O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

Duas ou Tres Coisas: Francisco Seixas da Costa sobre a Regra e a Exceção...


Duas ou Três Coisas

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019


Diplomacia brasileira

A diplomacia brasileira, ao longo dos anos, sob lideranças políticas muito diversas, tem sabido garantir ao país um lugar importante no sistema internacional.
Encontrei frequentemente, nos colegas brasileiros com quem me cruzei, alguns excelentes profissionais, conhecedores profundos do seu “métier”, capazes de cruzar os interesses - permanentes ou conjunturais - do seu país, com a evolução da sociedade global, na tentativa de nela preservar ao Brasil um papel de prestígio.
Ontem, ao ouvir o discurso do novo chefe da diplomacia brasileira, ele próprio um diplomata, confirmei a consabida regra de que não há regra sem exceção.


terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Os meus livros, e os do Embaixador Seixas da Costa: terriveis dilemas sobre o que fazer

Mutatis mutandis, minha situação é bastante parecida com a do meu amigo bibliófilo ( não para colecionar, simplesmente para ler, um dia), Embaixador Francisco Seixas da Costa, cujo blog é um dos mais saborosos que jamais encontrei na blogosfera, acreditem.
Paulo Roberto de Almeida 
Os meus livros
Há uns anos, dei por mim a olhar para umas estantes onde tinha grande parte dos meus livros e a interrogar-me sobre o que fazer-lhes. Nunca fui um bibliófilo no sentido clássico. Não tenho raridades bibliográficas, embora possa ser proprietário de alguns livros que, não sendo caros, é difícil encontrar, mesmo nos alfarrabistas. Não tenho uma "biblioteca" no sentido clássico, organizada por secções. Fui comprando livros ao sabor dos tempos, às vezes ao ritmo de algumas modas intelectuais, outras por via de escolhas políticas, muitas mais porque a atualização profissional ou os gostos do momento me levaram a aquiri-los. Comprei livros que não li de todo, alguns completamente desnecessários, outros que só folheei, outros ainda porque achava que um dia ia ter tempo para os ler e não tive, para além dos que eram tão baratos tão baratos, numa feira do livro ou num saldo, que achei pena não ficar com eles. Com escassas exceções, sei onde e por que razão comprei cada livro. Gosto muito de oferecer livros, mas nunca dei um único livro dos meus. A minha biblioteca é hoje, assim, uma mescla imensa, onde se pode encontrar um pouco de tudo, desde ficção avulsa a muitas biografias e memórias, bastante história contemporânea, uma imensidão de dicionários, enciclopédias e obras de referência, muita coisa sobre a Europa e relações internacionais, montanhas de "current issues" e o que restou de tempos "esquerdalhos" - Marx & companhia. Mas há também publicações periódicas encadernadas, folhetos vários, literatura clandestina, etc. O único setor com alguma coerência e bastante completo são centenas de volumes relativos às lutas contra o Estado Novo e à política portuguesa contemporânea (onde me deve faltar muito pouco do essencial).

Quando saí para o meu primeiro posto diplomático, no final dos anos 70, levei comigo quase todos os meus livros de então, umas largas centenas. (Curiosamente, eram, de forma esmagadora, em língua portuguesa e francesa; o inglês viria mais tarde). A partir daí, fui circulando pelo mundo levando só com alguns desses livros, mandando os restantes para Portugal, espalhados entre a casa em Lisboa e a dos meus pais, em Vila Real. E comprando outros, claro. Passei, a partir de então e para sempre, a ter livros espalhados por vários locais. Às vezes, chegou a acontecer-me comprar o mesmo livro duas vezes. Depois dos últimos doze anos passados ininterruptamente no estrangeiro, a situação tornou-se fisicamente insustentável. Assim, no início deste ano, cheguei a Portugal com mais alguns milhares de livros "às costas". Nas estantes que tinha por cá já não cabia mais nenhum! Havia deixado em Paris quase quatro centenas, mas alguns milhares que me acompanhavam (e que cresceram dia a dia, em Paris) tiveram de ir diretamente para Vila Real. Para estantes? Não, em muitas dezenas de caixotes que jazem na maior divisão de uma casa vazia. Se somar os que tenho por Lisboa, juntos com algumas centenas que o meu pai me deixou, estaremos a falar de cerca de dez mil livros.

Que fazer? Decidi começar a doar esse espólio bibliográfico à moderna Biblioteca Municipal de Vila Real. Não foi uma decisão fácil de tomar. Tive a sorte de encontrar na pessoa do diretor da biblioteca, Vitor Nogueira, uma figura pouco comum na cultura de Vila Real, o interlocutor que me sossegou. Com ele combinei o "modus faciendi" desta operação progressiva. A biblioteca apõe em cada livro o carimbo que a imagem mostra, é feita uma recensão de cada volume, que segue depois para a secção respetiva. Por via informática, posso ir seguindo (tal como qualquer outro utente) o curso deste trabalho de integração dos livros na Biblioteca, inseridos num "fundo" próprio. E vou ficando com a certeza de que há quem trata os meus livros com o cuidado que (eu acho que) eles merecem. Tenho vindo a enviar para a Biblioteca tudo aquilo que entendo já não me fazer falta, o que naturalmente significa que as coisas que considero mais interessantes vão manter-se, por ora, em minha posse. Estão já por lá cerca de oito centenas de livros. Outros se seguirão no início de janeiro. Esta é uma "operação" necessariamente lenta, porque acarreta o desligar psicológico de objetos com que fomos habituados a viver. E isso, como se sabe, está longe de ser uma coisa fácil. Só ficaria preocupado, e as pessoas próximas de mim o deveriam ficar também, se um dia eu decidisse, de repente, dar todos os meus livros. Isso significaria que havia desistido de uma parte da vida. Porque os livros foram e são uma das partes mais importantes dessa vida.

Bom, e agora só espero que ninguém me ofereça livros logo à noite... 

sexta-feira, 22 de março de 2013

A cultura dos candidatos 'a carreira diplomatica, em Portugal - Francisco Seixas da Costa

Esta retiro do excelente blog de meu colega de carreira e amigo, ex-embaixador de Portugal no Brasil, Francisco Seixas da Costa. Acredito que, mutatis mutandis, deveriam se aplicar os mesmos critérios no Brasil. Infelizmente não é o caso, e não o é, cada vez mais, de certos tempos para cá...
Estamos avançando na incultura, se me permitem a expressão de progresso para alguma coisa...
Paulo Roberto de Almeida

Cultura geral
Francisco Seixas da Costa
Blog Duas ou Três Coisas..., 19/03/2013

Anda por aí forte polémica sobre a prova de "cultura geral" com que se iniciou o novo concurso para a admissão de diplomatas no Ministério dos Negócios Estrangeiros. Não conheço o regulamento do concurso e, confesso, não tenho uma opinião formada sobre se o modelo de prova para aferir tais conhecimentos gerais é adequado ou não.

Uma coisa quero dizer, desde já: entendo que qualquer diplomata português deve ter conhecimentos de natureza cultural que excedam a história diplomática e relações internacionais, o direito internacional ou a economia política. E que o essencial desses conhecimentos tem de ser demonstrado nas provas de entrada. E que deve ser excluído, liminarmente, quem não seja suficientemente culto. Se a prova adequada é a que foi apresentada ou se há outros melhores melhores para fazer essa avaliação, isso é já uma outra questão.

Quando, em tempos idos, fiz parte do júri destes concursos, havia lugar a uma prova, de cerca de 20 minutos, durante a qual três membros desse júri tinham uma conversa com cada candidato, com um período de conversa em francês ou inglês. Posso estar enganado, mas tive sempre a ideia de que era relativamente fácil, através desse diálogo, constatar se o candidato era razoavelmente culto e se sabia expressar e articular ideias em moldes adequados. Não tenho a menor dúvida de que, no final dessa conversa, nós percebíamos se o candidato não tinha condições para fazer parte da carreira. Por vezes, alguns que deixámos ir em frente vieram a revelar-se maus funcionários, porque a prova que haviam feito nos iludiu ou porque não tinham outras qualificações, algumas das quais só o tempo permite ajuizar. Tenho a consciência muito tranquila: sem exceção, todos os que ajudei a "chumbar" não tinham qualidades mínimas para entrarem no número de vagas que nos competia preencher. Alguns foram admitidos noutros concursos posteriores, ou porque melhoraram, ou porque o nível médio dos candidatos baixou ou porque os critérios do novo júri variaram.

Não posso admitir que entre para os quadros do MNE alguém que, num diálogo com um interlocutor estrangeiro, não consiga manter uma conversa com substância cultural, que, por exemplo, não conheça um mínimo de literatura portuguesa, que não tenha referências sobre pintores, arquitetos, cineastas, etc, que não tenha uma ideia dos grandes tempos da nossa História, que não conheça aqueles que ajudaram a construir a nossa identidade nacional, por esse mundo fora. Quando fiz parte dos examinadores desses concursos (e também já examinei colegas noutros momentos avançados da carreira, sob critérios diversos), não foi uma nem duas vezes em que, ao citarem autores contemporâneos, os candidatos, perguntados sobre o que tinham efetivamente lido desses autores, esclareciam: "ler, ler, não li!". E alguns deles acabaram por "passar", porque, não obstante não terem lido esses autores, mostraram ter suficiente informação sobre eles.

É para mim indiscutível que quem tem a pretensão de vir a representar Portugal pelo mundo deve possuir uma razoável cultura geral, bem para além das temáticas técnicas da profissão. Resta saber se é através de testes "americanos", e especificamente dos que foram aplicados, que isso se avalia. 

Deixo aqui uma nota que, no passado, escrevi sobre este assunto.