O que é este blog?

Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida;

Meu Twitter: https://twitter.com/PauloAlmeida53

Facebook: https://www.facebook.com/paulobooks

Mostrando postagens com marcador coronavirus. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador coronavirus. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 25 de março de 2020

Consequências econômicas do coronavirus - Armando Castelar Pinheiro (CB)

02:02:41 | 25/03/2020 | Economia | Correio Braziliense | 

Medidas econômicas de combate à crise

    ARMANDO CASTELAR
    Coordenador de economia aplicada do IBREFGV e professor do IE/UFRG
    O Covid-19 chegou ao Brasil com cerca de quatro semanas de defasagem em relação à Europa e aos EUA, mas com a mesma força. Nas duas últimas semanas, o número de casos diagnosticados aumentou à taxa de 34,6% ao dia, acumulando 1924 casos até a segunda-feira, sem dar sinais de arrefecimento. O quadro é preocupante: se não conseguirmos desacelerar o processo, ainda em abril teremos mais de 1 milhão de brasileiros contaminados, com o sistema de saúde abarrotado de pacientes graves e as mortes sendo contadas aos milhares.
    A quarentena se mostrou até aqui a forma mais eficaz de impedir a disseminação do vírus, mas ela tem consequências econômicas pesadas, que se somam às que resultam da decisão voluntária de evitar certos locais, como restaurantes, cinemas e shopping centers. Não foi à toa que os governos mundo afora hesitaram em instituí-la, o que em geral acabou resultando em avanço maior da epidemia do que de outra forma teria sido necessário.
    O tamanho do choque sobre a economia será não trivial: em vez da expansão que se esperava até um mês atrás, agora se espera forte contração do PIB no segundo trimestre deste ano. O governo estima que o PIB de 2020 ficará no mesmo patamar de 2019, mas hoje em dia um cenário de queda me parece mais plausível. Isso vai ajudar a derrubar ainda mais a inflação e a reduzir o deficit externo do país, mas, em compensação, as receitas tributárias vão cair muito e o desemprego subirá bastante.
    O perfil da recessão esperada para este ano será diferente do de outras que tivemos nas últimas décadas: ela afetará bem mais o setor de serviços, como confirmam dados divulgados esta semana para Austrália, Japão e Europa. A contração de serviços derrubará o emprego, em especial de trabalhadores menos qualificados. O drama social que vai daí advir poderá ser bem grave.
    Esse quadro, na minha visão, acaba com a pequena chance que ainda havia para a aprovação de reformas antes do recesso parlamentar de julho e das eleições municipais de outubro. Os desafios colocados para a política econômica agora são outros e não triviais.
    A curto prazo, o governo precisa criar uma rede de segurança para proteger as empresas e famílias que forem mais afetadas, ficando sem receitas e rendimentos, e que não tenham como se sustentar com suas reservas. É o caso, em especial, das micro, pequenas e médias empresas e dos trabalhadores de baixa renda, em particular os informais, que não contam com a proteção de programas como o seguro desemprego. A própria viabilidade da quarentena vai depender, na prática, da criação dessa rede de proteção social, pois sem ela muita gente pode decidir simplesmente sair às ruas do mesmo jeito para garantir o sustento de algum jeito.
    Ainda a curto prazo, o governo precisa garantir o bom funcionamento dos mercados, em especial do financeiro, já que a tendência natural neste momento é todos protegerem seu caixa. Isso em geral significa problemas para bancos e fundos de investimento e pode levar a que certos mercados não funcionem bem, como o de dólar e de títulos de dívida corporativa, por exemplo.
    Por fim, o governo precisa adotar medidas de estímulo para compensar o efeito depressivo das quarentenas, voluntárias e obrigatórias. Nesse caso, há uma discussão relevante do momento certo de dar os estímulos. Fazer isso em momento de grande retração de consumidores e empresas pode dar pouco resultado.
    Por seu lado, a pressão por pacotes maiores, em especial de gastos públicos, vai aumentar conforme a crise na saúde pública avança. É o que se viu nos EUA e na Alemanha, por exemplo: o volume de gastos previstos foi se multiplicando ao longo da semana, conforme os políticos reagiam à pressão dos eleitores.
    O governo também terá um grande desafio para decidir quando e como começar a reverter a quarentena e normalizar o funcionamento das empresas. O governo federal terá incentivo para fazer isso cedo, pois o desempenho da economia influencia mais na popularidade presidencial do que a de outros políticos. Os governadores e prefeitos, por seu lado, estarão mais preocupados com a pressão que a epidemia coloca sobre os serviços de saúde.
    Por fim, penso que o mundo e o Brasil não vão voltar simplesmente a ser como eram, como se uma onda tivesse passado por cima e depois partido. Haverá um esgarçamento do tecido social e novos atores devem ganhar destaque, com novas propostas de como devemos avançar nos anos à frente.

    O Impacto geopolítico do coronavirus - Rubens Barbosa

    O IMPACTO GEOPOLÍTICO DO CORONAVIRUS

    Rubens Barbosa
    O Estado de S. Paulo, 24/03/2020

                A epidemia do coronavirus – a pior dos últimos cem anos – terá profundas consequências sobre um mundo globalizado, sem lideranças alinhadas e pouco solidários entre si. O impacto econômico e social vai ser profundo, com o  custo recaindo nos mais pobres, fracos e idosos e em países menos preparados e desenvolvidos.
                Os efeitos sobre os países e sobre a economia global estão sendo sentidos e deverão se agravar antes de melhorar.
                Como a geopolítica global poderá ficar afetada pela epidemia? O que poderá mudar no cenário global?
                Duas observações iniciais. A crise atual mostrou que as fronteiras nacionais desapareceram com as facilidades do transporte aéreo e o imediatismo das comunicações. E que as políticas econômicas domésticas estão intimamente influenciadas pelo que ocorre no resto do mundo. Nenhum pais ou continente é uma ilha. Por outro lado, a extensão e a repercussão da crise, em larga medida, deriva do peso da China na economia global. No inicio da década, quando ocorreu a SARS, o pais representava 4% da economia global, hoje representa 17%. A China é a segunda economia mundial, o maior importador e exportador do mundo e, para culminar, se transformou em um centro de suprimento de produtos industriais para as cadeias globais de valor.  
                Quais as consequências na relação entre os EUA e a China, as duas superpotências atuais? Nos últimos anos, cresceu a competição entre os dois países pela hegemonia global no século XXI. Os EUA, ao se isolarem e ampliarem ações confrontacionistas, protecionistas, nacionalistas e xenófobas, dificultam a interdependência entre os países como ocorre com a globalização. Enquanto os EUA apontam a China como adversária estratégica e criticam o governo pela condução da epidemia (vírus chinês), Beijing, ao invés de fechar as fronteiras como fez Washington, favorece a abertura e a ampliação do comércio externo e manda médicos e equipamentos para a Itália, Espanha e Brasil a fim de ajudar a combater o coronavirus. A guerra fria econômica, a nova fase da confrontação, evidencia-se pela iniciativa chinesa da Rota da Seda, pela competição nas redes 5G, e por conflitos sobre propriedade intelectual e inovações tecnológicas. A pandemia poderá também ter um efeito relevante no cenário interno dos dois países com consequências geopolíticas. Xi Jim Ping disse que caso a epidemia se prolongasse haveria o risco de estabilidade econômica e social no país. A maneira como, de início, Trump conduziu a crise epidêmica em seu país foi muito criticada e sua popularidade caiu. As prévias do partido Democrata veem definindo Joe Biden como o candidato contra Trump com o apoio do centro moderado. Caso essa tendência se firme, pela primeira vez seria possível pensar numa derrota do atual presidente. O resultado da eleição em novembro poderá ter efeitos importantes sobre a geopolítica global caso haja uma mudança da atitude do governo de Washington em relação ao mundo.
                Outra questão é como países e empresas reagirão para reduzir sua dependência do mercado e da produção de partes e componentes chineses nas cadeias produtivas. A tendência poderá ser uma gradual redução dessa dependência e alguns países mais preparados e organizados, como o Vietnã e alguns outros países asiáticos, poderão sair ganhando com investimentos para substituir a China. A médio prazo, a projeção externa das grandes economias vai depender de sua base produtiva nacional e de sua competitividade.
    A estabilidade politica e econômica global poderá ser significativamente afetada pela vigilância biométrica, que poderá vir a ser implantada para evitar epidemias futuras. A preocupação com a saúde poderá levar à invasão da privacidade, com possíveis reflexos em políticas totalitárias. Quanto à dramática queda do crescimento dos EUA e da China, as projeções apontam para uma redução nos EUA de 4% no primeiro trimestre e 14% no segundo. Para a China, as estimativas de crescimento não são maiores de 3,5% para 2020. Caso os EUA entrem em recessão e as projeções sobre a China se confirmem, não se pode afastar a possibilidade de recessão e, no pior cenário, de uma depressão, talvez mais dramática do que a de 1929, por não ficar limitada ao setor financeiro. Como os países emergentes, produtores agrícolas, sairão de um cenário tão dramático como esse?
                A Europa está debilitada pela saída do Reino Unido e viu a situação humanitária, social e econômica agravada pela crise em alguns países, como a Itália e a Espanha. Em um cenário dramático como o atual, é possível prever que o continente sairá com seu poder relativo diminuído.
                O Brasil, uma das dez maiores economias do mundo, terá que se ajustar rapidamente à nova geopolítica global, sob pena de perder mais uma vez a oportunidade de projetar-se como uma potência média em ascensão.
                Em outros momentos da história, movimentos tectônicos transformaram o equilíbrio de poder entre as nações e os rumos da economia. O mundo  pós-coronavirus deverá emergir com novas prioridades e com um novo cenário  geopolítico, com a Asia – em especial a China –melhor posicionada para ocupar um crescente espaço politico e econômico.

    Rubens Barbosa, presidente do Instituto de Relações Internacionais e Comércio Exterior (IRICE)

    A introversão do império sob Trump - Nicholas Burns (Foreign Affairs)

    How to Lead in a Time of Pandemic

    What U.S. Foreign Policy Should Be Doing—But Isn’t—to Rally the World to Action

    The world has never before confronted a crisis quite like COVID-19, one that has simultaneously tested both the limits of public health systems everywhere and the ability of countries to work together on a shared challenge. But it is in just such moments of crisis that, under all prior U.S. presidents since World War II, the institutions of U.S. foreign policy mobilize for leadership. They call nations to action. They set the agenda for what needs to be done. They chart a path beyond the point of crisis.
    Unfortunately, President Donald Trump has spent the last three years demeaning and degrading these very institutions and denigrating the kind of U.S. leadership and global collective action they promote—which is one reason for the world’s inadequate response to the coronavirus pandemic thus far. To date, world leaders have done alarmingly little together to blunt the crisis. The United Nations Security Council is silent. The World Health Organization (WHO) offers a useful global clearinghouse but lacks a global megaphone to lead. European Union nations have defaulted to national solutions and closed borders to their neighbors for the first time in generations. China hid the crisis from the world in its critical early days. And Trump has been especially disengaged. Beyond individual phone calls with world leaders, he has made just one attempt to organize countries to band together—a single conference call with European, Canadian, and Japanese leaders in the G-7 forum he currently chairs.  
    Depending on how long it lasts, COVID-19’s impact could match that of a world war, in terms of the number of people it affects, the changes to daily life it brings on every continent, and its human toll. And the impact on business, trade, and markets could result in the most devastating global economic crisis since the Great Depression.
    Such worst-case scenarios will be hard to avoid without American leadership. National leaders, including Trump, have understandably focused first on addressing the threat to their own citizens. But the pandemic must be fought simultaneously at the global level, with the full support of powerful countries—those that have a capacity to organize, set priorities, and unite disparate and often conflicting national efforts. For all the changes to the geopolitical landscape in recent years, one basic reality has not changed: such global action is impossible if the world’s strongest country, the United States, is either absent or acting alone.

    THE CRISIS LAST TIME

    Compare the extraordinary inactivity in the face of the coronavirus pandemic with the global financial crisis of 2008–9. Governments led by French President Nicolas Sarkozy and U.S. Presidents George W. Bush and then Barack Obama employed the G-20 to unite the world’s most powerful economies to work together on a global solution. Both Bush and Obama understood that the United States, with all its power and immense credibility, had to lead if the world was going to prevent the Great Recession from becoming a Great Depression.
    Throughout its history, the United States has been fortunate to have visionary, charismatic leadership at times of great crisis: George Washington during the Revolution, Abraham Lincoln during the Civil War, Franklin D. Roosevelt during the Great Depression and World War II. Trump, unfortunately, has not proved himself to be anywhere close to such a leader. His character drives him to divide rather than to unite at home. His “America first” foreign policy instincts drive him to act alone in the world rather than in concert with others. He seems incapable of imagining that the United States might be made stronger and more effective by confronting a crisis in lockstep with its allies and partners.
    Since the start of the coronavirus crisis, those tendencies have defined the international aspects of Trump’s response. In his daily press conferences, he rarely mentions concrete work being done in tandem with other governments. He has initiated no significant international action. And he has dramatically weakened many of the federal agencies that would normally lead the global response to such a crisis: the State Department, the U.S. Agency for International Development, the Federal Emergency Management Agency, the National Security Council Directorate for Global Health Security and Biodefense (which he very unwisely disbanded in 2018). It was not a slip of the tongue last week when Trump referred publicly to the “Deep State Department.” Is it any wonder that the institutions of government he routinely derides, and has starved for funds and leadership, would prove so catastrophically unprepared?
    Any other recent American president would have confronted the crisis much more urgently from the start. The priority would have been the home front, of course. But both Obama and Bush, like many presidents before them, would have also understood the need for an all-out global effort, led by the United States and its allies, to confront the threat together.

    NOT TOO LATE

    The Trump administration has lost valuable time since December, but it is not too late to assemble an international coalition to begin to limit COVID-19’s ruthlessly efficient global contagion. What might such an effort look like? The administration should join with other global leaders to launch at least three high-level international efforts to tackle the most difficult challenges posed by the pandemic—one made up of top leaders, one made up of economic policymakers, and one made up of U.S. and Chinese officials.
    The first should be a G-20 leaders steering group to focus on the health and economic challenges ahead. Trump, Chinese President Xi Jinping, Indian Prime Minister Narendra Modi, Japanese Prime Minister Shinzo Abe, and German Chancellor Angela Merkel, to start, should begin meetings via teleconference to discuss how to blunt both the health and economic impacts. This leadership group should meet weekly if necessary to assess progress and resolve the inevitable disputes and misunderstandings of such a massive global undertaking. They should appoint and empower trusted senior cabinet-level officials to meet daily to identify the roadblocks in the international response; to resolve practical problems impeding relief efforts; and to partner on long-term plans that can ultimately bring the crisis to an end. Trump can create this group at a first meeting this week. There is no time to waste.
    The agenda of this steering group will need to be broad and ambitious. The most urgent issue is to agree that national public health officials must exchange quickly and effectively accurate data on the number of people affected and tested and the mortality rate in countries around the world. This alone would be of inestimable help to the experts seeking to understand and model the impact of the virus and thus predict its arc going forward. There will need to be agreement on the central clearing-house for this exchange of information, whether that is the WHO or another body that can work more efficiently.
    These leaders must also push countries with greater capacity to agree on a joint effort to transfer material assistance, training, and know-how to countries with weaker public health systems. As the pandemic will likely persist for most of 2020, it will be critical for countries that have largely recovered to extend help to those in greatest need. That is unlikely to happen without top-down pressure from leaders such as Trump and Xi.
    It is also not too early for leaders to assign a group of eminent global public health experts to determine what has gone right so far, what needs to be urgently fixed, which international institutions are failing, and what (if any) new ones may need to be created. Leaders need to demand that governments be better prepared, individually and collectively, for the next crisis. (This is an especially acute weakness of the United States, of course, whose level of preparedness and early response has been among the weakest of any major nation.) The G-20 should also work to coordinate the many research universities and private companies working on a vaccine. Governments are not in most cases well suited to carrying out research themselves, but they can cut through regulatory red tape, provide seed funding, and, most important, agree on an equitable means of distribution once the vaccine is available.
    National governments have also struggled with how to help the hundreds of thousands of people stranded in foreign countries, with borders slammed shut with surprising speed in every part of the world. Embassies and consulates now need help to protect their citizens caught in the no man’s lands of the pandemic. The G-20 countries are in the best position to help organize special flights and humanitarian convoys. One has to go back 80 years, to the start of World War II, to find a time when so many people have been left helpless outside their countries’ borders.
    This high-level steering group would also allow leaders to communicate more effectively in advance of national decisions that will inevitably affect other countries. When Trump, for example, announced that he intended to stop travel by Europeans to the United States, he did so without any significant consultation with the European Union, whose leadership was understandably furious as a result. (That one act may for years color the way European governments and citizens view the United States.)
    Most important, in place of such dissension, world leaders should deliver a united message of resolve to fight the pandemic together and to plan for our ultimate deliverance from it. Even a simple public message of solidarity would help—particularly from Trump, who has reached out precious few times to convey American sympathy to those suffering abroad. The world needs hope, and these leaders can provide at least a measure of it.

    PREVENTING A GREAT DEPRESSION

    With major economies grinding to a halt, Trump and other leaders should also take personal oversight of a second high-level group, this one made up of finance ministers and central bank presidents from G-20 countries and others. In the face of the most serious economic crisis in nearly a century, their focus should be to more closely align fiscal and monetary policies to limit the severity of a likely global recession.
    U.S. Federal Reserve Chair Jerome Powell and his central bank colleagues in Canada, Europe, and Japan set a good example earlier this month in coordinating a first tranche of common measures to stimulate the global economy. But these countries cannot hope to steer effective global action without officials from Brazil, China, India, and other rising powers at the same table.
    There are also some immediate problems that need fixing. One is to lower tariff barriers on the medical products and parts that will be essential to a more successful health response. This won’t be easy at a time of economic distress when the temptation of national governments will be to protect their own markets, but the costs of failing to do so will be enormous. Another is to evaluate the sanctions currently in place on governments such as Iran, North Korea, and Venezuela and to lift any that are impeding vital humanitarian aid, at least temporarily. Citizens of these countries, who are as vulnerable as anyone to the coronavirus, should not pay with their lives for the sins of their governments. Just as important, uncontrolled outbreaks will threaten new waves of infections beyond their borders.

    WHEN TWO TIGERS UNITE

    Finally, the Trump administration needs to establish much more frequent communication between Washington and Beijing—between Trump and Xi themselves, between Secretary of State Mike Pompeo and his counterpart, and between Secretary of the Treasury Steven Mnuchin and his counterparts. As the two major global powers, the United States and China must do more to mitigate the worst aspects of the crisis and to provide public leadership. The low point of this crisis politically has been the failure of Washington and Beijing to set aside broader tensions and combine forces to combat the pandemic.
    If anything, distrust and hostility between the United States and China have gotten worse. During the last few weeks, they have fought a running war of words over who is ultimately responsible for the pandemic. Chinese officials set a low bar by claiming—falsely and outrageously—that the U.S. military planted the virus in Wuhan to weaken China. But Trump has not helped by referring to COVID-19 as the “Chinese virus.”
    For the sake of both their own citizens and the rest of the world, Washington and Beijing must stop the blame game and start working together on solutions. If China and the United States can’t communicate and cooperate effectively, it will be next to impossible to avoid further tensions—dividing a world that, now more than ever, should be united for common action. But there is also much at stake for the two superpowers’ reputation and credibility. While China is rightly praised for its rigorous social-distancing campaign and recent humanitarian aid to the European Union and others, it continues to come under intense (and deserved) criticism for initially suppressing information about the epidemic and, even now, for not sharing complete data on infections. Trump, meanwhile, is not even trying to lead globally. That image—of a United States that was not there to help during the most serious crisis in most people’s lifetimes—could do irreparable damage to how the rest of the world views the country going forward.
    A global crisis of this magnitude carries a final, and potentially deadly, risk. If countries turn against one another, competing for scarce resources and failing to communicate responsibly, it is not unthinkable that conflict and war could result.

    A WAR WITH ONE SIDE                                         

    When the world faced a very different crisis at the start of World War II, it was the confident and united leadership of Franklin D. Roosevelt and Winston Churchill that created the alliance critical to ultimate victory and forged a vision in the Atlantic Charter for what would come in its wake. Leaders and commentators have compared the current struggle to war. What makes this crisis different, though, is that every country and all citizens are now on the same side.
    To have a chance of prevailing, we need focused, determined, and effective leadership and genuine collaboration from Trump and other global leaders. They will largely determine whether the world can meet this existential test. In an age of nationalism and “America first,” the truth should be clear for all to see: nothing in human history has so clearly demonstrated how the fate of everyone—all 7.7 billion people—in our highly connected world is now linked.

    sexta-feira, 20 de março de 2020

    Geopolitics of the Coronavirus: A Global Challenge Needs a Global Response - Bernhard Zand (Der Spiegel)

    Geopolitics in the Corona Era: A Global Challenge Needs a Global Response
    An Analysis by Bernhard Zand
    Der Spiegel, 20/03/2020

    As European countries and the U.S. seal off their borders and turn inward in an attempt to slow the spread of the coronavirus, China is sending aid around the world. What the world really needs, though, is a coordinated response.

    Serbian President Aleksander Vucic  threw a tantrum this week of a kind that should give us pause for thought. "European solidarity does not exist," he raged. "That was a fairy tale on paper." He complained that recently, Europe had sought to force Serbia to reduce its reliance on goods from China and import from Europe instead. Now that Serbia needs goods from Europe, though, "Serbian money is worth nothing."
    Serbia, which isn't yet a member of the European Union club, would like to purchase protective suits and face masks from Europe to prepare for the coronavirus pandemic. But Europe isn't selling because "medical goods can only be exported to non-EU countries with the explicit authorization of the EU governments," as European Commission President Ursula von der Leyen announced earlier this week. "This is the right thing to do, because we need that equipment for our health-care systems."
    So Vucic wrote a letter to Chinese President Xi Jinping, certain that Beijing would jump in to fill the void. "I believe in my brother and friend Xi Jinping, and I believe in China's help," he wrote.

    "A Friend In Need Is a Friend Indeed"
    It's a crazy situation: The government that initially tried to cover up the coronavirus outbreak, then implemented radical measures to fight it and slowly got it under control at great cost, is now being seen by a European leader as the savior in the corona crisis. And Beijing was more than happy to accept the compliment. "A friend in need is a friend indeed," wrote Chinese state news agency Xinhua. "When handshakes are no longer encouraged in Europe, China's helping hand could make a difference."
    And that is how geopolitics work: If a vacuum appears, someone immediately jumps in to fill it.
    The EU, of course, is fully aware that Beijing is on the lookout for such vacuums. Just a year ago, Brussels declared China to be a "systemic rival promoting alternative models of governance." Yet now, Europe is exposing a flank to that rival -- not just in the Balkans and Eastern Europe, where China has been trying to ramp up its influence for years, but even within the EU itself.
    Rome "cried for help when it comes to ventilators and masks," said Italian Foreign Minister Luigi Di Maio. Italy's EU ambassador, Maurizio Massari, says that the European Commission forwarded Italy's request for medical equipment to the EU member states, "but it didn't work."
    Meanwhile, two teams of Chinese doctors with aid supplies have arrived in Italy and a third is on the way. Spain, too, can count on assistance from China, said Xi Jinping following a telephone call with Spanish Prime Minister Pedro Sánchez. "Sunshine always comes after the rain," the Chinese president said. On Wednesday, Commission President von der Leyen announced that China would be providing 2 million masks to Europe, along with other supplies.
    Beijing is also shipping aid supplies to Iran, Iraq and the Philippines. Jack Ma, the founder of the vast Chinese online retailer Alibaba, announced he was sending 20,000 test kits, 100,000 masks and 1,000 protective suits for doctors and nurses to each of the 54 countries in Africa. Previously, the Jack Ma Foundation and the Alibaba Foundation had sent aid supplies to Japan, South Korea and other countries.
    Politics - and, by extension, geopolitics – does not come to a halt in times of crisis. On the contrary, they can become much more ruthless. That can be seen particularly clearly in the conflict between the U.S. and China, which has grown especially tense following months of a disastrous trade war. In February, Washington announced that Chinese state media representatives in the U.S. would be categorized as "foreign agents." One day later, Beijing threw out a trio of reporters from the Wall Street Journal, while on Tuesday of this week, the Chinese Foreign Ministry demanded that at least 13 reporters from the New York Times, the Washington Post and the Wall Street Journal turn in their press credentials. It is an unprecedented step.
    At the same time, Beijing and Washington are exchanging accusations about who is responsible for the current crisis. U.S. President Donald Trump has taken to calling it the "Chinese Virus," while a spokesman for the Chinese Foreign Ministry in all seriousness suggested that soldiers from the U.S. Army may have brought the virus into Wuhan.

    Nobody Will Lead the World Out of Its Current Misery Alone
    During the global economic and financial crisis of 2008-2009, the U.S. and China consulted closely with each other. Washington pumped liquidity into the banking system while China set up a vast investment program to stimulate the real economy. Together with their partners in Europe and the Far East, the largest and then-third largest economies in the world managed to withstand the crisis.
    Today, though, the two powers are far away from that kind of cooperation. China, now the world's second largest economy, didn't receive a single mention in Monday's statement from G-7 heads of state and government. For Beijing, which is not a member of the G-7, it is just another indication that China is all on its own.
    "If we lose control, the pandemic will risk a new round of global and economic crises and social turmoil," a Chinese government adviser told the South China Morning Post. "So far, there is no coordinated global action, and we may not see one any time soon."
    If climate change and the migration tragedies we have witnessed in recent years didn't make it obvious enough, COVID-19 is demonstrating it day in and day out: In crises like this one, some form of global government is needed, as premature and incomplete is it might end up being, given the pressures created by the unending slew of bad news.
    Such crises require communication and cooperation far beyond national borders and even continental shores. Instead, though, we are seeing political and economic spheres of influence moving toward isolation.
    Nobody will be able to lead the world out of its current misery alone. Not China, which felt a couple of days ago that it was seeing an end to the health crisis, only to now be fearful of the economic waves crashing over the globe. Not the U.S., whose president assured his people just a few days ago that the country was well prepared and who is now mobilizing hundreds of billions of dollars to ward off the worst of it. And not Europe either, which is closing national borders one country at a time and seems to be forgetting its neighbors.
    Social distancing is the medical solution to the spread of the virus. But in global politics, we need quite the opposite.

    quarta-feira, 18 de março de 2020

    Pandemias são interrompidas pela ciência. E só por ela - Geraldo Wilson Fernandes, Sérvio P. Ribeiro (UFMG)

    Pandemias são interrompidas pela ciência. E só por ela

    Professores Geraldo Fernandes e Sérvio Ribeiro alertam que não ouvir os cientistas em situações como a da atual epidemia de coronavírus pode trazer consequências devastadoras

    Imagem de viriões de Sars-CoV-2 obtida por microscópio eletrônico de varrimento
    Imagem do Sars-CoV-2, o novo coronavírus, obtida por microscópio eletrônico de varrimentoNIAID Rocky Mountain Laboratories (RML), U.S. NIH / Domínio Público
    Cientistas investigam a natureza e tudo o que está relacionado a ela – desde a descrição de fenômenos, formas, quantidades e comportamentos até a formulação de predições sobre acontecimentos futuros, baseados no entendimento (passado e presente) dos fenômenos naturais.
    Faz 20 anos que os cientistas alertam que haveria mudanças de regimes de chuvas, com cenários mais imprevisíveis e com eventos extremos mais frequentes, caso o aquecimento global provocado pelo homem não fosse revertido. E não foi! 
    Em 29 de janeiro, de forma imprevisível, as áreas mais nobres de Belo Horizonte foram devastadas por uma chuva que superou os desastres das tempestades de 2017. Em regiões como as atingidas, essas chuvas extremas deveriam se repetir naturalmente em intervalos de mais ou menos 20 anos, mas agora estão mais frequentes. Na sexta-feira anterior ao dia 29, a chuva devastou ainda mais gravemente regiões carentes da cidade.
    Entre tantos campos em que a ciência se aplica, está o da previsibilidade. Quando fazem previsões, os cientistas não querem que elas se concretizem. O que querem é alertar as sociedades de perigos iminentes e provocar mudanças em políticas públicas e em comportamentos sociais, de forma a evitar danos às pessoas, ao meio ambiente e às economias. Fenômenos climáticos extremos e imprevisíveis que atingem os ricos os fazem perceber que não há onde se refugiar, e a necessidade de mudanças políticas contra o aquecimento global começa a ficar mais evidente.
    No que se refere às doenças, ocorre algo semelhante: a reação é mais rápida quando o risco de transmissão não pode ser controlado ou mesmo impedido apenas com a aplicação de recursos financeiros. Assim, vírus que se espalham rapidamente com grande risco de contaminação e causam doenças letais, são minimamente responsáveis por rupturas no sistema econômico global, o que faz o mundo se mobilizar por soluções rápidas. Enquanto alguns governos e instituições fundamentam suas decisões no entendimento preditivo da ciência, sempre há outros, assim como alguns setores da sociedade, que responsabilizam arbitrariamente fenômenos que não são a causa da pandemia ou atribuem a culpa às próprias vítimas, em especial aquelas que vivem em estado de pobreza crônica. 
    No início dos anos 2000, o mundo enfrentou duas outras pandemias de coronavírus de forma bem-sucedida. Isso ocorreu porque foram seguidos protocolos científicos aceitos globalmente para conter a expansão desses vírus. Resumidamente, cientistas epidemiologistas usam uma constante chamada H0, que é o número de pessoas que podem ser infectadas por um sujeito contaminado. Essa é uma medida classicamente ecológica, que avalia a velocidade de multiplicação em se tratando de vírus. O assustador é que se trata de uma medida exponencial, o que significa que, após certo ponto, é impossível de ser freada.
    Quando fazem previsões, os cientistas não querem que elas se concretizem. O que querem é alertar as sociedades de perigos iminentes e provocar mudanças em políticas públicas e em comportamentos sociais, de forma a evitar danos às pessoas, ao meio ambiente e às economias.
    O problema de certas viroses é que o H0 é muito alto, e as infecções se propagam tão rapidamente que chegam a atingir um número máximo de indivíduos que um ambiente pode sustentar. Dessa forma, a relação entre o hospedeiro e a doença entra em colapso. Como nós somos o “recurso” para o vírus, estamos falando de índices aterrorizantes de mortalidade e ruptura social. Usando a ciência, é fácil entender que, se as pessoas sadias (= recurso) estiverem fora do alcance do vírus, interromperemos esse ciclo mortal antes que ele se espalhe exponencial e descontroladamente. No entanto, em todos esses casos anteriores, as formas emergentes dos vírus não se transmitiam pelo ar, somente por partículas de saliva ou fluídos corporais.
    Neste ano, a nova pandemia de coronavírus avança, e os padrões sugerem que a infecção possa se dar de pessoa a pessoa, assim como pelo ar. Outro detalhe preocupa: a maior parte da população está nas mãos de governantes autoritários ou, quando democráticos, negacionistas da ciência.
    A tradição de escutar os cientistas tem variado de tempos em tempos.  Nos casos cotidianos de endemias, as consequências de não escutar a ciência (e de não agir coordenadamente via órgãos internacionais regulatórios) são, na verdade, um enorme crime social, com consequências quase sempre devastadoras.
    Qualquer governo no mundo que atuar desamparado de critérios científicos no combate ao coronavírus reeditará o chamado “racismo ambiental”, que define situações nas quais os custos de um impacto ambiental atingem mais os pobres que os ricos. Em outras palavras, um cenário epidemiológico desamparado de suporte científico e não pautado por condutas internacionais validadas cientificamente poderia vir a ser definido como “racismo sanitário” – no fundo, algo tão óbvio e antigo em países em desenvolvimento que dispensa explicações ou tipificações.
    O medo, portanto, não é só do vírus, mas de que, em regiões importantes do mundo, com largas rotas migratórias e comerciais, a ciência seja ignorada em detrimento de critérios político-financeiros. Olhando de maneira mais ampla, não valorizar as universidades e o ensino equivale a não planejar políticas com base no investimento na ciência e monitoramento de ameaças potenciais ao cidadão.
    Um governo responsável trata seu ministério da saúde como um segundo ministério de ciência e tecnologia, capaz de dialogar e criar força de trabalho com as universidades e centros de pesquisa. Essa base institucional de colaboração no controle epidemiológico está presente no Brasil há várias décadas.
    Geraldo Wilson Fernandes, professor titular de Ecologia da UFMG
    Sérvio P. Ribeiro, professor titular e chefe do Laboratório de Ecohealth da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e docente visitante no Departamento de Parasitologia do ICB/UFMG

    Portugal: presidente declara estado de emergência - um discurso de estadista

    Gostei do presidente português, Marcelo Rebelo de Souza, mencionar a história de quase nove séculos do seu país. Os portugueses foram bravos, ao longo de todo esse tempo, foram os primeiros a partir à descoberta do mundo, quaisquer que tenham sido os motivos.
    Foram bravos, foram corajosos, continuam corajosos.
    Viva Portugal, vivam os portugueses.
    Um discurso de estadista como estaríamos a merecer por aqui, mas que não teremos.
    Paulo Roberto de Almeida


    Estado de emergência por cinco razões
    O discurso de Marcelo na íntegra

    Mensagem do Presidente da República, a propósito da declaração do estado de emergência na sequência da pandemia de covid-19.
    Marcelo Rebelo de Sousa 
    18 de Março de 2020, 20:34

    Palácio de Belém, 18 de Março de 2020

    Portugueses,
    Acabei de decretar o estado de emergência.
    Uma decisão excepcional num tempo excepcional.
    A pandemia do Covid-19 não é uma qualquer epidemia como aquelas que já conhecemos na nossa democracia.
    Está a ser e vai ser mais intensa.
    Vai durar mais tempo até desaparecerem os seus últimos efeitos.
    Está a ser e vai ser um teste nunca vivido ao nosso Serviço Nacional de Saúde e à sociedade portuguesa, chamada a uma contenção e a um tratamento em família sem precedente.
    Está a ser e vai ser um desafio enorme para a nossa maneira de viver e para a nossa economia. Basta pensar na saúde, na educação, no comportamento nas famílias, no trabalho, nos efeitos no turismo, nas exportações, no investimento, na fragilização de famílias e empresas, nomeadamente de pequena e média dimensão.
    Esta guerra – porque de uma verdadeira guerra se trata – dura há um mês, começou depois dos vizinhos europeus, e, também por isso, pôde demorar mais tempo a atingir os picos da sua expressão.
    E o que fizemos nestes últimos 15 dias?
    Entendemos – e bem – que, no nosso Estado Social, era e é uma tarefa de todos e não de cada um abandonado à sua sorte.
    Apostámos na contenção, para tentar limitar o contágio, ganhar tempo para preparar a resposta e evitar uma concentração muito rápida da procura de cuidados de saúde.
    Na contenção, o Serviço Nacional de Saúde, fez e continua a fazer heroísmo diário, pela mão dos seus notáveis profissionais.
    E, com eles, todos os que estão a garantir a segurança e a produção e distribuição de bens essenciais para que o país funcione.
    E os portugueses, com a experiência de quem já viveu tudo numa história de quase nove séculos, disciplinaram-se, entenderam que o combate era muito duro e muito longo e foram e têm sido exemplares. Numa quase quarentena, que revela o bom senso de respeitar as orientações das autoridades de saúde, e digo-vos, por testemunho próprio, é nosso dever acatar as orientações genéricas e, por maioria de razão, as recomendações específicas das autoridades sanitárias.
    O Governo – que tem entre mãos uma tarefa hercúlea – adoptou medidas, tentando equilibrar contenção no espaço público e nas fronteiras e não paragem da vida económica e social, medidas que todos, Presidente, Parlamento, partidos e parceiros sociais, apoiámos, conscientes de que só a unidade permite travar e depois vencer guerras.
    Aqui chegados, entendi dever convocar o Conselho de Estado, e, nos termos da Constituição, ouvi o Governo e solicitei autorização à Assembleia da República para decretar o estado de emergência.
    Sabia e sei que os portugueses estão divididos. Há quem o reclame para anteontem. Há quem considere dispensável, prematuro ou perigoso.
    Sabia e sei que, em plena crise, as pessoas se sentem tão ansiosas, tão angustiadas, que aquilo que pedem um dia ou uma semana, uma vez dado, é logo seguido de mais exigências ou reclamações, à medida que as preocupações ou os temores se avolumam.
    Sabia e sei que muitos esperam do estado de emergência o milagre que tudo resolva num minuto, num dia, numa semana, num mês.
    Ainda assim, entendi ser do interesse nacional dar este passo. Agradeço aos conselheiros de Estado o terem expresso as suas opiniões, ao primeiro-ministro e ao Governo o terem aderido, solidariamente, e colaborado, de modo decisivo, no conteúdo do presente decreto, e à Assembleia da República o tê-lo autorizado com generosa prontidão e amplo consenso.
    Cinco razões essenciais explicam o passo dado.
    Primeira – Antecipação e reforço da solidariedade entre poderes públicos e deles com o povo. Outros países, que começaram, mais cedo do que nós, a sofrer a pandemia, ensaiaram os passos graduais e só agora chegaram a decisões mais drásticas, que exigem maior adesão dos povos e maior solidariedade dos órgãos do poder. Nós, que começamos mais tarde, devemos aprender com os outros e poupar etapas, mesmo se parecendo que pecamos por excesso e não por defeito.
    O povo português tem sido exemplar. Mas este sinal político, dado agora, e dado não apenas pelo Governo, mas por Presidente da República, Assembleia da República e Governo é uma afirmação de solidariedade institucional, de confiança e determinação, para o que tiver de ser feito nos dias, nas semanas, nos meses que estão pela frente.
    Segunda – Prevenção. Diz o povo: mais vale prevenir do que remediar. O que foi aprovado não impõe ao Governo decisões concretas, dá-lhe uma mais vasta base de Direito para as tomar. Assim, permite que possam ser tomadas, com rapidez e em patamares ajustados, medidas que venham a ser necessárias no futuro. Nomeadamente, na circulação interna e internacional, no domínio do trabalho, nas concentrações humanas com maior risco, no acesso a bens e serviços impostos pela crise, na garantia da normalidade na satisfação de necessidades básicas, nas tarefas da protecção civil, em que, nos termos da lei, todos já são convocados, civis, forças de segurança e militares. O que seria, mais tarde, se fosse necessário agir, num ou noutro caso, neste quadro preventivo e ele não existisse?
    Terceira – Certeza. Esta base de Direito dá o quadro geral de intervenção e garante que, mais tarde, acabada a crise, não venha a ser questionado o fundamento jurídico das medidas já tomadas e a tomar.
    Quarta – Contenção. Este é um estado de emergência confinado, que não atinge o essencial dos direitos fundamentais, porque obedece ao fim preciso do combate à crise da saúde pública e da criação de condições de normalidade na produção e distribuição de bens essenciais a esse combate.
    Quinta – Flexibilidade. O estado de emergência dura 15 dias, no fim dos quais pode ser renovado, com avaliação, no terreno, do estado da pandemia e sua previsível evolução.
    É um sinal político forte de unidade do poder político, que previne situações antes de poderem ocorrer, estabelece um quadro que confere certeza, dá poderes ao Governo mas não regidifica o seu exercício, e permite reavaliação na sua aplicação num combate que muda de contornos no tempo.
    É também um sinal democrático.
    Democrático, pela convergência dos vários poderes do Estado.
    Democrático, porque é a democracia a usar os meios excepcionais que ela própria prevê para tempos de gravidade excepcional.
    Não é uma interrupção da Democracia. É a democracia a tentar impedir uma interrupção irreparável na vida das pessoas.
    Não é, porém, uma vacina, nem uma solução milagrosa, que dispense o nosso combate diário, o apoio reforçado ao Serviço Nacional de Saúde, a capacidade de pessoas e as famílias continuarem a tentar limitar o contágio, para que os números a crescer cresçam menos do que os piores cenários e para que o tratamento possa ser, cada vez mais, em casa. Tudo mais cedo do que mais tarde.
    Até porque, num ponto, os especialistas são claros – depende da contenção nestas próximas semanas o conseguirmos encurtar prazos, poupar pacientes e, sobretudo, salvar vidas.
    Temos, pois, todos de fazer por contribuir para ir o mais longe e o mais depressa possível nesta luta desigual.
    E quanto mais depressa formos, mais depressa poderemos salvar vidas, salvar a saúde, mas também concentrar-nos nos efeitos, a prazo, no emprego, nos rendimentos, nas famílias, nas empresas.
    E, mesmo agora, só se salvam vidas e saúde se, entretanto, a economia não morrer.
    Por isso, o Estado está a ajudar a economia a aguentar estes longos meses mais agudos. Fazendo o que possa para proteger o emprego, as famílias e as empresas.
    Mas nós temos de fazer a nossa parte. Não parar a produção, não entrar em pânicos de fornecimentos como se o país fechasse, perceber que limitar contágio e tratar de contagiados em casa é e tem de ser compatível com manter viva a nossa economia.
    Assim é em tempo de guerra, as economias não podem morrer.
    Termino com um pedido.
    Nesta guerra, como em todas as guerras, só há um efectivo inimigo, invisível, insidioso e, por isso, perigoso.
    Que tem vários nomes.
    Desânimo. Cansaço. Fadiga do tempo que nunca mais chega ao fim.
    Temos de lutar, todos os dias, contra ele.
    Contra o desânimo pelo que corre mal ou menos bem.
    Contra o cansaço de as batalhas serem ainda muitas e parecerem difíceis de ganhar.
    Contra a fadiga que tolhe a vontade, aumenta as dúvidas, alimenta indignações e revoltas.
    Tudo o que nos enfraquecer nesta guerra alongará a luta e torná-la-á mais custosa e dolorosa.
    Resistência, solidariedade e coragem são as palavras de ordem. E verdade, porque nesta guerra, ninguém mente nem vai mentir a ninguém.
    Isto vos diz e vos garante o Presidente da República. Por vós directamente eleito para ser, em todos os instantes, os bons e os maus, o primeiro e não o último dos responsáveis perante os portugueses.
    O caminho ainda é longo, é difícil e é ingrato.
    Mas, não duvido um segundo sequer, que vamos vencê-lo o melhor que pudermos e soubermos.
    Na nossa História, vencemos sempre os desafios cruciais.
    Por isso temos quase novecentos anos de vida.
    Nascemos antes de muitos outros. Existiremos ainda, quando eles já tiverem deixado de ser o que eram e como eram.
    Deixem-me terminar com um exemplo de como somos.
    O exemplo da neta, enfermeira, que, no dia em que perdeu o seu avô, a primeira vítima mortal, me dizia: “Presidente, já só faltam nove dias para eu regressar à luta”.
    Somos assim. Porque somos Portugal.

    Governo Federal estabelece medidas de proteção para o serviço público: + de 60 anos poderão trabalhar em casa

    CORONAVÍRUS

    Governo Federal estabelece medidas de proteção para o serviço público

    Ministério da Economia publicou Instrução Normativa com medidas para diminuir o risco de contágio do coronavírus  
    Publicado em 17/03/2020 14h48
    Esplanada dos Ministérios | Foto: Agência Brasil ´EBC
    Esplanada dos Ministérios | Foto: Agência Brasil ´EBC
    O Ministério da Economia publicou Instrução Normativa que orienta órgãos e entidades da Administração Pública Federal sobre as medidas de proteção para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus (Covid-19).
    De acordo com a Instrução Normativa, os órgãos e entidades integrantes da Sistema de Pessoal Civil da Administração Pública Federal (Sipec) deverão suspender a realização de viagens internacionais a serviço, enquanto perdurar o estado de emergência de saúde pública. As viagens domésticas a serviço também deverão ser reavaliadas. 

    O documento também prevê que servidores com 60 anos ou mais, com doenças crônicas ou imunodeficientes, gestantes e lactantes trabalhem remotamente no período estabelecido como quarentena.

    Os servidores ou empregados com filhos em idade escolar, e que necessitem da assistência de um dos pais, também poderão executar as suas atribuições de maneira remota.

    O dispositivo prevê, ainda, que o ministro ou autoridade máxima da entidade poderá adotar medidas de prevenção e redução de transmissibilidade, tais como: jornada de trabalho em turnos alternados de revezamento, trabalho remoto, melhor distribuição física da força de trabalho presencial. O objetivo é evitar a concentração e a proximidade de pessoas no ambiente de trabalho, além da flexibilização dos horários de início e término da jornada.
    Segundo a instrução normativa, as determinações não se aplicam aos servidores e empregados públicos em atividades nas áreas de segurança, saúde ou de outras atividades consideradas essenciais pelo órgão ou entidade.
    Com informações do Diário Oficial da União