O novo perfil dos futuros jovens diplomatas brasileiros
Por Adriana Fonseca | De São Paulo
Valor Econômico – pág. D10
01.02.2012
Marcella Winter, 23 anos, faz este ano sua segunda tentativa no exame de admissão do Instituto Rio Branco para poder seguir carreira diplomática
Uma mudança no conteúdo das provas do Instituto Rio Branco, que forma diplomatas, alterou a história de um dos mais disputados concursos do país. Até dez anos atrás, era mais fácil para filhos de diplomatas serem aprovados no exame. Por residirem no exterior, eles dominavam o francês, idioma que antes era antes era mais popular e eliminatório no teste. Além disso, a prova da primeira etapa era de cultura geral, o que também beneficiava quem tinha passagem por diversos países.
"Desde a modificação no conteúdo do concurso, ficou até mais difícil a aprovação deles. Como muitos passam boa parte da infância e adolescência fora do Brasil, não têm o conhecimento necessário sobre a história do país, disciplina exigida atualmente", explica o secretário do ministério de Relações Exteriores Márcio Rebouças, um dos responsáveis pela organização do concurso do Instituto Rio Branco. Segundo ele, hoje são poucos os aprovados que têm familiares na carreira diplomática.
O secretário explica que foram criadas 400 novas vagas para diplomatas em 2006. Essas posições foram distribuídas em cinco diferentes concursos anuais. "Nos últimos anos, o Brasil se interessou mais pelo exterior e vice-versa. Isso tem impacto direto na demanda de trabalho do corpo diplomático", diz.
No ano passado, o número de postos abertos voltou ao usual. Para Rebouças, a reposição natural de diplomatas no país requer o ingresso de 25 a 30 novos profissionais a cada ano. Assim, em 2011 foram 26 vagas abertas e neste ano são 30.
O salário inicial para quem consegue a aprovação e passa a ocupar o cargo de terceiro secretário é de R$ 12,9 mil. Para concorrer a uma das vagas é preciso ter curso superior, ser brasileiro nato, estar em dia com as obrigações eleitorais e do serviço militar e ter 18 anos completos.
Formada em relações públicas pela PUC do Rio de Janeiro, Marcella Winter, 23 anos, tentará neste ano a aprovação no concurso do Instituto Rio Branco pela segunda vez. A jovem concluiu a faculdade em julho de 2010 e, depois disso, dedicou seis meses aos estudos preparatórios para a prova que seleciona os futuros diplomatas brasileiros. "Eu sabia que não iria passar, pois tinha pouco tempo de estudo. Fiz para ganhar experiência", diz. Agora, no entanto, é para valer.
O ano em que Marcella fez a prova foi o mais concorrido da história do concurso, chegando ao recorde de 276 candidatos para cada vaga oferecida - nos anteriores, essa relação ficava entre 70 e 80. Com a concorrência acirrada, ela sabe que tem uma batalha dura pela frente. Sua rotina de estudos reflete o tamanho do desafio, com quase 15 horas diárias de dedicação à prova. Na unidade carioca do Curso Clio, onde faz todas as matérias do programa avançado que prepara os candidatos para o concurso, além de aulas de redação e simulados, ela chega ao meio-dia. Ali permanece até às 20 horas. Depois, já em casa, continua estudando até às 3 horas da madrugada.
Essa programação acontece de segunda à sexta-feira. Aos sábados, Marcella faz um curso preparatório complementar no período da manhã. "A parte da tarde tento dedicar ao lazer", diz.
Aos domingos, ela elabora as questões da monitoria on-line de política internacional, responsabilidade dela no Curso Clio. "Procurei emprego nessa escola quando ainda estava na faculdade. Já sabia que queria seguir a carreira diplomática, mas não tinha dinheiro para pagar o cursinho. Dessa forma, consegui uma bolsa de estudos", conta. "O lado positivo é que o meu trabalho me ajuda a estudar para o concurso."
Marcella não é a única que tenta a carreira diplomática pela segunda vez. João Batista da Costa, coordenador pedagógico e fundador do Curso JB, uma das escolas preparatórias mais tradicionais de Brasília, diz que a grande maioria dos alunos não passa na primeira tentativa. O mais comum, de acordo com ele, é ter êxito na segunda ou na terceira vez.
"O que define a aprovação de um aluno é a bagagem de conteúdo que ele traz, uma boa quilometragem de leitura e uma formação sólida", ressalta. A recomendação dele é que o aluno dedique pelo menos seis horas por dia aos estudos, mas há exceções. "Tem gente que consegue bons resultados com menos horas de preparo", afirma.
O perfil dos aprovados é variado, mas, na média, eles têm entre 25 e 28 anos e de 20% a 30% são mulheres. Por área de formação, as mais representativas são direito, curso escolhido por um terço dos aprovados, e relações internacionais, opção de mais um terço. Também são comuns pessoas que estudaram economia, comunicação social, letras e história.
Para quem se interessa pela carreira diplomática, as inscrições para a prova deste ano estão abertas até 12 de fevereiro ao custo de R$ 150. A seleção é dividida em quatro etapas, sendo as três primeiras de caráter eliminatório. Apenas a primeira fase tem questões objetivas e, segundo Rebouças, somente 200 de todos os inscritos, em média, passam para a segunda etapa. As demais fases são compostas por provas escritas.
As disciplinas presentes no exame são português, história do Brasil e do mundo, geografia, política internacional, inglês, economia, direito e direito internacional público. Na última etapa são avaliados conhecimentos de espanhol e francês, em caráter classificatório.