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quinta-feira, 23 de março de 2023

Chanceler russo vem ao Brasil em teste à posição de neutralidade do país - Murillo Camarotto (O Globo)

Neutralidade não se significa se eximir ante o crime e a injustiça já se ensinava Rui Barbosa. (PRA)

Chanceler russo vem ao Brasil em teste à posição de neutralidade do país

Viagem é última escala de Sergei Lavrov na busca por maior apoio entre Brics

Por Murillo Camarotto — De Brasília

O Globo, 23/03/2023

 

O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, chega a Brasília no dia 17 de abril para uma reunião com o chanceler Mauro Vieira. A visita é mais uma escala do experimentado diplomata russo em seu périplo por países emergentes, de onde vem conseguindo extrair alguns gestos para atenuar o isolamento imposto ao país desde a invasão da Ucrânia, há cerca de um ano.

A missão por aqui parece a mais desafiadora, ao menos se considerado o conjunto de países-sócios do Brics. O Brasil foi o único membro do grupo a votar contra a Rússia em uma resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) que condenou a invasão da Ucrânia. China, Índia e África do Sul se abstiveram.

Se o objetivo de Lavrov é movimentar a posição brasileira no tabuleiro, as chances de ele sair daqui apenas com uma fotografia são grandes. No Itamaraty, a versão quase unânime é de que o Brasil vai manter intocado seu posicionamento atual, de neutralidade no conflito, mas crítico à invasão de um país soberano.

A agenda em Brasília prevê apenas uma reunião entre os dois ministros de Relações Exteriores, mas não está totalmente descartado um encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, caso haja disponibilidade.

A tendência do Brasil, a meu ver acertada, é continuar na posição atual. Uma posição de décadas do Itamaraty. Ao presidente Lula também não interessa se indispor com o Ocidente”, pondera Angelo Segrillo, professor de história pela Universidade de São Paulo e especialista em Rússia.

Ele explica que a movimentação de Vladimir Putin sobre os emergentes é, em síntese, o aprofundamento forçado de uma estratégia que já tem mais de 20 anos, de promoção de um mundo multipolar, com menor protagonismo dos Estados Unidos.

O próprio Brasil, já sob Lula, participou ativamente dessa agenda anos atrás, com a criação do G20 e a formação de blocos de nações emergentes, caso do Brics, no chamado “Sul Global”. Isolado rapidamente por americanos e europeus após invadir o vizinho, Putin se viu forçado a buscar suporte nesses países.

Sua estratégia, na avaliação de Segrillo, tem obtido algum êxito. Além do estreitamento das relações com a China - evidenciado nas últimas declarações de Pequim e na visita de Estado de Xi Jinping a Moscou -, Putin conseguiu manter laços firmes com a Índia e observou a neutralidade de quase metade do continente africano em votações na ONU.

Além de ter reforçado a compra de petróleo e gás da Rússia, o que ajudou Moscou a atenuar os embargos, o governo indiano tem adotado um tom crítico ao Ocidente. Em janeiro, o ministro do Exterior da Índia, Subrahmanyam Jaishankar, apontou a “hipocrisia” dos europeus sobre a invasão de um país pelo outro.

Posso dar-lhes muitos exemplos de países que violam a soberania de outro país. Se eu perguntasse onde está a Europa em muitos deles, temo ter um longo silêncio”, disse ele em entrevista a uma rede de TV austríaca, ao ser questionado sobre a posição de Nova Déli sobre a Ucrânia.

Ano passado, ele já havia sugerido que a Europa mudasse a mentalidade. “Em algum momento a Europa tem que sair da mentalidade de que os problemas da Europa são problemas do mundo, mas problemas do mundo não são problemas da Europa”, criticou o ministro durante uma conferência na Eslováquia.

Jaishankar teve uma reunião bilateral com Lavrov no início deste mês, em meio ao encontro dos ministros de Relações Exteriores do G20, na Índia. O chanceler Mauro Vieira compareceu ao evento e manteve reuniões.

Lavrov também colheu bons frutos na viagem à África do Sul, em janeiro. A ministra de Relações Exteriores do país, Naledi Pandor, descreveu a Rússia como um “país amigo”. A calorosa acolhida veio pouco tempo depois de Pretória confirmar exercícios militares conjuntos com as marinhas russa e chinesa - o que foi criticado pelos Estados Unidos.

A ofensiva russa para o continente africano aposta na relação construída durante a Guerra Fria, um período em que vários países da região estavam saindo da colonização europeia. A União Soviética ofereceu ajuda econômica e militar a várias nações.

Em julho do ano passado, Lavrov visitou quatro países africanos em apenas cinco dias na busca por alianças. Levou na bagagem a mensagem de que a Rússia garantiria o acordo para a exportação de grãos pelos portos ucranianos, operação importante para o abastecimento da região.

No início da guerra, somente 28 dos 54 países da África, pouco mais da metade, votaram contra a Rússia na Assembleia Geral da ONU. O percentual de votos africanos favoráveis à resolução, de 51%, ficou bem abaixo dos 81% representados pelas demais nações participantes da reunião.

Há, entre muitos analistas internacionais, a impressão de que se não há apoio para a invasão da Ucrânia entre os países emergentes, também é baixo o interesse por tomar lado no conflito. É nessa posição que o Brasil deve permanecer e que, de certa forma, a China parece disposta a mudar.

Apesar da pompa da visita a Moscou, nesta semana, o regime chinês ainda não seu sinais de que poderá dar subir o patamar da tensão ao anunciar uma aliança militar com Putin. Indiretamente, no entanto, Pequim seguirá financiando os russos, com compra de petróleo e gás e possíveis novos acordos comerciais.

Segundo o professor Segrillo, um possível teste para a posição neutra do Brasil seria a Rússia cruzar a linha do uso das armas nucleares, por exemplo. Isso poderia forçar o Itamaraty a tomar lado, o que, por ora está fora do radar. “Ninguém tem bola de cristal, mas acredito que a posição do Brasil não deve mudar.”

https://valor.globo.com/google/amp/brasil/noticia/2023/03/23/chanceler-russo-vem-ao-brasil-em-teste-a-posicao-de-neutralidade-do-pais.ghtml

 

quarta-feira, 24 de março de 2021

O patético chanceler acidental MASSACRADO no Senado, com razão: Ernesto: CAIA FORA! - Congresso cobra demissão imediata de Araújo - Daniel Rittner, Murillo Camarotto e Renan Truffi (Valor)

 Congresso cobra demissão imediata de Araújo

Em um depoimento de quase quatro horas, Araújo alternou momentos em que desafiou parlamentares com outros nos quais parecia acuado, gaguejando e com suor escorrendo pela testa
Por Daniel Rittner, Murillo Camarotto e Renan Truffi, Valor — Brasília, 24/03/2021
Mais de dez senadores -- de diferentes partidos -- cobraram duramente o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, pela condução errática da política externa e elevaram a pressão por sua saída imediata do cargo. Em um depoimento de quase quatro horas, Araújo alternou momentos em que desafiou parlamentares com outros nos quais parecia acuado, gaguejando e com suor escorrendo pela testa.
"Com toda a humildade, faço um apelo: renuncie. O senhor não tem mais condições de continuar à frente do ministério", pediu o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). "Pode ser um excelente diplomata, mas não é o seu momento. Pelos brasileiros, renuncie a esse ministério".
Durante toda a audiência, Araújo foi questionado sobre sua postura em episódios como a demora em reconhecer a vitória eleitoral de Joe Biden nas eleições americanas, a invasão do Capitólio (na qual chamou manifestantes de "cidadãos de bem"), as rusgas públicas com o embaixador da China em Brasília, o uso do termo "comunavírus" e da expressão "pária internacional" para designar a forma como o Brasil deveria ser visto no mundo.
"O senhor realmente cursou o Instituto Rio Branco?", questionou o senador Fabiano Contarato (Rede-ES). Ele reclamou que faltavam sujeito, verbo e predicado na maioria das respostas de Araújo. "O senhor faria bem ao corpo diplomático brasileiro se deixasse o seu posto".
Em vários momentos, Araújo questionou as "fontes" que subsidiavam os questionamentos dos senadores e usou um tom desafiador. Em uma ocasião, ironizou: "Deixe eu tentar encontrar alguma pergunta objetiva aqui".
"Nós não somos 80 idiotas", retrucou Tasso. A senadora Daniella Ribeiro (PP-PB) queixou-se da "falta de respeito" e apontou confusão do chanceler em suas intervenções. "Não sei se o chanceler não entende ou se faz-se de desentendido. Provavelmente seja assim nas nossas relações exteriores", disse Daniella. Jorge Kajuru (Cidadania-GO) veio em seguida: "Saia do Ministério das Relações Exteriores!".
Pela manhã, durante a reunião convocada pelo presidente Jair Bolsonaro para a criação de um comitê de crise sobre a pandemia, Araújo ouviu uma reprimenda pública do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O parlamentar cobrou uma atuação mais incisiva da diplomacia brasileira para a busca de vacinas no exterior e chegou a dizer que “o Itamaraty precisa funcionar”.
Segundo autoridades que participaram dessa reunião, o chanceler demonstrou desconforto com as declarações de Lira, mas não respondeu. Saiu antes do término e seguiu para o Congresso, onde ouviu ataques e sugestões de demissão por horas a fio, especialmente no Senado Federal.
"Vossa Excelência é unanimidade em rejeição e incompetência nesta Casa", disse, em tom forte, a senadora Simone Tebet (MDB-MS). "Faço um desafio: peça exoneração por 30 dias. Veja se, com esse gesto, não conseguimos mais rapidamente as vacinas da Pfizer e [o excedente de vacinas] dos Estados Unidos. Com esse gesto, estaríamos nos redimindo perante a China e os americanos".
Simone atribuiu ao chanceler uma "guerra ideológica desnecessária" e a "a radicalização ao extremo de irmãos brasileiros que hoje não se sentam à mesma mesa". "Não é pessoal. O senhor não foi bom para o Brasil. Peça para sair e durma com a consciência tranquila", completou Mara Gabrilli (PSDB-SP).
O ambiente da sessão no Senado, que já era de cobrança, ficou ainda mais tenso com um episódio no meio do depoimento. O assessor internacional da Presidência da República, Filipe Martins, irritou senadores ao fazer um gesto considerado "obsceno" durante a audiência pública. O gesto com as mãos foi feito durante o discurso do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), num momento em que Filipe Martins aparecia ao fundo da transmissão, na TV Senado.
O líder da oposição na Casa, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), chamou atenção para o fato e pediu providências. "Eu estou acompanhando aqui a sessão quando, também pelas redes sociais, tenho conhecimento de que, durante a fala de Vossa Excelência, o senhor que estava localizado logo atrás, o Filipe Martins, que é analista político e assessor especial para Assuntos Internacionais do presidente Jair Bolsonaro, estava demonstrando gestos obscenos. No meu sentir, [foram] gestos obscenos", afirmou Randolfe.
O senador do Amapá sugeriu que Filipe Martins explicasse o movimento com as mãos. "Eu não sei qual o sentido do gesto do senhor Filipe. Era bom que ele explicasse, mas isso é inaceitável, presidente".
Araújo tentou se defender. "Nós não somos perfeitos, mas estamos convencidos de que estamos defendendo os interesses nacionais, estabelecidos pela Constituição. Eu tenho a certeza de que tenho feito tudo, absolutamente tudo, para ajudar o meu país. Tenho um amor profundo pelo povo brasileiro e não admito que ninguém questione", disse o ministro, emocionando-se e segurando lágrimas.
"Saia do Ministério das Relações Exteriores!", afirmou o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO).
Kátia Abreu (PP-TO), presidente da Comissão de Relações Exteriores, falou em uma condução "desastrosa" da política externa e lamentou o "tratamento descortês" dado ao diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom, durante a pandemia.
Enquanto os senadores repudiavam a postura de Araújo, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado, pediu a palavra e repreendeu o assessor internacional da Presidência da República, Filipe Martins, que acompanha Araújo na audiência pública e estava sentado ao fundo da sala.
Em um vídeo que circulava entre os senadores, Martins foi flagrado fazendo gestos considerados obscenos enquanto o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), conduzia a sessão. Randolfe pediu retratação imediata do assessor presidencial ou sua condução imediata pela polícia legislativa para fora da Casa. "É um circo de horror que eu nunca vi", completou Rose de Freitas (MDB-ES).
Gaguejante e aparentemente nervoso, o chanceler repetiu sua tradicional cartilha, repudiando avaliações de que o Brasil foi subserviente aos Estados Unidos durante a gestão de Donald Trump e buscando ilustrar os esforços do governo em busca da viabilização da oferta de mais vacinas.
Em vários momentos, no entanto, ele questionou as "fontes" que subsidiavam os questionamentos e usou um tom desafiador. Em uma ocasião, ironizou: "Deixe eu tentar encontrar alguma pergunta objetiva aqui".
Araújo também se emocionou num trecho do depoimento. "Nós não somos perfeitos, mas estamos convencidos de que estamos defendendo os interesses nacionais, estabelecidos pela Constituição. Eu tenho a certeza de que tenho feito tudo, absolutamente tudo, para ajudar o meu país".
"Tenho um amor profundo pelo povo brasileiro e não admito que ninguém questione", ainda disse o ministro, segurando lágrimas.
Gestos obscenos
O gesto com as mãos foi feito pelo assessor Filipe Martins durante o discurso de Rodrigo Pacheco, num momento em que Filipe Martins aparecia ao fundo da transmissão, na TV Senado.
Logo após o ocorrido, Randolfe chamou atenção para o fato e pediu providências. "Eu estou acompanhando aqui a sessão quando, também pelas redes sociais, tenho conhecimento de que, durante a fala de vossa excelência, o senhor que estava localizado logo atrás, o Filipe Martins, que é analista político e assessor especial para Assuntos Internacionais do presidente Jair Bolsonaro, estava demonstrando gestos obscenos. No meu sentir, [foram] gestos obscenos", afirmou Randolfe.
O senador do Amapá sugeriu que Filipe Martins explicasse o movimento com as mãos. "Eu não sei qual o sentido do gesto do senhor Filipe. Era bom que ele explicasse, mas isso é inaceitável, presidente. Em uma sessão do Senado Federal, durante a fala do presidente do Senado, um senhor está procedendo com gestos obscenos, está ironizando o pronunciamento do presidente da nossa Casa. Isso é inaceitável, é intolerável", complementou.
Em resposta, Pacheco afirmou que iria pedir à Secretaria-Geral da Mesa e à Polícia Legislativa que identificassem o fato apontado, mas optou por dar seguimento aos trabalhos. "Não prejudicarei o andamento desta sessão do Senado Federal, porque é muito importante nós ouvirmos o ministro de Estado das Relações Exteriores, que aqui comparece para poder fazer os esclarecimentos necessários aos senadores", afirmou.
Filipe Martins é um dos principais integrantes da chamada ala "ideológica" do governo e foi promovido a assessor-chefe da Assessoria de Assuntos Internacionais da Secretaria Especial de Assuntos Estratégicos (Sae) da Presidência da República no ano passado. Ele é bem próximo dos filhos de Bolsonaro e um dos principais auxiliares do presidente, tendo acompanhado Bolsonaro em diversas de suas missões ao exterior.
O gesto feito pelo assessor durante a sessão lembra a representação de "OK". Segundo a BBC Brasil, esse sinal de mão ganhou nova conotação para grupos extremistas e, por isso, foi adicionado recentemente a uma lista de símbolos de ódio. O gesto com forma arredondada entre o indicador e o polegar, que também é um emoji popular, foi classificado como "uma verdadeira expressão da supremacia branca" pela Liga Antidifamação, organização dos Estados Unidos que monitora crimes de ódio. Os três dedos esticados simbolizam a letra "w" (em referência à white, do inglês para branco), enquanto o círculo formado significaria a letra "p" (power, do inglês para a palavra poder).