômico interessante e atrativo para os capitais internacionais, se tivesse continuado na sua primeira vocação de países emergentes em rápido crescimento e plataforma para investimentos estrangeiros diretos ou de portfólio. Mas, os países supostamente democráticos – Brasil, Índia, talvez África do Sul – se submeteram às pressões das duas grandes autocracias para transformá-la numa plataforma antiocidental, antiG7 e antiamericana. O Brasil não merecia essa evolução nefasta para seus interesses nacionais.

 

Du groupe des BRICS aux « BRICS+ »

AB Pictoris | Entreprise française fondée par Blanche Lambert, cartographe indépendante

Sur le plan politique, les BRICS peuvent s’apparenter à un « contre-pouvoir », en étant souvent perçu comme un concurrent du Groupe des 7 (G7). Le groupe des BRICS, aujourd’hui nommé « BRICS+ », devient manifestement très attractif pour les pays du « Sud global ». Le sommet de Kazan d’octobre 2024 a en effet rassemblé « 35 délégations », avec la présence 20 chefs d’États. Cependant, de nombreux points de tension, qui fragilisent déjà les relations entre certains pays membres, risquent de limiter la portée du groupe. 


A L’OCCASION du XVIème sommet des BRICS qui a eu lieu à Kazan (Russie) du 22 au 24 octobre 2024, de nouveaux pays ont annoncé rejoindre le groupe en tant que pays « partenaires ». Le groupe, passé de cinq à neuf membres en janvier 2024, compte désormais treize participants : l’Algérie, la Biélorussie, la Bolivie, Cuba, l’Indonésie, le Kazakhstan, la Malaisie, le Nigeria, l’Ouganda, l’Ouzbékistan, la Thaïlande, la Turquie et le Vietnam.

Il s’agit d’une nouvelle étape dans l’élargissement du groupe : en effet, en août 2023, en clôture du 15e sommet des BRICS, composé du Brésil, de la Russie, de l’Inde, de la Chine et de l’Afrique du Sud, le président sud-africain Cyril Ramaphosa annonce l’entrée de six nouveaux membres au sein du groupe. L’Arabie saoudite, l’Égypte, les Émirats arabes unis, l’Éthiopie et l’Iran rejoignent le « bloc » dès le 1er janvier 2024.

Même si l’entrée de l’Afrique du Sud dans le groupe des BRIC [1] en 2011 constitue un élargissement de l’organisation, l’ouverture de cette dernière à six nouveaux membres est une première. En effet, jusqu’au sommet de Johannesburg, la question de l’élargissement du groupe était largement débattue. Alors que plusieurs pays ont officiellement déposé une candidature lors de l’année 2022 - année marquée par la présidence chinoise des BRICS - l’Inde, et dans une moindre mesure le Brésil, avaient exprimé leur désaccord avec l’ouverture du groupe à de nouveaux membres.

Conférence diplomatique entre pays ayant connu une croissance économique rapide, les BRICS aspirent désormais à peser sur la scène internationale en incarnant une plateforme de dialogue et de coopération entre pays du « Sud global » [2]. Les BRICS, bien qu’ayant des intérêts divergents en interne, s’accordent sur leur volonté de donner plus de place aux pays émergents au sein des institutions internationales, qui ne reflèteraient plus la réalité du XXIe siècle. La création en 2014 d’une institution financière au sein du groupe, la Nouvelle banque de développement (NBD), en est un exemple probant, en accordant des prêts aux pays émergents avec des conditions moins « exigeantes » que celles du FMI. Cette institution financière avait déjà accueilli de nouveaux membres en 2021 (Bangladesh, Émirats arabes unis, Uruguay, Égypte), et accueillera probablement l’Arabie saoudite, qui a entamé des négociations avec la NBD en mai 2023.

Les BRICS représentent 42% de la population mondiale, presque le tiers du PIB mondial et comptent trois puissances nucléaires.

Sur le plan politique, les BRICS peuvent s’apparenter à un « contre-pouvoir », en étant souvent perçu comme un concurrent du Groupe des 7 (G7) [3]. En 2023, le groupe des BRICS représente 42% de la population mondiale, quasiment le tiers du PIB mondial et il compte également trois puissances nucléaires (Russie, Inde, Chine). Il est par ailleurs intéressant de voir que les États qui rejoindront le groupe en 2024 sont pour la plupart déjà membres du G20 [4] (Groupe des 20, comptant évidemment les membres du G7), conférant davantage d’importance au groupe des BRICS sur la scène internationale. La création d’un format de dialogue dit « BRICS Plus » en 2018, rassemblant des pays tels que l’Indonésie, le Kazakhstan, l’Égypte, l’Algérie, le Sénégal ou encore les Fidji, participe à l’attraction des BRICS pour les pays émergents, et à la croissance de son poids sur la scène politique internationale.

Le groupe des BRICS, aujourd’hui nommé « BRICS+ », devient manifestement très attractif pour les pays du « Sud global ». Le sommet de Kazan a en effet rassemblé « 35 délégations », avec la présence 20 chefs d’États. Cependant, de nombreux points de tension, qui fragilisent déjà les relations entre certains pays membres, risquent de limiter la portée du groupe. Ces tensions se sont déjà ressenties à propos des adhésions de certains pays. La Turquie et la Vénézuela, qui avaient exprimé leur volonté de devenir membres à part entière du groupe, se sont vus refuser ce statut à cause de blocages émis respectivement par l’Inde et le Brésil.

Voir la carte Les Brics : une plateforme de coopération entre pays émergent qui s’élargit au format PDF haute qualité d’impression

Copyright pour le texte et la carte Novembre 2024-AB Pictoris-B. Lambert/Diploweb.com

https://www.diploweb.com/Carte-commentee-Du-groupe-des-BRICS-aux-BRICS.html?utm_source=brevo&utm_campaign=Gopolitique%20des%20nouvelles%20ralits&utm_medium=email 


Contradições anti-históricas: poluição e escravatura - Paulo Roberto de Almeida

Contradições anti-históricas

Paulo Roberto de Almeida

Países ricos precisam, HOJE, pagar pela poluição que causaram, no PASSADO, para que países em desenvolvimento possam, AGORA, se desenvolver como eles? 

Ou seja, estes “precisam” se industrializar e, de certa forma, vão poluir ou destruir parte do meio ambiente, e para isso requerem ajuda dos ATUAIS países ricos.

Os atuais países ricos assim se tornaram APENAS por terem, no passado, poluído o meio ambiente, sem ter uma consciência exata sobre seus efeitos FUTUROS?

Isso é conceitualmente, historicamente, correto? Seria justo?

Seria como se se pretendesse obrigar os atuais italianos a pagarem uma suposta dívida histórica a povos colonizados (basicamente países do Hemisfério ocidental) com base na escravatura africana pelo fato do império romano ter praticado o regime escravo extensa e intensamente, mas não só a partir da África, e sim de povos eslavos (origem do nome), de fato todos os demais povos conquistados pelas legiões romanas.

Os atuais italianos concordam em pagar uma suposta “dívida histórica”, que aliás também teria de ser dividida com os demais escravocratas europeus e, principalmente, com os mercadores árabes, que foram extremamente ativos no nefando comércio?

Alguns, aqui no Brasil, pretendem que o ATUAL Banco do Brasil — uma empresa criada na REPÚBLICA — pague pelo escravismo praticado no passado por um Banco do Brasil, supostamente antecessor, mas que existiu APENAS no passado colonial, durante o Reino Unido e sob o Primeiro Reinado (1809-1829). 

Os atuais acionistas do BB concordam com essa suposta “dívida histórica”? Os imigrantes europeus e japoneses, que foram importados em certa medida para substituir os escravos africanos “libertados” na Abolição, se sentem responsáveis pela “dívida”?

Falta um pouco de perspectiva histórica aos que atualmente reivindicam resgate ou compensação por “erros” ou “crimes” de gerações passadas. 

Até quando recuar SELETIVAMENTE supostas culpas por males do passado?

Paulo Roberto Almeida

Brasília, 10/11/2024


Muro de Berlim: o retrato de uma época, de um mundo dividido - Paulo Roberto de Almeida

Muro de Berlim: o retrato de uma época, de um mundo dividido 

(continua dividido, não na economia, mas na política)


Paulo Roberto de Almeida


10 de novembro de 1989: estávamos ainda na Suíça, Carmen Lícia e eu, com nossos dois filhos, acompanhando por todos os canais de TV a derrocada do muro de Berlim (simbolicamente) em face da pressão da população da RDA por simples liberdade de movimento entre um lado e outro de uma “cortina de ferro” já esgarçada pelas iniciativas reformistas de Mikhail Gorbatchev, o burocrata russo que tentou salvar o comunismo soviético de si próprio. 

Não conseguiu, mas mereceu o Prêmio Nobel que lhe foi concedido mais tarde, por ter se recusado a reprimir pela força os impulsos liberalizantes dos povos dos países dominados e oprimidos pela até então totalitária URSS.

Francis Fukuyama já tinha publicado em junho de 1989 — ANTES, portanto, da “queda” do muro — seu famoso artigo sobre o “fim da História”, não premonitório, pois que nele sequer antevia o fim do comunismo ou o desaparecimento do império soviético,  apenas o fim das alternativas credíveis ou práticas às democracias de mercado.

Estava totalmente certo quanto aos sistemas de mercado — já em vigor na China de Deng desde 10 anos —, mas foi otimista demais quanto aos sistemas democráticos. 

A Rússia profunda NUNCA abandonou seus instintos totalitários, pois que Gorbachev, o estadista que tentou torná-la uma “democracia normal”, sempre foi odiado pela maioria da população, justamente por tentar mudar o sistema econômico, baseado num Estado supostamente protetor e garantidor da igualdade básica dos cidadãos. Nunca foi o caso, desde a origem bolchevique, uma contradição total no campo econômico, justamente, como visto por Mises desde 1919.

O “despotismo oriental” ainda triunfa no campo político, como visto pela estreita aliança entre as duas maiores autocracias do mundo contemporâneo, uma weberiana (burocraticamente racional), a outra apenas despótica, e na origem de uma nova divisão do mundo.

O novo “muro de Berlim” assumiu a forma de um agrupamento manipulado pelas duas grandes autocracias, o Brics+, que tenta seduzir incautos ou oportunistas do chamado Sul Global, uma construção puramente intelectual e tão diversa quanto o antigo “Terceiro Mundo”. 

As esquerdas, non variatur, apoiam a nova ficção, como antes apoiavam os poderes antidemocráticos da coalizão antiocidental, mais um sinal de que a democracia liberal não faz parte de seu universo mental no terreno político. Não por isso, as direitas fazem progressos em várias partes do mundo, mas seu universo mental tampouco se filia às democracias liberais, e sim a uma das variantes dos regimes autocráticos.

O novo “muro de Berlim” continuará dividindo o mundo por mais algumas décadas, e direitas e esquerdas seguirão, não coincidentemente, apoiando objetivos antiliberais. 

Erich Fromm, um frankfurteano escapado do nazismo, publicou um livro no qual examinava o “medo à liberdade” de muitos residentes dos sistemas liberais, mais uma evidência das contradições dos regimes de liberdades, que compreendem a esfera da política, mas têm dificuldades para concretizá-la na vertente econômica, o que já era uma dificuldade para o jovem Marx.

As soluções estatizantes nunca foram a resposta a essas contradições, mas os antiliberais à esquerda e à direita continuam tendo medo às liberdades econômicas, preferindo a suposta proteção do Estado. Bastiat, antes de Marx, já indicava ser o Estado a grande ilusão de pessoas que, economicamente, pretendem viver às custas de todos os demais.

Uma crença aparentemente inextinguível!

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 20/11/2024


The Berlin Wall Never Fell - Timothy Snyder

The Berlin Wall Never Fell

It Didn't

Thirty five years ago today, the Berlin Wall did not fall.

I realize that I am running against the torrent of anniversary remembrances here.  And no doubt you are thinking: he means this metaphorically; he means that some mental barrier remains between East and West, or perhaps between eastern and western Germany.

No, I mean that, quite literally, the Berlin Wall did not fall.  It did not fall thirty-five years ago today.  It never fell.  The "fall of the Berlin Wall" is a literary device, not a historical event. 

And that we have chosen a false image to stand for a moment of liberation reveals a problem.

But first, a reminder of what did happen.  At the time, East and West Germany were two different countries.  Berlin was a special island inside East Germany, itself divided between Western and Eastern parts.  A physical wall did indeed separate the two, built by the East German regime to keep their people in. 

In summer and autumn 1989, amidst Gorbachev's perestroika and reforms and gestures among neighboring communist countries, East Germans were finding ways to visit or to emigrate to West Germany.  The East German regime, in turmoil itself amid protests, was trying to formulate a new set of rules for the border.  Amidst a great deal of confusion, a regime spokesman seemed to announce, in response to a question by an Italian journalist, that the border posts at the wall would allow East Germans to depart for the West.

That was on November 9th, 1989.  The Berlin Wall did not topple over because of that press conference.  What happened was that tens of thousands of East Berliners took advantage of the pronouncement and crowded the border checkpoints, one of which eventually opened.  People rushed through to forbidden West Berlin, where they were greeted with champagne and flowers.  It was a night that changed the history of Germany, which would unify less than a year later.

But no wall actually fell.  People eventually clambered on it, and chipped off pieces of it (I have a few, somewhere).  People painted on ot for a while, which is why those concrete souvenirs are colorful. On New Year's Eve, 1989, David Hasselhoff played a concert over the Berlin Wall, in a crane.  The wall was of course still standing, because it had not fallen down. 

Words matter.  Pretty much everyone says "the fall of the Berlin Wall" as a shorthand for the "the end of communism in eastern Europe."  But something that never happened cannot be a source of an actual memory.  It cannot teach us, for example, how authoritarianism is resisted.

The image of a wall falling transforms a complicated history into a simple moment.  But when we embrace that image of something that never happened, we lose everything that we need to remember, everything that is human and interesting.

The opening of the checkpoint that night was an accident.  But it was an accident made possible by human action.  East Germans had chosen to leave their country.  They were protesting, and believed that they could protest in part because other people were doing so.  The largest and most effective protests were in neighboring Poland.  They went back to the foundation of a labor union, Solidarity, in 1980.  By November 1989, Poland had already formed a post-communist government.

And that of course is the Polish gripe with the whole "Berlin wall falling" story.  Poles will want you to know that Poland was more important than East Germany in the history of the end of communism.  And that is very true.  But the crucial thing to remember is what Poles did.  In the face of dictatorship they found concepts of cooperation and lived them.

The resistance to communism was a human story of cooperation.  Its dissidents stressed the need to work together.  Its most important organization was a union.  When a certain conjuncture emerged in 1989, it was these practices and traditions that allowed new political alternatives to emerge.  The human cooperation, called "civil society" at the time, was not enough in itself to change the world.  But when the world began to change in other ways, people were ready.  

When we imagine the Berlin Wall falling, as we will be summoned to do today, we are instructed that freedom is something that just happens.  The wall was up.  Bad.  And then it fell.  Good.  We think of freedom like that because it removes the responsibility from us.  And that is the wrong lesson, wrong historically and so wrong politically and morally.

Thirty five years ago today, the Berlin Wall did not fall. 

Thirty five years ago today, some people made history, amidst other people making history, thanks to some prior cooperation, and some good thinking about what freedom means.

We cannot change the world all at once.  But we can change the way we think.  We can clear away the clichés and make ourselves more lively.  We can work together and then, when other things are in motion, be ready to turn the change in the right direction. 

Moedas locais dos Brics e a desdolarização - Otaviano Canuto (Poder 360)


Moedas locais dos Brics e a desdolarização

Otaviano Canuto

Poder Global, 5/11/2024

https://www.cmacrodev.com/moedas-locais-dos-brics-e-a-desdolarizacao/

Na Cúpula de Kazan, na semana passada, reuniram-se, pela primeira vez, os líderes do BRICS ampliado. Um dos objetivos anunciados foi o de avançar no uso de suas moedas nacionais em vez do dólar para pagamentos transfronteiriços, algo introduzido na cúpula que expandiu os BRICS no ano passado na África do Sul. Com efeito, foram dados passos adicionais na direção dessa desdolarização, mas a Declaração de Kazan não avançou tanto quanto o anfitrião Putin provavelmente esperava ou desejava.

Além da China e demais membros do grupo, vários países têm buscado mecanismos alternativos de pagamentos externos que reduzam a necessidade de recorrer ao dólar dos EUA ou outras moedas conversíveis. Pares de países têm acordado liquidar transações comerciais e financeiras entre si em suas moedas locais, em geral mediante acordos bilaterais entre seus bancos centrais.

Há três funções cumpridas por moedas para além de fronteiras nacionais. Antes de tudo, servem como unidade de medida de valor para faturas comerciais e preços de ativos financeiros negociados. Cumprem também o papel de meio de troca: de efetuar pagamentos pelas transações comerciais e financeiras através de fronteiras. Por fim, servem para a formação de reservas, de acumulação de valores e riqueza no exterior.

As ações dos membros dos BRICS potencialmente dizem respeito à segunda função, ou seja, a função de efetuar pagamentos transfronteiriços. Cabe observar que, embora de uma perspectiva privada agentes em geral associem a segunda e a terceira funções, há no mínimo uma parcela das transações cujo pagamento pode ser determinado pelas autoridades públicas nacionais.

Que motivações pode haver para o uso de moedas locais em tais pagamentos? Uma óbvia é a vulnerabilidade em relação a sanções para fins geopolíticos pelos países emissores e destinos de reservas externas em suas moedas. Esse é o caso de Rússia, Irã e Venezuela, objetos de sanções no passado recente – com Rússia e Irã membros e Venezuela impedida pelo Brasil. Por razões geopolíticas, China e outros estão também buscando diminuir sua vulnerabilidade a potenciais sanções contra eles. Além disso, acrescenta-se o objetivo de aumentar o uso da moeda local em transações internacionais, por si só, como claramente ocorre com a China.

Pode-se apontar um eventual ganho para um país em termos de menores estoques de reservas em moedas plenamente conversíveis – dólar, euro, iene, libra esterlina – necessários para que bancos centrais assegurem a estabilidade em seus pagamentos transfronteiriços. Neste caso, porém, vale observar também um possível custo: em relações bilaterais nas quais um país seja sistematicamente superavitário – como atualmente, por exemplo, tende a ser o Brasil em relação à China – o superavitário tende a acumular reservas externas na moeda do país no lado deficitário, em vez de fazê-lo em alguma moeda plenamente conversível e generalizadamente aceita por outros agentes em mercados cambiais.

Basta que um lado imponha o uso de moeda local nos pagamentos para que, mesmo a contragosto, os agentes privados do outro tenham que aceitá-la para tornar possível a transação. Exportadores brasileiros, por exemplo, hoje em dia não encaram mais uma conversibilidade mandatória de suas receitas para a moeda brasileira e podem dispor de sua receita em dólares ou o que quiserem. Contudo, se os chineses exigirem pagar em sua moeda, os brasileiros não terão opção se quiserem lá vender.

renminbi (RMB) chinês tem sido a moeda com maior expansão de uso mediante acordos bilaterais de pagamentos externos. No ano passado o Banco Central chinês chegou a ter acordos bilaterais de criação de linhas de troca de moedas (currency swaps) com bancos centrais de 41 países – inclusive o Brasil -, num montante de US$ 480 bilhões e com o saldo de fundos acionados em tais linhas atingindo US$ 15,6 bilhões. A China também expandiu agências de compensação no exterior.

A China tem sido capaz de usar sua moeda para liquidar metade de suas transações externas de comércio e investimento. Além disso, o RMB tem sido ocasionalmente usado em transações bilaterais entre terceiros. Algumas refinarias da Índia compraram petróleo da Rússia pagando em RMB. A Argentina, por sua vez, recorreu no ano passado a sua linha bilateral com a China para efetuar pagamento de serviço de dívida com o FMI e evitar um calote com este.

Em Kazan, O BRICS Clear – uma estrutura de liquidação e depósito transfronteiriço projetada para negociar valores mobiliários sem a necessidade de conversões para o dólar, utilizando tecnologia blockchain e tokens digitais lastreados em moedas nacionais – não chegou a ser acordado. A ver como, nos detalhes, alguns membros dos BRICS – como os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita – farão questão de garantir a integridade de suas relações com o dólar. A iniciativa tende a favorecer principalmente o uso do renminbi e menos outras moedas domésticas

Ainda assim, o impulso dado pela Rússia e pela China – os dois potenciais beneficiários de um esforço de desdolarização, seja para evitar sanções ou para internacionalizar suas moedas – foi reconhecido na Declaração de Kazan, com um acordo para realizar uma análise de viabilidade do BRICS Clear.

Um Arranjo Contingente de Reservas dos BRICS também foi incluído na declaração, com o objetivo de incluir moedas alternativas elegíveis dos BRICS nas linhas de swap existentes entre os países do bloco. Vale notar que a maioria dessas linhas de swap foram estendidas pelo Banco Popular da China e, portanto, utilizam o renminbi como veículo monetário contra cada uma das moedas locais. Isso reforça a visão de que o BRICS está se consolidando como um modelo tendo a China como centro, com raios bilaterais com os demais.

Finalmente, para apoiar o uso de moedas locais em transações financeiras entre os países dos BRICS, será desenvolvido um novo Mecanismo de Cooperação Interbancária dos BRICS. O BRICS já havia instalado, em 2010, um Mecanismo de Cooperação Interbancária para facilitar pagamentos em moedas locais por bancos do grupo. Como esse mecanismo pode promover o uso de moedas locais sem ir diretamente ao BRICS Clear ainda precisará ser mostrado.

O uso crescente de moedas locais em pagamentos externos, nos BRICS ou fora deles, será parte do que já chamamos de “desdolarização devagar e limitada”. Como parcela das reservas globais, o dólar americano caiu de um pouco acima de 70% em 2000 para um pouco abaixo de 60% em 2022. Enquanto uma moeda local não for plenamente conversível, permanecendo sujeita a regulações restringindo a liquidez e a disponibilidade de ativos – como permanece sendo o renminbi – não cumprirá a função de reserva externa de valor para o grosso dos agentes na economia global.

Por outro lado, parece haver uma “fragmentação” parcial do sistema global de pagamentos em curso…


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