A largada para o pré-sal
Editorial - O Estado de S.Paulo
04 de setembro de 2010
As ações da Petrobrás subiram vigorosamente ontem, depois de anunciados os detalhes da capitalização da empresa. Se o entusiasmo dos investidores se mantiver nas próximas semanas, a empresa poderá realizar sem dificuldade a maior oferta de ações da história. Serão lançados 2,174 bilhões de ações ordinárias e 1,586 bilhão de preferenciais, mais um lote adicional e um suplementar já planejados, se a fome do mercado for muito grande. A corrida aos papéis, logo depois de conhecido o prospecto preliminar da operação, pode ser atribuída a mais de um fator.
Só neste ano a estatal perdeu cerca de 30% de valor de mercado, por causa das incertezas quanto à capitalização e aos planos de exploração do pré-sal. Eliminada boa parte das dúvidas, alguma recuperação deveria ocorrer e todos sabiam disso. Em segundo lugar, pode ser bom negócio reforçar a carteira antes da nova emissão. Em terceiro, pelo menos parte do público pode estar de fato animada com as possibilidades de ganho a longo prazo. Mas só nas próximas semanas será possível avaliar com alguma segurança a disposição da grande massa de minoritários.
O retorno de 8,83% estimado para a exploração dos 5 bilhões de barris cedidos à empresa pela União foi considerado baixo por investidores. O resultado efetivo poderá ser melhor, quando ocorrerem "ganhos de sinergia" e integração com outras áreas exploradas, disse o presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli. Mas as perspectivas mais otimistas são, obviamente, para longo prazo. A taxa interna de retorno por enquanto prevista praticamente empata com o custo de capital da empresa, esclareceu o executivo.
Os investidores também levarão em conta o preço efetivo de lançamento dos papéis. Esse preço será fechado no dia 23, depois de encerrado o registro das intenções de compra. Até essa data, segundo alertou uma corretora, as cotações poderão oscilar, "em virtude do rearranjo de posições e expectativas".
Mesmo com a divulgação do prospecto, sobraram dúvidas importantes e motivos de inquietação para os investidores. A fixação do preço médio dos 5 bilhões de barris cedidos pela União à Petrobrás continua mal explicada. O valor de US$ 8,51 por barril foi apresentado, oficialmente, como a média ponderada dos valores atribuídos a produtos de vários campos. Mas esse preço, por uma notável coincidência, corresponde quase precisamente à média entre os valores extremos - muito diferentes - sugeridos por duas consultorias, uma contratada pela Petrobrás, outra, pela Agência Nacional do Petróleo (ANP).
Mal explicada, também, continua a seleção dos campos oferecidos à Petrobrás. Inicialmente se falava de um. Finalmente foram oferecidos sete campos, mas só depois de divulgadas pela imprensa as dúvidas sobre o potencial produtivo do primeiro. Ainda não há segurança, porém, sobre o assunto, porque só um poço foi perfurado em todas essas áreas. Mas isso não é problema, de acordo com Gabrielli: se não forem achados os 5 bilhões de barris, a Petrobrás será indenizada.
Acionistas privados criticaram o valor médio proposto para os barris cedidos pela União. É muito alto, segundo eles, e por isso os minoritários terão de aplicar muito dinheiro para manter sua participação. O governo não terá desembolso. Poderá antecipar sua contribuição por meio da emissão de títulos.
Há a possibilidade, portanto, de um aumento da participação estatal na Petrobrás. Essa hipótese é mencionada no prospecto. A União detém 55,66% das ações ordinárias - isto é, do capital com direito a voto - e sua fatia poderá aumentar para 57,33%, se os minoritários não quiserem ou não puderem acompanhar toda a capitalização.
Mas o dado mais inquietante é a evidente politização do tema. Desde o início, a política do pré-sal foi subordinada não só a critérios ideológicos, mas principalmente às concepções de governo e ao projeto de poder de um grupo. A conversão da Petrobrás em instrumento de política industrial é parte desse projeto. O cumprimento das metas de nacionalização dos equipamentos e materiais será gradual. Mas isso não elimina o risco de ineficiência e de custos adicionais na exploração e na produção.
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