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segunda-feira, 3 de janeiro de 2022

Eleições presidenciais de 2022: uma possível plataforma de Ciro Gomes - Nelson Marconi (FSP)

 Ciro Gomes é o candidato que, no momento, apresenta o melhor, talvez o único, programa econômico estruturado e racional. 

Mas, como sabemos, o papel aceita tudo. Seria preciso que não apenas o eleitor comum, mas sobretudo os donos do capital, os representantes do poder político e a classe média comprassem as promessas bonitinhas e aparentemente factíveis do candidato, para que ele tivesse, pelo menos uma vez, a chance de colocar suas ideias em prática.

 Não tenho certeza de que o candidato — mais conhecido por sua metralhadora giratória verbal — seja capaz de convencer gregos e goianos, ou seja, os setores relevantes da opinião pública, para crescer nas preferências eleitorais. Em todo caso, ele deveria ter direito a uma chance nos debates eleitorais, tanto porque é um candidato sério e já provou ser bom administrador. Adelante!

Meu comentário puramente circunstancial ao artigo de Nelson Marconi sobre um possível programa econômico de Ciro Gomes, da série de economistas de candidatos, da FSP.  Merece aprofundamento analítico, mas tem certo estilo Ha-Joon Chang revisitado.

Paulo Roberto de Almeida 


É preciso coragem para mudar o modelo econômico fracassado

Um plano nacional de desenvolvimento pactuado entre os setores público e privado abriria uma nova rota para o crescimento 

Folha de S. Paulo, 2.jan.2022 às 23h15

Nelson Marconi

É professor da FGV-Eaesp, foi coordenador do programa de governo de Ciro Gomes em 2018


A economia brasileira está comendo poeira há muito tempo. Em 1980, nosso PIB per capita era 15 vezes maior que o chinês e 1,6 vez superior ao sul-coreano; em 2020 equivalia, respectivamente, a apenas 79% e 26% do observado nestes países.

O que fizeram os asiáticos? Perceberam que os países mais bem-sucedidos incentivam a indústria e os setores importantes ao redor; logo, ampliaram sua participação no mercado internacional via exportações de manufaturados, usando e abusando de planejamento, boas práticas macroeconômicas, políticas de desenvolvimento científico e tecnológico e educação, focando em áreas estratégicas e sempre defendendo os interesses de seus países.

Por aqui, entregamos nosso mercado interno, de mão beijada, via moeda apreciada, aos produtores de outros países, sem expandir as exportações de manufaturados; enquanto as vendas no varejo, descontada a inflação, hoje são o dobro do que eram em 2003, a produção industrial está no mesmo patamar de 2005.

Criaram-se todas as dificuldades possíveis para os produtores locais eficientes atuarem nos mercados interno e externo: além do câmbio, juros altos, estrutura tributária distorcida, políticas industriais ineficazes, investimento insuficiente em educação e ciência e tecnologia e má qualidade dos gastos públicos.

Como resultado, nos desindustrializamos e hoje sentimos a pior consequência deste processo: deixamos de gerar bons empregos e as pessoas estão tendo que se virar na informalidade, em ocupações muito mais precárias, e o PIB per capita do Brasil atual é igual ao de 2010. Perdemos 11 anos.

É possível reverter esse cenário e voltarmos a gerar bons empregos, que é um de nossos objetivos principais, e estimular o real empreendedorismo? Certamente que sim! Precisamos investir mais em educação? Lógico, e o Ceará de Ciro Gomes e seus sucessores é um exemplo mundial. Precisamos participar mais do comércio internacional? Sim, mas estimulando as exportações, e não aniquilando os produtores locais. Como fazer?

Primeiro, é necessário estruturar um cenário macroeconômico favorável a quem produz: devemos equacionar a questão fiscal a médio prazo, tornando a trajetória da dívida pública sustentável, via redução de subsídios e isenções, da mudança da lógica orçamentária —que premia quem gastou mais no passado, da instituição de tributação progressiva sobre lucros e dividendos, heranças e patrimônio, desonerando compensatoriamente a produção, e da melhoria na qualidade do gasto público. Assim, neutralizam-se as pressões contrárias à queda da taxa de juros, viabiliza-se a manutenção da taxa de câmbio em um patamar competitivo e os investimentos públicos que necessitamos para retomar o crescimento neste momento. Também são fundamentais ações para reduzir a inflação e o endividamento privado.

Do ponto de vista estratégico, vemos que EUA, Alemanha e França criaram planos para recuperar suas indústrias e seu espaço na economia mundial, incluindo elevados gastos em infraestrutura e pesquisa e desenvolvimento. Não há como agirmos de outra forma.

Um plano nacional de desenvolvimento pactuado entre os setores público e privado, nos moldes defendidos por Ciro, é essencial, prevendo tanto o desenvolvimento científico e tecnológico como a redução de desigualdades e a melhoria de indicadores sociais, que se recuperarão com a melhoria na qualidade dos empregos, o avanço educacional e políticas específicas para os mais desfavorecidos. A gestão pública deverá ser reorientada para o alcance das metas deste plano, atuando de forma matricial, monitorando e cobrando resultados e premiando o bom desempenho.

A pauta ambiental constitui uma oportunidade de investimentos: o desenvolvimento de novas fontes de energia, a reorientação do uso do petróleo, as alterações na forma de produzir carnes e outros alimentos, a implantação de uma infraestrutura de baixo uso de carbono e os necessários avanços tecnológicos na área da saúde, por exemplo. Todos esses fatores estimularão a inovação e sofisticação tecnológica, incluindo a microeletrônica, softwares e inteligência artificial. E pensemos em todos os serviços que serão demandados por estas atividades.

Há, sim, muito espaço para retomar o crescimento, os bons empregos e a dignidade do povo brasileiro. Mas é necessária disposição e coragem para mudar o modelo econômico fracassado que impera há décadas.


SÉRIE PENSAMENTOS ECONÔMICOS DOS PRÉ-CANDIDATOS

Artigos de economistas dos pré-candidatos à Presidência discutem principais temas para as campanhas

Domingo (2)

Ciro Gomes (PDT), por Nelson Marconi

Segunda (3)

João Doria (PSDB), por Henrique Meirelles

Terça (4)

Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por Guido Mantega

Quarta (5)

Sergio Moro (Podemos), por Affonso Celso Pastore



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