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sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Importacao de medicos cubanos e a situacao do atendimento no Brasil

Algumas informações: 
O acordo foi formalizado por meio de um termo de cooperação com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), que receberá R$ 10 mil por médico e repassará esse valor ao Ministério da Saúde cubano. (...) Na América Latina, Venezuela e Bolívia já tiveram convênios semelhantes. Nesses países, 75% do salário do médico era repassado a Cuba, segundo entidades ligadas ao setor de saúde. (...) Diferentemente dos demais inscritos no Mais Médicos, os cubanos não poderão escolher os municípios nos quais vão atuar... Esses profissionais não poderão trazer a família, como os outros estrangeiros do programa. “O acordo só prevê os médicos”...
Até o fim do ano, grupos de médicos de Cuba chegarão mensalmente. Em outubro, 2 mil virão ao país para a segunda fase do programa, aberta nesta semana. De acordo com Padilha, esses médicos preencherão as vagas remanescentes dos profissionais que estudaram no Brasil, dos brasileiros formados no exterior e de outros estrangeiros com inscrições individuais. “Eles vêm para vagas não preenchidas pelos brasileiros. Vêm profissionais bastante experientes. Todos têm residência em medicina da família”, disse Padilha. Os cubanos também não revalidarão os diplomas e receberão uma autorização especial para trabalhar no país.
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Da coluna diária do jornalista Políbio Braga, 22/08/2013

Entrevista, Osmar Terra - Importaremos também enfermeiros, hospitais, laboratórios, dentistas, macas, remédios, gestores e equipamentos ?

ENTREVISTA: Osmar Terra, deputado PMDB do RS, ex-secretário da Saúde
Importaremos também enfermeiros, laboratórios, dentistas, macas, remédios, gestores e equipamentos ?

Importar médicos cubanos resolverá o problema da saúde pública no Brasil ?
O governo federal não fez o que devia ter feito em relação aos profissionais da saúde. Em 2006, o governo Lula concluiu um projeto para criar carreiras para médicos, enfermeiros, dentistas, e engavetou tudo para não gastar dinheiro. Agora vem com esta solução imediatista, eleitoreira, irresponsável, importando 4 mil médicos cubanos generalistas por três anos.
Que jogo é este, então ?
Só jogou a população contra os médicos. O governo nada faz para evitar o sucateamento dos hospitais, contratar e qualificar mais enfermeiros, laboratórios, médicos, equipamentos, macas, remédios, gestores – ou vai trazer tudo isto de Cuba também ?

Como convencer o médico brasileiro a trabalhar no interior e em regiões mais carentes ?
Com carreira federal, é claro, para deslocar o servidor para qualquer local do País.

Isto é possível ?
Eu fiz isto como prefeito de Santa Rosa, há 20 anos. Pagamos 30 salários mínimos para médicos, 22 para enfermeiras, 28 para dentistas. Todos ficaram conosco. Muitos estão até se aposentando.

Esses médicos cubanos possuem alguma qualificação ? 
São bons clínicos gerais, sim, mas é só. O dinheiro nem irá para eles, mas para o governo de Cuba. Eles ficarão com menos de 10% do valor.


Como é financiada a saúde pública no Brasil ?
Em 2002, o governo federal entrava com 60% dos recursos para a área da saúde no Brasil, mas hoje a fatia caiu para 40%. A carga mais severa ficou com os municípios, que deviam aplicar constitucionalmente algo como 15% e, hoje, na média, já respondem por 25%, o que os sufoca de modo selvagem. 
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Opinião do leitor - Brasil não pode tolerar trabalho escravo de médicos apenas para ajudar a balança comercial de Cuba

Opinião do leitor

4.000 médicos  a  R$ 10.000 por mês, significa para Cuba uma renda de US$ 200 milhões por ano. Colocaram outra instituição de intermediária, a Organização Panamericana de Saúde, só para enganar os mais bobos. É porque Cuba necessita de caixa, e de subsídios de governos que comungam a sua ideologia, que este negócio está saindo. Cuba está falida desde a década de 80, quase morreu de fome quando os russos cortaram os subsídios. Sobrevive por esmolas de cubano-americanos, com o turismo e com os subsídios dos que comungam a sua ideologia, como Venezuela, e empréstimos do governo brasileiro, sempre perdoados. O incrível é que os médicos estão sujeitos ao confisco do valor de seu trabalho, ou em outras palavras, o governo do Brasil e de Cuba estão se apropriando do fruto do trabalho humano, ou da "mais valia" como pregava Karl Marx. Trabalho escravo mereceria um editorial da imprensa livre, e com a coragem de arriscar perder as verbas de publicidade oficiais e das estatais. 

Artur Zelain Martins, Porto Alegre.
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Onyx apresenta projeto proibindo exercício da medicina para médico estrangeiro que não revalidar diploma no Brasil

Tendo em vista a confirmação da vinda dos médicos-escravos de Cuba para atuar no Brasil, o deputado Onyx informou esta manhã ao editor que protocolou o Projeto de Lei 6102/2013, que veda, em todo o território nacional, nas redes pública e privada de saúde, o exercício da medicina por médicos formados no exterior que não tenham seus diplomas de graduação ou pós-graduação, expedidos por universidade estrangeira

. A revalidação precisa ser feita por  órgão responsável pelo registro profissional e normatização da prática profissional da medicina. 

CLIQUE AQUI para examinar o inteiro teor do projeto.

domingo, 14 de julho de 2013

Os centauros da medicina companheira: meio medico, meio escravo - Fernando Reinach

Quando saiu a medida provisória criando o programa "Mais médicos", deveria ter sido criada uma página a respeito pelo Ministério da Saúde, mas não parece haver nada. Talvez tudo não passe de uma ficção, um programa construído apenas para inserir no sistema de atendimento médico do Brasil os companheiros dos companheiros que tinha ido fazer um curso de "medicina" na Escuela Latinoamericana de Salud, de Cuba, e também para acomodar algumas centenas de médicos cubanos, exportados pelo regime a preço de custo (cubano), mas que depois reverte em dólares para o regime comunista.
A opinião do cientista Fernando Reinach é bem mais severa.
Ao final, a carta de um médico à PR, de Porto Alegre, terra governada pelos companheiros.
Paulo Roberto de Almeida

FERNANDO REINACH
O Estado de S.Paulo, 13 de julho de 2013

Incapaz de convencer jovens médicos a trabalhar no SUS, o governo federal resolveu criar um novo profissional, o meio médico meio escravo. Esse profissional, inspirado nos mitológicos centauros e na famosa meia muçarela meia calabresa, virá em duas versões, nacional e importado. É a pizza que vai ser servida no SUS.

Durante anos dei aula para os calouros da Faculdade de Medicina da USP. Eram jovens que haviam escolhido uma profissão em que a derrota é certa. Ninguém consegue escapar da morte. Ingenuamente arrogantes e prepotentes, algo compreensível em quem sempre foi o melhor aluno, sobreviveu dois anos de cursinho, e se classificou entre os 300 melhores no vestibular mais competitivo, acreditavam que se tornando médicos curariam doenças letais, mitigariam o sofrimento, descobririam novos remédios e, lutando contra o único inimigo realmente invencível, ajudariam a humanidade. Durante os dois primeiros anos de curso, a maior dificuldade era mantê-los longe do hospital. Bastava surgir a oportunidade de participar em alguma atividade que envolvesse pacientes e a frequência nas minhas aulas de bioquímica minguava. Isso não era um problema, aqueles alunos aprendiam sozinhos.
Mas nos anos seguintes a realidade desabava sobre a cabeça dos alunos. O primeiro cadáver dissecado, cenas de sofrimento, a primeira morte observada de perto, a primeira parada cardíaca que não consegui reverter, um erro que só não foi fatal porque um supervisor estava atento. A primeira noite no pronto-socorro, uma lâmpada quebrada dentro da vagina de uma paciente. Na década de 80 ano, um aluno se suicidava todo ano. Hoje existe na Medicina da USP um serviço dedicado exclusivamente a ajudar os alunos a enfrentar a impotência e o convívio com o sofrimento e a morte.
Mas a realização do sonho também aparece, sofrimentos são amenizados, situações desesperadoras são revertidas. Aos poucos, os alunos percebem que a medicina moderna é poderosa, mas complexa. Com conhecimento teórico, muita prática e um trabalho coordenado de toda a equipe, o sonho pode se tornar realidade.
A arrogância do calouro que acreditava que se bastava, que o sucesso dependia somente de sua dedicação e esforço, desaparece. Ele aprende que o bom médico, sem recursos diagnósticos e equipamentos, sem leitos hospitalares, sem remédios, sem enfermeiros, sem fisioterapeutas, sem nutricionistas e sem um processo de gestão sofisticado e ágil, vai praticar uma medicina medíocre.
Doenças que poderiam ser curadas pioram, doenças controláveis progridem rapidamente e mortes que poderiam ser evitadas ocorrem frequentemente. Aprendem que o médico é somente uma peça importante do sistema de saúde. Esse aprendizado não é teórico, os alunos trabalham no caos semiorganizado do Hospital das Clínicas, fazem estágios em outros hospitais públicos e em centros de saúde. Ao terminar o curso, eles sabem que praticar a medicina sem suporte é tão difícil quanto jogar tênis sem raquete.
Para os recém-formados, a frustração mais difícil de tolerar é não praticar a medicina que aprenderam por falta de infraestrutura. Muitos, incapazes de suportar a impotência diante de pacientes que voltam piores por falta de remédio, frustrados diante de pacientes que não podem ser tratados por falta de resultados de diagnósticos, ou desesperados com a visão de filas infinitas, abandonam a prática médica. Outros, apesar de despreparados para tarefas administrativas, se tornam gestores na esperança de melhorar a infraestrutura pública. Vários preferem trabalhar em hospitais de elite, onde a infraestrutura é quase perfeita. Alguns desenvolvem uma casca mais grossa e aceitam fazer o que é possível, tolerando a frustração. E é claro que há os que se aproveitam da bagunça para fingir que trabalham e receber o salário no final do mês.
Não é de se espantar que nos últimos anos os serviços públicos não tenham conseguido atrair médicos para trabalhar nos postos de saúde e hospitais onde as condições de trabalho são piores. Os salários foram aumentados, mas a maioria dos médicos recusa um emprego fixo de R$ 10 mil em um local sem infraestrutura. O experimento não foi levado adiante, mas seria interessante saber o salário necessário para convencer os melhores alunos de nossas melhores universidades a venderem seus sonhos.
Melhorar as condições de trabalho é a solução óbvia. Mas isso exige que o governo assuma a culpa e deixe de empurrar o problema com a barriga. Mais fácil é culpar os jovens médicos, pouco patrióticos, que só pensam em dinheiro e se recusam a trabalhar em um sistema público de saúde bem organizado, eficiente, sem filas e tão bem avaliado pela população.
Diálogo no Planalto: “A solução é forçar os médicos a trabalhar onde queremos. Mas como é possível forçar alguém que possui um CRM e portanto o direito de praticar sua profissão em qualquer lugar do País? Fácil, basta criar um CRM provisório, que só permite ao recém-formado clinicar no local designado. Cumprida a missão, liberamos o CRM definitivo. Mas isso não é uma forma de coerção? Não se preocupe, o trabalho cívico fará parte formal do treinamento, basta aumentar o curso em dois anos. Boa ideia, quem escreve a medida provisória?”
No dia seguinte: “Um aluno com um CRM provisório é um médico de verdade? Pode tratar pacientes sem supervisão? Claro que sim, senão como ele vai trabalhar no local designado? Mas então ele não é um aluno, é um médico escravizado. Não, escravidão é inconstitucional, ele tem de ser também aluno, vai lá, escreve a MP, depois resolvemos esse detalhe. Sim, chefe, mas que tal incluirmos os médicos importados na MP? Basta dar a eles uma licença provisória para praticar a medicina no País, uma espécie de CRM provisório atrelado ao local de trabalho. Brilhante, vai, escreve a MP que o Diário Oficial fecha daqui a duas horas.”

No terceiro dia eles descansaram. Haviam criado o meio médico, meio escravo. A pizza que esperam servir aos manifestantes. Se tudo der certo, agora vamos protestar na frente das Faculdades de Medicina e do CRM, os verdadeiros culpados pela crise na saúde pública.
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CARTA À PRESIDENTE DILMA
02/07/2013
Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Milton Pires

Excelentíssima Sra. Presidente da República Dilma Rousseff

Permita-me a apresentação: na minha opinião eu sou um médico; na sua um "trabalhador da saúde". Na minha opinião,medicina é cuidar de pessoas doentes; na sua é fazer "transformação social". Eu penso em salvar vidas; a senhora em ganhar votos. Como podemos ver, a senhora e  eu, não temos muito em comum à primeira vista mas existem na minha vida alguns fatos que a senhora desconhece.

Assim como a senhora,eu já fui marxista – e dos fanáticos! Brigava com colegas da faculdade no final dos 80 e início dos anos 90 para ver seu projeto de poder realizado. Caminhei ao lado daquele seu amigo que gosta de uma cachacinha e costuma ser fotografado com livros de cabeça para baixo..Conversei pessoalmente com o "poeta do sêmen derramado" que agora governa o Rio Grande do Sul..

Não tinha ideia correta daquilo que havia acontecido no Brasil entre 1964 e 1985. Imaginava, como a senhora quer fazer parecer até hoje, que tudo estava indo bem até que militares malvados que não tinham nada para fazer decidiram, com ajuda dos americanos, derrubar o governo brasileiro.

Eu só me dei conta, presidente, de quem Lula, a senhora e seu Partido-religião representavam quando comecei a trabalhar com a gente de vocês aqui em Porto Alegre a partir de 98. Duvido que eu estivesse mal-preparado, sabe? Eu já tinha feito 6 anos de faculdade, um ano de residência em Pediatria, um de Medicina Interna e dois de Cardiologia. Gostaria que a senhora visse em que lugar seus "cumpanheros" aqui dos pampas me colocaram para trabalhar...Imagino a senhora doente naquelas condições de segurança, higiene, espaço e administração que a ralé do PT do Rio Grande do Sul nos ofereceu.

A senhora tem ideia de como deve se sentir um médico ao ter seu estágio probatório avaliado por técnicos de enfermagem? A senhora sabe o que é receber, depois de tudo que se estudou na vida, ordens de enfermeiras, presidente? Em nome de que? Em nome de um delírio chamado "democratização da gestão"? Em nome de um absurdo chamado "controle social"??

A senhora tem alguma noção de quantas pessoas eu vi morrerem depois que esse seu partido de assassinos e mensaleiros terminaram com o resto da rede hospitalar brasileira "aparelhando" a gestão dela com uma legião de analfabetos, recalcados, alcoólatras e incompetentes que por oferecer uma parte de seu salário ao PT passaram a dar ordens a homens e mulheres com capacidade de salvar vidas ???

Mas por favor, não fique ofendida comigo presidente, de certa forma essa carta é um agradecimento, sabe? Formado há quase 20 anos, eu nunca havia visto os médicos brasileiros tão unidos quanto agora. É mais um mérito seu e desse seu partido a promover a maior humilhação que os médicos de um país sofreram até hoje! A senhora não tem vergonha de apelar para uma ditadura bananeira, para um país que mata, tortura, prende e vigia seus próprios cidadãos para fornecer médicos para o SEU povo? A senhora é brasileira, ou não, presidente Dilma??

Se não tem vergonha da medicina do seu país, tenha pelo menos do seu povo! A senhora nasceu aqui e a primeira pessoa que lhe viu foi provavelmente um médico do Brasil. Provavelmente vai ser algum colega, intensivista como eu sou hoje, quem vai estar ao seu lado no último momento e mesmo assim a senhora quer chamar médicos cubanos para enganar nossa gente pobre e doente a ponto de garantir sua reeleição? 

Quem lhe deu esse conselho, presidente Dilma? Identifique por favor, um por um, os médicos que lhe cercam e sugeriram semelhante ideia! A senhora e eu já conhecemos alguns, né?  Vamos apresentar os demais ao Conselho Federal de Medicina, ou não?

Presidente Dilma, até bandidos e prostitutas se ofendem quando tem seu território e ganha pão ameaçados. Nós somos médicos, nós salvamos vidas e não vamos permitir que uma profissão cuja origem se perde no tempo seja levada ao fundo do poço por um partido como o da senhora com o argumento de que estamos sendo corporativistas e o Brasil está sem médicos.

Deus lhe proteja na batalha que vai enfrentar conosco, presidente. Se a senhora for ferida vai precisar ser atendida por um médico – e eu duvido muito que ele fale português..

Porto Alegre, 2 de julho de 2013

Milton Simon Pires é Médico - CREMERS 20958.

domingo, 30 de junho de 2013

Medicos de qualidade, hospitais abaixo da qualidade - Juliana Mynssen da Fonseca Cardoso

Juliana Mynssen da Fonseca Cardoso
O Globo, 30/06/2013

Há alguns meses eu fiz um plantão em que chorei. Não contei à ninguém (é nada fácil compartilhar isso numa mídia social). Eu, cirurgiã-geral, "do trauma", médica "chatinha", preceptora "bruxa", que carrego no carro o manual da equipe militar cirúrgica americana que atendia no Afeganistão, chorei.

Na frente da sala da sutura tinha um paciente idoso internado. Numa cadeira. Com o soro pendurado na parede num prego similiar aos que prendemos plantas (diga-se: samambaias). Ao seu lado, seu filho. Bem vestido. Com fala pausada, calmo e educado. Como eu. Como você. Como nós.

Perguntava pela possibilidade de internação do seu pai numa maca, que estava há mais de um dia na cadeira. Ia desmaiar. Esperou, esperou, e toda vez que abria a portinha da sutura ele estava lá. Esperando. Como eu. Como você. Como nós.

Teve um momento que ele desmoronou. Se ajoelhou no chão, começou a chorar, olhou para mim e disse "não é para mim, é para o meu pai, uma maca". Como eu faria. Como você. Como nós.

Pensei "meudeusdocéu, com todos que passam aqui, justo eu... Nãoooo..... Porque se chorar eu choro, se falar do seu pai eu choro, se me der um desafio vou brigar com 5 até tirá-lo daqui".

E saí, chorei, voltei, briguei e o coloquei numa maca retirada da ala feminina.

Já levei meu pai para fazer exame no meu HU. O endoscopista quando soube que era meu pai, disse "por que não me falou, levava no privado, Juliana!" Não precisamos, acredito nas pessoas que trabalham comigo. Que me ensinaram e ainda ensinam. Confio. Meu irmão precisou e o levei lá.

Todos os nossos médicos são de hospitais públicos que conhecemos, e, se não os usamos mais, é porque as instituições públicas carecem. Carecem e padecem de leitos, aparelhos, materiais e medicamentos.

Uma vez fiz um risco cirúrgico e colhi sangue no meu hospital universitário. No consultório de um professor ele me pergunta: "e você confia?".

"Se confio para os meus pacientes tenho que confiar para mim."

Eu pratico a medicina. Ela pisa em mim alguns dias, me machuca, tira o sono, dá rugas, lágrimas, mas eu ainda acredito na medicina. Me faz melhor. Aprendo, cresço, me torna humana. Se tenho dívidas, pago-as assim. Faço porque acredito.

Nesses últimos dias de protestos nas ruas e nas mídias brigamos por um país melhor. Menos corrupto. Transparente. Menos populista. Com mais qualidade. Com mais macas. Com hospitais melhores, mais equipamentos e que não faltem medicamentos. Um SUS melhor.

Briguei pelo filho do paciente ajoelhado. Por todos os meus pacientes. Por mim. Por você. Por nós. O SUS é nosso.

Não tenho palavras para descrever o que penso da "Presidenta" Dilma. (Uma figura que se proclama "a presidenta" já não merece minha atenção).

Mas hoje, por mim, por você, pelo meu paciente na cadeira, eu a ouvi.

A ouvi dizendo que escutou "o povo democrático brasileiro". Que escutou que queremos educação, saúde e segurança de qualidades. "Qualidade"... Ela disse.

E disse que importará médicos para melhorar a saúde do Brasil....

Para melhorar a qualidade....?

Sra "presidenta", eu sou uma médica de qualidade. Meus pais são médicos de qualidade. Meus professores são médicos de qualidade. Meus amigos de faculdade. Meus colegas de plantão. O médico brasileiro é de qualidade.

Os seus hospitais é que não são. O seu SUS é que não tem qualidade. O seu governo é que não tem qualidade.

O dia em que a Sra "presidenta" abrir uma ficha numa UPA, for internada num Hospital Estadual, pegar um remédio na fila do SUS e falar que isso é de qualidade, aí conversaremos.

Não cuspa na minha cara, não pise no meu diploma. Não me culpe da sua incompetência.

Somos quase 400mil, não nos ofenda. Estou amanhã de plantão, abra uma ficha, eu te atendo. Não demora, não.

Não faltam médicos, mas não garanto que tenha onde sentar. Afinal, a cadeira é prioridade dos internados.

Hoje, eu chorei de novo.


Juliana Mynssen da Fonseca Cardoso é cirurgiã geral no Hospital Estadual Azevedo Lima, no Rio de Janeiro.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

FIFA-manifestantes: unidos por uma saude melhor (por enquanto so a FIFA...)

Não satisfeita com hospitais públicos, Fifa será atendida pela rede particular

Entidade acredita que rede pública não oferece um serviço minimamente decente

22 de junho de 2013 | 8h 12
JAMIL CHADE E LEONARDO MAIA - O Estado de S. Paulo
RIO – A Fifa e os manifestantes que tomaram as ruas brasileiras tem pelo menos um ponto em comum: ambos concordam que os hospitais públicos brasileiros não oferecem um serviço minimamente decente. Ao contrário do que ocorreu na África do Sul, quando a entidade credenciou algumas unidades públicas de saúde para atender seus membros e investiu neles, no Brasil a Fifa será atendida pela rede particular.
Caso um jogador, cartola, repórter estrangeiro ou membro da entidade sofra algum problema de saúde, será levado para um desses hospitais credenciados. Todos, salvo no caso de Porto Alegre, são clínicas privadas.
"Essa é uma definição da Fifa escolher em qual rede quer ter seu atendimento. O governo brasileiro tem se preparado para melhorar toda sua rede, estamos no processo de preparação na rede pública. Estamos investindo pesadamente", comentou Derborah Malta, diretora de promoção da saúde do Ministério da Saúde.
Com o cuidado de medir as palavras, o diretor médico da Fifa, Jiri Dvorak, procurou não fazer críticas diretas ao sistema de saúde público brasileiro e dizer que a decisão tomada levou em conta a orientação das autoridades locais.
"Quando escolhemos os hospitais nós o fazemos junto com o COL (Comitê Organizador Local). É uma avaliação complexa. Não estamos impondo que seja hospitais privados. Temos um grupo independente que avalia (os hospitais)".
Diante de perguntas sobre os protestos que pedem por melhores hospitais públicos, Deborah disse que o governo Dilma tem como prioridade aumentar o orçamento da saúde.
"Atualmente 9% do PIB são investidos na saúde, mas achamos sempre que podemos investir mais. É uma demanda legítima de melhorias na saúde. Estamos trabalhando para melhorar a gestão e o investimento na saúde pública. Somos um país em desenvolvimento e ainda temos muito a construir", ponderou a diretora. 

domingo, 23 de junho de 2013

Milhares de medicos: para o que, exatamente? - o desabafo de uma medica do interior

Dilma, deixa eu te falar uma coisa! 
Fernanda Melo, médica, moradora e trabalhadora de Cabo Frio, cidade da baixada litorânea do estado do Rio de Janeiro.
[Recebido: 23/06/2013]

Este ano completo 7 anos de formada pela Universidade Federal Fluminense e desde então, por opção de vida, trabalho no interior. Inclusive hoje, não moro mais num grande centro. Já trabalhei em cada canto...

Você não sabe o que eu já vi e vivi, não só como médica, mas como cidadã brasileira. Já tive que comprar remédio com meu dinheiro, porque a mãe da criança só tinha R$ 2,00 para comprar o pão.

Por que comprei?

Porque não tinha vaga no hospital para internar e eu já tinha usado todos os espaços possíveis (inclusive do corredor!) para internar os mais graves.

Você sabe o que é puxadinho?
Agora, já viu dentro de enfermaria? Pois é, eu já vi. E muitos. Sabe o que é mãe e filho dormirem na mesma maca porque simplesmente não havia espaço para sequer uma cadeira?

Já viu macas tão grudadas, mas tão grudadas, que na hora da visita médica era necessário chamar um por um para o consultório porque era impossível transitar na enfermaria?

Já trabalhei num local em que tive que autorizar que o familiar trouxesse comida ( não tinha, ora bolas!) e já trabalhei em outro que lotava na hora do lanche (diga-se refresco ralo com biscoito de péssima qualidade) que era distribuído aos que aguardavam na recepção.

Já esperei 12 horas por um simples hemograma. Já perdi o paciente antes de conseguir um mera ultrassonografia. Já vi luva descartável ser reciclada. Já deixei de conseguir vaga em UTI pra doente grave porque eu não tinha um exame complementar que justificasse o pedido.

Já fui ambuzando um prematuro de 1Kg (que óbvio, a mãe não tinha feito pré natal!) por 40 Km para vê-lo morrer na porta do hospital sem poder fazer nada. A ambulância não tinha nada...

Tem mais, calma! Já tive que escolher direta ou indiretamente quem deveria viver. E morrer...

Já ouvi muito desaforo de paciente, revoltando com tanto descaso e que na hora da raiva, desconta no médico, como eu, como meus colegas, na enfermeira, na recepcionista, no segurança, mas nunca em você.

Já ouviu alguém dizer na tua cara: meu filho vai morrer e a culpa é tua? Não, né? E a culpa nem era minha, mas era tua, talvez. Ou do teu antecessor. Ou do antecessor dele...

Já vi gente morrer! Óbvio, médico sempre vê gente morrendo, mas de apendicite, porque não tinha centro cirúrgico no lugar, nem ambulância pra transferir, nem vaga em outro hospital?

Agonizando, de insuficiência respiratória, porque não tinha laringoscópio, não tinha tubo, não tinha respirador?

De sepse, porque não tinha antibiótico, não tinha isolamento, não tinha UTI?

A gente é preparado pra ver gente morrer, mas não nessas condições.

Ah Dilma, você não sabe mesmo o que eu já vi! Mas deixa eu te falar uma coisa: trazer médico de Cuba, de Marte ou de qualquer outro lugar, não vai resolver nada!

E você sabe bem disso.

Só está tentado enrolar a gente com essa conversa fiada. É tanto descaso, tanta carência, tanto despreparo...

As pessoas adoecem pela fome, pela sede, pela falta de saneamento e educação e quando procuram os hospitais, despejam em nós todas as suas frustrações, medos, incertezas...

Mas às vezes eu não tenho luva e fio pra fazer uma sutura, o que dirá uma resposta para todo o seu sofrimento!

O problema do interior não é falta de médico. É falta de estrutura, de interesse, de vergonha na cara. Na tua cara e dessa corja que te acompanha! 

Não é só salário que a gente reivindica. Eu não quero ganhar muito num lugar que tenha que fingir que faço medicina. E acho que a maioria dos médicos brasileiros também não.

Quer um conselho?

Pare de falar besteira em rede nacional e admita: já deu pra vocês!

Eu sei que na hora do desespero, a gente apela, mas vamos combinar, você abusou!

Se você não sabe ser "presidenta", desculpe-me, mas eu sei ser médica, mas por conta da incompetência de vocês, não estou conseguindo exercer minha função com louvor!


Não sei se isso vai chegar até você, mas já valeu pelo desabafo!