De vez em quando, homens (mulheres também) cometem enormes bobagens, desastres que se revelam incomensuráveis. A expulsão dos judeus da península ibérica -- 1492 da Espanha, 1503 de Portugal -- foi uma dessas bobagens enormes que causaram um atraso secular -- vários séculos -- em termos de atraso, perda de capital humano e isolamento cultural e comercial.
O "grande salto para a frente" -- que provocou 25 a 30 milhões de mortos -- e a "revolução cultural" -- que simplesmente destruiu a educação na China, e pode ter provocado alguns poucos milhões de mortos -- ambas provocadas, sustentadas e estimuladas por esse grande tirano megalomaníaco que foi Mao Tsé-tung devem ter representado um desastre de proporções inimagináveis para a China.
Nenhuma família chinesa ficou imune a uma ou a outra. Tragédias fabulosas, se ouso dizer.
Paulo Roberto de Almeida
Calendário Histórico
1969: Termina a Revolução Cultural na China
Deutsche Welle, 27 de abril de 2011
No dia 27 de abril de 1969, seguindo as ordens de Mao Tse-tung, o Exército chinês dissolveu as Guardas Vermelhas.
Mao Tse-tung em 1966, no início da Revolução Cultural
A Revolução Cultural da China nasceu de um estrondoso fracasso do líder Mao Tse-tung. Com a campanha do Grande Salto para a Frente (1958-1960), ele pretendia industrializar a China em tempo recorde e, simultaneamente, construir a sociedade igualitária preconizada pelo comunismo.
Ele obrigou os camponeses a se juntarem em gigantescas comunas agrícolas e instalou siderúrgicas de tecnologia rudimentar por todo o país. Mas o único resultado da campanha foi a desorganização total da economia. Milhões de agricultores morreram de fome.
No dia 27 de abril de 1969, seguindo as ordens de Mao, o Exército chinês dissolveu as Guardas Vermelhas, que levaram a China praticamente à anarquia durante a Revolução Cultural. Oficialmente, o número de mortos durante a Revolução Cultural foi de 34 mil, embora muitos acreditem que, na realidade, houve milhões de vítimas.
Ostracismo e contra-ofensiva de Mao
O desastre do "grande salto" condenara Mao ao ostracismo. O Partido Comunista Chinês afastou-o da condução dos assuntos internos do país, mas ele continuou comandando a política externa.
Em 16 de maio de 1966, advertiu num documento interno que o PCCh estava repleto de revisionistas capazes de, a qualquer momento, instaurar o capitalismo na China. Começava assim sua audaciosa contra-ofensiva para recuperar prestígio, mergulhando o país na chamada Grande Revolução Cultural Proletária.
A revolução mobilizou os estudantes de Pequim e, em pouco tempo, alastrou-se por toda a China. Principalmente a juventude era estimulada a se rebelar contra o "elitismo, revisionismo e a mentalidade burguesa". As consequências foram dramáticas: filhos denunciavam os pais, estudantes agrediam seus professores e forçavam à suspensão das aulas, chefes torturavam seus subordinados.
Perseguições políticas
Cerca de 20 milhões de colegiais e universitários, liderados por Jiang Qing, a mulher de Mao, formaram as Guardas Vermelhas e iniciaram uma onda de perseguições políticas. Intelectuais e líderes do PCCh foram espancados, presos e, em muitos casos, mortos.
Um dos ilustres perseguidos, por exemplo, foi Deng Xiaoping, o dirigente que, depois de enfrentar o exílio interno, voltou ao poder nos anos 70 e arquitetou a revolução capitalista responsável pelo crescimento atual da economia chinesa.
Paralelamente à perseguição política, o movimento promoveu uma faxina cultural. Os "guardas vermelhos" destruíam templos e outros vestígios do "passado feudal", queimavam livros que não tivessem conteúdo revolucionário. A peça Romeu e Julieta, de Shakespeare, por exemplo, era considerada incompatível com o sonhado "paraíso proletário". Mao usou a juventude também para levar ao extremo o culto à personalidade, promovendo marchas colossais em sua própria homenagem.
"Dez anos perdidos"
O "Grande Timoneiro", no entanto, logo perdeu o controle do movimento. Seguiram-se dez anos de turbulências que paralisaram o sistema educacional e abateram a economia. "Foram anos de injustiça, humilhações e sofrimento sem fim", resume o escritor Ba Jin. Os excessos dos "guardas vermelhos" levaram o exército a intervir, já em 1969, com o apoio de Mao. Era, na prática, o fim da Revolução Cultural.
Hoje, o governo comunista se refere à Grande Revolução Cultural e Proletária como "dez anos perdidos". A principal preocupação de Mao não era salvar a ideologia do proletariado. Sabe-se que ele arquitetou o movimento para se livrar de rivais políticos e consolidar seu poder. Seus maiores rivais eram dirigentes da ala moderada do PCCh, como Deng Xiaoping, que defendiam a "liberalização da economia".
Possuído pelo poder, Mao eliminou 12 dos 23 membros incômodos no politburo. A Revolução Cultural pareceu um golpe de Estado. No fim, o próprio Mao viu-se obrigado a acabar com o movimento, ordenando a dissolução das Guardas Vermelhas.
A decisão de extingui-las foi aprovada no nono Congresso do Partido Comunista, a 27 de abril de 1969, marcando formalmente o fim da Revolução Cultural. O país, porém, só voltou à normalidade em 1976, com a morte de Mao. Hoje o governo chinês procura ignorar o aniversário da revolução, para não arranhar a imagem do "Grande Timoneiro" Mao Tse-tung.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentários são sempre bem-vindos, desde que se refiram ao objeto mesmo da postagem, de preferência identificados. Propagandas ou mensagens agressivas serão sumariamente eliminadas. Outras questões podem ser encaminhadas através de meu site (www.pralmeida.org). Formule seus comentários em linguagem concisa, objetiva, em um Português aceitável para os padrões da língua coloquial.
A confirmação manual dos comentários é necessária, tendo em vista o grande número de junks e spams recebidos.