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segunda-feira, 26 de setembro de 2022

Eleições 2022: O dever dos neutros 2 - Rubens Ricupero (FSP)

Não li o primeiro "O Dever dos Neutros", mas vou procurar, para colocar nesta mesma postagem. 

O dever dos neutros 2

Escolha agora é entre a esperança ou o agravamento da barbárie

Rubens Ricupero

Diplomata, é ex-embaixador do Brasil em Washington (1991-1993) e Roma (1995) e ex-ministro do Meio Ambiente e da Fazenda (1993-1994 e 1994, governo Itamar Franco); titular da Cátedra José Bonifácio, da USP

Entre justiça e injustiça, não se pode ser neutro. Com termos semelhantes a esses, que evocavam a posição de Rui Barbosa na Primeira Guerra Mundial, escrevi artigo publicado nesta Folha pouco antes do segundo turno de 2018 ("O dever dos neutros", 11/10/18).

Encontro-me na mesma posição, com a diferença de escrever antes do primeiro turno. Na época, afirmei que não podia ser neutro entre valores e contravalores, democracia e autoritarismo, meio ambiente e devastação. Tudo o que temia se revelou mil vezes pior. À luz da experiência dos horrores destes quatro anos, nem eu, nem ninguém, tem o direito de não escolher entre a esperança de um governo que salve o pouco que sobrou dos ideais da Constituição de 1988 e a continuação e o agravamento da barbárie que estamos sofrendo.

O princípio de uma terceira via não está em jogo porque ela não existe mais. Existiu antes e se chamou Marina Silva, mas foi triturada pelo moinho dos marqueteiros. Em 2018, ainda se podia ignorar que Jair Bolsonaro encarnaria a mais grave contestação ao sistema eleitoral democrático. Agora não, depois da repetição infinita da ameaça do presidente de não reconhecer nem o resultado do primeiro turno. A prudência aconselha evitar condições propícias à contestação. Quanto mais cedo e mais decisiva for a vitória da democracia, menos espaço haverá para seus inimigos.

Já inquieta a transição demasiada longa para a transmissão do poder. Não é mais a loucura da República Velha, que elegia o presidente em março para empossá-lo em 15 de novembro. A espera atual continua longa demais. Favorece os conspiradores, como se viu na eleição de Juscelino Kubitschek em 1955, a primeira em que votei. Quem garantiu então o respeito ao resultado foi um general legalista no Ministério da Guerra. Não preciso dizer que hoje não se pode contar com a mesma situação.

Votar, porém, não basta. Ao escolher a chapa Lula-Alckmin, é preciso deixar claro que votamos em favor de aliança suprapartidária em favor da democracia, não para consagrar a volta de um partido ou de políticas envelhecidas. Ao se aliar ao ex-governador paulista, Lula reconheceu que sozinho nem ele nem seu partido tem força para ganhar, ou no caso de vitória, para governar.

No Brasil atual, nenhum partido, nenhuma posição pura de esquerda e direita, goza de hegemonia. O que existe é maioria em favor de temas cruciais: democracia, Estado de Direito, Constituição de 1988, combate à fome, à pobreza, à desigualdade, ao desemprego, ao racismo e ao machismo; proteção aos indígenas, promoção do acesso de todos à educação, à saúde, à cultura e à ciência; crescimento sustentável com redistribuição e responsabilidade fiscal.

Deve servir-nos de alerta o exemplo da monarquia, em que todos eram contra a escravidão, mas não chegavam a acordo sobre quando e como aboli-la. O consenso sobre os fins é sempre mais fácil que sobre os meios. O futuro governo terá de empreender a árdua tarefa de reconstruir sobre a terra arrasada. Terá de governar num mundo e país que não são mais os mesmos de 2003.

Contará com a oposição de algo antes inexistente: uma extrema direita aguerridaarmada e com apoio em influentes setores sociais. Terá, por exemplo, de enfrentar na Amazônia a resistência do lobby ruralista, de grileiros, garimpeiros, madeireiros ilegais. Precisará negociar com o Congresso novo pacto orçamentário que elimine as emendas secretas e sem racionalidade. Não poderá adiar novamente uma reforma tributária que abra caminho à redistribuição da excessiva concentração de renda no topo. Tampouco atingirá tal objetivo sem reforma profunda do sistema político, partidário e eleitoral.

Nada disso será possível sem ampla aliança que supere o sectarismo partidário ou ideológico. O governo não poderá se dar ao luxo de desperdiçar nenhuma colaboração no esforço paciente de construir consenso sobre meios, prioridades e prazos. Depois de quatro anos de demolição, é preciso abertura de espírito para acolher todos os que se disponham a trabalhar na reconstrução do Brasil.

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. 


domingo, 25 de setembro de 2022

Eleições 2022: entre o crime e a Justiça, não se pode ser neutro - Rubens Ricupero (FSP)

 O embaixador Ricupero se pronuncia claramente em favor da defesa dos valores democráticos e da reconstrução do país em seus fundamentos políticos e econômicos, inclusive partidarios, a partir das eleições do próximo domingo. Mas ele começa citando Rui Barbosa, que se referia ao caso da Bélgica neutra invadida pelas tropas bárbaras do Império alemão na Grande Guerra de 1914-18, a caminho de atacar a França republicana. Isso nos leva diretamente ao caso da bárbara invasão de Putin contra a Ucrânia: não se pode ser neutro entre o crime e o Direito Internacional. 



terça-feira, 20 de setembro de 2022

Eleições brasileiras de 2022 num cenário de terra arrasada - Paulo Roberto de Almeida (InterAção)

 Meu trabalho publicado mais recente: 

4222. “Eleições brasileiras de 2022 num cenário de terra arrasada”, Brasília, 22 agosto 2022, 12 p. Publicado na revista InterAção (Santa Maria: UFSM; vol. 13, n. 2, edição especial, setembro 2022; ISSN: 2357-7675). Relação de Publicados n. 1469.


Eleições brasileiras de 2022: um cenário de terra arrasada

 

 

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

Texto composto em 22/08/2022

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com)

Publicado na revista InterAção (Santa Maria: UFSM; vol. 13, n. 2, edição especial, setembro 2022; ISSN: 2357-7675). Relação de Publicados n. 1469.

 

 

Estaria o Brasil evoluindo insidiosamente para um regime iliberal?

Uma primeira reflexão interrogativa sobre o atual cenário de grandes dúvidas a respeito do desenvolvimento normal das eleições de 2022 poderia ser feito partindo de um questionamento geral sobre nossa trajetória como nação política. Rupturas institucionais ou de regimes políticos só ocorrem excepcionalmente na vida das nações. As sociedades já constituídas politicamente não costumam fazer assembleias gerais para decidir sobre o seu próximo destino: normalmente, mudanças e reformas, inclusive no plano institucional, se dão no âmbito parlamentar, depois de ampla discussão no corpo representativo. 

Com efeito, rupturas radicais só ocorrem ao cabo de revoluções ou de guerras civis. Ainda não é o caso do Brasil. Pelo menos não na magnitude dos episódios antecedentes que podem ser aqui sumariados: a crise do regime imperial, que também se devia, além dos casos religiosos e militares, a grandes dúvidas sobre a sucessão da monarquia, dada a idade provecta do imperador; quando se deu o golpe militar em prol da República; a crise da primeira República, refletida na luta dos militares e da classe média contra os votos falsos, também estimulada pela crise econômica externa; a própria crise do regime getulista ao final da Segunda Guerra Mundial; o clima de radicalização que se seguiu à renúncia de Jânio Quadros e o arremedo parlamentarista que levou João Goulart à presidência, mas precipitou o acirramento das oposições; o golpe de 1964, quando os militares decidiram não apenas intervir na política, mas “fabricar” um novo regime tecnocrático; finalmente, a crise de vinte anos de autoritarismo que soçobrou na crise econômica e na falta de legitimidade política. 

Essa foi a sucessão de rupturas desde o início do regime republicano, o que justificou que o principal brasilianista americano, Thomas Skidmore, examinando nossa trajetória dos anos 1930 ao golpe de 1964, desse como subtítulo de seu primeiro livro sobre a política no Brasil esse qualificativo dubitativo: Politics in Brazil, 1930-1964: an Experiment in Democracy (1967). Atualmente, o Brasil, definitivamente, não vive um ciclo toynbeeano de ascensão e declínio civilizatório. Nossa trilha é um pouco mais “abaixo”, não em termos de avanços materiais ou progressos tecnológicos, mas no terreno dos valores e princípios morais de uma sociedade que deveria ser regrada, mas não consegue encontrar as bases de um regime político definitivamente regido pelas leis, não pela esperança eleitoral de se encontrar o próximo “salvador da pátria”. Não escapamos do sebastianismo, mas tampouco somos capazes de degringolar em experimentos tão radicais como as vistas em outros países.

Certas sociedades, enfrentando profundas crises, como a República de Weimar ou a Venezuela dos anos 1990, acabaram se entregando a um bando de sacripantas criminosos que terminam por levá-la ao paroxismo da autodestruição. Estaria o Brasil se aproximando dessa “atração fatal”? Não parece ser o caso, pelo menos não ainda.

Não se pense que certas “deformações” de um ciclo normalmente e tendencialmente ascensional estejam restritas a países que passaram por profundas crises sociais e econômicas como a Alemanha de Weimar ou a Venezuela pré-Chávez. Elas podem afetar, igualmente, nações aparentemente bem-sucedidas, mas bastante diversas em sua composição “civil”, com estamentos privilegiados, mas decadentes, e diferentes estratos de “desclassificados”, mas dotados de franquias eleitorais, como ocorre atualmente com a maior parte dos Estados-nacionais do sistema onusiano. Os Estados Unidos recentes podem ser um exemplo disso, como já revelaram alguns estudiosos da própria franja avançada das democracias de mercado, que veem o liberalismo em crise e o declínio das democracias. Tais processos parecer ser bem mais o resultado do avanço da ignorância do que dos retrocessos da economia.

Nessas fricções do processo histórico e no itinerário da evolução de nações assim confrontadas a desafios adaptativos podem surgir espaços, abrir “janelas”, para que oportunistas dotados de “boa” retórica consigam empolgar as massas com suas propostas disruptivas. Pode ser o começo do declínio, mais ou menos dramático segundo as forças sociais mobilizadas ao redor do personagem: um Mussolini, um Hitler, um Chávez, um Trump, um Bolsonaro.

Não está claro o que pode advir desse tipo de “atração fatal”. O que está claro é que tal tipo de fenômeno deveria, pelo menos, afastar essas teorias deterministas da História. A história de cada nação em particular é um livro aberto ao imponderável, ao contingente, ao inesperado, ao acidental e até ao dramático. Apenas se espera que o Brasil não esteja no vórtice de alguma “atração fatal”.

 

Qual é a conjuntura política existente no Brasil semanas antes das eleições?

Duas semanas antes das supostas festividades pelos 200 anos de nossa independência como Estado autônomo e menos de 40 dias antes do próximo pleito presidencial, o contexto eleitoral que se observa, de um ponto de vista independente, é próximo de um cenário de terra arrasada. As razões não são difíceis de definir, bastando olhar o panorama político.

Nada do que venha a ocorrer no curso das próximas semanas, em plena campanha política presidencial, deveria poder nos impedir de reconhecer exatamente quem são os corruptos, os grandes mentirosos, os incompetentes e até um ou outro desequilibrado, entre os que estão na liça para a presidência nos próximos quatro anos, assim como entre os milhares de candidatos para os demais cargos em disputa. O que já vimos até aqui – em termos de emendas secretas, uso abusivo dos fundos eleitoral e partidário – também pode nos confirmar que o estamento político brasileiro é essencialmente predatório das riquezas duramente produzidas pelo povo trabalhador. Digo estamento num sentido flexivelmente weberiano, pois que a classe política de fato se converteu numa categoria à parte no cenário social brasileiro. Ela se apresenta hoje como sendo o pior inimigo do Brasil e dos trabalhadores brasileiros, que estão sendo sistematicamente extorquidos por ladrões organizados. Esta é uma constatação que se funda na observação dos crimes eleitorais, ou crimes comuns, perpetrados por vários dos candidatos e que, no entanto, estão em liça.

Vai ser difícil reparar tal sistema necrosado pela corrupção entranhada, totalmente alheio a qualquer ética no serviço público, servindo apenas a si mesmo e confiante na impunidade judicial que seus grandes integrantes construíram para si. 

Como chegamos a isso?

Foi um lento acumular de distorções e de deformações banais, que atingiram inclusive as mais altas corporações de Estado, e que produziram um mundo à parte das preocupações mundanas dos brasileiros do setor produtivo, um mundo focado exclusivamente na captura da riqueza criada pelo setor produtivo sob a forma de nacos cada vez maiores do orçamento nacional, sistematicamente desviados para ganhos prebendalistas, o que está no centro do patrimonialismo que nunca deixou de se fortalecer no Brasil.

Nossa decadência política é de um tipo diferente: ela não tem nada de ideológico, pois que todas as correntes de opinião política, todas as tendências do sistema partidário partilham do mesmo afã pelo ganho fácil, pela extorsão legalizada por um sem-número de dispositivos e mecanismos dedicados ao objetivo comum de extrair renda do Estado brasileiro.

Os rentistas do estamento político estão unidos no aprofundamento do declínio da nação e prometem aperfeiçoar o sistema de extorsão legalizada justamente no ano em que “comemoramos” o Bicentenário do Estado independente. Existe maior ironia do destino do que essa?

De fato, podemos proclamar desde já, ou seja, quarenta dias antes dos resultados dos escrutínios – para os cargos executivos e para todos aqueles representativos – que as próximas eleições podem ser totalmente inúteis para a correção das graves dificuldades que enfrenta o Brasil, como resultado do pior declínio político a que assistimos em nossa história republicana, um processo que se arrasta desde o início do século. 

Quer ganhe um ou outro dos principais candidatos, segundo as pesquisas eleitorais, isso não parece ter a menor importância para a governança ou para as reformas necessárias no país, pois a cidadania votante nem se sabe se elas serão, ou não, feitas, algumas sim, outras não, ao sabor das coalizões sempre cambiantes e oportunistas no Parlamento. 

Quem continuará mandando, de fato, serão os políticos predadores e predatórios do largo estamento de hienas do orçamento, pois essa é a última instância de poder. O Centrão, na verdade, nem precisaria existir na sua forma e composição atuais: o que existe, de fato, é uma ameba sequiosa de verbas públicas em favor do seu enriquecimento pessoal, e isso de forma permanente. O velho patrimonialismo continua e continuará forte, feliz e seguro de si no Brasil do Bicentenário. Senão vejamos.

 

Estamos numa conjuntura “gatopardiana”? Mudar para nada mudar?

Menos de três semanas após a data dos 200 anos de independência e de construção tentativa de uma nação controlada e extorquida pelo Estado, o eleitorado brasileiro, independentemente de quem tenha sido o mais votado para a presidência, elegerá, de forma quase inconsequente e inconsciente, os mesmos sanguessugas para os diversos outros cargos — velhos ou novos, não importa— que continuarão a se locupletar com e a partir da riqueza duramente criada pelo povo trabalhador. 

Difícil acreditar, a essa altura das miseráveis negociações pouco republicanas que ocorrem à margem das candidaturas presidenciais, que algo de fundamentalmente diferente ocorra a partir dessas eleições, que tenhamos homens probos no Congresso, engajados por um momento, não em suas prebendas orçamentárias, mas em reformas estruturais no tocante à educação, infraestrutura, segurança, luta contra a corrupção e a insegurança jurídica.

O eleitorado continuará fixado no próximo salvador da pátria e, ao lado disso, os verdadeiros donos do poder — que nem é só o estamento burocrático de que falava Raymundo Faoro — continuarão suas soturnas maquinações em busca da preservação, da manutenção ou da conquista de mandatos parlamentares, que são os que determinam, em última instância, o destino das verbas públicas.

Podemos ter a certeza de que o estupro orçamentário continuará, com todos os tipos de emendas que a imaginação fértil dos sanguessugas congressuais concebeu, que isenções, subsídios e outros favores (sempre setoriais), que perdão de dívidas por impostos não pagos, que concursos públicos para lotar a máquina do Estado de centenas de funcionários muito bem remunerados, que milhares de cargos em comissão, tudo isso continuará a existir, que carros, imóveis e penduricalhos diversos a título de “auxílios” não tributáveis continuarão a existir e que novos serão criados. Enfim, basta dizer que o Brasil continuará sendo muito parecido com o Brasil que já conhecemos.

Não há nenhum pessimismo nesse tipo de afirmação. Basta observar o declínio de outras nações, a decadência democrática e a semiestagnação econômica, processos muito mais frequentes do que progressos fulgurantes em direção à prosperidade. Basta olhar em volta para conferirmos esse tipo de cenário de quase terra arrasada.

O Brasil não é muito melhor do que a Argentina aqui ao lado, que já nos provou que a pobreza pode, sim, voltar e se espalhar, pelas mãos e pés dos mesmos políticos que infelicitam a nação há décadas. O Brasil não é muito melhor, em sua democracia de baixa qualidade, do que os EUA, um exemplo lamentável de retrocessos inacreditáveis num processo de reforço de particularismos anacrônicos trazidos por carolice religiosa, ignorância cidadã e introversão nacionalista da mais baixa qualidade.

As eleições, finalmente, não são a grande festa da democracia, como nos quer fazer crer a propaganda ingênua do TSE. Elas são apenas a continuidade de um ritual compulsório, a que nos conduziram as hordas de políticos hábeis na manipulação de cidadãos — na verdade súditos de um Estado expropriador — com o único objetivo de se constituírem em governantes — federais, estaduais ou municipais — legitimamente mandatados para continuar o processo de extorsão.

O eleitorado se arrastará sem qualquer entusiasmo para as urnas de outubro, sem qualquer esperança de que 2023 será muito diferente do que já vimos nos anos precedentes. Esta descrição relativamente pessimista não é um impedimento absoluto quanto às possibilidades de o Brasil dar um grande salto para a frente na correção das suas piores iniquidades, a desigualdade social em primeiro lugar. Ela deve servir unicamente para nos guardar daquele otimismo reincidente a cada nova eleição: desta vez será diferente…

Será? Observando o cenário de terra arrasada, não existem razões para se acreditar que desta vez possa ser diferente. Inclusive porque, olhando a realidade de frente, a polarização promete tudo contaminar, antes, durante e após o próximo pleito eleitoral

 

O que nos promete o atual processo eleitoral? Nada de muito brilhante.

Parece que, por enquanto, temos pela frente dois responsáveis por dois grandes desastres, que ameaçam se repetir, um por corrupção e sectarismo, o outro por incompetência e perversidade negacionista. Sair dessa camisa de força, mesmo dispondo de alguns bons candidatos alternativos, não depende só deles, mas de um eleitorado pouco educado e muito castigado por frustrações contínuas.

Ninguém, nenhum partido ou movimento, dispõe da chave do futuro: este pode estar na acentuação da divisão do país, como até agora prometido pelas pesquisas eleitorais, ou numa longa caminhada para a normalização da nação, que será efetivamente muito difícil, e não apenas pela amplitude dos desafios econômicos e sociais, mas sobretudo pela péssima qualidade da representação política, que pode ainda se acentuar na próxima legislatura.

Cabe, portanto, ser moderadamente pessimista quanto aos próximos anos: tudo leva a crer que permaneceremos ainda, e durante bastante tempo mais, na mediocridade que tem sido a nossa por quase meio século, com poucos momentos de lucidez. Não somos, infelizmente, o que gostaríamos de ser. 

O Brasil vai saltando de salvador em salvador, continuando a afundar na mediocridade de esperar que um presidente “dê jeito nas coisas”. Construímos nós mesmos essa gaiola de ferro que não leva a nada, a não ser a novas frustrações. 

Ainda não crescemos o suficiente. Custa pensar?

Por que, como é que toda uma sociedade, que possui gente capaz, pesquisadores e professores que produzem obras magníficas de saber consistente, empresários inteligentes e batalhadores, e até alguns políticos sagazes, como é que tanta gente se deixa aprisionar e levar por um punhado de aproveitadores, mentirosos e incompetentes, que são saudados como “líderes”, dos quais se espera a solução a tantos problemas criados pelos mesmos mentirosos aproveitadores?

A sociedade como um todo, em sua grande maioria formada de cidadãos contribuintes e votantes, se deixa levar por alguns poucos pilantras, que continuam a praticar falcatruas a prazos regulares?

Mais de dez mil anos de “civilização”, religiões salvadoras, maravilhas da modernidade tecnológica, e até economistas competentes, para no final nos deixarmos levar por alguns espertinhos, que possuem a retórica adequada em face das dificuldades da vida e que continuam a apregoar falsas soluções? 

Somos tão crédulos assim, ou apenas passivos e acomodados?

Estamos no limiar de um novo exercício do mesmo gênero, mais um autoengano, que vai beneficiar velhos e novos espertinhos, e deixar a maioria mais ou menos como ela estava antes. 

Até a próxima vez…

É, parece que, finalmente, a humanidade, as sociedades nacionais, os povos constituídos em forma de Estados, nós não avançamos tanto assim: continuamos ingênuos e incapazes de cuidar de nós mesmos, e temos de recorrer a outros para organizar a bagunça. Tem um preço em tudo isso: não avançamos tanto quanto poderíamos: conflitos de opinião continuam possíveis. As paixões e os interesse ainda nos dominam.

Finalmente, não estamos tão longe assim da guerra de Troia. Mas mesmo que os brasileiros pretendessem voltar para uma Ítaca imaginária – alguns poucos bons governos no passado de duas ou três gerações: JK, FHC, quem mais? –, o caminho seria longo e semeado de escolhos. Existiria alguma outra via? 

 

Sobre a natureza do declínio relativo do Brasil no último meio século

Não existe qualquer fatalidade interna ou externa que explique a perda de impulso para o crescimento e o desenvolvimento econômico e social que afeta o Brasil desde a fase final, de crises e desacertos, do regime militar. As razões são essencialmente políticas e self-made.

O Brasil afundou menos pela ação persistente de algum projeto organizado de pensamento equivocado aplicado à nação — como podem ter sido os fenômenos do bolchevismo e do peronismo, nos casos bem mais graves dos desacertos ocorridos na Rússia e na Argentina durante décadas— e mais pela inconsciência geral quanto aos destinos do país por parte daqueles que ascenderam ao poder, de esquerda ou direita, desde aquela época.

Os problemas foram se acumulando lentamente, asfixiando não só a possibilidade de correções pontuais pela via da política, como a própria consciência de que problemas conjunturais estivessem reforçando tendências estruturais negativas, já longamente estabelecidas, como por exemplo a persistência de baixos níveis de educação na população.

A correção dos desacertos é difícil e incerta, ao observarmos o cenário de curto prazo, uma vez que ainda persistimos em identificar um improvável “salvador da pátria” como o redentor dos nossos males, sendo que este pode estar tanto à direita quanto à esquerda. Tais são as indefinições que persistem, e que mostram a divisão do país, num quadro de incerteza geral quanto a um programa geral de ajustes. As “soluções” ainda são buscadas em nível de pessoas, não de políticas.

Difícil vislumbrar qualquer inversão da atual tendência declinante e de recuperação da nação como um processo longo e desgastante, tantas são as deformações criadas por políticos desonestos e medíocres no comando do país — de esquerda e de direita —, ao lado da incultura ainda largamente predominante em todos os estratos sociais.

Não há nenhuma dúvida quanto a inexistência de fatalidades inevitáveis, pois todos os nossos problemas são o resultado de disfuncionalidades cumulativas criadas domesticamente. Mas muitas são as dúvidas de que possamos ter, no ambiente atual da fragmentada política brasileira (ou seja, as “elites dirigentes”) e da virtual inexistência de qualquer consenso sobre a natureza dos desafios entre as elites verdadeiramente dominantes (ou seja, os donos do capital), alguma possibilidade de correção de rumos no futuro previsível.

Em resumo: a retomada do dinamismo é incerta e provavelmente tomará mais de uma geração. Perdemos o rumo e até a consciência de que devemos ter algum tipo de rumo, qualquer que seja ele. Vai demorar para encontrar algum outro, tal a rigidez de interesses consolidados na atual anomia societal.

Se ousarmos pensar no Brasil como “país do futuro”, 80 anos depois que Stefan Zweig ousou predizer boas promessas nessa perspectiva, em boa medida pelo caráter plástico de nossas relações raciais, parece que até isso se perdeu, uma vez que o politicamente correto continua a criar arestas de uma divisão cultural racial que não existia antes da importação das ideias americanas sobre a “afro” descendência. Paramos de insistir naquilo que nos distingue como povo tolerante e culturalmente integrado, e começamos a construir uma sociedade demarcada por conceitos raciais, como os Estados Unidos?

 

A trajetória perversa do estamento político no Brasil

O Brasil está economicamente estagnado há muito tempo. Isso é certo e conhecido.

Mas, uma outra economia cresceu bastante nos últimos anos, a da criminalidade, não necessariamente aquela “normal”, bem conhecida, e sim uma especificamente política, ou melhor, dos políticos. 

Esse aumento da corrupção política dos “representantes do povo” foi acelerado na era Lula, que, para ter maioria no Congresso, passou a comprar, literalmente, parlamentares e bancadas inteiras com dinheiro público e das estatais. Tudo isso está muito bem documentado, embora os lulopetistas pretendam agora reescrever a história.

Daí o processo de corrupção política se desenvolveu enormemente depois, passando de fenômenos como Mensalão e Petrolão para processos endógenos de sustentação financeira, como os fundos e as emendas (de vários tipos), cobrindo todo o espectro do leque político, de um extremo a outro, sem exceções ou muito poucas. Isso também é conhecido.

Um governo fraco, débil, improvisado e caótico, como é o atual desgoverno do psicopata perverso, tornou ainda mais resiliente a criminalidade política, assim como estimulou a criminalidade comum, não só pela crise, pandemia e guerra, mas porque isso corresponde à sua natureza profunda; ele vem desses meios.

Essa é a verdadeira “herança maldita” a ser legada por um ladrão ordinário, fraudador como muitos outros colegas de Parlamento do dinheiro público, via rachadinhas e outras falcatruas, mas que virou, voluntária e involuntariamente, um grande criminoso político. Alguma dúvida? Essa triste trajetória já pode ter ocorrido em diversos outros países, em especial na América Latina, mas o Brasil ingressou, definitivamente, na era da grande criminalidade política. 

Não se pode esperar que o “fenômeno” se dissolva rapidamente. Ele acompanha o processo de deterioração educacional e moral da sociedade, inclusive porque já adentramos num regime “parlamentar”, mas um parlamentarismo de fachada.

O Brasil já chegou ao “parlamentarismo”, mas de um tipo disfarçado, deformado e até criminoso, pois que apenas exercido no sentido da apropriação, em vários casos da extorsão, de recursos públicos por parte dos “parlamentares”, com finalidades exclusivamente patrimonialistas.

Isso se deve ao fato de que o presidente atual é um completo inepto em matéria de governança e por isso transferiu — ou transferiram — a essência do seu desgoverno aos profissionais do ramo, os mesmos que elevaram os fundos indecentes a extremos de apropriação.

Se trata de um “parlamentarismo” podre, no qual os parlamentares não assumem nenhuma responsabilidade pela gestão, apenas se dedicam a arrancar nacos do orçamento para seus fins pessoais e familiares. Tudo isso sob o controle de uma espécie de familiocracia miliciana.

 

O Brasil “presidencialista” acabou? 

Com efeito, tudo indica que o Brasil “presidencialista” de tempos atrás, acabou: entramos num híbrido institucional não formalizado, próximo de um parlamentarismo de fachada, que vai nos levar à anarquia política nos anos à frente

Votos à parte, a desorganização financeira e orçamentária promovida pelo atual governo vai impactar negativamente as contas públicas estaduais e da União durante anos à frente. Não existe mais processo orçamentário, e sim uma extrema fragmentação dos recursos públicos em milhares de emendas paroquiais, sem qualquer sentido de planejamento racional e com amplo espaço para a corrupção.

Esta é a verdadeira herança maldita a ser deixada pelo desespero eleitoral do atual dirigente, ao lado da destruição total da cultura, da educação e do fomento à C&T. O Brasil se degrada politicamente pela pior gestão administrativa na história e pelo avanço de um falso parlamentarismo criado e mantido pelo estamento político predatório que se firmou no país.

O número de partidos pode até diminuir — embora apenas formalmente—, mas os caciques partidários passam a controlar um volume exponencial de recursos públicos, dados os fundos Partidário e Eleitoral ao lado do estupro orçamentário de todos os tipos de emendas. Conseguimos nos rebaixar deliberadamente, pela completa ausência de estadistas, ou de dirigentes responsáveis, seja na classe política, seja entre as elites econômicas.

O Brasil se suicida lentamente, não por um projeto consciente, mas pela extrema mediocridade dos que estão no comando político e econômico do país, não excluindo as corporações de Estado desse processo, mandarins do Estado focados exclusivamente em seus ganhos patrimonialistas, inclusive militares e aristocratas do Judiciário. 

Cabe, portanto, prepararmo-nos para uma mudança institucional para pior no Brasil, nos próximos anos, independentemente dos que forem eleitos, em todos os cargos em outubro de 2022. A ideia de uma nação voltada para o futuro terminou: os feudos cuidam apenas de si mesmos. A degradação interna e internacional do Brasil já se tornou visível aos olhos do mundo inteiro. Cada vez mais quadros formados estão abandonando o país. 

 

Sobre algumas das razões de nosso atraso político e econômico

Não existe nenhuma novidade ao se afirmar que o cenário visível do desalento nacional é caracterizado pelo aumento da miséria e da pobreza da população mais carente e a total falta de educação cívica em amplos setores do eleitorado, dois fatores potencializados pelo crescimento do evangelismo extrator, isto é, a indústria religiosa predatória dos pobres e deseducados. 

Se a Receita Federal tivesse condições de avaliar o volume de dinheiro que é carreado de forma praticamente subterrânea para as arcas dos pastores – um indústria que talvez iguale, ou supere, os tráficos de todos os tipos – constataria que ele é muitas vezes maior do que todo o "maná" governamental sob a forma de "auxílio à pobreza", sobretudo porque o maná dos pastores passou do dízimo arrecadado voluntariamente ou das bolsinhas circulando nos cultos, para a forma mais moderna do Pix oficial das "igrejas" (o que aliás facilitaria a avaliação do oceano de dinheiro manipulado por esses "pastores da fé").

O crescimento da demagogia religiosa juntou-se ao velho populismo eleitoral para levar o Brasil para trás, e não apenas no sentido cívico, mas propriamente educacional. Daí decorrem políticas gerais, inclusive econômicas, altamente equivocadas que rebaixam o capital humano daqueles mais desprovidos.

É um imenso problema, nunca resolvido mesmo nos anos de estabilização macroeconômica e que está arrastando o Brasil para trás e para baixo. A diminuição da renda e o aumento dos pobres e famintos são visíveis a olho nu, o que não é só uma decorrência da crise da epidemia e da guerra. A má qualidade do estamento político faz o resto, ao produzir baixo crescimento (ou nenhum em termos per capita, e até recuando), pela adoção de políticas inconsistentes ou simplesmente direcionadas a privilegiar os já ricos.

As políticas de “assistência à pobreza” não eliminam na verdade a pobreza, apenas subsidiam o consumo dos mais pobres, e podem até provocar efeitos deletérios, sobre o mercado de trabalho, por um lado (ao alterar o custo desse fator no plano microeconômico), e, por outro lado, sobre a chamada agricultura de subsistência ou atividades muito elementares que atuavam como “renda” não monetária (e, portanto, não computada nos levantamentos baseados em moeda circulante). 

Se havia desnutrição, subnutrição ou até surtos epidêmicos de fome localizada (secas em determinadas regiões do agreste, por exemplo), não havia gente condenada a morrer de fome pela ausência de ajuda assistencial do governo ou inexistência de alternativas. Um equilíbrio precário, mas não o quadro de pessoas realmente passando fome extrema, pela ausência de algum maná público. 

O desequilíbrio ou interrupção das ajudas levou à dependência passiva, e, portanto, a casos agudos de fome, pois a expectativa era a ajuda, não a busca ativa ou desesperada de uma solução ao nível individual. O tão apregoado e incensado “maior programa de assistência social do mundo” pode ter criado uma cultura da dependência nefasta no plano dos comportamentos sociais e individuais. 

O “Estado” — isto é, políticos demagogos do governo — perpetuam a solução da ajuda pública, pois parece um expediente mais fácil — ou útil eleitoralmente— do que a educação de massa de qualidade e políticas de produtividade do capital humano. As políticas de combate à pobreza podem estar perpetuando a pobreza. 

Poderemos superar os tremendos obstáculos políticos que obstam, presentemente, um processo sustentado de crescimento econômico, com transformação produtiva e distribuição socialmente equitativa dos frutos desse crescimento? Talvez, mas para isso seria necessário um grande esforço da cidadania no sentido de renovar a representação política, empreender as reformas institucionais e econômicas indispensáveis e renovar o sentido de união nacional em torno dos legítimos interesses da população mais pobre. Persistem fundadas dúvidas sobre se tal esforço tem condições de ser levado adiante por estadistas responsáveis, inclusive porque uma das razões do declínio relativo é justamente a falta de estadistas responsáveis que se apresentem à sociedade com um discurso renovado de unidade nacional em torno de metas e objetivos efetivamente conjugados. 

O principal obstáculo parece residir, como já se afirmou repetidas vezes, na notória mediocridade de nossas elites. O atraso não é tanto material, quanto ele é essencialmente mental. 


Paulo Roberto de Almeida

Brasília, 4222: 22 agosto 2022, 12 p.

Publicado na revista InterAção (Santa Maria: UFSM; vol. 13, n. 2, edição especial, setembro 2022; ISSN: 2357-7675). Relação de Publicados n. 1469.




 


segunda-feira, 12 de setembro de 2022

Eleições 2022: Lula já ganhou no 1o. turno: o que Bozo está esperando para dar o golpe? (Deutsche Welle)

Lula oscila para cima e pode ganhar no 1° turno, aponta Ipec

há 28 minutos

Deutsche Welle, 12/09/2022

Ex-presidente passa de 44% para 46% em nova pesquisa, enquanto Bolsonaro permanece estagnado com 31%. Rejeição a Bolsonaro e reprovação do governo também oscilaram para cima.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) continua na liderança da disputa pela Presidência nas eleições de outubro, segundo a pesquisa do Instituto Ipec, divulgada nesta segunda-feira (13/09).

Os números demonstram oscilações dentro da margem de erro, de dois pontos percentuais para mais ou para menos, mas também sugerem uma consolidação da preferência dos eleitores, a três semanas das eleições.

Segundo a sondagem divulgada nesta segunda, Lula oscilou positivamente, chegando a 46% das intenções de voto, em comparação aos 44% registrados no levantamento anterior, do dia 5 de setembro.

Os números sugerem que uma vitória de Lula no primeiro turno das eleições é possível.

Jair Bolsonaro (PL) manteve os mesmos 31% da pesquisa da semana passada, quando tinha oscilado um ponto para baixo.

Nos votos válidos, que não consideram brancos e nulos, Lula aparece com 51%, contra 35% de Bolsonaro.

Nos votos totais, em terceiro lugar, aparece o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), com 7% (queda de 1 ponto), seguido da senadora Simone Tebet (MDB), que manteve os mesmos 4% da pesquisa anterior.

Felipe D'Ávila (Novo) e Soraya Thronicke (União Brasil) continuam com 1% cada. Vera Lúcia (PSTU), Constituinte Eymael (PDC), Sofia Manzano (PCB), Léo Péricles (UP), e Padre Kelmon (PTB) foram citados mas estiveram abaixo de 1% das intenções de voto.

Pablo Marçal (Pros) não constou na pesquisa por sua candidatura ter sido indeferida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) , Brancos e nulos somam 6% e não sabem/não opinaram, 4%.

Segundo turno

No caso de um eventual segundo turno, Lula aparece novamente como favorito na disputa com Bolsonaro. De acordo com o Ipec, o petista venceria com 53% dos votos – oscilando 1 ponto para cima desde a última pesquisa – enquanto Bolsonaro ficaria com o mesmo número registrado há uma semana, 36%.

O Ipec revelou que 80% dos eleitores dizem estar decididos sobre em quem vão votar nas eleições de outubro.

Rejeição e avaliação do governo

Metade do eleitorado (50%) diz não votar em Bolsonaro de jeito nenhum (contra 49% do levantamento anterior), enquanto Lula é rejeitado por 35% (36% há uma semana). Ciro Gomes tem 17% de rejeição, enquanto o nome de Simone Tebet foi rejeitado por 7% dos entrevistados.

A avaliação do governo Bolsonaro oscilou negativamente, dentro da margem de erro da pesquisa; 59% dos entrevistados reprovam a maneira como o presidente governa o país, enquanto 35% aprovam. No dia 5 de setembro, a reprovação à administracao do presidente era de 57%, e a aprovação, 38%.

O número dos que dizem não saber avaliar permaneceu inalterado, com 5%.

O Ipec ouviu 2.512 pessoas entre os dias 9 e 11 de setembro em 158 municípios. A margem de erro é de dois pontos percentuais para cima ou para baixo, levando-se em conta um nível de confiança de 95%.

Datafolha

A pesquisa mais recente do Datafolha, divulgada no dia 9 de setembro, também colocou Lula como favorito. O petista apareceu com 45% das intenções de voto, contra 34% de Bolsonaro.

Em seguida aparecem Ciro Gomes (PDT), com 7%, Simone Tebet (MDB), com 5%. No caso de um eventual segundo turno, o petista venceria com 53% dos votos, e Bolsonaro ficaria com 39%, segundo o Datafolha.


quinta-feira, 1 de setembro de 2022

Militares continuam a fazer confusão em torno das eleições, e o Itamaraty segue atrás...

 Sem TSE, Itamaraty discute ‘aperfeiçoamento eleitoral’ com militares


Chanceler Carlos França se reuniu no Ministério da Defesa com o general-ministro Paulo Sergio e com o chefe da Equipe das Forças Armadas de Fiscalização do Sistema Eletrônico de Votação.

por Hugo Souza
31 de agosto de 2022

No início da tarde da última quinta-feira, 25, Dia do Soldado, o ministro das Relações Exteriores, Carlos França, foi ao Ministério da Defesa acompanhado de dois funcionários do Itamaraty para tratar de “aperfeiçoamento da segurança e da transparência do processo eleitoral”.

Nenhum representante do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) participou da reunião, na qual as Forças Armadas informaram “mais detalhadamente” a Carlos França suas “propostas” de mudanças no sistema eletrônico brasileiro de votação. Pela defesa, quem participou da reunião, além do general-ministro Paulo Sergio Nogueira de Oliveira, foi o coronel do Exército Marcelo Nogueira de Souza, chefe da Equipe das Forças Armadas de Fiscalização do Sistema Eletrônico de Votação (EFASEV).

Em meados de julho, o coronel Marcelo Sousa disse no Senado da República que “é possível que um código malicioso tenha sido inserido na urna e fique lá latente esperando algum tipo de acionamento”.

O chanceler Calos França, por seu turno, disse em maio na Câmara dos Deputados que “os reclamos do governo brasileiro por um voto auditável e transparente vai na direção da busca de transparência”.

A principal das “propostas” que o general Paulo Sergio e o coronel Marcelo Sousa discutiram na última quinta-feira com o chanceler Carlos França é que, no dia das eleições, o teste de integridade das urnas eletrônicas seja feito nas seções eleitorais e com eleitores reais liberando a urna com biometria, em vez de nas sedes dos TREs e com as urnas liberadas por servidores da Justiça Eleitoral.

A proposta é tida pela Defesa como “inegociável”. No entendimento “colaborativo” do ministro-general Paulo Sergio, só esta mudança “reduziria a possibilidade de um código malicioso furtar-se ao teste”. Técnicos do TSE, porém, já informaram ao presidente do tribunal, Alexandre de Moraes, que a possibilidade de testar as urnas eletrônicas com biometria de eleitores reais no dia da eleição é “inviável”, “impossível em várias frentes”.

Entre o “inegociável” e o “inviável”, portanto, criou-se um impasse. Ou melhor: o impasse foi deliberadamente criado, construído, premeditado pelos militares, que, com seus pós-graduados em informática há tempos debruçados sobre as urnas, decerto já sabiam há tempos sobre a inviabilidade da requisição.

‘Faz parte do meu putsch’
Este Come Ananás mostrou na semana passada que o objetivo da sinuca é ter na manga da farda, para todo caso, um pretexto – “a possibilidade de um código malicioso furtar-se ao teste”, como disse o general Paulo Sérgio no Senado – para tentar adiar indefinidamente o primeiro ou o segundo turnos ou, havendo eleições, apontar possibilidade de fraude, bagunçando o coreto, quando e se Lula for declarado presidente eleito.

Neste sentido, as tratativas da Defesa com o Itamaraty sobre “aperfeiçoamento da segurança e da transparência do processo eleitoral”, feitas à revelia do TSE, em clara extrapolação de papeis institucionais, mostram que o movimento de preparação dos espíritos da “comunidade internacional” para a eventualidade de, digamos, um problema técnico com as eleições não se esgotou com a famigerada reunião de Bolsonaro com embaixadores no Palácio do Planalto, na qual os ministros Paulo Sergio e Carlos França estiverem presentes e sentaram-se lado a lado na primeira fila da plateia.

Neste sentido, nesta quarta-feira, 31, a praticamente um mês do primeiro turno e com um parecer técnico de inviabilidade da proposta na praça, Paulo Sergio vai ao TSE para dar um “alô” ao inimigo; para reforçar a proposta, apesar de tudo, junto a Alexandre de Moraes.

No melhor estilo codinome beija-flor: “invento desculpas/provoco um briga”.

No melhor estilo “faz parte do meu putsch”.

https://comeananas.news/sem-tse-itamaraty-discute-aperfeicoamento-eleitoral-com-militares/

segunda-feira, 22 de agosto de 2022

Eleições 2022: os temores dos eleitores, de dois bichos-papão: Lula e Bolsonaro - Daniel Weterman, Lauriberto Pompeu (Estadão)

Eleições 2022 | Sucessão presidencial

Pesquisa mostra que 45% dos eleitores têm medo da continuidade do atual governo e 40% temem um novo mandato de Lula; campanhas atuam para reforçar sentimento

DANIEL WETERMAN LAURIBERTO POMPEU

BRASÍLIA

Uma grande parte do eleitorado diz ter medo da volta do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao poder e da reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL). Os dois rivais, que lideram as pesquisas de intenção de voto, provocam nos brasileiros o mesmo sentimento de temor do que pode ocorrer se forem eleitos.

Os motivos do medo, segundo pesquisas de opinião, têm base em fatos concretos das trajetórias dos dois candidatos. O eleitor teme que, com Lula, voltem a corrupção, o alinhamento internacional com ditaduras de esquerda e o empoderamento de pautas progressistas - tema delicado para os segmentos conservadores. Com Bolsonaro, o medo é de aumento da pobreza, acirramento do discurso de ódio e até de uma ruptura democrática.

Fake news têm sido usadas para reforçar o medo que o eleitor já tem. A mistura de fatos concretos com pós-verdade (a disseminação deturpada de informações que se sobrepõem aos fatos em si) fortalece o sentimento negativo no eleitor com relação aos dois.

Levantamento feito pela Quaest para a Genial Investimentos apontou que 45% dos eleitores têm mais medo da continuidade do governo Bolsonaro; 40% temem a volta do PT. A diferença entre os dois grupos caiu de 17 para apenas cinco pontos porcentuais entre junho e agosto. O levantamento, divulgado semana passada, não considera a intenção de voto em um candidato específico, mas o sentimento do eleitor na hora da escolha.

Pesquisadores estimam que metade do eleitorado não é fiel nem a Bolsonaro e nem a Lula, mas admite votar em um por ter medo do outro. "Existem dois polos muito influentes na cabeça do brasileiro, e existe um eleitor que não é apaixonado por nenhum desses dois polos, mas acaba ficando de um lado porque tem medo do que o outro representa", diz o cientista político Bruno Soller, do Instituto Real Time Big Data.

Segundo Soller, o medo de Lula cresce com a sensação de volta da corrupção, alinhamento internacional com ditaduras de esquerda, risco para o empresariado, empoderamento de pautas como aborto, drogas e LGBTQUIA+ e a fragilidade no combate ao crime.

HISTÓRICO. O governo do petista foi marcado por escândalos de corrupção, como o mensalão, que envolvia compra de apoio no Congresso. Quatro integrantes do primeiro escalão do PT foram presos, incluindo José Dirceu e José Genoino. Depois do impeachment de sua sucessora, Dilma Rousseff, o próprio Lula foi encarcerado pela Operação Lava Jato, em 2018, acusado de receber propina de empreiteiras em troca de favores no governo. Os processos contra ele foram arquivados, mas por falhas processuais.

Como presidente, Lula se alinhou a Hugo Chávez na Venezuela e a ditaduras na África, como a de Ornar Bongo no Gabão e de Teodoro Obiang na Guiné Equatorial. Também fez alianças com Kadafi na Líbia e José Eduardo dos Santos em Angola.

O medo de Bolsonaro nos eleitores, por outro lado, está associado à piora na condição de vida dos mais pobres, no acirramento do discurso de ódio contra minorias, na falta de preparo para comandar crises como a pandemia, na ruptura democrática e no isolamento internacional.

Bolsonaro termina os quatro anos de mandato como um pária por ignorar fóruns globais. Aliado de Donald Trump, ele não reconheceu a eleição de Joe Biden nos Estados Unidos num primeiro momento e travou um embate direto com o presidente da França, Emmanuel Macron, envolvendo questões ambientais.

Na pandemia, negou a doença que matou mais de 680 mil pessoas no Brasil e foi contra a vacinação. O Supremo Tribunal Federal (STF) investiga uma rede de fake news operada por aliados diretos dele para atacar seus adversários. Já na economia, Bolsonaro encerra os quatro anos de gestão com número recorde de pessoas em situação de pobreza.

INSEGURANÇA. Um dos mais tradicionais políticos do MDB, o ex-governador gaúcho Pedro Simon afirma que o comportamento imprevisível de Bolsonaro e sua postura radical reforçam o temor do eleitor com um segundo mandato. "A gente olha para o Bolsonaro, vê que ele é uma pessoa que não passa em um (teste) psicotécnico. É uma pessoa que a gente não tem confiança."

Lula, por sua vez, na avaliação de Simon, provoca medo ao emitir sinais dúbios. "Em primeiro lugar, ele não foi absolvido, anularam o processo, mas não esclareceram o assunto. Segundo, essa interrogação do Lula... Trazer como seu vice uma pessoa da qual ele disse horrores lá atrás é uma grande interrogação", declarou.

"Para o Lula, a área mais complicada e sensível é a questão do combate à corrupção e o desempenho do PT durante o mandato de sua sucessora, que não trouxe bons frutos", complementou o cientista político e professor do Insper Leandro Consentino.

ESTRATÉGIA. Provocar medo no eleitorado sempre foi uma estratégia dos marqueteiros de campanhas eleitorais. A diferença agora é que, pela primeira vez, estão na disputa um ex-presidente contra o atual. Lula e Bolsonaro são as duas maiores lideranças políticas do País, ambos têm torcidas e suas gestões e histórias despertam no eleitor incertezas sobre que Lula ou que Bolsonaro virão nesse possível novo mandato.

Após ter trabalhado em 91 campanhas majoritárias pelo País, o cientista político Antonio Lavareda afirma que o medo é uma das ferramentas emocionais usadas pelas candidaturas para reforçar os sentimentos de raiva e ansiedade. "Os brasileiros estão inseguros com o seu futuro, com o futuro das suas famílias. Isso desperta ansiedade e leva as pessoas a reavaliarem as escolhas anteriores", afirmou.

Em 1989, o então presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Mário Amato, causou polêmica ao dizer que 800 mil empresários deixariam o País se Lula ganhasse. Em 1995, a campanha de Fernando Henrique Cardoso aproveitou o sucesso do Plano Real para propagar o medo da volta da inflação. A disputa de 2002 foi marcada pela atriz Regina Duarte, na campanha de José Serra. "Eu tenho medo", disse, em relação a Lula. Em 2014, a propaganda da petista Dilma Rousseff divulgou que a proposta de Marina Silva (então no PSB, hoje na Rede), de dar autonomia ao Banco Central tiraria comida da mesa das famílias. A fake news do PT ajudou a derrubar a adversária.

A "campanha do medo" deste ano reeditou Regina Duarte. Na terça-feira, 16, ela, que foi secretária de Cultura de Bolsonaro, disse que o presidente "é exemplo de democracia para o mundo". "Como em 2002, eu tenho medo (de Lula)'", repetiu a atriz.

Do outro lado, o deputado André Janones (Avante-MG), que tem forte presença nas redes sociais, entrou de cabeça na campanha digital de Lula e tem se referido a Bolsonaro como "futuro presidiário".

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"Os brasileiros estão inseguros com o seu futuro , com o futuro das suas famílias.

Isso desperta ansiedade e leva as pessoas a reavaliarem as escolhas anteriores "

Antonio Lavareda cientista político e pesquisador do Ipespe 

Bolsonaro dá guinada em propostas para Itamaraty e abraça o "globalismo" no programa de governo - André Duchiade (O Globo)

 Bolsonaro dá guinada em propostas para Itamaraty e abraça o "globalismo" no programa de governo

Bolsonaro caminha na direção contrária de política diplomática empenhada pelo órgão nos últimos quatro anos

O Globo
Por André Duchiade — Rio de Janeiro
22/08/2022

Em agosto de 2018, o então candidato Jair Bolsonaro prometeu que, se chegasse ao Planalto, o Brasil abandonaria as Nações Unidas.

— Se eu for presidente eu saio da ONU, não serve para nada esta instituição — afirmou. — É uma reunião de comunistas, de gente que não tem qualquer compromisso com a América do Sul.

Na campanha à reeleição, o discurso sobre política externa deu um giro de 180 graus. No capítulo dedicado ao tema do programa de Bolsonaro entregue ao TSE, está o contrário do que se lia há quatro anos, isto é, uma enfática defesa do sistema internacional multilateral. O Brasil agora “se destaca como defensor histórico de uma ordem global multipolar, alicerçada no direito internacional e centrada na Carta das Nações Unidas”.

O abraço ao chamado “globalismo” — termo empregado pela extrema-direita mundial para se referir ao multilateralismo — contrasta não só com a campanha de há quatro anos, mas também com a prática diplomática liderada pelo presidente em boa parte de seu mandato, sobretudo quando o ex-chanceler Ernesto Araújo chefiava o Itamaraty.

Os planos para política externa dos demais principais candidatos à Presidência não trazem surpresas. Lula (PT) promete o resgate com poucas atualizações da linha adotada em seus dois governos, enquanto Ciro Gomes (PDT), especialmente, e Simone Tebet (MDB) são mais sucintos ou genéricos, numa evidência, na avaliação de alguns analistas, de que o tema terá pouco peso na disputa eleitoral deste ano.

O governo Bolsonaro em imagens

Se não chegou a tentar tirar o país da ONU, o governo Bolsonaro ainda assim mudou o rumo histórico da política externa brasileira. O discurso encampado por Araújo e outros assessores presidenciais denunciava a existência de uma “ditadura climática” global e buscava aproximar o país, por exemplo, da Hungria e da Polônia, onde houve ascensão da nova direita, em detrimento de China, Alemanha e França.

Bolsonaro mudou, e agora reconhece a crise climática, mas o ex-chanceler ainda pensa o mesmo. Após deixar o Itamaraty, Araújo criou um canal no YouTube em que critica a gestão mais moderada das relações internacionais pedindo que o país adote “posições pró-Ocidente” em questões como o conflito na Ucrânia.

Em 2022, o programa de governo promete continuar “seguindo o conceito universalista de nossa política externa”.

— Bolsonaro fez muitas promessas. Prometeu uma revolução e uma refundação do Itamaraty. Isso, no entanto, é muito difícil de fazer — avalia Dawisson Belém Lopes, professor de Política Internacional na UFMG. — O novo programa é a comprovação de que, depois uma política externa revolucionária que fracassou, o Itamaraty volta ao curso normal.

Das 48 páginas do programa de Bolsonaro, o capítulo “Política externa e defesa nacional” ocupa três e meia. Além da diplomacia, as propostas abordam a indústria de defesa e parcerias comerciais. O documento também diz que o “Brasil constitui parte incontornável da solução dos principais desafios do planeta”.

Discurso e prática

A despeito do tom mais baixo, um eventual segundo governo do candidato do PL terá o desafio de amenizar certo isolamento do país nos últimos anos. O atual governo tem a imagem arranhada em temas centrais da política global, como política ambiental e climática, direitos humanos e respeito à democracia. Para Carlos Milani, professor de Relações Internacionais do Iesp-Uerj, a solução estará menos na diplomacia e mais na prática do futuro governo.

— Uma imagem não se projeta só com palavras, mas sim com ações concretas. Como o Brasil vai dizer que é uma solução para os problemas do planeta enquanto aumenta o desmatamento? — indaga.

No programa de Lula, a linguagem do programa remete à empregada pelo Itamaraty durante os seus dois governos, quando o ministério esteve sob o comando de Celso Amorim. “Defender nossa soberania exige recuperar a política externa ativa e altiva que nos alçou à condição de protagonista global”, diz o documento. A cooperação com países do Sul Global, sobretudo na América Latina e na África, tem destaque. O documento também se refere ao fortalecimento de Mercosul, Unasul, Celac e Brics.

Segundo Milani, as promessas carecem de detalhamento sobre como conduzir essa política em um contexto global diferente, de rivalidade entre grandes potências.

— Não fica muito claro como o novo governo conceberá um retorno à cooperação estratégica sem pensar que o mundo mudou. A China ascendeu desde então, e agora não há mais nenhuma decisão que o Brasil tome sem que intervenha a rivalidade entre EUA e China, e às vezes entre EUA e Rússia — avalia. — Não fica claro quais são as ferramentas que tornarão essa política externa “ativa e altiva” factível. Não que não seja, mas não há explicação.

Além dos quatro parágrafos dedicados explicitamente à política externa no documento de 21 páginas, há vários temas que exigem negociações internacionais e aparecem de forma transversal ao longo do programa petista, como sustentabilidade, enfrentamento das mudanças climáticas e transição energética.

Há ainda uma inovação: o realce oferecido ao atendimento consular aos brasileiros fora do país. “São milhões de pessoas que trabalham, estudam e vivem fora do país e contribuem para a economia e desenvolvimento do Brasil. Retomaremos as políticas públicas para a população brasileira no exterior a partir de acordos bilaterais”, diz o texto. De acordo com Belém Lopes, a atenção à diáspora exprime uma busca por esse eleitorado.

— Em outros países, como o Equador, com frequência os candidatos vão fazer campanha no exterior. No Brasil, nunca se tentou mirar no eleitor expatriado — disse Belém Lopes. — O Brasil virou um país de emigrantes, com mais de 4 milhões de cidadãos vivendo fora. Estamos falando de 2% da população brasileira, e o PT percebeu essa mudança.

Entre outros candidatos, o programa de Ciro Gomes se caracteriza por uma ausência de trechos que abordem diretamente a política externa, com duas menções à noção de soberania nas negociações entre países. Assuntos internacionais aparecem em outros itens, como quando o documento se refere ao meio ambiente, ao fortalecimento de complexos industriais nacionais, a uma política de incentivo à cultura nacional e à intenção de transformar o Brasil em uma potência educacional.

No plano de Tebet as propostas aparecem numa página no eixo “Governo parceiro da iniciativa privada”. Com ênfase no comércio internacional, ela propõe “implementar plano de redução gradual de tarifas aduaneiras”. O texto defende ainda “consolidar e aprofundar o Mercosul”.

A despeito dos programas, que se tornaram menores e mais vagos nos últimos ciclos eleitorais, é improvável que a política externa vá desempenhar papel crucial nestas eleições, ao contrário de há quatro anos, quando Bolsonaro foi a Taiwan, hostilizou a China e deixou claro que se aproximaria do então líder americano Donald Trump.

— O tema externo deve aparecer bem pouco nas campanhas. Talvez um pouco no contexto ambiental, mas, de resto, não antecipo uma discussão mais ampla sobre a temática — afirmou Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais da FGV-SP. — Em 2018, havia a narrativa anti-China, a promessa de aproximação a Trump, e também uma discussão proeminente sobre a Venezuela. Dessa vez, o Brasil está mais focado em assuntos internos, em questões econômicas e nas guerras culturais.

https://oglobo.globo.com/politica/eleicoes-2022/noticia/2022/08/bolsonaro-da-guinada-em-propostas-para-itamaraty-e-abraca-o-globalismo-no-programa-de-governo.ghtml