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Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.

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quinta-feira, 26 de outubro de 2023

Pensamento Diplomático Brasileiro: o período autoritário (1964-1985) (2016) - Paulo Roberto de Almeida

 Um documento de planejamento, para uma nova obra coletiva na Funag, à qual não foi dada continuidade prática, que deveria servir de continuidade à obra em 3 volumes sobre o Pensamento Diplomático Brasileiro (2013). 

3012. “Pensamento Diplomático Brasileiro: o período autoritário (1964-1985)”, Brasília, 13 julho 2016, 43 p. Proposta de trabalho para a Funag, no seguimento do primeiro projeto, que cobriu o período 1750-1964. Entregue ao presidente da Funag, sem intenção de participar. Partes servindo de subsídio para redação de um capítulo sobre as relações internacionais do Brasil durante o regime militar brasileiro, para obra coletiva sob a direção de Jorge Ferreira (jorge-fer@uol.com.br) e Lucilia de Almeida Neves Delgado (lucilia.almeidaneves@gmail.com), Brasil Republicano (Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, 2003, 4 vols., várias edições e reimpressões). Projeto em curso. Utilizado para compor trabalho para a II Jornada de Pensamento Político Brasileiro (IESP-UERJ), em 2017 (n. 3112).Disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/108623382/3012_Pensamento_Diplomático_Brasileiro_o_período_autoritário_1964_1985_2016_).



Pensamento Diplomático Brasileiro: o período autoritário (1964-1985)

 

Paulo Roberto de Almeida (pralmeida@me.com)

Brasília, 3012: 14 de julho de 2016.

  

“A melhor tradição do Itamaraty é saber renovar-se.”

Antônio F. Azeredo da Silveira

 

Sumário: 

Introdução

1. Um “pensamento diplomático” na era militar? Premissas e fundamentos

2. O que foi a era militar do ponto de vista da política externa e da diplomacia?

3. Pensamento Diplomático Brasileiro: a era autoritária (1964-1985) – esquema

4. Bibliografia sobre a diplomacia e a política externa da era militar

5. Apêndices

5.1. Principais atos multilaterais do período

5.2. Cronologia sumária do período

 

 

Introdução

Os objetivos desde documento preliminar de planejamento são os de apresentar algumas reflexões em torno do conceito e da temática indicados no título e de formular, tentativamente, propostas de organização e um esquema para a possível composição de um segundo conjunto de textos vinculados sequencialmente à obra Pensamento Diplomático Brasileiro, formuladores e agentes da política externa, 1750-1964 (Brasília: Funag, 2013, 3 vols.; ISBN: 978-85-7631-462-2), organizada pelo ex-presidente da Funag (2012-2014), embaixador José Vicente Pimentel, da qual fui um dos primeiros propositores e um dos colaboradores, ao lado de diversos outros colegas de carreira e de representantes da academia. Trata-se da continuidade desse projeto exitoso, que parece ter encontrado vasto e positivo acolhimento por parte da comunidade brasileira trabalhando ou se exercendo academicamente na área, que justamente parece estar reivindicando o seu prosseguimento no período ulterior àquele da primeira obra, desta vez cobrindo as duas décadas do regime militar brasileiro.

Este texto está dividido nas seguintes partes: uma primeira, de reflexões sobre a noção de “pensamento diplomático brasileiro”, tal como suscetível de cobrir um amplo espectro de formulações e ações diplomáticas brasileiras, disseminadas por diferentes orientações de política externa, com atores diversos ao longo de um período bastante complexo – certamente excepcional – da história do Brasil; uma segunda, que busca capturar os elementos essenciais do período em questão (1964-1985), evidenciando alguns dos traços distintivos de sua política externa e da participação do estamento diplomático em sua formulação e execução; e uma terceira, que propõe um esquema preliminar sobre o que se poderia chamar de “índice de matérias” do que seria esse novo volume de um projeto que teve um início auspicioso, e que se espera possa apresentar continuidade adequada, antecipando, inclusive, uma possível continuidade (um terceiro volume) para o período subsequente, eventualmente chegando à atualidade. Segue-se uma bibliografia preliminar (baseada no livro de Fernando de Mello Barreto sobre o período militar) e, como apêndices, uma relação dos principais atos multilaterais instituídos no período e uma cronologia dos fatos mais relevantes ocorridos nos planos doméstico e internacional no mesmo período (tal como constante da obra de Eugênio Vargas Garcia de natureza cronológica, justamente).

As considerações que se seguem são puramente pessoais, representativas de minhas próprias concepções sobre quais seriam as bases ideais para a continuidade desse projeto, e não têm a pretensão de servir de guia para a execução de tal projeto. Mas elas balizam as condições sob as quais reputo ser possível conduzir um trabalho sério, metodologicamente sólido, substantivamente fundamentado, sem os parâmetros rígidos dos “policy papers” da diplomacia oficial, e sem as digressões teórico-abstratas normalmente encontradas nos textos puramente acadêmicos. O texto consolida uma experiência adquirida na pesquisa historiográfica e da documentação diplomática, bem como o saber adquirido em leituras, aulas e ampla vivência no mundo acadêmico, já registradas em inúmeros textos publicados ou inéditos no vasto campo das relações internacionais e da política externa do Brasil.

 

1. Um “pensamento diplomático” na era militar? Premissas e fundamentos

A primeira questão a ser considerada, no primeiro capítulo substantivo deste projeto de livro é justamente a existência de um “pensamento diplomático” na era militar, como de resto em qualquer outra época, antes ou depois dessa fase especial da história brasileira. Falar em “pensamento diplomático” implica necessariamente em se dispor de certa homogeneidade de conceitos e de formulações gerais nos planos dos princípios e dos valores, aplicados na frente externa, que mantenham certa consistência com as articulações políticas e diplomáticas durante pelo menos dois governos, apresentando, portanto, certa estabilidade temporal e suficiente coerência interna para justificar o epíteto. Em outros termos, significa haver um corpo harmônico de ideias, ou um conjunto de princípios organizadores da política externa que possa ser reconhecido, interna e externamente, como representativo do Estado ou da nação. 

(...)


Leia a íntegra deste trabalho neste link: 

https://www.academia.edu/108623382/3012_Pensamento_Diplomático_Brasileiro_o_período_autoritário_1964_1985_2016_


quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Brasil: relações econômicas internacionais: a era colonial (1994) - Paulo Roberto de Almeida

 BRASIL: RELAÇÕES ECONÔMICAS INTERNACIONAIS: 

A ERA COLONIAL 

Paulo Roberto de Almeida

Paris, 15 novembro 1994

 

Cronologia comentada de eventos, processos e negociações relativas às relações econômicas internacionais do Brasil, com impacto no seu  desenvolvimento, nas relações exteriores do País e na sua diplomacia econômica.

 

ETAPA COLONIAL

Primórdios

1415: Tem início pela tomada de Ceuta, sob D. João I e por iniciativa de D. Henrique, o ciclo das descobertas portuguesas, aventura oceânica que visava incorporar terras e mercados às atividades da precoce monarquia mercantil.

1441/1444: primeiros cativos, mouros, depois negros, ingressam em Portugal; D. Henrique retém o quinto sobre a primeira frota negreira (244 escravos) que ingressam em Portugal.

1454: Bula Romanus Pontifex, do Papa Nicolau V, concede perpetuamente ao Rei D. Afonso V, o Africano, e ao Infante D. Henrique, a “conquista que vai desde o cabo Bojador... passando por toda a Guiné... para a plaga meridional”, vedando a qualquer pessoa levar mercadorias a tais terras sem licença daquelas autoridades, sob pena de excomunhão.

1469: D. Afonso concede a Fernão Gomes, em contrato quinquenal, o monopólio do tráfico e do comércio da Guiné, mediante contribuição anual; o contrato é tão proveitoso que, em 1475, a Coroa restabelece seu império. 

1481: Lisboa se torna porto de entrada obrigatória das peças da África, para cobrança do imposto (ou sisa), rivalizando com Sevilha.

1492: Cristóvão Colombo, pensando encontrar o caminho das Índias, descobre novo continente.

1494: Tratado de Tordesilhas, Capitulação da Partição do Mar Oceano, dividindo o mundo entre Portugal e Espanha. O Tratado possui um grande impacto econômico, ao consolidar o princípio do monopólio comercial pelos Estados respectivos sobre suas áreas de influência: ele legaliza o exclusivismo português sobre o tráfico de escravos africanos e, desde 1502, Portugal passa a abastecer Sevilha e esta fornecia negros à América espanhola.

1498: Caminho marítimo para a Índia, contornando a África, realizado por Vasco da Gama.

1500: Pedro Álvares Cabral parte com a finalidade de estabelecer comércio regular com a Índia; no caminho assegura a posse da terra que viria a ser o Brasil. Pero Vaz de Caminha escreve ao Rei que “... até agora não podemos saber se há ouro ou prata nela, ou outra coisa de metal ou ferro. Contudo, a terra em si é de muito bons ares... Águas são muitas, infinitas. E em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo, por causa das águas que tem”.

1501: Primeira expedição exploradora ao Brasil (“Não encontramos nada de proveito, salvo infinitas árvores de pau-brasil”, segundo carta de Américo Vespúcio); na verdade, é na índia onde se concentram os esforços dos portugueses: entre 1497 e 1527, 320 navios portugueses, transportando um total de 80 mil pessoas, civis e militares, seguiram para a Índia.

1502/?: Os serviços obrigatórios impostos aos contratantes do Rei consistiam em enviar anualmente 6 navios ao Brasil, explorar 300 léguas de terra e levantar, e manter por 3 anos, uma fortaleza. 

1506: Relazione de agente veneziano em Lisboa dá conta que “de há três anos para cá foi descoberta Terra Nova da qual se traz cada ano 20 mil quintais de verzino (brasil), o qual vale 2 1/2 ducados o quintal, o qual pau-brasil foi concedido a Fernando de Loronha, cristão-novo, durante 10 anos, por este Sereníssimo Rei, por 4 mil ducados ao ano...”

1516: Intensificando-se as expedições de franceses ao Brasil (Gonneville já em 1504), alvará do Rei ordena a doação de machados, enxadas e mais ferramentas “às pessoas que fossem a povoar o Brasil”; outro ordena que “elegessem um homem prático e capaz de ir ao Brasil dar princípio a um engenho de açúcar”.

1526: Expedição guarda-costas de Cristóvão Jacques. A alfândega de Lisboa já registra o pagamento de direitos sobre partida de açúcar de Pernambuco e Itamaracá.

1530: Expedição colonizadora de Martim Afonso de Sousa; seu irmão, Pero Lopes, toma o fortim erguido pelos franceses em Pernambuco.

1531/32: D. João III institui o Governo-Geral para o Brasil, decide a concessão de capitanias hereditárias e pede à Santa Sé o estabelecimento da Inquisição em Portugal. Os donatários de capitanias tinham o monopólio das drogas e especiarias, podiam doar sesmarias, cunhar moedas e participar dos privilégios fiscais da Coroa (arrecadação do quinto dos metais preciosos e do dízimo dos demais produtos, vintena do pau-brasil, meia dízima do pescado etc.). Com as capitanias e sesmarias, o latifúndio surge como a base da colonização e do poder social.

1540: O monopólio sobre o comércio de escravos (Lisboa controlava 10 a 12 mil cabeças por ano) torna-se uma das atividades mais rendosas da Coroa. França, Inglaterra e Holanda se lançam no comércio escravagista.

 

Era Colonial

1548: D. João III institui o Governo-Geral do Brasil, nomeando Tomé de Sousa. O novo regimento corrige o sistema descentralizado das capitanias e a exploração dos recursos naturais da terra: se passava a controlar os embarques de mercadorias e a arrecadação dos tributos reais; se concede isenções fiscais para instalar engenhos de açúcar. O provedor-mor da Fazenda ordena dotar todas as alfândegas de um livro de receitas e despesas.

1549: Fundada a cidade de S. Salvador, que se torna a capital do governo-geral.

1570: O cronista Pero de Magalhães Gandavo se refere a 18 engenhos na Bahia, de um total de 60 no Brasil, de S. Vicente a Itamaracá, produzindo 70 mil arrobas anuais. Dez anos depois, o número de engenhos dobrara, segundo Gabriel Soares de Sousa (Tratado Descritivo do Brasil em 1587), produzindo 466 mil arrobas anuais. No final do século, a produção poderia ultrapassar 2 milhões de arrobas, ocupando 3/4 dos 20 mil escravos existentes na colônia. Os mercadores flamengos já se tinham tornado grandes comerciantes do produto: refinavam-no na Flândria e distribuíam-no pela Europa.

1580/1640: União Ibérica, sob Felipe II. O Estado do Brasil permanece colônia de Portugal. Notável expansão luso-brasileira em terras antes castelhanas (no Sul e na Amazônia), mas o Brasil passa a sofrer os ataques dos inimigos da Espanha. Surge o sentimento de brasilidade. Desenvolve-se o comércio com as possessões espanholas na América do Sul.

1604: Criado o Conselho da Índia, exclusivamente para as colônias portuguesas, que na Restauração torna-se Conselho Ultramarino, órgão principal de administração colonial.

1605: Editado o Regimento do Pau-Brasil, defendendo o monopólio real e mantendo o sistema de arrendamento. Durante a ocupação holandesa, o pau-de-pernambuco constitui, desde 1637, monopólio da Companhia de Comércio das Índias. Apenas em 1859, em pleno Império, seria extinto o monopólio estatal sobre a exploração do pau-brasil.

1612: Tentativa de ocupação francesa no Maranhão: fundação de S. Luís. A reconquista por capitães-mores portugueses possibilita a ocupação efetiva do Norte. Mais tarde, o Maranhão passa a ser administrado separadamente do Estado do Brasil.

1624/1630: Invasões holandesas, estimuladas pela produção de açúcar. Moerbeeck havia escrito pouco antes o opúsculo Motivos por que a Cia. das Índias Ocidentais deve tentar tirar ao rei da Espanha a terra do Brasil. Os holandeses chegam a conquistar Angola para garantir o abastecimento regular de escravos às plantações nordestinas.

1630: Os Estados Gerais da Holanda decretam a liberdade de comércio no Brasil, mas a Companhia das Índias se reserva o monopólio do pau-brasil e o do transporte de mercadorias. A Companhia se beneficiava também do apresamento de navios luso-espanhóis carregados de açúcar e de pau-brasil.

1637/1644: Nassau inaugura um período de progressos econômicos e sociais, com base no aumento da arrecadação. Poder político é transferido dos proprietários de terras aos comerciantes urbanos, com forte predominância de holandeses e judeus. Sem lograr a vinda de imigrantes europeus, recorreu ao tráfico negreiro: a Companhia se apossa de empórios de embarque na África. Alto valor dos escravos (200 a 300 florins), aos quais se busca dar uma educação profissional.

1641: O Capitão-do-porto (Havenmeester) do Recife faz desse ancoradouro o mais organizado da América do Sul. 

1642: Para escapar da dominação espanhola, Portugal começa uma relação especial com a Inglaterra, tornando-se pouco a pouco um vassalo comercial dos britânicos, situação agravada no século XVIII com o Tratado de Methuen. Os britânicos obtêm foro especial (juiz privado). Em troca de concessões econômicas, Portugal recebia garantias militares. Novas vantagens comerciais concedidas em 1654, na época de Cromwell: abertura do comércio do Brasil aos britânicos.

1654: Expulsos definitivamente do Brasil, os holandeses, dominando perfeitamente a técnica da industrialização do açúcar, passam a colaborar com os colonos das Antilhas franco-inglesas, levando capitais e assistência técnica à região. Os preços do açúcar caem e começa a decadência econômica da região nordeste do Brasil. A economia açucareira nordestina sobrevive na depressão e se recuperaria de forma intermitente, em função do comportamento do mercado externo.

1649: Criação da Companhia Geral do Comércio do Brasil, numa conjuntura de dificuldades econômicas para Portugal. Ela passa a ter o monopólio, do Rio Grande do Norte a S. Vicente, do comércio de pau-brasil e do fornecimento de farinha de trigo, bacalhau, vinho e azeite, com preços preestabelecidos: podia construir navios em Portugal, no Brasil ou em países amigos; importava para o reino, recebendo frete e seguro marítimo, açúcar, fumo, couros, algodão etc. Para defender seu monopólio, ficava proibida a fabricação no Brasil de vinho e restrito o uso não-comercial da aguardente aos negros nos engenhos. Usuários fazem reclamações contra os abusos e especulações de seus agentes.

1659: É suspenso o monopólio dos gêneros portugueses, mas a Companhia aumenta as taxas de comboio e seguro. A Companhia se extingue gradualmente e acaba transformando-se num tribunal de comércio no governo de D. João V (1720).

1661: Portugal, para consolidar a Restauração, embarca em política de alianças e tratados. Com a Holanda, em troca do reconhecimento da reconquista do Brasil, se prevê o pagamento de 4 milhões de cruzados (metade a ser paga pelo Brasil) e o reconhecimento do domínio flamengo no Ceilão, Malaca e Molucas. Acordo secreto concluído com a Grã-Bretanha obrigava esta a defender os domínios portugueses contra quaisquer inimigos. As concessões feitas no século XVII permitiram que Portugal retivesse, no século seguinte (o do ouro), a colônia mais lucrativa do mundo na época, o Brasil. Entretanto, a doutrina do mare liberum sobre o mare clausum, do mar livre ao comércio sobre o mar fechado ao monopólio, começa a se impor como noção de direito.

1679-80: Criação da nova Colônia do Sacramento, no Prata.

1682: Criada a Companhia do Comércio do Estado do Maranhão, recebendo monopólio por 20 anos para introduzir 10 mil negros (500 por ano), bem como todos os gêneros necessários ao consumo. Devia fomentar a cultura da baunilha, cacau e cravo e podia utilizar o trabalho de indígenas administrados. Abusos e fraudes resultam na “revolta de Beckman”, em 1684. O rei Pedro II decide extinguir o monopólio.

1694: Criação da Casa da Moeda da Bahia, para contornar a falta de moeda na província. Transferida para o Rio de Janeiro em 1698, ela é mudada para Recife em 1700 e de novo transferida para o Rio em 1702.

1698-1750: Estabelecimento progressivo do regime absolutista em Portugal, com repercussões econômicas na colônia, geralmente de efeito tributário e de regulamentação (proibitiva) de atividades e ofícios (proibição de produzir sal, aguardente, taxação da produção local etc.).

1700: Começa o ciclo do ouro no Brasil. Em 1711 é publicada em Lisboa (e logo apreendida) a obra Cultura e Opulência do Brasil por suas drogas e minas, do jesuíta italiano Andreoni, conhecido como André João Antonil. A expansão da exploração mineira e da criação animal integra o sertão aos domínios portugueses: o couro, depois do açúcar, do ouro e do tabaco, passa a figurar entre os principais artigos de exportação do Brasil. Sentimento nativista se expande no Brasil, com lutas entre paulistas e “emboabas” (reinóis).

1703: Pelo Tratado de Methuen, Portugal se obriga a admitir, para sempre, os tecidos britânicos, e a Inglaterra, também para sempre, os vinhos portugueses, mediante o pagamento de 2/3 dos direitos incidentes sobre os vinhos franceses. A Inglaterra podia, a qualquer momento, suprimir a preferência dada aos vinhos lusos, pela simples modificação da tributação diferencial, mas Portugal não dispunha da mesma faculdade.

1707-1711: Confisco, pelos tribunais do Estado português e do Santo Ofício, de bens e propriedades dos cristãos-novos no Brasil, com a finalidade de angariar recursos para o reinado de D. João V.

1713: Pelos tratados de Utrecht (depois da invasão do Rio de Janeiro por Duguay-Trouin), a França reconhece o domínio português do Amazonas ao Oiapoque e Portugal devolve Colônia do Sacramento aos espanhóis.

1713: Criação da capitania de S. Paulo e Minas do Ouro, para consolidar a administração régia na zona aurífera: estabelecidos diversos sistemas de arrecadação de impostos sobre o ouro, entre eles o dos quintos, depois combinado às derramas (1725-1735) e a proibição do ofício de ourives (1730) e finalmente a capitação (1735-1751), isto é, incidência de imposto sobre cada indivíduo, mineiros ou não, livres ou escravos. Os sistemas de controle da produção diamantífera variaram da livre extração (até 1733), ao monopólio de Estado (de 1734 a 1739) e o regime de contratos (até 1771). A corrida ao diamante supera a do ouro: 40 mil pessoas afluem ao Distrito Diamantino.

1720: Os governadores nomeados por Portugal passam a ostentar o título de vice-reis, sem que o Estado se tornasse um vice-reinado. O centralismo absolutista de D. João V começa a extinguir as capitanias hereditárias.

1748: Santa Catarina transforma-se em comarca vizinha à de Paranaguá e começa a receber imigrantes açorianos.

1750: Tratado de Madri, enterrando a linha de Tordesilhas e ratificando as conquistas das entradas e bandeiras: ponto alto da diplomacia portuguesa (e do brasileiro Alexandre de Gusmão), o tratado legitima juridicamente a ocupação econômica, administrativa e militar do Oeste brasileiro. Portugal ganha os Sete Povos das Missões, mas a Espanha recupera definitivamente Colônia do Sacramento.

1750-1777: Administração Pombal tenta modernizar Portugal e estimular indústrias, no Reino e no Brasil; consegue melhorar o aparelho fiscal, mas seu período coincide com a crise no Brasil, motivada pela queda na produção de ouro. Promove a criação de várias companhias de comércio: a da Ásia (1753), do Grão-Pará e Maranhão (1755), da Pesca da Baleia (1756) e de Pernambuco e Paraíba (1759). Em 1759, proíbe e expulsa dos domínios portugueses os religiosos da Companhia de Jesus.

1752: Pombal, o “Colbert” português, promulga lei proibindo exportações de ouro e prata para conter o desvio das riquezas brasileiras para a Inglaterra: a lei deixa progressivamente de ser aplicada em virtude da dependência estratégica de Portugal em relação à Grã-Bretanha. Cresce consideravelmente no período a pressão fiscal sobre o Brasil, que foi compelido a conceder um donativo voluntário para reconstruir Lisboa, destruída por terremoto em 1755. Os contratos dos diamantes, pesca da baleia e tabaco passaram a rendimentos da Coroa.

1761: Tratado de El Pardo revoga o de Madri, que tinha permanecido inaplicado por falta das demarcações previstas.

1763: A sede do vice-reino instala-se no Rio de Janeiro. Todas as capitanias do Estado do Brasil (exceto a de S. Vicente, que sobrevive até 1791) são colocadas sob a administração real e, em 1777, o Estado do Grão-Pará e Maranhão é unificado ao do Brasil. A regulamentação das partidas das frotas do Brasil é abolida em 1765, quando se estabelece a liberdade de comércio entre o Reino e o Ultramar. A construção naval recebe estímulos e se edifica o Arsenal da Marinha do Rio de Janeiro.

1760-1808: Portugal encontrava-se na dependência econômica do Brasil, que exportava ouro, diamantes, açúcar, tabaco e pau-brasil e importava escravos e manufaturas grosseiras. A produção e a exportação do Brasil passam por períodos depressivos, as companhias de comércio dão prejuízo e o imposto de entrada de escravos declina, com a baixa concomitante da produção aurífera. Tanto no Brasil como em Portugal, o cenário é de atrasos nos soldos e aumento das dívidas. Os cargos públicos começam a ser licitados através de leilão (o de secretário-geral do Brasil foi arrematado por 44 contos).

1777: O comércio internacional português apresentava um déficit de 1.493 contos, com importações de 6.397 e exportações de 4.904 contos; desse total, a contribuição dos produtos brasileiros, excluídos ouro e diamantes, representava 2.715 contos (açúcar, branco e mascavo, mais de 800 contos; couros, tabacos, cacau, drogas e especiarias diversas, arroz, azeite de peixe etc.; o café representava então apenas 2 contos). O Brasil aumenta progressivamente suas exportações e o porto do Rio de Janeiro torna-se o mais importante do país.

1777-1792: Administração de D. Maria I extingue as companhias de comércio do Grão-Pará e Maranhão (1778) e de Pernambuco e Paraíba (1780); tenta corrigir o déficit comercial com a Inglaterra. Reverte os processos de laicização do Estado e de retirada de privilégios da nobreza, empreendidos por Pombal. Organização de missões científicas: Viagem filosófica ao Brasil, de Alexandre Rodrigues Ferreira (1783); viagem de José Bonifácio pela Europa, para aprofundar-se em ciências naturais.

1777: Tratado de Santo Ildefonso fixa os limites do Brasil segundo o princípio do uti possidetis, mantendo aproximadamente os limites do Tratado de Madri e estabelecendo a paz entre Portugal e Espanha. Em 1783 Portugal reconhece a independência dos Estados Unidos.

1785: Alvará de D. Maria I, endereçado ao vice-rei do Estado do Brasil, proíbe todas as indústrias no país (ouro, prata, linho, seda, lã e algodão), exceto o fabrico de pano grosso; a medida vigorou até ser revogada em 1808. Ao mesmo tempo, são estimuladas diversas indústrias em Portugal.

1789: A Conjuração Mineira, projeto separatista nascido da pressão policial e econômica (exação fiscal) nas regiões mineiras decadentes, será reprimido severamente pelas autoridades portuguesas e seu líder, Tiradentes, é executado em 1792. O sistema de impostos onerava os bens essenciais e favorecia os supérfluos.

1792: D. João, em vista da demência de sua mãe, assume o governo do Reino e, em 1799, torna-se Príncipe Regente de Portugal. 

1802/1807: No conflito entre Napoleão e os ingleses, a “vassalagem” política e militar de Portugal em relação à Inglaterra se faz cada vez mais presente, enquanto sua vida econômica passa a depender, cada vez mais estreitamente, da produção brasileira de ouro e da redistribuição de açúcar, café e algodão da colônia. 

1807/1808: A política de bloqueio continental e o jogo de pressões militares por parte de Bonaparte não deixam a Portugal muita escolha: partida da família real portuguesa e de toda a Administração para o Brasil.

1808: Por sugestão de José da Silva Lisboa, o futuro Visconde de Cairu, D. João expede Carta Régia, em 8 de janeiro, em Salvador, determinando a abertura dos portos brasileiros ao comércio com as nações amigas. A medida, que praticamente terminava com o monopólio (à exceção do pau-brasil e alguns outros gêneros), beneficiava sobretudo os comerciantes ingleses, protegidos pela Royal Navy. Ainda de Salvador, foi criada a Companhia de Seguros (para o comércio marítimo), autorizadas fábricas diversas (entre elas, de vidros, siderúrgica e moinhos de trigo) e criada a cadeira de Economia Política, para a qual foi nomeado José da Silva Lisboa (à razão de 400 mil réis por ano).

1808: Declaração de guerra à França e tomada da Guiana, que seria devolvida em 1817.

1808: No Rio de Janeiro, Alvará de 1° de abril determina a liberdade de indústria no Brasil e domínios ultramarinos. Alvará de 12 de outubro constitui o Banco do Brasil, com capital de 1.200:000$000. Diversas outras medidas organizam as finanças e as atividades econômicas, entre elas a cobrança de direitos alfandegários sobre molhados importados de Portugal e a isenção dos mesmos direitos sobre mercadorias estrangeiras procedentes de Lisboa e Porto que já houvessem recolhido impostos nesses portos; a proibição da circulação de ouro em pó como dinheiro e determinação da circulação de moedas de ouro, prata e cobre em todas as capitanias. Em 28 de abril, ficam isentos de direitos todas as matérias-primas destinadas a manufaturas, bem como a entrada ou saída de tecidos fabricados no Brasil.

1810: Tratados comerciais estabelecem relações privilegiadas com a Inglaterra. Começam, igualmente, novas correntes de comércio entre o Brasil e seus parceiros do continente, sobretudo os Estados Unidos.

1810/1811: Novas medidas buscam estimular a indústria local (isenção de direitos sobre fios e tecidos de algodão, seda ou lã fabricados no Brasil) ou o comércio (permissão de comércio direto, com isenção de tributos, de Macau para o Brasil). Criação dos Arsenais, fábricas e fundições do Rio de Janeiro, de indústria de lapidação de diamantes, fundação de laboratório químico.

1815: Elevação do estatuto do Estado do Brasil à condição de Reino, unido ao de Portugal e dos Algarves, o que, do ponto de vista jurídico, encerra o período colonial: as capitanias passam a ser chamadas de províncias. Na verdade, a medida se destinava a seguir recomendação do Congresso de Viena, que reestruturou a ordem européia no seguimento da queda de Napoleão. Dentre os diversos atos ali aprovados estavam a proibição do tráfico de escravos e a livre navegação dos rios internacionais.

1816/1817: Com a morte de D. Maria I, o Príncipe Regente torna-se Rei D. João VI. Decreto de 29 de julho torna a navegação de cabotagem exclusivamente nacional. Estabelecimento de colônia suíça no território fluminense e medidas de fomento à colonização. Concessão de sesmarias.

1817: A estrutura fiscal era complicada pela existência de tributos de natureza diversa, de incidência local (selos, foros de patentes, taxas do sal) ou geral: subsídio real sobre carnes e couros; taxa suntuária sobre lojas e armazéns; taxa sobre engenhos; sisa (10%) sobre imóveis; meia-sisa sobre escravos urbanos etc.

1820: A revolução liberal no Porto, com a convocação das Cortes constituintes e a transformação da monarquia absoluta em constitucional obrigam o Rei a voltar a Portugal.

1821: D. João parte em abril. Deputados brasileiros são eleitos às Cortes. D. Pedro torna-se regente do Brasil. Cortes tentam reverter a autonomia do Brasil.

1821/1822: D. Pedro começa a governar em meio à crise administrativa e fiscal: em julho o Banco do Brasil suspende seus pagamentos. Às vésperas da independência, decreto regencial impedia a saída de qualquer espécie de moeda do Brasil.

 

Fonte: Hélio de Alcântara Avellar: História Administrativa e Econômica do Brasil

         (2a. ed., Rio de Janeiro, FENAME, 1976)

[Paris, 461: 15/11/1994]

 

461. “Relações econômicas internacionais do Brasil: Etapa Colonial”, Paris, 15 novembro 1994, 8 pp. Cronologia comentada de eventos, processos e negociações relativas às relações econômicas internacionais do Brasil, com impacto no seu  desenvolvimento, nas relações exteriores do País e na sua diplomacia econômica. Versão provisória, elaborada com base em Hélio de Alcântara Avellar: História Administrativa e Econômica do Brasil (2a. ed., Rio de Janeiro: FENAME, 1976); a ser reescrita, com base em novas fontes secundárias.

 

 

sábado, 12 de dezembro de 2020

Uma síntese cronológica anual de nossa desesperança atual - Paulo Roberto de Almeida

 Uma síntese cronológica anual de nossa desesperança atual

Paulo Roberto de Almeida

A decisão de apoiar o capitão foi tomada lá atrás, pelo efeito combinado das manifestações de 2013, das eleições de 2014, da crise de 2015, do impeachment de 2016, da Lava Jato em 2017, das hesitações no STF em 2018, e de conversas nos altos comandos militares. 

O cálculo dos generais graduados era outro: tutelar o capitão e obter ganhos corporativos para as FFAA.

Eles se enganaram terrivelmente: foram aprendizes de feiticeiro e com isso jogaram o povo brasileiro nas mãos e pés do pior dirigente do Brasil de todos os tempos, desde D. Tomé de Souza (1549) pelo menos, ou seja, desde sempre.

Em síntese, tivemos, em 2019, uma pequena amostra de todas as falcatruas de que era capaz uma mente doentia, apenas obcecada com a sua reeleição e com a defesa da ficha miliciana e corrupta de toda a sua familia, e em 2020 uma demonstração cabal de todo o mal que um psicopata armado do poder presidencial é capaz de infligir a toda uma população incapaz de reagir por seus próprios meios, pois que confrontando-se a instituições republicanas aparelhadas por oportunistas notórios, impulsionados pela grande corrupção política, e também a militares inermes em face de tantos desatinos perpetrados com sua aparente colaboração.

Num possível cenário prospectivo, teremos um 2021 ainda marcado por muitas mortes suplementares às que teriam resultado de uma curva “normal” da pandemia, não fossem os desatinos e o comportamento mórbido e criminoso do capitão-presidente, e, finalmente, teremos um 2022, o ano de um infeliz bicentenário da Independência, provavelmente caracterizado por uma grande divisão doentia da sociedade e da política, com grandes incertezas quanto às próximas definições eleitorais, um cenário econômico ainda depressivo, a miséria cultural já definitivamente instalada no país e um clima geral marcado por muita desesperança em nosso povo.

Desulpem-me por ser, uma vez mais, apenas realista quanto ao nosso passado recente, nosso presente depressivo e deprimente e nosso futuro ainda sombrio, em função das más escolhas feitas preteritamente.

Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 12/12/2020