Desafios do novo governo na
frente econômica externa
Paulo Roberto de Almeida
O governo que tomar posse em janeiro
de 2015, qualquer que seja sua orientação política, tem pela frente uma série
de desafios na área econômica externa.
1. Economia
internacional: uma variável independente
O cenário externo se subtrai às
possibilidades de atuação do governo, que poderá, se tanto, influenciar posições
do Mercosul em negociações multilaterais ou inter-regionais. O panorama é mais
benigno, com a retomada do crescimento nos EUA e a superação das crises mais
graves na zona do euro. Assim, o novo governo não poderá alegar que a crise
internacional prejudica o Brasil, o que não foi verdade mesmo quando as duas
grandes economias estavam deprimidas. Tendo a China como principal parceiro – o
que assegurou altos preços nas commodities – o Brasil navegou sem grandes
percalços durante o pico da crise; se o crescimento declinou, na fase recente, tal
não se deve ao cenário externo. Continuarão as conversas no âmbito do G20 (mas
elas são só conversas) e as de foros como o Brics, mas esse grupo não vai resolver
a deterioração das transações correntes. Cabe tirar as lições que nos veem de
novos emergentes, todos eles empenhados em se inserir mais e mais nos circuitos
produtivos internacionais, em lugar de recorrer ao protecionismo, como foi
fartamente o caso aqui, ultimamente.
2. Negociações
comerciais: entre o minilateralismo e o multilateralismo
Não se deve esperar muito delas, já
que quase todos os países esperam que os demais sejam mais abertos do que eles próprios.
A conclusão da Rodada Doha não é facilitada pelas reticências de alguns dos
“melhores amigos” do atual governo brasileiro no G20 comercial, a exemplo da
Índia, que continua a impedir um consenso mínimo em temas como estoques agrícolas
de segurança, ou da Argentina, na frente industrial, em ambos casos atendendo interesses
protecionistas. O mundo vai continuar com os seus exercícios minilateralistas,
com a possível marginalização da OMC. O Mercosul só fez recuar nos últimos doze
anos, o que caberia remediar mediante uma renegociação de seu formato como
união aduaneira, passando-se, possivelmente, a um simples acordo de livre
comércio. O Brasil ficaria livre para negociar acordos atendendo a seus
interesses, o que não quer dizer que será fácil, pois a indústria continua
perdendo competitividade.
3. Finanças: menos
riscos, mais volatilidade?
Depois de um ciclo de “tempestades
perfeitas” na área bancária, é possível que os grandes atores – EUA, UE, Japão,
e a China – se engajem numa fiscalização mais atenta dos fluxos de capitais. Mas
nunca foi tão grande a liquidez internacional, o que permite prever, aos
tomadores de recursos externos como o Brasil, o atendimento de suas necessidades
de financiamento a juros razoáveis. Não deixa de ser uma ironia que os Brics,
que pretendem opor-se à “hegemonia do dólar”, tenham criado um banco com
capital subscrito de US$ 50 bilhões e um fundo contingente de US$ 100 bilhões. Não
faltarão dólares para isso.
Os aplicadores de curto prazo,
porém, continuarão ariscos e prontos a bater asas ao menor sinal de
volatilidade. Esta, ao contrário do que acreditam os ingênuos, é mais provocada
por mudanças na regulação interna do que por uma suposta “especulação
internacional”. Um governo sensato sabe que deve manter estabilidade nas
regras. Assim, se espera que diminuam as bravatas contra a “guerra cambial
internacional” e os “tsunamis financeiros”.
Em síntese, o Brasil deve continuar
a receber investimentos diretos estrangeiros, com base na abertura regulatória e
em novas concessões “privatizantes”; a integração regional precisa abandonar a
retórica, para enfrentar seus verdadeiros desafios; por fim, seria bom deixar
de lado o stalinismo industrial, e inserir decisivamente a economia brasileira
na globalização. Na verdade, todo os problemas econômicos externos do Brasil
estão mesmo dentro do país, como qualquer observador atilado pode perceber.
[Hartford,
17/07/2014]
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