sábado, 31 de dezembro de 2016

Minhas previsoes imprevidentes para 2017 - Paulo Roberto de Almeida


Minhas previsões imprevidentes para 2017: já estou sentindo saudades dos companheiros

Paulo Roberto de Almeida
[Dando continuidade à série, com novas e jocosas previsões impossíveis]


Desde o início do milênio atual, com absoluta constância desde 2003, dei início a esta série que denominei, provocativamente, de “previsões imprevidentes”, ou seja, o contrário daqueles chutes bem informados que todo astrólogo amador, ou profissional, faz a cada final ou começo de ano. A diferença de minhas previsões, em relação a essas afirmações científicas dos adivinhos de plantão, é que as minhas não estão de modo algum destinadas a serem confirmadas pelo carro sempre balouçante da História: ao contrário, elas foram expressamente concebidas para, justamente, não se realizarem.
Devo dizer que desde o início da década passada, eu vinha sendo ajudado – e como! – pelos companheiros e suas políticas tresloucadas: cada vez que eles expunham um programa, uma nova política, uma medida macro ou setorial, eu sempre apostava exatamente o contrário. E pimba!: não hvia nenhuma chance das coisas acontecerem, da forma como eles queriam. Alto lá: corrijo imediatamente: a coisa sempre se desenvolvia de modo totalmente inverso ao pretendido. Os companheiros eram infalíveis nesse jogo.
Confesso que fiquei repentinamente órfão: com o afastamento totalmente injusto dos companheiros do poder, por meio desse golpe aplicado pela direita, pelos tucanos neoliberais, pela grande mídia, pelos capitalistas mancomunados com o perverso imperialismo, pelos banqueiros conspirando com o capital financeiro monopolista internacional – enfim, por todos aqueles que não são companheiros, ou pecedobistas, ou psolistas, ou gramscianos de academia, ou teólogos da libertação, ou saúvas freireanas e pedagogos da conscientização, os que não são progressistas, esquerdistas, modernistas, pós-modernos, partidários do politicamente corretos, enfim, toda essa fauna, que lutou bravamente contra os golpistas organizados por aquele ex-presidente da Câmara, ufa!, retomo –, com esse atentado fundamental contra a democracia companheira fiquei totalmente sem a ajuda dos ditos companheiros na minha elaboração regular, anual, destas previsões imprevidentes. Eu estava ameaçado de ficar agora sem previsões.
Estava até disposto a apoiar um movimento de novas eleições, só para ter um pequeno laivo de esperança no retorno dos companheiros ao poder, especialmente do chefão mafioso, e com isso poder voltar a elaborar minhas previsões com plena certeza de que nunca vou acertar, ou melhor, sabendo que vou acertar errando redondamente (ou quadradamente, como poderia ser o caso em se tratando desse pessoal de apoio).  
Antes, porém, de me debruçar sobre minhas novas previsões imprevidentes e imprevisíveis para o ano da graça de 2017, vamos fazer um pequeno retrospecto. Aliás, que graça tem esse ano que começa? Depois de dois anos de recessão, vamos continuar recuando no poder de compra, pois o fraquíssimo crescimento da economia, previsto pelos gurus habituais, ficará bem abaixo da inflação, pela primeira vez, não dentro da meta, como andam anunciando, mas dentro da banda, que já é larga. Então, vamos ver o que é que eu que tinha previsto para este ano de 2016, nesta tresloucada profissão?

Previsões imprevidentes para 2016: pela primeira vez a imprevisão ganha da previsão (Brasília, 31 de dezembro de 2015)
1) Criação do programa Pedaladas Legais
2) Cristo Redentor entra no programa de concessões companheiras
3) Companheiros aderem ao livre comércio... de talentos
4) Protocolo aditivo à convenção da ONU sobre corrupção
5) O governo companheiro vai conseguir equilibrar as contas nacionais
6) Os companheiros renovam sua promessa de não mais roubar
7) A Justiça aumenta sua produtividade em 350%
8) Os industriais da FIESP param de reclamar do aumento de juros
9) O PSOL reconhece que Cuba pode não ser um modelo para o Brasil
Como todos podem constatar, eu errei todas, ou seja, acertei a totalidade das minhas previsões, sucesso a 100% portanto. (Quem quiser conferir o detalhe de cada uma dessas previsões destinadas fatalmente ao fracasso completo, pode ver neste link: http://www.diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/01/previsoes-imprevidentes-para-2016.html).

OK, chega da enrolação típica dos preguiçosos. Mesmo sem a contribuição que sempre considerei fundamental dos companheiros, vou tentar arriscar novas previsões imprevidentes para o ano que está começando. Fazer esse tipo de chute contra o futuro imediato apresenta um alto risco, pois nas condições surrealistas do Brasil atual – quando não se sabe quem é situação, quem é oposição, que deu golpe e quem o sofreu – as coisas mais surpreendentes podem ocorrer, até minhas previsões darem certo, ou melhor, errado, e tudo se realizar contra os prognósticos. Vamos portanto dar a partida nos chutes, em mais um exercício de surrealismo futurista na total irresponsabilidade dos adivinhadores improvisados, assim como quem faz esporte com uma bola de ferro amarrada numa das pernas, com uma mão amarrada nas costas, com um olho tapado.

1) Companheiros aderem definitivamente à honestidade teórica
Depois de tentar todas as demais maneiras ter sucesso no mundo da política e dos negócios em famiglia, os companheiros decidiram anunciar que estavam, formal e oficialmente, renunciando a qualquer intermediação escusa com grandes companhias estatais e privados, et pour cause: com todos os seus principais operadores e executivos temporariamente fora de combate – com uma única e grande exceção – e com todos eles colocados na mesa de escuta de companheiros outrora aliados na causa da justiça social, eles decidiram enveredar por novas formas de empreendedorismo político e social, caçando as sandálias da humildade, prometendo ir à missa todos os domingos e comer o pão bento da honestidade. Não sabemos ainda se eles conseguirão refrear seus instintos adquiridos ao longo de anos e anos de treinamento intenso nas artes que o Padre Vieira já encontrava insuperáveis nestas paragens de Pindorama, mas o fato é que eles parecem sinceramente engajados no novo jogo da castidade política. Vai ser difícil, sobretudo com respeito aos companheiros que ainda ocupam cargos públicos, e que podem, por isso mesmo, fazer um por fora), mas o comitê central (ops, a direção) já avisou que a ordem, por enquanto, é se mostrar bem comportado, pelo menos enquanto a República de Curitiba estiver alerta e lépida nos procedimentos. (Atenção: eu disse “teórica”.)

2) Governo golpista anuncia anistia preventiva, com validade de dez anos
Um imenso alívio ouviu-se nos mais diferentes recantos do país: do Oiapoque ao Chuí, a chusma respirou aliviada com essa promessa de cheque em branco, quero dizer, de vale habeas-corpus com prazo delongado de validade, até, pelo menos, que consigam aprovar a tal lei do “pega leve” no propinoduto. A medida (ainda provisória, mas que deve ser rapidamente aprovada pelos garotos em plenário) não concede total liberdade preventiva aos meliantes políticos, apenas alivia os processos, solicitando documentos em cartório, em três vias cada um, devidamente legalizados, antes de passar por três comissões parlamentares e obter pelo menos dois relatórios favoráveis, o que deve fazer com que cada processo demore três legislaturas, tempo suficiente para que cada um em perigo possa repousar na doce aposentadoria congressual. Estava sendo esperada essa medida, pois do contrário não seria possível votar mais nada na Santa Casa legislativa.

3) Odebrecht passa a operar unicamente com o banco do Vaticano
A caminho de uma difícil regeneração, com seu patrimônio diminuído em vários bilhões de dólares, e governos arredios a continuar operando com uma empresa que parece ter o DNA da malversação, ou seja, ser geneticamente corrupta, a outrora maior construtora do país liquidou todas as suas 3.547 contas em 189 bancos em 25 países, e anunciou solenemente que, doravante, e em conformidade com seu espírito cristão, vai trabalhar única e exclusivamente com o Istituto per le Opere dei Religione, mais vulgarmente conhecido como Banco do Vaticano (antigamente Ambrosiano, mais do que centenário), indiferente ao fato de que o banco já foi colhido mais de uma vez em lavagem de dinheiro pelo Fisco italiano. O que vale, no entanto, são as boas intenções: a Odebrecht e o IOR devem fazer uma bela dupla a caminho do paraíso fiscal. As duas empresas prometem se sustentar mutuamente, e até combinaram que vão fazer confissões conjuntas, desde que essas delações premiadas mereçam indulgência eterna, o que o papa peronista prometeu examinar. Como diria Santo Agostinho, “Uma virtude simulada é uma impiedade duplicada: à malícia une-se a falsidade. (Quem duvidar da total correção e da fidelidade desta frase aparentemente debochada pode ver aqui: http://www.frasesfamosas.com.br/frases-de/agostinho/).

4) Teremos candidatos absolutamente honestos sendo preparados para 2018
A palavra do momento é aquela famosa frase – provavelmente mentirosa – sobre a “mulher de César” (quem era ela, mesmo?). Segundo essa hipocrisia cansativamente repetida por 11 jornalistas entre cada 10, ela deveria não só ser, como parecer honesta. Ninguém conferiu, no entanto, se era isso mesmo que ocorria naqueles tempos de traições e golpes baixos E alguém de fato acreditava nessa coisa? Repetida a frase, todo mundo seguia adiante, como se nada tivesse acontecido, e assim segue a vida. Em todo caso, já aquecendo os músculos para a maratona do ano seguinte, os principais candidatos a qualquer coisa, estão em busca de novos laranjas naquele cantinho da Ucrânia cuja soberania ainda permanece indeterminada, pelo menos enquanto durar o reinado do neoczar. Vão precisar de um dicionário de bolso russo-português, mas nada que a Amazon não possa encontrar, inclusive em formato Kindle, o que facilita um bocado os negócios. Estima-se novo equilíbrio no balanço de pagamentos da Ucrânia oriental, a ponto de poderem até emprestar para a pátria-mãe, caso as sanções se agravem no futuro imediato.

5) PEC dos Gastos ganha Emenda constitucional: banda da inflação
Com o agravamento da situação fiscal dos estados e municípios, e sem a possibilidade de criar novos ou amentar os impostos já existentes, os parlamentares resolvem fazer um favor a seus amigos governadores e aprovam uma emenda à emenda constitucional (de número 117, na sequência linear) sem mudar o vínculo dos gastos públicos à inflação, mas criando uma banda para o número, que deixa de ser um número e passa a ser um espaço flexível, com trezentos pontos-base para lá e mais trezentos para cá. Chamado de “nova banda diagonal endógena”, o sistema, engenhoso, como se vê, vai permitir salvar “gregos e goianos”, empurrando as obrigações futuras para os tataranetos dos atuais estudantes do ensino fundamental. Trata-se de um novo conceito de ajuste gradual e seguro, compatível com a qualidade reconhecida dos melhores economistas da UniCamp e adjacências. Os brasileiros, sobretudo os desempregados, podem dormir tranquilos: não há que os economista da UniCamp não imaginem que os bravos representantes do povo deixam de aproveitar em seus labores parlamentares.

6) Trump propõe um pacto de não agressão ao Estado Islâmico
Ops, esse tipo de previsão internacionalista não costuma fazer parte do menu habitual de previsões imprevidentes (e irresponsáveis) já tradicionais neste blog, mas como é preciso exercer todas as competências que a divina providência nos concedeu, aqui vamos nós pelos terrenos sempre pantanosos das relações internacionais. O fato é que o novo, imprevisível e imprevidente, presidente da maior potência planetária (depois da torcida do Barça, claro) ainda em estado de propor qualquer coisa fez uma oferta aparentemente irrecusável ao califa-chefe do Daesh, também conhecido como EI: parar com o mercado de escravas brancas em troca de deixar estacionados na Turquia os drones ditos inteligentes. O EI ficou de pensar, e ao que parece só vai parar com seu departamento de operações estruturadas se a OTAN enviar um suprimento adequado de garotas de programa, de maneira a aquietar os ardores belicistas dos seus combatentes do profeta. Não se sabe, no momento do fechamento destas previsões, se negociações sérias poderiam ser estabelecidas num terreno apropriado, em Genebra ou Viena, de preferência, com interrupções para algumas escapadas no Folies Bergères.

Voilà: é tudo que eu posso prometer para o novo ano que pronto se inicia, mesmo sabendo que minhas previsões imprevidentes são tudo, menos seguras. Não se pode oferecer certezas num país no qual sequer sabe se vamos terminar o ano com o mesmo governo. Em todo caso, eu desejo a todos e a todas (ou a todxs, como quer certo pessoal chatérrimo), um feliz início, um ótimo desenvolvimento e uma excepcional finalização de um ano altamente incerto, como são, aliás, estas minhas previsões imprevidentes. Nisso 2017 também me ajuda, já que nem toda bola de cristal funciona.
Numa coisa, portanto, estou alinhado com eles: sem os companheiros eu estava me sentindo, como direi?, órfão, sem qualquer indício de que poderia contar com eles para errar em toda a linha (ou seja, acertando 100% dos chutes formulados ao longo dos últimos treze anos durante os quais fui por eles maltratado). Eu lhes sou, de verdade, devotamente reconhecido: sem sua proverbial inépcia, sua incompetência, aa tradicional improvisação, a tremenda burrice, a estupidez contumaz e a sua ignorância crassa, eu teria corrido o risco de acertar algumas, pelo menos, de minhas previsões ao longo de todo este milênio tão rico de babaquices por eles perpetradas. Se vocês duvidam do que estou dizendo, basta conferir a série completa:

Previsões anteriores:
2016:
2912. “Previsões imprevidentes para 2016: pela primeira vez a imprevisão ganha da previsão”, Brasília, 31 dezembro 2015, 5 p. Continuidade do exercício, com apenas quatro previsões imprevisíveis. Postado no blog Diplomatizzando (link: http://diplomatizzando.blogspot.com.br/2015/12/previsoes-imprevidentes-para-2015-pela.html), e disseminado no Facebook (https://www.facebook.com/paulobooks/posts/1061451080585008). Revisão ampliada, 14 de janeiro de 2016, 8 p. Postado novamente no Diplomatizzando (link: http://www.diplomatizzando.blogspot.com.br/2016/01/previsoes-imprevidentes-para-2016.html) e no Facebook (https://www.facebook.com/paulobooks/posts/1069196793143770).

Para as previsões anteriores a 2016, ver estas duas postagens:
Preparando as previsões imprevidentes para 2016: conferindo as de 2015:
e
Preparando as previsões de 2016: algum retrospecto pode ser útil:

A despeito de tudo, e desculpando qualquer erro de previsão, feliz 2017 a todos!

Paulo Roberto de Almeida 
Brasília, 31 de dezembro de 2016

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