Índia consegue apoio da África do Sul e dos 'bolivarianos' na OMC
RAQUEL LANDIM
Folha de S. Paulo, 5/12/2013
Antes isolada nas negociações da Organização Mundial de Comércio (OMC), a Índia conquistou apoio de África do Sul, Namíbia, Zimbábue e dos países "bolivarianos": Venezuela, Cuba, Bolívia e Equador.
Em reunião realizada nesta quarta-feira (4) à tarde para tentar superar o impasse que ameaça de fracasso a conferência ministerial da OMC, esses países defenderam a demanda indiana de garantir o direito dos países pobres subsidiarem seus agricultores em programas de segurança alimentar.
A Argentina também demonstrou desconforto com o acordo de liberalização do comércio em discussão em Bali, mas por outro motivo. Os argentinos querem um compromisso concreto dos países em acabar com os subsídios à exportação de produtos agrícolas.
ACORDO DESBALANCEADO
No total, nove dos 55 países que participaram do encontro informal convocado pelo diretor geral da OMC, Roberto Azevêdo, afirmaram que o esboço do acordo costurado nas negociações prévias em Genebra está "desbalanceado".
Eles reclamaram que os países pobres serão obrigados a investir para desburocratizar suas aduanas e fronteiras, enquanto os ricos não estão fazendo o suficiente no outro braço da negociação, a agricultura.
Na OMC, as decisões são tomados por consenso, portanto, basta um país ser contra para acabar com o acordo. Desse grupo, apenas a Índia teria peso político para tomar essa decisão sozinha. No entanto, o apoio dos demais reforça a posição indiana.
Segundo apurou a Folha, Paquistão e Uruguai foram explicitamente contra a demanda indiana de uma "cláusula de paz" que permaneça até que seja encontrada uma solução para adequar os programas de segurança alimentar às regras multilaterais.
Para os uruguaios, a "trégua" precisa ter um prazo, porque senão se torna um "cheque em branco" para subsidiar. Os paquistaneses temem que o vizinho acabe exportando seus estoques de alimentos, deprimindo os preços pagos aos produtores agrícolas da região.
No encontro privado entre os ministros, os indianos mantiveram a mesma posição intransigente que demonstraram na reunião plenária de manhã. "A segurança alimentar não é negociável", disse Ahmad Sharma, ministro do Comércio da Índia.
Por enquanto, a Índia não colocou na mesa as "garantias" de que seus programas de segurança alimentar não vão distorcer o comércio mundial, conforme sinalizou na terça-feira (3) a brasileiros e sul-africanos. Eles podem se comprometer, por exemplo, a não exportar produtos destinados aos estoques de alimentos.
Já os Estados Unidos, que exigem um prazo de quatro anos para a "cláusula de paz", estão demonstrando mais flexibilidade. Eles reiteram que já cederam muito, mas abandonaram a postura de que "não mudariam uma linha" no acordo fechado em Genebra. Eles agora dizem que "não vão deixar de chegar a um acordo se houver algo razoável na mesa".
O Brasil assumiu o papel de mediador do acordo de Bali. Nesta quarta-feira (4), o chanceler Luiz Alberto Figueiredo esteve reunido com os ministros de Índia, África e com o diretor geral, Roberto Azevêdo. Um pouco antes, teve um encontro com o representante comercial dos Estados Unidos, Michael Froman. "Nós enfatizamos que estamos preparados para aceitar o pacote de Bali", disse Figueiredo.
NAS MÃOS DO DIRETOR GERAL
A medida que o tempo passa, aumenta a pressão dos países para que Azevêdo coloque na mesa de negociação um texto próprio para tentar alcançar o consenso. Mais de 30 países fizeram esse pedido ao diretor geral. "Chegou o momento do diretor geral apresentar um texto de aterrissagem. Conte conosco", disse o representante do Chile.
Pelo novo ritmo que imprimiu as negociações na OMC, Azevêdo tem bastante credibilidade para "colocar um papel na mesa", apesar do pouco tempo no cargo. Mas ele ainda não decidiu o que fazer. Todos os ex-diretores gerais que tomaram esse risco fracassaram, incluindo o francês, Pascal Lamy.
Em meio a sua mais grave crise, a OMC ganhou nesta quarta-feira um integrante. O Iêmen se tornou o 160º membro da entidade.
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