Há coisas que se leem nos jornais e que passam despercebidas porque essas declarações têm como objetivo fazer o bem, ajudar outros países e setores, mas, na prática, partem de uma lógica equivocada.
(1) Precisamos criar rapidamente o Banco Sul para ajudar a Argentina que não tem um banco de desenvolvimento.
Os argentinos se queixam de que linhas de financiamento, como o Finame, do BNDES, dão vantagens para as companhias brasileiras no continente. Está fora de questão, até por motivos legais, estender o Finame aos vizinhos, mas o fundo no Banco do Sul poderá reduzir o desconforto na Argentina, acredita o assessor do Planalto (O Ministro Marco Aurélio Garcia) .” (Do Valor Econômico, 14 de dezembro de 2011)
O Ministro Marco Aurélio Garcia declarou em matéria recente no Valor Econômico que, dada a impossibilidade de utilizar o BNDES para financiar empresas estrangeiras fora do Brasil, que “pensamos em criar no Banco do Sul uma espécie de fundo especial para ajudar a Argentina nessas questões”, disse Garcia, que prefere não dar detalhes, por envolverem “tecnicalidades”.
O Banco Sul ainda está para ser criado com capital de US$ 7 bilhões e o Brasil deverá colocar entre US$ 1 bilhão e US$ 2 bilhões neste banco. Mas essa preocupação especifica com a Argentina não faz sentido.
Deveríamos ensinar a Argentina como criar o seu próprio banco de desenvolvimento que é simples: cria-se um novo imposto para financiar as operações desse banco e/ou aumenta-se a dívida para emprestar recursos para esse banco. Mas se a Argentina quer ter um banco de desenvolvimento sem aumentar impostos e sem aumentar a dívida, nesse caso, são eles que precisam nos ensinar como fazer tal mágica.
(2) “A indústria brasileira precisa das mesmas condições de competitividade das empresas na China”
Li hoje no valor que um grupo de empresários de associações empresariais diferentes serão recebidos pelo Ministro da Fazenda. Da forma que a matéria foi escrita me veio à mente o filme “O Poderoso Chefão” com aquela fila grande de pessoas pedindo favores ao Don Corlleone, que deveria arbitrar a quem entender e de que forma atender a esses pedidos. Olhem o primeiro parágrafo da matéria e vejam se eu não tenho razão:
“A expectativa dos empresários do setor industrial que vão se reunir hoje em São Paulo com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, é não sair do encontro de mãos vazias. Apesar de o objetivo da reunião ser apresentar um balanço do ano, os industriais se preparam para colocar na mesa suas reivindicações e esperam que algumas delas sejam atendidas. Os pedidos “natalinos” dos setores variam de desoneração tributária à crédito para o consumo de bens. (Valor Econômico, 15/12/2011: Perto do Natal, indústria espera ‘presentes’ de Mantega)”
Mas o que mais me chamou atenção foi a seguinte afirmação do presidente da Abit: “O que o setor quer é uma condição igualitária de competição com a China. A gente não pode deixar que os subsídios internos que eles têm destruam empregos no Brasil”.
Os empresários no Brasil têm que entender uma realidade dura. Eles jamais terão a mesma condição de competitividade de uma empresa na China porque Brasil e China adotam modelos diferentes de crescimento. Na China, as politicas sociais são limitadas e, consequentemente, a carga tributária é baixa: menos de 20% do PIB. Ademais, como o governo gasta pouco com transferências para famílias, concentra o uso dos recursos no investimento público e financiamento do investimento privado. Se há algum paralelo é o Brasil dos anos 70.
Hoje, no Brasil, o eleitor fez opção por um modelo diferente e, como empresários fazem parte da sociedade, estão no mesmo barco que todos nós o que significa pagar uma carga tributária elevada e participar de pacto social que ai está, o que implica gastos sociais crescentes. Assim, esqueçam, pois vocês jamais terão no Brasil, na manufatura, “condição igualitária de competição com a China”.
É verdade que diferenças de tributação podem ser resolvidas em uma economia aberta via taxa de câmbio (a moeda mais desvalorizada pode neutralizar a maior carga tributária em relação a uma economia de menor carga tributária), mas o nosso modelo atual de crescimento nos leva a uma maior especialização no que já temos vantagem comparativas (commodities) e, assim, a valorização do real piora ainda mais o cenário para indústria. E a desvalorização induzida do Real para digamos, R$ 2.40/US$ 1; significaria redução do salário real dos trabalhadores e, novamente, a quebra do pacto social atual no qual os eleitores querem consumir mais e desejam política sociais mais ativas.
Empresários, levem suas demandas não para o Ministro da Fazenda, mas sim para os candidatos ao longo do processo eleitoral que seria a época de questionarmos o nosso modelo de desenvolvimento. Por enquanto, o goveno está seguindo à risca o que prometeu ao seu eleitor e ainda falta 0,5% do PIB para acabar com a extrema pobreza até 2014.
2 comentários:
Paulo,
Uma pergunta que sempre quis fazer a alguém mais bem informado sobre as elites intelectual e política brasileiras: em quanto o nosso atraso se deve à falta de noção sobre temas básicos de economia? Eu sempre fico com a sensação de que o pessoal das outras ciências humanas e sociais tem um especial desprezo pela ciência econômica, por mais educados que sejam nas outras áreas.
abraços, guilherme
Guilherme,
Não só economia, mas gestao e administração em geral. A classe política brasileira é feita, em grande medida, de mediocres oportunistas.
Se formos pensar então nos que nos governam atualmente, eles têm uma noção muito elementar de economia: metade fez na Unicamp, com seu cepalianismo vulgar e keynesianismo de araque.
São muito rusticos em economia.
Paulo Roberto de Almeida
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