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segunda-feira, 26 de julho de 2021

A democracia morre no fim deste enredo - Míriam Leitão, O Globo

 Crônica de uma morte anunciada, a da democracia brasileira. Autores do crime: os milicos e o PR, mais algumas forças de PMs e eventuais lumpen-SS do bolsonarismo. 

Paulo Roberto de Almeida 

A democracia morre no fim deste enredo

Míriam Leitão, O Globo (25/07/2021)

O agressor da democracia não vai parar. É como o agressor da mulher que, após perdoado, volta a atacar e muitas vezes o fim é a morte da vítima. Quem me fez esse raciocínio foi uma autoridade da República. Todos os dias a democracia apanha do presidente Jair Bolsonaro. Os generais e os civis que o cercam reforçam suas atitudes ou tentam justificá-lo. Essa violência só vai parar no fim deste governo, mas deixará cicatrizes. Quando as instituições estão funcionando, ninguém precisa dizer em notas e declarações.

— O presidente fala uma coisa e na hora que aperta ele recua, igualzinho ao homem que agride mulher. O agressor recua, garante que a ama, algumas pessoas asseguram que ele vai mudar e a violência cresce. Um dia ele chegará com um revólver e vai matar a mulher. É dessa certeza que surgiu a Lei Maria da Penha — explicou a pessoa com quem eu conversei sobre as crescentes ameaças do presidente e dos generais que o seguem, da reserva ou da ativa, nessa mesma lógica de agredir e negar que agrediu, prenunciando outro ato que seja ainda mais forte.

Nesse último episódio, revelado pelo “Estadão”, o ministro da Defesa, Braga Netto, enviou um recado ao presidente da Câmara, Arthur Lira, com o seguinte teor: “a quem interessar, se não tiver eleição auditável não terá eleição.” Foi dentro de uma escalada de agressões. Tudo se passou entre os dias 7 e 8 de julho. A nota do ministro da Defesa e dos comandantes militares tentando coagir a CPI do Senado foi no dia 7. No dia 8, Bolsonaro afirmou que ou vai ter o voto impresso ou não vai ter eleição, o general Braga Netto mandou o mesmo recado golpista, e o comandante da Força Aérea deu uma entrevista ao GLOBO elevando o tom da ameaça contida na nota, sendo em seguida apoiado pelo comandante da Marinha. O atentado foi combinado. Eram instituições funcionando. Com o objetivo de destruir a democracia.

O roteiro que se seguiu era previsível. Vieram os desmentidos com palavras ambíguas, as afirmações de que a democracia vai bem, e novo ataque do presidente. A nota de Braga Netto repetiu a ingerência em assuntos sobre os quais as Forças Armadas não têm que se pronunciar, ao defender o voto impresso que eles apelidaram de “auditável”. A quem disse que o ministro da Defesa estava invadindo a esfera política, Bolsonaro respondeu. “Quando vejo algumas autoridades tuitarem que isso é uma questão política, que certas pessoas não devem se meter nisso, quero dizer a vocês que isso é uma questão de segurança nacional. Eleições são uma questão de segurança nacional”, disse o presidente fechando aquele dia de debate sobre o recado do general. Isso autoriza as intervenções militares no tema que o presidente elegeu como pretexto. Todo golpe autoritário inventa seu pretexto. Esse é o de Bolsonaro. O de Donald Trump foram as acusações mentirosas de fraude. Ao fim, os trumpistas invadiram o Capitólio.

O agressor da democracia brasileira instalou cúmplices em postos estratégicos. Braga Netto é da reserva, mas a carreira militar é usada para ele sempre falar escudado nas Forças Armadas. Os atuais comandantes assumiram com o mandato de mostrar que os militares defendem o projeto político de Bolsonaro. Foram escolhidos para apoiar o agressor. O general Luiz Eduardo Ramos quando foi para o governo era da ativa e estava no comando do II Exército. Ele fez parte do canal dessa bolsonarização dos militares. O Almirante Flavio Rocha, da SAE, está ainda na ativa. O projeto é deixar sempre a impressão de que as Forças Armadas vão agir para proteger Bolsonaro.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, e seus auxiliares diretos agiram várias vezes de forma contrária ao papel constitucional da PGR. O ministro André Mendonça teve atitudes e defendeu teses que feriam a Constituição. A Polícia Federal colocou seus documentos sob sigilo quando a publicidade tem que ser a regra numa República. Aras foi reconduzido, Mendonça foi indicado para a corte constitucional, um delegado da Polícia Federal é o ministro da Justiça. As agressões à democracia deixam cicatrizes. Algumas delas podem ser permanentes.

A democracia está sendo agredida. O agressor é o presidente da República. Ele tem ajudantes militares e civis. O maior risco é não ver o perigo, porque, como nos casos de violência contra a mulher, o fim pode ser a morte.

sábado, 24 de julho de 2021

Emiliano Mundrucu: como um Brasileiro Negro desafiou a segregação nos EUA, 190 anos atrás - Mariana Schreiber (BBC News Brasil)

 

The black immigrant who challenged US segregation - nearly 190 years ago

Mariana Schreiber
BBC News Brasil, in Brasília, 
24/07/2021

Artistic illustration of the Mundrucu family on the boat
In 1832, the Mundrucu family refused to be barred from an area exclusively for white people on the steamboat Telegraph

It was a cold, rainy day in November 1832 when Brazilian immigrant Emiliano Mundrucu boarded a steamboat - the Telegraph - with his wife Harriet and their one-year-old daughter Emiliana.

They were taking a business trip from the Massachusetts coast to Nantucket Island, in the northeast of the United States.

During the crossing, Harriett, who wasn't feeling well, tried to seek shelter with her daughter in an area of the ship exclusively for women, but their path was blocked. The reason? They were black, and only white women were allowed in the ladies' cabin, comfortable accommodation with private berths.

At that time, slavery was no longer allowed in northern states (it persisted until the Civil War in the US south), but segregationist practices separating whites from "coloured" people were growing. 

However, the Mundrucu family did not accept their exclusion and the episode led to a pioneering lawsuit against racial segregation in the United States - proceedings that were big news at the time, but were later forgotten and have only recently been rediscovered by historians.

The case went to court after Harriett insisted on entering the ladies' cabin with her child, while the captain of the boat, Edward Barker, argued with Mundrucu - a Brazilian revolutionary who fled to Boston after being sentenced to death for his role in an attempt to create a republic in northeastern Brazil in 1824.

"Your wife a'n't a lady. She is a n---er," Barker told Mundrucu.

1833 New York newspaper report announces Mundrucu's victory in the first court case
This 1833 report announces Mundrucu's victory in the first court case

The impasse was momentarily interrupted because a storm forced the boat to return to the coast. The next day, however, the couple once again tried to ensure Harriett and Emiliana travelled safely, instead of using the inferior cabin, where there were no berths and men and women had to sleep on mattresses on the wet floor.

Mundrucu argued that he had paid the most expensive fare for the trip, but the captain ordered the family to get off the vessel. The Brazilian declared that he would sue, promising to "go and get a writ out immediately".

This was the start of the lawsuit filed by Emiliano Mundrucu against Captain Edward Barker for breach of contract, in a case that received coverage on the front page of newspapers across the US, and which even made waves in Europe.

The little-known story is detailed in an article published in December by South African historian Lloyd Belton in the academic journal Slavery & Abolition. 

Belton studied Mundrucu's life for his master's degree at Columbia University in New York and is currently continuing his research studying for a PhD at the University of Leeds.

He says this lawsuit is the oldest known legal action against racial segregation in the United States. Before the discovery of this case, historians thought similar lawsuits had only begun a decade later.

"It is incredible that a black Brazilian immigrant was the first person in US history to challenge segregation in a courtroom." 

"And it is even more incredible that no-one knows who he is. In the 1830s in Boston, people knew who he was. In Brazil, in the 1830s, people knew who he was," Belton told BBC News Brasil.

An 1856 engraving showing a black man being expelled from a railway carriage
image copyrightLibrary of Congress
image captionSegregation policies were common in northern states before the Civil War - in this 1856 engraving a black man is expelled from a railway carriage

Also a researcher of the life of Emiliano Mundrucu, American historian Caitlin Fitz, a professor at Northwestern University, says that it was not just the Mundrucu lawsuit which was pioneering, so were the couple's actions on the boat. 

The well-known episode in which ex-slave Frederick Douglass, one of the most important black activists in American history, entered a whites-only wagon on a train in Massachusetts (he was forcibly removed) occurred in 1841, almost a decade later.

"It's not just the first known lawsuit against segregated transportation, it's also just a really bold radical step to put your body on the line, on board a ship," she points out.

A well-connected revolutionary in Boston

But how did a Brazilian and his African-American wife become pioneers in the struggle against segregation in the US? 

For the historians, the answer can be found in Mundrucu's unusual life story - he was a soldier and revolutionary who had spent time in Haiti and Gran Colombia (modern-day Venezuela) before settling in Boston, where he forged important links with abolitionist leaders.

For Belton, the fact that Mundrucu came from a country where he had more rights than free African Americans in the US, such as the right to vote or join the army, fuelled his indignation against the segregation that his family suffered.

In addition, his past as an international revolutionary was important in opening the doors in Boston to a network of important contacts, such as the abolitionist community and Freemasons.

Prominent lawyers represented him against Barker: renowned abolitionist David Lee Child and Massachusetts Senator Daniel Webster.

According to Prof Fitz, Mundrucu's case proved useful to anti-segregation activists because it reinforced their argument that racial oppression in the US was worse than anywhere else, although this statement was "very debatable", she finds. Brazil was the last country in the Americas to abolish slavery, in 1888. 

Prof Fitz believes Mundrucu's connections in Boston and the way the clash unfolded on board the Telegraph indicate that the action may have been premeditated.

"We sometimes assume that these acts of resistance were spontaneous, that Emiliano and Harriet just got angry. Maybe they were angry, but they were also strategic political thinkers who were thinking very carefully about the best way to bring about change," she says. 

Emiliano was the one who filed the lawsuit against the captain, but Prof Fitz highlights Harriet's role in the story.

"We don't know much about Harriet. She was an educated coloured woman born in Boston. We can infer that she was quite adventurous, because she married a Brazilian Catholic revolutionary who was still learning English. She was also incredibly brave and committed to fighting for racial equality, since she tried repeatedly to enter the ladies' cabin, putting her body on the line," she notes.

The impact of the lawsuit

1832 engraving of the boat The Telegraph
image copyrightEwen Collection
image captionThe boat in question, the Telegraph, can be seen in this 1832 engraving

The central argument of the case was "breach of contract", since Mundrucu had bought the most expensive ticket, but the Brazilian's lawyers "also wanted to expose the inhumanity of segregationist practices," writes Belton. 

"No lady on God's earth, no educated white person, would have been subject to such treatment. The Mundrucus' colour was their only distinction," said Webster, according to the lawsuit records.

Barker's lawyers countered by saying that segregation on steamboats was common practice on the North American coast, an argument reinforced with testimony from captains from New York and Rhode Island.

The jury found Barker guilty of breach of contract and awarded Mundrucu $125 in damages in October 1833. But the captain managed to overturn the decision in January 1834 in the Massachusetts Supreme Judicial Court, which found there was no evidence that Barker had explicitly agreed that the family would travel in the best cabins. 

After that, Belton notes, the Telegraph wrote racial segregation into its ticket policy, so that black people could only buy the cheapest tickets, to travel in the common cabin, while white people could only buy the most expensive ones. But this did not end the protests.

"One of the other broader impacts was that Mundrucu's defiance in 1833 directly inspired other black activists. There was another very famous African-American activist, David Ruggles, who did the exact same thing as Mundrucu on the same boat a few years later, in 1841," he notes.

According to Prof Fitz, the case led to a fundamental shift for campaigners.

"The lawsuit ends up being an important moment in the development of activists' legal tactics. It broadens their horizons and sort of opens the way for these more expansive legal arguments that attack the very legal basis of segregation itself," she says.

Views and customs of Rio de Janeiro - Sir Henry Chamberlain's watercolour shows the racial hierarchy of Brazilian society
image copyrightBrazilian National Library/1822
image caption
A watercolour painting showing the racial hierarchy of 19th Century Brazilian society

Mundrucu gave up on taking the case to the US Supreme Court when he was pardoned by the Brazilian government for his participation in the failed uprising and he was able to resume his military career in Brazil in 1835.

In 1841, however, he returned to Boston, when he was prevented from taking up a military command post in the northeastern city of Recife, which Mundrucu also attributed to racial prejudice in a newspaper article in 1837.

Mundrucu had many influential opponents in this area because he had allegedly led a failed attack on the white population of Recife in 1824, inspired by the Haitian Revolution - the rebellion of slaves and free blacks that made Haiti independent from France in 1791.

A leader in Boston's cosmopolitan abolitionist community

Painting in honor of Mundrucu made in 2020 by the artist Moisés Patrício for the book Black Encyclopedia
image copyrightMoisés Patrício/Companhia das Letras
A painting in honour of Mundrucu made in 2020 by the artist Moisés Patrício for the book Black Encyclopedia

In the final two decades of his life in Boston, the Brazilian continued campaigning against slavery and for civil rights.

Mundrucu died in 1863 after President Abraham Lincoln had signed the Emancipation Act, which freed slaves from the southern US states.

According to Belton, Mundrucu celebrated this announcement alongside Frederick Douglass, at a meeting of the Union Progressive Association, a predominantly black abolitionist group of which Mundrucu was vice-president.

"By 1863, Mundrucu and his wife were well-respected by their fellow Bostonians, black and white. Both were honoured in their respective obituaries, in which they were remembered as generous, public-spirited and unusually well-travelled," the historian writes. 

"Mundrucu's story shows us just how connected the Americas were at that time. Brazil was connected to Venezuela, Venezuela to Haiti, Haiti to the USA. These black activists were very mobile. They could travel, they could speak various languages," he notes.

"And he was not the only one. There were other black immigrants from South America, the Caribbean, who were in Boston, New York, or Philadelphia, and they were involved in these activist communities which were very cosmopolitan." 

More on this story

O Afeganistão derrotou o Império Britânico, a União Soviética e agora o Império Americano - Foreign Policy

Foreign Policy, July 24, 2021 

Leaving Afghanistan 
 
What happens to the country after the forever war ends?
 
 
 
 
 
 
“America’s greatest strategic disaster,” is how FP’s Michael Hirsh describes the United States’ war in Afghanistan, which after two decades is coming to an end with the withdrawal of US troops by Aug. 31. It didn’t have to be this way, Hirsh writes, quoting some military historians who believe the war was winnable. But as is, and even as Afghan forces regain some ground in a searing summer offensive, the Taliban is winning the propaganda war, affecting the morale of a “fearful population waiting for reassurance,” writes Lynne O’Donnell from Kabul.


Now you can find all of FP’s coverage on the war and what comes after—a refugee crisis, a new strategic corridor for China, a broader reshuffling of geopolitical alliances—in one place, with our “Leaving Afghanistan” portal. There you’ll find our latest reporting, as well as thematic analysis around important topics like peace negotiations, Afghanistan’s neighbors, women in Afghanistan and the prospect of a Taliban takeover. There are few stories more complex, and heartbreaking, than this one, and FP is committed to bringing you insights into all aspects of it.

Read selected highlights below:
 
 
 
 
 
 

Pompeo's plan to make peace with the resurgent Taliban is a sad reminder of all that went wrong in Afghanistan—and how it could have been otherwise.

 
 
 
 
 
 
 
Beijing has its eyes set on using Afghanistan as a strategic corridor once U.S. troops are out of the way.
 
 
 
 
 
 
 
Afghanistan’s foreign minister on what may await his country after the U.S. withdrawal.
 
 
 
 
 
 
 
Nineteen years ago, the United States began its war in Afghanistan. What is it leaving behind?
 
 

quinta-feira, 22 de julho de 2021

O que esperar da diplomacia para o século 21? - Felipe Estre (UOL) - Paulo Roberto de Almeida

Este acadêmico, aparentemente mal informado, escreve isto ao final de seu artigo: 

Sob a estrutura vigente, opaca e autocentrada, o silêncio dos funcionários do Ministério face à destruição promovida por Ernesto Araújo não foi surpreendente: era esperado. A resistência, onde possível, partiu da sociedade civil; somente muito adiante o Senado se posicionou.

Ele parece ignorar que eu, diplomata da ativa, me pronunciei contra os novos bárbaros que tomaram o Brasil de assalto desde as eleições de 2018, e já em 2019 eu começava uma série de livros de um ciclo (infeliz, pois não deveria existir) que eu chamei de "bolsolavismo diplomático", acusando e atacando a destruição da diplomacia pelos aloprados ineptos em torno do presidente ignorante, e sobretudo pelas mãos e pés de seu capacho de estimação, o chanceler acidental. Foram dois anos e meio de intensas publicações neste meu quilombo de resistência intelectual, o Diplomatizzando, depois recolhidos em livros, vários dos quais livremente disponíveis, e que relaciono a seguir: 

Miséria da diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty (Brasília: Edição do autor, 2019, 184 p., ISBN: 978-65-901103-0-5). Livremente disponível na plataforma Academia.edu e em Research Gate.

Miséria da diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty (Boa Vista: Editora da UFRR, 2019, 165 p., Coleção “Comunicação e Políticas Públicas vol. 42; ISBN: 978-85-8288-201-6 (livro impresso); ISBN: 978-85-8288-202-3 (livro eletrônico); disponível nos links da Editora da UFRR e aqui;  e no site do Google books. Incorporado à plataforma Academia.edu e a Research Gate.

O Itamaraty num labirinto de sombras: ensaios de política externa e de diplomacia brasileira (Brasília: Diplomatizzando, 2020, 204 p.; Edição Kindle, 1302 KB; ASIN: B08B17X5C1; ISBN: 978-65-00-05968-7; disponível na Amazon. Apresentação no blog Diplomatizzando

Uma certa ideia do Itamaraty: a reconstrução da política externa e a restauração da diplomacia brasileira (Brasília: Diplomatizzando, 2020, 169 p.) Anunciado no blog Diplomatizzando. Livremente disponível em Academia.edu

O Itamaraty Sequestrado: a destruição da diplomacia pelo bolsolavismo2018-2021

(Brasília, 13 maio 2021, 114 p.; ISBN: 978-65-00-22215-9; Formato Kindle, ASIN: B094V28NGD; 927 KB). Divulgado no blog Diplomatizzando, com sumário, dedicatória e prefácio (8/05/2021); disponível na Amazon.com.br (link).

 E ainda tem este que está sendo editado para publicação: 

Apogeu e demolição da política externa: itinerários da diplomacia brasileira (Brasília, 29 março 2021, 263 p.) Apresentação geral no blog Diplomatizzando (3/06/2021). 

Sumários de todos os livros do ciclo do bolsolavismo diplomático, postado no blog Diplomatizzando (9/05/2021).

Paulo Roberto de Almeida


Opinião

O que esperar da diplomacia para o século 21?

O que esperar da diplomacia para o século 21?... - Veja mais em https://noticias.uol.com.br/colunas/democracia-e-diplomacia/2021/07/21/o-que-esperar-da-diplomacia-para-o-seculo-21.htm?cmpid=copiaecola
Democracia e Diplomacia, Colunista do UOL

21/07/2021 14h31 

Por Felipe Estre*

Em fins do século 19, às margens do rio Nilo, moradores locais encontraram curiosas placas de argila nas ruínas da antiga cidade egípcia de Amarna. Assim que chegaram em mercados de antiguidade, as placas chamaram a atenção de arqueólogos, que rapidamente iniciaram escavações na região.

Os mais de 300 itens então encontrados, datados entre 1350-1330 a.C., tornaram-se uma das mais importantes descobertas daquele século: condensam enorme riqueza de informações sobre as relações entre o Reino do Egito e seus vizinhos.

Esse verdadeiro "Departamento de Correspondência do Faraó" é um registro até pouco ignorado, mas inestimável para as relações internacionais: as placas condensam mais de 300 correspondências diplomáticas, que permitem conhecer com riqueza de detalhes a dinâmica política do Oriente Próximo. São o primeiro registro conhecido do que poderíamos chamar de diplomacia.

O que chamamos de diplomacia moderna, contudo, é uma invenção bem mais recente. Suas origens podem ser identificadas na Península Itálica, ao final do século 15. A enorme insegurança das cidades-estado italianas —ricas, porém pouco protegidas— tornou imperativa a constituição de uma rede ágil e contínua de comunicação. A proximidade das cidades, que compartilhavam o mesmo idioma e religião, mostrou-se o local ideal para o nascimento das primeiras embaixadas permanentes.

O próximo passo na evolução da diplomacia moderna pode ser encontrado na França do século 16. Em 1589, o Rei Henrique 3º atribuiu ao seu secretário Louis de Revol a responsabilidade por concentrar as relações da França com as demais entidades políticas. Está aí o embrião do Ministério das Relações Exteriores. Contudo, nos tempos de Richelieu, essa era uma atribuição pessoal, em nada se parecendo com uma burocracia nos moldes atuais. Será apenas no início do século 18, nos anos finais do reinado de Luís 14, que será formada uma estrutura mais especializada, responsável pela abundante correspondência diplomática entre a França, grande poder da época, e os demais estados.

Em meados do século 18, a maioria dos estados europeus já possuía estrutura semelhante. A Secretaria de Negócios Estrangeiros de Portugal foi criada em 1736; o Foreign Office Britânico foi dos últimos a surgir, em 1782; nos Estados Unidos, nasce em 1789 o Departamento de Estado; nas décadas seguintes, China, Japão, Turquia seguem o modelo. O Brasil herdou de Portugal essa estrutura. Contudo, ela em nada se parecia com o Itamaraty dos dias de hoje.

Até fins do século 19, os Ministérios das Relações Exteriores eram estruturas bastante reduzidas e pouco burocratizadas. Além disso, havia rígida separação —não apenas funcional, mas também socia— entre os funcionários do ministério no país e os diplomatas servindo no exterior. Os primeiros eram servidores públicos que lidavam essencialmente com a correspondência externa. Já os diplomatas eram membros da elite que compartilhavam de um ethos aristocrático, financiavam com recursos próprios suas moradias no exterior, e muitos passavam anos sem retornar ao país de origem.

Era também comum que os representantes no exterior fossem divididos entre o serviço diplomático e o consular. A depender do tamanho do estado, havia até mesmo um serviço comercial especializado.

Apenas no início do século 20 as instituições como as que hoje identificamos como Ministérios das Relações Exteriores de fato começam a se formar. Em 1904, a Noruega destaca-se como pioneira na modernização ao juntar na mesma estrutura os funcionários do estado e os diplomatas no exterior. Mais do que isso, começa a haver um movimento de afastamento do modelo personalista de lidar com negócios estrangeiros em direção a uma burocratização. Interessante notar que, não obstante seus méritos, o Barão do Rio Branco promove no Brasil movimento contrário a essa inovação administrativa ao imprimir ao Itamaraty sua liderança personalista e carismática. Será apenas na década de 1930 que o Brasil promoverá essa fusão.

Se a primeira metade do século 20 promove os últimos ajustes estruturais à diplomacia moderna, a criação da Organização das Nações Unidas em 1945 promove sua pluralização temática ao impulsionar decisivamente a diplomacia multilateral. Grandes conferências, grandes convenções, grandes negociações tornam-se atividade corriqueira, exigindo franca expansão da burocracia diplomática. A agenda diversifica-se: meio ambiente, direitos humanos, imigração, cooperação, cultura, comércio. Ainda que a primeira organização internacional - a União Internacional de Telecomunicações - tenha sido criada em 1865, houve aumento exponencial na quantidade desse tipo de instituição desde meados do século 20. A diplomacia não fica para trás, e os Ministérios das Relações Exteriores diversificam-se e especializam-se. A seleção torna-se mais exigente, e há constantes treinamentos ao longo da carreira. Departamentos regionais e seções temáticos são criados.

Desde o fim da Guerra Fria, o que se vê é uma intensificação das tendências identificadas. O descongelamento da política internacional pluraliza ainda mais a agenda e mais instituições são criadas, como a Organização Mundial do Comércio e o Mercosul. A isso, soma-se a intensificação da globalização e aceleração de inovações em transporte e comunicações. Cada vez mais atores participam da política internacional: governos municipais e estaduais, organizações não governamentais, empresas transnacionais. Não mais se pode pensar em diplomacia como atividade exclusiva de estados e de seus Ministérios das Relações Exteriores. A chamada "paradiplomacia", para bem e para mal, está aí para ficar.

O que se vê globalmente é um esforço de adaptação dos Ministérios das Relações Exteriores às tendências do século 21. Aos diplomatas generalistas, somam-se especialistas. Os processos de seleção permanecem rígidos, mas há esforço de ampliação e diversificação, promovendo seleção de mais mulheres e membros de minorias. Se, antigamente, os Ministérios dos Negócios Estrangeiros buscavam ser "leões de chácara", preservando as fronteiras do internacional, esforços de controle dos fluxos transnacionais hoje mostram-se não apenas infrutíferos, mas contraproducentes. A tendência global é que essas instituições atuem menos como protagonistas, mas como coordenadoras e facilitadoras das relações internacionais. A diplomacia do século 21 é mais diversa, mais descentralizada e mais cooperativa.

Se, como dizia Azeredo da Silveira, "a melhor tradição do Itamaraty é saber renovar-se", é imperativo que o ministério do século 21 assuma papéis de facilitação, ampliando esforços de coordenação e cooperação com os demais entre federados, com outros ministérios, universidades, centros de reflexão em políticas públicas e associações civis. Para isso, será preciso maior grau de abertura, caso contrário a inércia prevalecerá. Não nos esqueçamos de que diplomatas são, antes de tudo, burocratas.

Sob a estrutura vigente, opaca e autocentrada, o silêncio dos funcionários do Ministério face à destruição promovida por Ernesto Araújo não foi surpreendente: era esperado. A resistência, onde possível, partiu da sociedade civil; somente muito adiante o Senado se posicionou. Parece seguro dizer que, tornando mais porosa e democrática a diplomacia brasileira, melhor protegeremos seu acumulado histórico e mais equipada estará para contribuir com os novos e diferenciados atores e desafios das relações internacionais contemporâneas.

* Felipe Estre é doutorando em relações internacionais pela USP e King's College London e pesquisador da Rede de Segurança e Defesa da América Latina (Resdal)


quarta-feira, 21 de julho de 2021

Pierre Salama, brasilianista francês, publica novo livro, sobre a pandemia na América Latina

 Caras amigas, caros amigos


Gostaria de anunciar que a tradução do meu livro sobre a pandemia na América Latina será publicada nos próximos dias pela editora Contracorrente.Escrevi-o há apenas um ano e acrescentei um posfacio bastante longa sobre o que a gestão da pandemia no Brasil nos pode ensinar.
Coloco abaixo o “flyer” para obter o livro.

pré-venda do livro no site da Contracorrente: https://loja-editoracontracorrente.com.br/produto/contagio-viral-contagio-economico-e-riscos-politicos-na-america-latina/

Gostaria de lhe o ter oferecido mas, infelizmente, é impossível. 
Este correio é colectivo. Lamento, mas prometo escrever-lhe pessoalmente se fizer algum comentário sobre o conteúdo deste livro, que é muito importante para mim e que estou feliz por ter publicado em espanhol e hoje em português.
Se estiver interessado no livro, que espero que esteja, não hesite em contar aos seus amigos sobre ele.
Obrigado.
Seu amigo Pierre

Apresentação:

A pandemia está em curso na América Latina. No Brasil, o número oficial de mortos está próximo dos 500.000 no final de Maio.

No momento de escrever este livro, entre março e junho de 2020, ela ainda parecia distante, e seu pico ainda não parecia ter sido alcançado no Peru, México e Brasil, já fortemente impactados. Você pode se perguntar por que não esperar para escrever este livro, e alguns de meus amigos me fizeram essa pergunta. É um pouco perigoso embarcar nesta análise quando a história ainda não foi escrita. É sempre mais fácil contar quando você a conhece. No que me diz respeito, sou daqueles que não pensam que a História segue um caminho inevitável, sempre há bifurcações possíveis de ordem econômica e ou política e, por isso, prefiro me antecipar, sob pena de errar, em vez de me situar depois. Parafraseando Marx: “Os homens fazem livremente a sua História, mas sob condições que não são livremente decididas por eles”. Em outras palavras, existe uma margem entre idealismo e determinismo. A História que está sendo feita é fruto deste idealismo dos Homens, da sua vontade e do determinismo das leis econômicas. Nenhum desses pode ser ignorado, a menos que mergulhemos no idealismo puro ou no determinismo vulgar. É esta margem que me interessa e que é fascinante e, acima de tudo, que pode ser útil para quem pensa que a partir de uma análise aprofundada podemos tanto atuar sobre o curso dos acontecimentos, quanto nos preparar para enfrentar uma repetição da pandemia ou o aparecimento de um novo vírus.

A pandemia atuou como um indicador das fraquezas de um sistema. Todas as fraquezas e novas dependências foram pontilhadas com a hiperglobalização. Não foi a globalização que produziu a pandemia, embora tenha contribuído para ela com o sofrimento causado à Natureza e o surgimento de novos vírus. O vírus SARS-CoV-2 agiu sobre um “corpo já doente” na América Latina. Ele já estava doente? A resposta infelizmente é positiva. Desde o final dos anos 1980, a famosa "década perdida" para a América Latina, a taxa de crescimento do PIB per capita em média tem sido mais do que modesta, na maioria das vezes inferior a 1%. Em contraste com muitas economias asiáticas, que experimentaram seu “milagre” econômico com a ajuda de um estado desenvolvimentista nos últimos quarenta anos, uma tendência de estagnação econômica se enraizou na América Latina, em contraste com o boom observado nessa região no período que foi do pós-guerra até os anos 1970.

Com a pandemia, um novo período está se abrindo. Não será mais possível reatar com o passado como se nada tivesse acontecido. Porém, no futuro imediato, existe um grande risco de retorno às velhas políticas econômicas, com exceção, no entanto, de algumas medidas destinadas à realocação industrial estratégica. A pandemia derrubou dogmas econômicos. É provável, todavia, que eles voltarão à vida após esse parêntese intervencionista ultra-keynesiano. É também possível que, com uma mudança de presidência e a chegada de Lula ao jogo político, tanto as perspectivas sociais como econômicas sejam diferentes. Do ponto de vista social e do ponto de vista econômico, o futuro pode ser diferente com uma nova presidência, desde que o governo tenha aprendido com os erros do passado, e procure estimular tanto uma reindustrialização como um esforço substancial na investigação.

Entao, agora, desfrute da sua leitura; pré-venda do livro no site da Contracorrente: 

 https://loja-editoracontracorrente.com.br/produto/contagio-viral-contagio-economico-e-riscos-politicos-na-america-latina/

Derniers livres parus en 2020: *

Contagion virale, contagion économique, risques politiques en Amérique latine, aux éditions du Croquant, publié en espagnol, édition ALAS-CLACSO (disponible gratuitement sur le site de Clacso), publié en portugais par Contracorrente

L’économie de l’Amérique latine, avec Mylène Gaulard aux éditions Breal

MA PAGE (ancienne) : htpp://perso.wanadoo.fr/pierre.salama/ mes articles en français, espagnol, portugais, quelques uns en anglais sont gratuitement disponibles ainsi que certains de mes livres


Celso Lafer na ABL faz discurso crítico ao presidente da República - Lauro Jardim (O Globo)

Recebido de um amigo: 

"Celso Lafer hoje na venerável Academia Brasileira de Letras (ABL) colocou o dedo na ferida: chega de tanta ignorância. Ninguém nem com um mínimo de neurônios é capaz de aguentar tanto obscurantismo e narrativa imbecil por tanto tempo. O País precisa sair dessa era das trevas e do negacionismo tacanho que deitou raizes por aqui com os arrivistas desse bolsonarismo sem eira nem beira."

Eis o artigo de Lauro Jardim, no Globo desta quarta-feira, 21/07/2021


Orador da solenidade (virtual) que comemorou os 124 anos da Academia Brasileira de Letras, terminada há pouco, Celso Lafer fez um discurso de tom político inédito da história da entidade.
O chanceler dos governos Collor e FHC fez críticas acerbas a Jair Bolsonaro, "sua postura negacionista" e suas "omissões". Ressaltou a falta de decoro do presidente e afirmou que as palavras de Bolsonaro dividem o país.
Eis alguns trechos da fala de Lafer:
* (...)Daí a inconformidade com este estado lamentável das coisas em nosso país provenientes da postura negacionista do Presidente e de seu governo quanto ao papel da ciência e do conhecimento no enfrentamento da crise do coronavírus, que aprofunda um “mundo às avessas”.
*"O negacionismo se expressa por ações e omissões. São agravados pelas palavras do Presidente. Estas ignoram o proceder com a dignidade e o decoro do cargo, que é o “standard” de conduta presidencial lícita, prevista na lei 1.079 de 10 de abril de 1950. (...). Decoro, que como dignidade, provém do latim decet, o que convém, o que é apropriado, manifesta-se pela compostura no exercício da função pública.
Nem uma nem outra encontram-se nas palavras de ruptura e de improvisações mal concebidas do Presidente, que alimentam a insegurança, correm a confiança e dividem o país.
*"Não atendem ao papel que se espera de liderança que é o de definir construtivamente rumos para a sociedade. É incompatível com o zelo que deve presidir as políticas públicas de saúde numa situação-limite como a da pandemia".
*"Ensina o Pe. Antonio Vieira: “O verdadeiro zelo teme o perigo e trata dos remédios”, advertindo que “O maior perigo não é quando se teme o perigo, é quando se teme o remédio”. Os remédios são aqueles que o estágio atual do conhecimento e da ciência, validados pelos pesquisadores nacionais e internacionais indicam em matéria de contenção e mitigação dos riscos da pandemia. Entre eles, vacinas e o seu papel imunizador, máscaras, isolamento social, administração da sobrecarga dos cuidados hospitalares a serem implantados sem atropelos e desvios de qualquer natureza e sem o ímpeto desagregador das competências concorrentes da União, dos Estados e dos Municípios".