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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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sexta-feira, 19 de agosto de 2022

À la recherche d’un blog perdu : Metapolítica 17 - Paulo Roberto de Almeida

 À la recherche d’un blog perdu : Metapolítica 17

  

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)

Notas sobre um blog desaparecido de um ex-chanceler acidental.

 

 

Recentemente, alguém me contactou para perguntar sobre os escritos do patético ex-chanceler acidental, um personagem que era obscuro, antes de ser designado primeiro chanceler do governo do capitão, e que voltou a ficar novamente obscuro, depois de sua demissão em março de 2021, e do qual nunca mais me ocupei, depois de escrever e publicar cinco livros sobre o infeliz ciclo do bolsolavismo diplomático (ver todos os títulos em meu blog Diplomatizzando, a partir do Miséria da Diplomacia, em meados de 2019). 

Para atender à demanda, efetuei uma rápida verificação, colocando o endereço do blog responsável pela sua designação como chanceler: https://www.metapoliticabrasil.com/. A resposta veio rápidaLooks Like This Domain Isn't Connected to a Website Yet!

Ou seja, ele desativou o seu antigo blog do período ascensional e desapareceu com todas as postagens do período de declínio, talvez porque tenha sido chutado pelo capitão e ficou sem qualquer apoio nos antigos setores. Mas muita gente, inclusive eu, deve ter registrado e guardado suas postagens, assim como matérias sobre ele e suas “ideias”. Não sei por que alguém ainda teria curiosidade de retornar ao “mar morto” do período de ativismo do ex-chanceler acidental, mas creio ser uma das pessoas mais habilitadas a fazê-lo, dado que segui a carreira e o besteirol dos dois anos e três meses nos quais ele conseguiu desmantelar a diplomacia do Itamaraty e boa parte da política externa (determinada pelo ex-chefe). Não vou reproduzir as bobagens escritas pelo bizarro personagem, mas vou fazer um relato sintético sobre o período de maiores loucuras que frequentaram a Casa de Rio Branco, de 2019 a 2021.

 

A designação do chanceler acidental e a imensa surpresa em torno do personagem

No dia 22 de setembro de 2018, um até então obscuro diplomata anunciava triunfalmente ao mundo que ele estava a caminho de salvar o Itamaraty, o Brasil e o mundo, por meio de seu novo blog, curiosamente chamado de Metapolítica 17: contra o globalismo, nestes exatos termos: 

Sou Ernesto Araújo. Tenho 28 anos de serviço público e sou também escritor. Quero ajudar o Brasil e o mundo a se libertarem da ideologia globalista. Globalismo é a globalização econômica que passou a ser pilotada pelo marxismo cultural. Essencialmente é um sistema anti-humano e anti-cristão. A fé em Cristo significa, hoje, lutar contra o globalismo, cujo objetivo último é romper a conexão entre Deus e o homem, tornado o homem escravo e Deus irrelevante. O projeto metapolítico significa, essencialmente, abrir-se para a presença de Deus na política e na história. (blog pessoal: Metapolitica 17; iniciado em 22/09/2018)

 

Nem tomei conhecimento, naquele momento, dessa coisa estranha, e apenas fui saber da “novidade” no dia 14 de novembro pela tarde, quando o personagem até então realmente desconhecido pela maioria dos jornalistas foi designado como o novo chanceler, pelo presidente eleito no mês de outubro anterior. Antes de anunciar o seu escolhido, o candidato, depois presidente eleito, afirmou várias vezes que escolheria para o Itamaraty um “diplomata experiente e sem ideologia”. Parece que ele errou nos dois conceitos (ou foi deliberado).  

Mas, eu só soube da escolha do seu nome porque um jornalista amigo me telefonou, na tarde do dia 14 de novembro, para inquirir sobre a obscura figura. Só então soube que ele tinha um blog com aquele nome curioso. Prestei as informações que eram do meu conhecimento ao jornalista ignaro – e todos o eram até aquele momento – e depois passei o resto da noite do dia 14/11 e todo o feriado da República, lendo as postagens inacreditáveis (que até então eram poucas), mas extremamente reveladoras de uma personalidade angustiada com o avanço do marxismo no Brasil e no mundo, com a falta de Deus no Itamaraty e nas cercanias da política, e devidamente equipado, pelo número de doutas citações, a libertar o Brasil, se não o mundo, dos vários e aflitivos demônios ameaçadores.

Mas, sempre atento às novidades “cercando” (e como) a política externa, fiz uma primeira postagem, em meu blog, já no dia 16 de novembro, já refletindo a investigação de alguns jornalistas sobre o que pensava (ou deixava de pensar), o chanceler designado. Sem qualquer comentário de minha parte, transcrevi esta matéria, tal como lida: 

sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Futuro chanceler: perto de Trump e longe da China - Lu Aiko Otta (OESP)

Futuro chanceler está perto de Trump e longe da China

Escolhido para chefiar Itamaraty diz que mudança climática é uma trama marxista para favorecer País asiático

Lu Aiko Otta, O Estado de S. Paulo, 16 novembro 2018 | 05h00

Blog Diplomatizzandohttps://diplomatizzando.blogspot.com/2018/11/futuro-chanceler-perto-de-trump-e-longe.html

 

Mas, a confusão em torno da diplomacia bolsolavista já tinha começado antes mesmo da designação do chanceler acidental, que é como eu sempre chamei o patético personagem, apadrinhado por um conhecido e polêmico guru ideológico da nova tropa de aventureiros que chegava ao poder. A confusão se instalou a partir de diversas declarações do presidente eleito sobre temas externos, todas elas rigorosamente ideológicas e denotando uma vontade de romper totalmente com a diplomacia tradicional, não tanto porque tivesse outra para colocar no lugar, mas por pura ignorância crassa. Uma delas eu registrei em postagem do dia 8 de novembro, ao tomar conhecimento de que uma delegação diplomática egípcia a caminho do Brasil tinha cancelado sua viagem, depois que Bolsonaro anunciou que mudaria a embaixada do Brasil de Tel Aviv a Jerusalém:

terça-feira, 6 de novembro de 2018

https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/11/diplomacia-bolsonarista-ainda-nem.html

Diplomacia bolsonarista: ainda nem começou, mas já agita um bocado

Notícias turbulentas: Em reação a Bolsonaro, Egito adia sem data visita oficial do Brasil : https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,em-reacao-a-bolsonaro-egito-adia-sem-data-visita-oficial-do-brasil,70002587188

 

No dia 11 de novembro, ou seja, três dias antes da designação oficial do chanceler acidental, eu registrava uma matéria da Gazeta do Povo revelando, com algum grau de detalhe, como seria a política externa do novo governo: 

domingo, 11 de novembro de 2018

https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/11/como-sera-politica-externa-do-governo.html

Como será a política externa do governo Bolsonaro - Fernando Martins (Gazeta do Povo) - Como será a política externa do governo Bolsonaro

 

Exatamente um dia antes de ser anunciado quem seria o novo chanceler, o embaixador Rubens Barbosa publicava no Estadão, um artigo sobre os desafios diplomáticos do novo governo, já levando em conta tudo o que já se sabia das declarações estapafúrdias do presidente eleito – mas sem que se soubesse que o chanceler seria alguém ainda mais esquizofrênico –, como também registrei em meu blog, mas no mesmo dia, um outro artigo, do jornalista Bernardo de Melo Franco, também se dedicava a especular sobre o futuro, texto que registrei na manhã do dia seguinte, ainda sem ter conhecimento do “chanceler”: 

terça-feira, 13 de novembro de 2018

https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/11/a-politica-externa-do-governo-bolsonaro.html

A política externa do governo Bolsonaro - Rubens Barbosa

 

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/11/desafios-ao-novo-chanceler-bernardo.html

Desafios ao novo chanceler - Bernardo Mello Franco (Globo)

Próximo chanceler terá árduo trabalho, O Globo, 13/11/2018

 

Finalmente, tendo tomado conhecido da designação do chanceler acidental, emiti, no próprio dia 15 de novembro, depois de ler vários de seus petardos iniciais no Metapolítica 17, um pequeno texto que pode ser lido na postagem abaixo resumida: 

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

https://diplomatizzando.blogspot.com/2018/11/sobre-o-chanceler-designado-paulo.html

Sobre o chanceler designado - Paulo Roberto de Almeida

Minha postura quanto ao chanceler designado

 

Nela eu dizia basicamente o seguinte:

Eu fiquei 13,5 anos completamente afastado de qualquer cargo na SERE durante todo o regime lulopetista, e não pude, assim, acompanhar sua trajetória no período 2003-2016. Apenas recentemente soube que ele era casado com a filha do ex-SG Luiz Filipe de Seixas Corrêa. Não tinha a menor ideia de que ele mantinha uma campanha política militante em favor do candidato vencedor, como transpareceu na imprensa cerca de um mês atrás. (...)

Se ele foi escolhido pelo presidente eleito a exercer a função política de comandar a diplomacia brasileira no próximo governo, só posso desejar-lhe sucesso na função. (...)

Apenas ontem (14/11/2018), e depois da nomeação, tomei conhecimento pela primeira vez de que ele mantém um blog pessoal, para a expressão dessas ideias, o que eu também faço, no Diplomatizzando, mas, no meu caso, geralmente para transcrição de matérias de terceiros, com alguns poucos comentários de minha parte. Não me envolvo, nunca me envolvi, em atividades partidárias, e pretendo assim manter-me invariavelmente à margem desse tipo de opção. Minhas prioridades principais, no presente momento, ou desde sempre, consistem em preservar o Itamaraty e a diplomacia brasileira de quaisquer desvios indesejados, em termos ideológicos ou políticos, que possam ser considerados nefastos para a manutenção de sua alta qualidade intelectual, de sua grande capacidade de trabalho, puramente profissional, e de uma postura isenta no plano político-ideológico. Acredito, como aliás deve ser, que a política externa é determinada pelo chefe de Estado e de governo, como ocorre nos regimes presidencialistas, cabendo ao Itamaraty aconselhá-lo da melhor forma possível visando à defesa estrita dos altos interesses da nação e do Estado.

 

No próprio dia 15, e nos dias seguintes, jornalistas, pesquisadores, observadores, continuaram escrevendo sobre o chanceler designado, com base nas poucas “ideias” reveladas em seu blog ou no artigo “Trump e o Ocidente”, que havia sido publicado um ano antes na revista do IPRI da qual eu era o editor, que depois eu comentei amplamente num dos capítulos de meu primeiro livro do ciclo bolsolavista, Miséria da Diplomacia: a destruição da inteligência no Itamaraty (livremente disponível desde junho de 2019). Três dias depois da designação, no dia 18 de novembro, portanto, fiz uma listinha dos artigos (meus e de terceiros) publicados em meu blog, como indicado a seguir, postagem que terminava com estas minhas palavras: “Pode ser que o frenesi em torno do novo chanceler se acalme nas próximas semanas, ou não...” 

1)             Sobre o chanceler designado - Paulo Roberto de Alm...

2)             Globalismo e globalizacao: uma confusao persistent...

3)             Sobre o marxismo cultural - Paulo Roberto de Almei...

4)              Futuro chanceler: perto de Trump e longe da China ...

5)             A política externa do governo Bolsonaro - Rubens B...

6)             Os perigos da guinada radical no Itamaraty - Guilh...

Já prevendo que as semanas seguintes à posse do novo governo seriam confusas e conturbadas, pelo ineditismo esquizofrênico das posições antecipadas por eles mesmos – recusa do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas, do Pacto Global das Migrações, da política externa regional, que seria regida em termos ideológicos “direita-esquerda” –, corri para terminar os projetos em curso no IPRI e paralelamente: finalização e lançamento dos dois volumes com a produção do ex-chanceler Celso Lafer em relações internacionais, e publicação do primeiro número da revista 200, produzida por meu colega Carlos Henrique Cardim, mas que acabaria bloqueada pelo novo chanceler antes mesmo da sua posse (um ano depois, eu obtinha o arquivo digital da revista e colocava na plataforma Academia.edu). Foram semanas de muito trabalho no final de novembro e dezembro, e de algum temor.

Nas semanas seguintes, enfastiado com aquelas ideias delirantes, pouco prestei atenção à luta do cruzado contra os perigos do marxismo, tanto que tirei férias no final do ano, viajei, e nem estava em Brasilia para a posse presidencial ou a do “flamante” chanceler, como dizem os hermanos. Soube, por amigos, que seu discurso de posse, no dia 2 de janeiro de 2019, foi um verdadeiro choque de surrealismo para todos os diplomatas ali presentes. No mesmo dia, recebi, por WhatsApp, em Gramado (RS), onde me encontrava, um pedido da nova administração para opinar sobre o Instituto Rio Branco, o que me recusei a fazer, por não ter essa área em minha competência, até então restrita ao Instituto de Pesquisas de Relações Internacionais (IPRI).

Ao mesmo tempo, chegou-me uma espécie de “instrução” para não aplicar o programa de trabalho que havia sido aprovado pelo Conselho da Funag no mês de dezembro de 2018. Percebi que a coisa iria degringolar no Itamaraty. Aliás, esperava ser demitido logo no primeiro dia do novo “regime”, pois já havia alcunhado o novo dono do poder de fascista, o que não era exatamente um cumprimento. Demorou um pouco, e entendi que ainda estavam buscando um substituto para a direção do IPRI, mas finalmente chegou, no começo de março de 2018, em plena segunda-feira de Carnaval, dia de suposto feriado. No intervalo fiquei fazendo o que sempre faço: ler, refletir, escrever algumas coisas, inclusive mais algumas “pérolas” do chanceler acidental, o tal orgulhoso animador do blog Metapolítica 17 (contra o globalismo, não esquecer). 

O fato é que eu fui “exonerado” do meu cargo de Diretor do IPRI numa “manhã de Carnaval”, no próprio dia em que eu publicava no meu blog um artigo do chanceler acidental, com alguns poucos comentários da minha parte, sem relação com o artigo, apenas relatando meus 13,5 anos de travessia do lulopetismo diplomático: 

segunda-feira, 4 de março de 2019

https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/03/contra-o-consenso-tradicional-na.html

Contra o consenso "tradicional" na politica externa - artigo do chanceler

 

Não vou me estender sobre todas as postagens feitas no blog Diplomatizzando nos primeiros meses de 2019 sobre o asilo de alucinados em que se converteu o Itamaraty, tanto porque, exonerado do IPRI, refugiei-me na Biblioteca do Itamaraty e fiquei preparando meu primeiro livro de 2019, que não tinha nada a ver com o novo governo, mas cuidava apenas do período anterior: Contra a Corrente: ensaios contrarianista sobre as relações internacionais do Brasil, 2014-2018 (Appris). Depois resolvi tomar notas para o que seria o primeiro livro do ciclo bolsolavista, o já citado Miséria da Diplomacia (em duas edições, uma de autor, a outra pela Universidade Federal de Roraima, ambas inteiramente livres e disponíveis no meu blog Diplomatizzando). Naquele livro “contrarianista”, aproveitei um texto que tinha escrito no mês de novembro anterior, feito a caminho de Santa Maria (RS), para um seminário, “Por que sou um contrarianista?”, imediatamente publicado no blog, antes da fatídica data de 14 de novembro quando foi anunciado o chanceler acidental, o que apenas reforçou a minha vocação de ser contrarianista. Quando o livro finalmente foi publicado, em meados do primeiro semestre, eu anunciava, na sua última página (247), um novo livro para aquele mesmo ano, como “Obra em preparação: Meio Século de Aventuras Intelectuais: escritos sobre o Brasil e o mundo, 1968-2018”. Esse livro não foi, até aqui, concluído.

 

O que aconteceu com o blog do novo cruzado?

O blog Metapolítica 17, do chanceler acidental, permaneceu ativo durante todo o tempo em que ele infelicitou o Itamaraty e a diplomacia profissional e ajudou o presidente a demolir a política externa relativamente equilibrada do período imediatamente anterior. Assustado com os caminhos adotados por ambos, na defesa de teses indefensáveis, como por exemplo a de que o nazismo seria uma “ideologia de esquerda”, continuei a seguir seus petardos alucinados e alucinantes, eventualmente comentados e “corrigidos” por mim e por jornalistas experientes. Por exemplo, para rebater a tese de que o nazismo seria “de esquerda”, o jornalista experimento Diogo Schelp produziu um artigo arrasador, que reproduzi no Diplomatizando

domingo, 7 de abril de 2019

https://diplomatizzando.blogspot.com/2019/04/ernesto-araujo-e-o-nazismo-de-esquerda.html

Ernesto Araujo e o nazismo "de esquerda": Diogo Schelp recomenda um livro

Uma recomendação de livro para o chanceler Ernesto Araújo

Diogo Schelp - UOL 07/04/19

https://diogoschelp.blogosfera.uol.com.br/2019/04/06/uma-recomendacao-de-livro-para-o-chanceler-ernesto-araujo/

 

Eu mesmo acabei produzindo um artigo sobre as vinculações entre suas “ideias” em torno da metapolítica e o nacionalismo alemão que tinha desembocado no nazismo: 

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/01/metapolitica-de-wagner-hitler-e-ao.html

Metapolitica: de Wagner a Hitler, e ao chanceler acidental - Paulo Roberto de Almeida

Nas origens da Metapolítica: o romantismo alemão que derivou para o nazismo

 

Depois, escrevi dois outros livros, em plena vigência do bolsolavismo diplomático triunfante, rebatendo a cada vez o festival de absurdos que ocorria, de forma regular, constante e repetidamente, com (na verdade, contra) a política externa e a diplomacia brasileira. Menciono rapidamente esses livros publicados geralmente em formato Kindle ou divulgados livremente, para facilitar e apressar os contra-argumentos às loucuras emanadas dos amadores da diplomacia: O Itamaraty num labirinto de sombras: ensaios de política externa e de diplomacia brasileira (Brasília: Diplomatizzando, 2020; Edição Kindle); Uma certa ideia do Itamaraty: a reconstrução da política externa e a restauração da diplomacia brasileira (Brasília: Diplomatizzando, 2020; plataforma Academia.edu). Neste segundo eu já propunha uma política externa pós-bolsolavista.

O tipo de evento que a Funag andou promovendo nos tempos ideológicos

Fundação Alexandre de Gusmão e o IPRI se converteram num valhacouto de antiglobalistas, negacionistas, fundamentalistas (e nem sei por que os monarquistas foram se meter com aquele bando de malucos), nos eventos, seminários e palestras organizados exclusivamente para a malta dos adoradores do sofista da Virgínia, aquele a quem eu chamava de “Rasputin de Subúrbio”, assim como os aloprados do bolsonarismo com alguma tintura supostamente acadêmica. Cheguei a sentir pena dos alunos do Instituto Rio Branco, de excelente nível, mas assembleia cativa, e necessariamente passiva (mas provavelmente estupefata), com aquelas palestras estrambóticas. Imagino o sofrimento que deve ter sido para eles escutar invectivas contra o multilateralismo, o perigo iminente do comunismo que rondava a política brasileira, assim como os projetos diabólicos do Foro de São Paulo nos seus projetos de implantar o socialismo na América Latina. 

Imaginei que com a derrota de Trump – nunca admitida por Bolsonaro, meses depois da posse de Biden – e antes mesmo da posse do novo presidente americano, o chanceler acidental seria trocado por alguém mais razoável, o que todavia não ocorreu. Cheguei a escrever um pedido de demissão para o chanceler, se ele tivesse coragem de abandonar a cadeira que conspurcar, mas nada ocorreu até o início dos trabalhos legislativos. Minha carta recomendando renúncia, a ele dirigida, foi publicada no blog no final de janeiro de 2021: 

quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

https://diplomatizzando.blogspot.com/2021/01/carta-aberta-um-diplomata-completamente.html

Carta aberta a um diplomata completamente fora do tom

 

Como ele não se resolvia, publiquei meu quarto livro sobre os delírios do chanceler acidental e sua obra destruidora da diplomacia profissional: O Itamaraty Sequestrado: a destruição da diplomacia pelo bolsolavismo2018-2021 (Brasília: Diplomatizzando, 2021; edição Kindle). Poucos dias depois ele era levado a se demitir, por pressão da bancada da Comissão de Relações Exteriores do Senado, mas manteve, durante algum tempo, seus textos no blog Metapolítica 17; como ele já era “carta fora do baralho”, deixei de prestar atenção nos seus petardos malucos, e esses textos últimos, antes da eliminação completa do blog e das postagens eu não gravei, mas espero que alguém o tenha feito, e aqui fica o meu apelo para que essa coleção de alucinações seja completada, quem sabe para o benefício de algum candidato a mestrado ou doutorado em psiquiatria diplomática.

Para finalmente dar por concluído esse ciclo de livros que não deveriam ter sido escritos – pois nada justificou a perda de tempo com tantas bobagens, tendo tanta coisa mais interessante para escrever – condensei meus estudos e reflexões sobre algumas décadas de política externa (grosso modo desde a redemocratização, a partir de 1985) num livro que sintetiza meu pensamento sobre a diplomacia conduzida de Sarney a Bolsonaro: Apogeu e demolição da política externa: itinerários da diplomacia brasileira (Appris, 2021). Creio que com o livro publicado pela LTC em 2012, Relações internacionais e política externa do Brasil: a diplomacia brasileira no contexto da globalização, são minhas duas melhores obras que tratam do meu próprio trabalho em 44 anos de desempenho diplomático.

Quando e exatamente porque o ex-chanceler acidental resolveu deletar de sua vida todas aquelas “saborosas” postagens antiglobalistas, fundamentalistas, raivosas e rançosas, feitas no Metapolítica 17, isso eu não sei, mas as razões não são difíceis de adivinhar: a tropa dos ideólogos da “nova política” soçobrou inteiramente depois que o Itamaraty se entregou, de armas e bagagens, ao Centrão, o que lhe garantiu certa sobrevivência política numa das trajetórias mais infames já conhecidas em toda a história do Brasil, e isso desde que aqui desembarcou, na Bahia mais exatamente, o primeiro governador-geral do Brasil, D. Tomé de Souza: nunca tivemos um dirigente tão medíocre, inepto e doentio, ao ponto da perversidade.

Talvez algum dia alguém escreva a trajetória do ex-chanceler acidental, embora já existam alguns livros sobre a diplomacia bolsonarista. Sobre o personagem, eu organizei um livro, a partir de outros petardos, os de um cronista desconhecido, que recomendo aos que apreciam a galhofa: Ereto da Brocha, Memorial do Sanatório, ou Ernesto e seus dragões no país de Bolsonaro (Brasília: Ombudsman, 2022; disponível na plataforma Academia.edu: https://www.academia.edu/71720946/Memorial_do_Sanatorio_Ereto_da_Brocha_Ombudsman_do_Itamaraty_2021_). 


Paulo Roberto de Almeida

                                                                               Brasília, 4230: 19 agosto 2022, 8 p.





quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Condutas dos servidores na campanha eleitoral: ironias do Itamaraty bolsolavista - chanceler acidental; Paulo Roberto de Almeida

Conduta dos servidores na campanha eleitoral: ironias do Itamaraty bolsolavista

 

Paulo Roberto de Almeida

(www.pralmeida.orghttp://diplomatizzando.blogspot.com)

[Objetivoesclarecimento públicofinalidaderessaltar a contradição]

 

O boletim diário do Itamaraty, instrumento básico de informação dos diplomatas, ao lado do Boletim de Serviço – que publica os atos oficiais de movimentação de pessoal e medidas correlatas –, que deveria ser complementado pelos clippings diários de notícias nacionais e internacionais – perversamente suprimidos pela atual gestão, provavelmente porque a “grande mídia” trazia muita matéria contrária à política externa bolsolavista –, publicou a seguinte nota nesta quarta-feira, 9/09/2020:

 

"Eleições Municipais 2020 – Orientações sobre condutas vedadas aos Agentes Públicos Federais em eleições | Última atualização - 31/08/2020 às 09:51

Com o objetivo de orientar a ação dos agentes públicos, a Plataforma +Brasil disponibiliza cartilha com informações básicas acerca dos direitos políticos e das normas éticas e legais que devem nortear a atuação dos agentes públicos federais no ano das eleições municipais de 2020 http://plataformamaisbrasil.gov.br/ajuda/manuais-e-cartilhas/condutas-vedadas-aos-agentes-publicos-federais-em-eleicoes-2020.

Além disso, a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República também publicou normas sobre veiculação de publicidade governamental no período de eleições municipais, disponíveis no endereço http://www.secom.gov.br/eleicoes-municipais-2020-orientacoes-ao-sicom."

 

Existe aqui uma suprema ironia para quem conhece a história do chanceler acidental. Essa mesma Cartilha, distribuída a todos os “agentes públicos federais” a cada eleição, já estava em vigor nas eleições presidenciais de 2018, da qual o então ministro de primeira classe recém promovido pela administração Temer-Aloysio Nunes, participou com grande entusiasmo, ainda que clandestinamente ao início. Quando descoberto, numa famosa matéria da jornalista Patrícia Campos Mello, do dia 30 de setembro de 2018, o militante até então secreto da causa bolsonarista, foi pedir perdão ao titular do Gabinete, por meio da Secretaria Geral do Itamaraty; recebeu permissão para continuar, e por isso até fez uma postagem, no dia 2 de outubro, agradecendo a deferência: 

Quero aqui agradecer e enaltecer as altas chefias do Itamaraty por seu compromisso com a liberdade de expressão e com o pluralismo, que me dá a oportunidade de compartilhar estas reflexões. Não sei se esses princípios sobreviverão se o PT “tomar o poder”.

 

Pretendo destacar aqui algumas pérolas do comentarista desconhecido, até quase a véspera do primeiro turno de 2018, agregando alguns exemplos ao longo do período eleitoral que vai de meados de setembro até a realização do segundo turno. O fato é que ele estava empenhado na campanha desde 2017, quando se revelou por meio de um famoso artigo, “Trump e o Ocidente”, que foi publicado na revista do IPRI, que eu dirigia, Cadernos de Política Exterior (embora o artigo não tivesse muito a ver com a natureza da publicação).

Os interessados em conhecer o “pensamento” – se o substantivo se aplica – do chanceler acidental podem acessar o seu blog (enquanto existir) que se chama – num título que remete aos círculos wagnerianos pré-nazistas – Metapolítica 17 - contra o globalismo (neste link: https://www.metapoliticabrasil.com/blog/), do qual retiro apenas alguns tópicos, para refrescar a memória de alguns responsáveis pelo Comitê de Ética da PR sobre como se pode burlar impunemente as regras de conduta que eles recomendam aos “agentes públicos”. 

 

1) Na primeira postagem, em 22 de setembro de 2018, Ernesto Araújo, enalteceu as virtudes do povo: 

Os ignorantes e os instruídos

Ernesto Araújo O povo é muito mais são e sábio do que a classe instruída. Talvez justamente por não passarem por uma escolarização emburr...

Na campanha eleitoral brasileira, hoje, vemos os instruídos preocupados unicamente com duas ou três frases pronunciadas por Bolsonaro ou pelo General Mourão. Repetem essas frases nos seus restaurantes e teatros e competem para ver quem mais se indigna. (Só não se dão ao trabalho de analisar o contexto das frases, é claro, porque analisar uma expressão no seu contexto é tarefa complexa, a exigir as faculdades cognitivas que os vários níveis de educação lhes retiraram.) Dizem que jamais votariam num candidato que disse isto ou aquilo sobre "as mulheres" ou "os gays". Para eles, mulheres ou gays não são indivíduos realmente existentes, mas categorias políticas, personagens chapados numa novela esquerdista com um enredo absolutamente primário, que jamais satisfaria qualquer pessoa dotada de boa-fé e curiosidade intelectual.

 

2) Logo em seguida, no dia 23/09/2018, ele enaltece a polarização em curso: 

Viva a polarização

Toda a realidade, seja humana ou natural, está estruturada de maneira polarizada, com dois polos binários, que se resolvem no logos incar...

As mesmas pessoas que dizem detestar a polarização querem apelar a um certo moralismo puramente verbal no atual debate político. Sustentam que algumas frases que Bolsonaro pronunciou a respeito de mulheres, gays ou negros, transformam a eleição numa questão moral. O saque da Petrobras, o mensalão, o achincalhamento das instituições, o assassinato de Celso Daniel e a tentativa de assassinato de Bolsonaro, nada disso acaso são questões morais? (...)

A esquerda não quer polarização porque não quer nenhuma concorrência ao seu polo totalizante, que ocupa todo o espectro do centro moderado até o stalinismo (veja-se, para exemplificá-lo, a perspectiva de uma aliança do PT, cuja candidata a vice-presidente pertence ao PC do B stalinista, com o PSDB liberal reformista, cuja candidata a vice-presidente pertence ao PP, partido herdeiro da ARENA: assim, o centro moderado no Brasil vai de Stalin a Geisel, passando por Lula e FHC).

 

3) Dois dias depois, em 25/09/2018, o elogio é ao povo, que “se interessa por política externa”, contrariamente ao que acreditaria a esquerda: 

O que está em jogo

Ernesto Araújo É um equívoco dizer que o eleitor brasileiro não se interessa por política externa e que por isso as relações internaciona...

O sistema não quer que o brasileiro saiba que o Brasil está, hoje, chamado a participar de uma gigantesca luta mundial, que se desdobra em vários aspectos: (...)

A luta pela soberania econômica e política dos países, contra o domínio das cadeias produtivas de bens e contra o monopólio da circulação de informações por uma elite transnacional niilista, contra uma economia globalizada maoísta-capitalista centrada na China.

A luta pela democracia efetiva e contra a reemergência do bolivarianismo na América Latina, o sistema regional de implantação do "Socialismo do Século XXI".

As opções reais de política externa são: ou aliar-se aos países e forças que lutam contra o globalismo, ou deixar que o Brasil, junto com todas as nações, desapareça na geleia geral de um mundo desnacionalizado e desespiritualizado (a nação é a casa do espírito!) e torne-se uma província da "pátria grande" socialista.

A esquerda, juntamente com o centro..., usa o seu controle da mídia e da academia para ocultar ao brasileiro o que está em jogo nas eleições, em relação à nossa inserção internacional: se o Brasil combaterá por um mundo de nações e de pessoas livres, ou se continuará deixando-se levar para um império global sem amor e sem apego, onde impera um programa de controle político-mental que aniquila a personalidade de pessoas e povos para melhor dominar.

 

4) No dia seguinte, 26/09, os ataques ao PT emanam naturalmente do “povo”: 

O povo contra o sistema

Ernesto Araújo No final dos anos 70 e primeira metade dos anos 80, o debate esquerda-direita no Brasil era um debate político entre liber...

O PT assumiu assim, sem maior dificuldade, o completo controle do país. Atribuiu ao PSDB o papel de "direita" e governou confortavelmente por 13 anos. (...) Esse regime tão eficiente e popular só se esqueceu de colocar uma coisa em sua equação: o povo. (...)

Dessa agenda do povo brasileiro nasceu a candidatura de Bolsonaro. Todos sabem que Bolsonaro é o único candidato anti-sistema. (...) Na verdade, sua candidatura é o único projeto político que atende ao anseio mais profundo do povo brasileiro.

Trata-se de uma candidatura de direita, certamente, e não poderia ser de outra forma já que todo o espectro político do sistema foi ocupado pela esquerda. (...)

Tudo o que é decente e bom, hoje, está na direita, simplesmente porque a direita é, hoje, o único lugar que acolhe tudo o que é bom e decente. (...)

Por isso, muitas pessoas que se consideram centristas e muitos políticos autênticos estão abandonando os candidatos presidenciais ditos de centro e entendendo que a única casa sob cujo teto podem abrigar suas ideias e suas esperanças é a campanha de Bolsonaro.

 

5) Imediatamente após, em 27/09, confiando na sua “clandestinidade”, Ernesto se permite criticar o discurso do presidente Temer, na abertura dos debates na Assembleia Geral, quando o presidente se refere à “nossa Venezuela” (ele coloca o vídeo do discurso para provar), e logo em seguida transcreve um trecho do discurso do presidente Trump atacando de forma veemente o governo de Maduro: 

"Nosso país, a Venezuela"

Do discurso do Presidente Michel Temer na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas (Nova York, 25/10/2018): “Na América do Sul, os ...

Mas sabemos que a solução para a crise virá quando, na verdade, o nosso país, a Venezuela, reencontrar o caminho do desenvolvimento. (https://www.youtube.com/watch?v=1nYdOEM6D1M).

Do discurso do Presidente Donald Trump na mesma ocasião: (...)

 

6) No mesmo dia, ele ainda encontra tempo para atacar o candidato do PT e seu projeto, provavelmente numa alusão à linha de transmissão que transporta eletricidade da Venezuela a Roraima, destacada da rede nacional de energia.: 

Linha de transmissão

Haddad é o poste de Lula. Lula é o poste de Maduro, atual gestor do projeto bolivariano. Maduro é o poste de Chávez. Chávez era o poste d...

Haddad é o poste de Lula.

Lula é o poste de Maduro, atual gestor do projeto bolivariano.

Maduro é o poste de Chávez.

Chávez era o poste do Socialismo do Século XXI de Laclau.

Laclau e todo o marxismo disfarçado de pós-marxismo é o poste do maoísmo.

O maoísmo é o poste do inferno.

Bela linha de transmissão.

 

7) No dia seguinte, em 28/09, sempre atarefado em sua missão secreta de angariar votos para o seu candidato, ou mais provavelmente em consolidar sua candidatura ao cargo de chanceler do futuro presidente, ele conclama os conservadores a se mobilizarem: 

Acorda e luta!

Acorda, liberal! Sai da cama, conservador! Você pretende ficar neutro, assistindo à batalha pelo futuro do Brasil e comendo pipoca, como ...

Acorda, liberal!

Sai da cama, conservador!

Você pretende ficar neutro, assistindo à batalha pelo futuro do Brasil e comendo pipoca, como se estivesse vendo Croácia x Dinamarca?

Você tem algo mais importante a fazer do que salvar o seu país?

Quem se diz liberal e não está com Bolsonaro é porque não se importa com a liberdade, mas apenas com a sua própria imagem.

Quem se diz conservador e não está com Bolsonaro é porque só quer conservar sua própria convicção de superioridade moral.

O PT (Partido Terrorista) está se preparando para tomar o poder no Brasil.

Na véspera da I Guerra Mundial, o Secretário do Exterior britânico, Edward Grey, prevendo a catástrofe, disse a um amigo: “As luzes estão-se apagando em toda a Europa. Não as veremos novamente em nossas vidas.”

No Brasil, se o PT ganhar, vai extinguir todas as luzes da decência e da liberdade, e não as veremos acesas novamente em nossas vidas. (...)

Fascista é o nome dado pelos comunistas a qualquer inimigo do regime de terror que o PT pretende instaurar ou reinstaurar no Brasil.

A sobrevivência do Brasil depende de você perder o medo de ser chamado de fascista. 

Acorda, sai da cama e vem para a luta! É o Brasil que está jogando o jogo mais importante da sua vida.

 

8) Depois de mais uma postagem atacando a esquerda no dia 29, no próprio dia em que sua identidade seria revelada na reportagem de Patrícia Campos Mello na FSP (30/09), como o único diplomata a apoiar ativamente o candidato da direita, ele novamente conclama o povo a vir em apoio ao candidato, revelando seus sentimentos com uma grande carreata pró-Bolsonaro em Brasília: 

Mas se ergues da justiça a clava forte

Algumas reflexões sobre a carreata pró-Bolsonaro em Brasília, com 25.000 carros, em 30 de setembro: Não vi ódio em ninguém, em nenhum ins...

Algumas reflexões sobre a carreata pró-Bolsonaro em Brasília, com 25.000 carros, em 30 de setembro:

Não vi ódio em ninguém, em nenhum instante. O movimento popular por Bolsonaro não se nutre de ódio, mas de amor e de esperança. As pessoas sorriem e celebram. Há um clima de congregação, uma energia coletiva impressionante, uma presença. Só me lembro de uma atmosfera cívica desse tipo em duas ocasiões: a campanha das Diretas Já em 1984 e o movimento pelo impeachment em 2016. É a primeira vez, portanto, que este oceano profundo, obscuro, poderoso de sentimento coletivo, ruge desta maneira em uma situação eleitoral. Isso significa que se trata de muito mais do que uma eleição, de uma escolha entre diferentes projetos para a pátria. Trata-se de uma luta pela sobrevivência da pátria.

O hino nacional fala de bosques e campos floridos e de uma vida serena, mas em certo ponto interrompe todo esse aconchego e proclama: “mas se ergues da justiça a clava forte, verás que o filho teu não foge à luta”. A mão fazendo o gesto de atirar é a pátria-mãe erguendo a clava forte! E não esqueçamos que Jesus, o príncipe da paz, disse em alto e bom som: “não vim trazer a paz, mas a espada”.

Arma só é símbolo de violência na mão de bandido. Na mão de pessoas de bem, arma é símbolo de orgulho, confiança, determinação e justiça.

Vi pessoas de todos os níveis de renda, de todos os tons de pele. Vi homens e muitas mulheres, se bobear mais mulheres do que homens. Pensei na cena final do Fausto de Goethe: Das Ewig-Weibliche zieht uns hinan. “O eterno feminino nos eleva ao alto.” A Virgem e a pátria-mãe gentil estão conosco.

Alegria por poder participar de algo tão grande, angústia por saber que não temos a opção de perder diante de um inimigo tão pérfido, confiança na justiça e no poder mais alto. A carreata continua até salvarmos o Brasil.

 

9) No dia seguinte, 1/10/2018, mas com uma postagem que já devia estar preparada antes, ele ainda ataca o candidato da esquerda em especial e o marxismo em geral: 

Teses sobre Fernando Haddad

Em 1998, o então professor de Ciência Política da USP Fernando Haddad publicou, na revista Estudos Avançados, um breve texto intitulado "...

O marxismo é um projeto para destruir o cristianismo, não o capitalismo. O capitalismo é visto por Marx simplesmente como um meio capaz de acelerar, pela desagregação que promove na sociedade tradicional, seu projeto anticristão. (...) A tarefa então é aniquilar a família humana, destruir o homem, para poder aniquilar o salvador que é Deus. Isto não está em alguma nota de pé de página ou em algum rascunho de Marx, está no centro do texto que os marxistas consideram a essência de sua obra. Esse é o marxismo ou o socialismo que, com Haddad, pretende tomar o Brasil.

 

10) Finalmente, provavelmente constrangido por ter sido revelado, ele vai pedir compreensão ao Gabinete, no dia 2/10, e até se permite elogiar a postura aberta das “altas chefias”, personalidades que ele atacaria de forma acerba depois, com munição fornecida pelo “Gabinete do Ódio”;

Um registro

Quero aqui agradecer e enaltecer as altas chefias do Itamaraty por seu compromisso com a liberdade de expressão e com o pluralismo, que m...

Quero aqui agradecer e enaltecer as altas chefias do Itamaraty por seu compromisso com a liberdade de expressão e com o pluralismo, que me dá a oportunidade de compartilhar estas reflexões.

Não sei se esses princípios sobreviverão se o PT “tomar o poder”.


11) Nos dias seguintes, e durante todo o intervalo entre o primeiro e o segundo turno, EA faz diversas postagens, praticamente uma a cada dia, sempre atacando a esquerda, o PT e o seu candidato. Quase na véspera do segundo turno, em 20/10, ele recrudesce: 

Eu vim de graça

Não há nada que o PT odeie tanto quanto a liberdade: liberdade econômica, liberdade de pensamento, liberdade de expressão. Isso porque o ...

Não há nada que o PT odeie tanto quanto a liberdade: liberdade econômica, liberdade de pensamento, liberdade de expressão.

Isso porque o PT, fiel ao “belo ideal socialista”, odeia o ser humano.

Deixado a si mesmo, o ser humano cria e produz, ama e constrói, trabalha e confia, realiza-se e projeta-se para a frente.

Então não pode. O PT (que aqui significa não apenas “Partido dos Trabalhadores”, mas também Projeto Totalitário ou Programa da Tirania) não pode deixar o ser humano a si mesmo. (...)

A única coisa que o Projeto Totalitário não criminaliza é o próprio crime e os próprios criminosos. Ou seja, o PT criminaliza tudo, menos a si mesmo.

Agora querem criminalizar o Whatsapp.

O ideal do PT (já expresso por alguns ecologistas radicais) é que a espécie humana não existisse. Já que existe, ainda, vamos fazer dela o pior possível, para que a humanidade se odeie tanto a ponto de um dia cometer suicídio. Sim, o Projeto Totalitário, do qual o “Partido dos Trabalhadores” faz parte integralmente até a medula dos seus ossos e até o fundo do buraco que tem no lugar do coração, é levar a humanidade ao suicídio. Para isso precisa destruir a alegria de viver, que depende da liberdade. Censurar o Whatsapp é mais uma tentativa.

 

12) Finalmente, o triunfo, devidamente comemorado em 24 de outubro de 2018:

Todo o poder emana

Nunca é demais lembrar o que diz o Artigo 1º, parágrafo único, da Constituição Federal: “Todo o poder emana do povo.” Em todos os 114 art...

O povo vem criando um novo Brasil. Já criou ao menos a imagem de um novo Brasil – um Brasil sem PT, sem crime, sem falsidade – e agora se prepara para alcançar essa imagem, para tocá-la e começar a vivê-la.

 

13) Seguiram-se uma dezena de postagens altamente ideológicas, como pode ser verificado no site Metapolítica 17, e isso a despeito de o presidente, que o escolheu em 14/11/2018 (sob provável injunção do guru expatriado e dos dois olavistas que o controlam de perto, em Brasília), ter prometido uma política externa “sem ideologia”. Uma dessas postagens consistiu num artigo, “Contra o consenso da inação”, com críticas acerbas ao ex-ministro Rubens Ricupero e ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que foi objeto de uma postagem conjunta, que fiz em meu blog na madrugada do dia 4/03/2019, e que motivou minha exoneração poucas horas depois.

 

14) Nos meses seguintes, as postagens amainaram, mas todas elas tinham um sentido altamente ideológico, como aquela famosa que defendia a tese – imediatamente rejeitada até pela embaixada da República Federal da Alemanha em Brasília – segundo a qual o nazismo era um “movimento de esquerda”, em 30/03/2019: 

Pela aliança liberal-conservadora

A esquerda fica apavorada cada vez que ressurge o debate sobre a possibilidade de classificar o nazismo como movimento de esquerda. Dá a ...

 

15) Raras foram as postagens no restante do ano de 2019, sendo que uma delas, em 19 de julho, defendia a “liberdade religiosa, religião libertadora”, até que finalmente chegamos à apoteose ideológica da famosa reunião dos impropérios, no dia 22 de abril de 2020, durante a qual o presidente recrudesceu contra a Polícia Federal e seus demais inimigos no governo e fora dele, ao passo que o chanceler acidental, defendendo o grande papel do Brasil de Bolsonaro na reorganização do poder mundial, cunhou o famoso slogan do “comunavirus”, o terrível inimigo que surgiu na China para dominar o Ocidente: 

Chegou o Comunavírus

O Coronavírus nos faz despertar novamente para o pesadelo comunista. Chegou o Comunavírus. É o que mostra Slavoj Žižek, um dos principais...

 Žižek revela aquilo que os marxistas há trinta anos escondem: o globalismo substitui o socialismo como estágio preparatório ao comunismo. A pandemia do coronavírus representa, para ele, uma imensa oportunidade de construir uma ordem mundial sem nações e sem liberdade.


Querem mais, querem se divertir, querem lamentar? Basta acessar o site do chanceler acidental – que não sei quanto tempo dura, mas tenho tudo registrado –, embora outras formidáveis bobagens figuram em entrevistas e artigos que podem ser acessadas nos sites do Itamaraty e da Funag. Creio que bastam as pérolas acima...

 


Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 3750, 9 de setembro de 2020