José Genoino e a esquerda do PT que se opõe aos ukases do chefão de todos eles
Paulo Roberto de Almeida
Diplomata, professor
(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)
Leio o seguinte na coluna do sempre bem-informado e levemente irônico jornalista Carlos Brickmann (1/01/2022):
“Claro, claro
Tudo bem, cada petista pode pensar o que quiser, desde que faça o que seu ídolo máximo, o ex-presidente Lula, determina que seja feito. Mas vale como curiosidade: José Genoíno é um dos petistas que mais resistem à união entre Lula e o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin. Tem prestígio no partido, do qual foi fundador e presidente; quando enfrentou dificuldades enfrentou-as sozinho, não delatou ninguém.
Sem dúvida o partido fará o que Lula quiser. É interessante ler os argumentos de Genoíno (expressos numa live com gente do PSOL) e, mais interessante ainda, entendê-los: "O que está em jogo é se a esquerda socialista será protagonista do enfrentamento do neoliberalismo ou se a esquerda será domesticada, domada para um projeto de melhorismo por dentro de um neoliberalismo com feição progressista”.”
PRA: José Genoíno sempre foi e continua sendo um grande quadro da esquerda, não necessariamente por uma vocação política esquerdista e mais por sua postura digna e consequente, em relação ao despotismo pouco esclarecido do grande chefe de todos os petistas e pretendente a líder tirânico de todas as esquerdas e, agora, de todas as vias opostas ao grande psicopata.
Mas ele demonstra, igualmente, uma visão estreita e sectária não só do jogo político — que ele pretende situar limitadamente no campo exclusivo de uma esquerda também sectária —, mas sobretudo no terreno da política econômica, que ele pretende que seja oposta a um “neoliberalismo” que jamais existiu no Brasil, a não ser como slogan totalmente equivocado de uma esquerda que jamais conseguiu renegar sua adesão a um estatismo que sempre serviu maravilhosamente bem aos interesses da burguesia e os de todos os donos do grande capital, na indústria, na agricultura e nos serviços (especialmente os do setor financeiro e bancário).
Essa esquerda que José Genoíno representa revelou-se incapaz de realizar um aggionamento ao estilo do Bad Godesberg do SPD alemão, do PSF sob Mitterrand e do Labour sob Blair e sempre conduziu o Brasil ao velho estatismo das esquerdas anacrônicas que subsistem no mundo, em especial na AL.
José Genoíno faz muito bem em se opor aos decretos autoritários e personalistas do chefão mafioso, mas sua visão política e econômica é ainda mais embotada e equivocada do que a do Guia Genial dos Povos, que pelo menos demonstra certo realismo — e evidente oportunismo — com relação ao processo, atualmente em curso no Brasil, de oposição consequente ao horror que representa o projeto bolsonarista para o Brasil. José Genoíno pretende ancorar o PT e as esquerdas ao mundinho limitado dos grupelhos de esquerda, que ainda por cima são totalmente ignorantes em matéria de políticas econômicas avançadas e em relação ao funcionamento da economia global. Eles são o que eram o SPD, o PSF e o Labour antes de suas bem-sucedidas conversões a uma socialdemocracia moderna, arejada e sobretudo destituída dos cacoetes do passado estatista.
Se adesão ao estatismo capitalista funcionasse — em total conluio das esquerdas tradicionais com os mais belos representantes do capitalismo industrial e agrícola— o Brasil e a maior parte da AL seriam exemplos de potências econômicas e de prosperidade social no contexto da economia global, não da miséria social e campeões da desigualdade que efetivamente são e foram, no passado, no presente e no futuro previsível. Essas esquerdas são tudo o que o capitalismo mais predatório e o corporativismo mais exacerbado sempre desejaram para si e para os seus objetivos continuístas limitados ao campo das desigualdades distributivas. Ironicamente e paradoxalmente, elas pensam como o equivocado representante do distributivismo igualitarista que é o economista socialista francês Piketty, para quem a solução da desigualdade social consiste em taxar mais os ricos para distribuir o maná do 1% dos bilionários aos pobres e remediados, como se essa fosse a solução do problema distributivo. É o contrário do que seria a mais nobre missão dos economistas, que seria conceber maneiras eficientes de enriquecer os mais pobres, e não propor formas equivocadas e não funcionais para empobrecer os mais ricos.
Paulo Roberto de Almeida
2 janeiro 2022, 2 p.
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