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domingo, 17 de março de 2019

Mensagem da Republica de Curitiba: um amigo me escreve solidariamente...

Um grande amigo de Curitiba me escreve em solidariedade:


Afastado há mais de 15 dias de minhas atividades profissionais, (...) e inclusive... fora de Curitiba, só nesta semana tomei conhecimento de truculenta e lamentável demissão que lhe tirou a presidência do IPRI.
Confesso que atualmente tenho procurado me distanciar das discussões em torno do maniqueísmo que tomou conta da política nacional. Longe de mim pactuar com a esquerda lírica, patológica, ensimesmada, irresponsável e corrupta que manejou a direção do país nos últimos anos. De outra parte, não há como concordar com os rumos da atual política externa brasileira, conduzida por um alienado sabujo de plantão, e comandada à distância por alguém totalmente inexperiente, inconsequente e temerário nas suas orientações e indicações, conquanto erigido à condição de conselheiro-mor do Executivo pátrio.
Dito isto, venho solidarizar-me com o amigo, renomado diplomata e brilhante intelectual brasileiro, louvado dentro e fora do território nacional, em face do subjetivo, indecoroso e imerecido ato que o removeu de posto dos mais importantes aos rumos da diplomacia nacional.
Vivemos, lamentavelmente, tempos da autoafirmação do pensamento único, que se compraz e necessita, para prevalecimento, de impor o “fechamento do universo do discurso”, e por decorrência, retalhando todos os que ousam discordar ou opinar contrariamente às decisões e ideias do novel governo, tanto em público quanto no privado.
Tenha a certeza, caríssimo Paulo Roberto, de que você não está só em suas manifestações, tampouco sua exoneração foi aceita passivamente pela crítica e/ou pela opinião pública. Aqui em Curitiba, mais que um amigo, tenha em mim, em comunhão, a “pièce de résistence” local contra os ortodoxos e levianos rumos conferidos às relações externas brasileiras.
Receba meu fraterno abraço e minhas melhores homenagens.
Xxxxxx Xxxxxxxx
Curitiba, 15/03/2019

domingo, 10 de março de 2019

Itamaraty de volta à Lei da Mordaça? - Thais Bilenky (FSP)


Tenho diversas, na verdade muitas, divergências com o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães em várias áreas de interesse comum: política externa, relações econômicas internacionais do Brasil, diplomacia regional, etc. 
Mas temos uma característica comum: ambos defendemos ideias nas quais acreditamos, e não hesitamos em afrontar superiores na defesa do nosso direito de expressar essas ideias. Samuel é um corajoso, e sofreu vários percalços no Itamaraty – como eu aliás – por defender essas ideias, até o ponto de ser defenestrado do posto que ocupava como diretor do IPRI, o que acaba de ocorrer comigo.
Fizeram uma "Lei da Mordaça" especialmente para ele, o que é de uma vergonha sem par, uma vez que acresce ao que já está na Lei do Serviço Exterior introduzindo um regime de censura prévia e de controle absoluto sobre o que possam falar os diplomatas. Ou seja, tratava-se de um instrumento intimidatório. Não adiantou: Samuel continuou falando o que queria sobre a Alca, o Nafta, o Mercosul "neoliberal".
Foi defenestrado no início de 2001, e eu me solidarizei com ele. Quando eu fui, meses mais tarde, punido pela mesma Lei da Mordaça, por causa de uma entrevista às Páginas Amarelas de Veja, foi ele a telefonar-me para emprestar-me a mesma solidariedade que eu havia demonstrado no começo do ano.
Isso não o impediu – et pour cause – de me vetar o cargo de diretor do mestrado do Instituto Rio Branco no início de 2003, quando ele já se tinha tornado o todo poderoso SG do Itamaraty.
Agora foi ele quem novamente me telefonou para demonstrar sua solidariedade para comigo.
Somos dois defenestrados por motivos similares: enfrentar a cúpula do Itamaraty, uma espécie de Vaticano, com seus cardeais, seus ritos, seus dogmas, uma rígida hierarquia, impondo disciplina aos servos de gleba, que somos todos os demais...
A história tem muitas voltas Eu e Samuel vamos tomar cerveja para falar sobre tudo isso. Não nos moveremos um milímetro de nossas crenças e posturas políticas e econômicas, mas certos valores e princípios são comuns.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 10 de março de 2019

Araújo retoma e reforça censura imposta por seu sogro no Itamaraty
Demissão de embaixador reacende chama de perseguição da época da Lei da Mordaça, sob FHC
Thais Bilenky
FSP, 10.mar.2019 às 2h00

A demissão de um embaixador durante o Carnaval reacendeu no Itamaraty a chama da perseguição política que afligiu diplomatas em diversos momentos da história —um em particular. 
Em 2001, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o Ministério de Relações Exteriores baixou uma circular conhecida como Lei da Mordaça, que impunha a necessidade de aprovação prévia de qualquer manifestação pública dos diplomatas.
Foi designado como censor o então secretário-geral, Luiz Felipe de Seixas Corrêa, sogro do atual chanceler, Ernesto Araújo.
O mais conhecido alvo da circular foi o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, demitido do cargo que ocupava na época, o de diretor do Ipri (Instituto de Pesquisas de Relações Internacionais).
A ruidosa demissão na segunda-feira de Carnaval, 4 de março, atingiu outro embaixador, Paulo Roberto de Almeida, que exercia a mesma função no Ipri. E envolveu, mais uma vez, ainda que de forma indireta, Seixas Corrêa.
O sogro do chanceler daria uma palestra no instituto —um braço acadêmico do Itamaraty— na sexta-feira (8). 
Segundo apurou a Folha, para escapar da saia justa, Seixas Corrêa desistiu ao saber da demissão do diretor, crítico da influência do polemista Olavo de Carvalho na política externa brasileira. 
“O sogro do Ernesto me puniu duas vezes pela chamada ‘Lei da Mordaça’”, afirmou Almeida em uma rede social.
“Depois da demissão do Samuel, quando ele me cumprimentou, em 2016, por ter assumido o Ipri, eu apenas respondi: ‘Grato, embaixador; só espero não ser defenestrado como um antecessor meu’. Ele sorriu e nada disse. Pois é, agora aconteceu, por uma dessas ironias do destino.”
Chanceler à época da Lei da Mordaça, Celso Lafer afirmou que os dois momentos são incomparáveis. Na sua gestão, a polêmica girava em torno da Alca (Área de Livre-Comércio das Américas), à qual a esquerda, de forma geral, e Pinheiro Guimarães, em particular, eram contrários. Lafer afirma que queria pluralismo nos debates no Ipri, daí a demissão.
“O que está ocorrendo agora é uma espécie de vocação inquisitorial, onde aparentemente o chanceler se unge da lembrança de [Tomás de] Torquemada, um grande inquisidor [do século 15]”, diz.
A gestão de Ernesto Araújo, na sua avaliação, se mostra “muito centralizadora e muito inquisitorial”. Desde que foi indicado chanceler pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), Araújo, cuja promoção a embaixador não tem um ano, gerou desconforto no corpo diplomático por medidas vistas como quebra de hierarquia.
Diplomatas gabaritados foram removidos ou postos de escanteio, e servidores menos graduados ocuparam postos de comando na atual gestão.
São citados os casos de Everton Vargas e Gisela Padovan, entre outros. O primeiro estava cotado para comandar as negociações ambientais do Itamaraty e não o foi. A segunda, meses depois de assumir a direção do Instituto Rio Branco, está de mudança para Madri para tocar o consulado.
Reservadamente, o grupo de Araújo diz que não assumiu compromisso com esses servidores, que as destinações foram decididas em comum acordo, que Almeida ofendeu o chanceler e que é natural o ministro se cercar de pessoas de sua confiança.
“Um governo que se elegeu com maioria pode evidentemente escolher pessoas que são mais afins”, disse o embaixador Rubens Ricupero, crítico de Araújo. “Mas dar à diplomacia uma cor unívoca vai eliminar muito a diversidade, que é desejável nessa área.”
Para Ricupero, que protagonizou um debate público nesta semana com Araújo, o chanceler “está revelando uma atitude de irritação e pouca tolerância à crítica”.
Procurado, o ministro não se manifestou.
“É um momento de muito mais constrangimento ideológico do que nunca”, afirmou Guilherme Casarões, pesquisador na Fundação Getúlio Vargas. “A identificação da crítica é tácita.”
Para irem para o jocosamente chamado departamento de escadas e corredores, diplomatas não precisaram verbalizar críticas a Araújo. Em alguns casos, a presunção de divergência bastou. Aconteceu antes mesmo da oficialização de Araújo como chanceler.
Hoje assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, Filipe Martins, aluno de Olavo de Carvalho e próximo de Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, fez campanha contra nomes aventados para liderar o Itamaraty durante a transição. 
O argumento era suposta submissão ao ideário do PSDB.
“Quem quer que esteja recomendando diplomatas vinculados a FHC para chefiar o MRE tem em mente interesses estranhos aos da nação e contrários aos do presidente eleito”, escreveu, em novembro.
Alguém perguntou se era o caso do embaixador José Alfredo Graça Lima, ligado ao PSDB, desafeto do PT e então cotado para o cargo. Martins assentiu. “Continuísmo explícito, visão exclusivamente comercialista, aversão às propostas do Jair”, justificou. 
Escaparam à análise daquele momento as afinidades políticas do sogro de quem viria a ser escolhido. Seixas Corrêa foi secretário-geral do Itamaraty, segundo posto mais alto da instituição, no governo Collor e no de FHC. Mantém laços com o círculo de diplomatas experimentados e afinidades com o tucanato. É elogiado pelo genro publicamente.
Ao tomar posse pela segunda vez, em 1999, discursou: “Acreditamos plenamente no projeto e teremos orgulho em contribuir para a sua consolidação e aprofundamento neste novo mandato que a sociedade brasileira outorgou pelas urnas ao presidente Fernando Henrique Cardoso”.

quinta-feira, 7 de março de 2019

Retificando Eliane Cantanhede no GloboNews em Pauta e no Estadão


Esclarecimentos vindos do “outro lado” da história

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de março de 2019

Vou transcrever em primeiro lugar o artigo de Eliane Cantanhede no Estadão desta quinta-feira 7 de março, que reproduz, em formato ampliado, seus argumentos no GloboNews em Pauta de 6/03.
Acho que ela só ouviu o Itamaraty e não teve o cuidado, ou o tempo, de me ouvir, ou interpretou mal o que escrevi no meu blog Diplomatizzando.
Na sequência, e desculpando-me pela longa postagem, coloco os meus argumentos, que ela usará se desejar.
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de março de 2019


1) Matéria do Estadão

Ataques a Ernesto Araújo motivaram exoneração de embaixador
Para Itamaraty, Paulo Roberto de Almeida foi afastado de cargo por ter “agredido” pelas redes sociais o chanceler e a política externa do governo Bolsonaro
Eliane Cantanhêde, O Estado de S.Paulo
06 de março de 2019 | 23h22

BRASÍLIA - O Itamaraty desmente, extraoficialmente, a versão do embaixador Paulo Roberto de Almeida para sua exoneração do cargo de presidente do Instituto de Pesquisas de Relações Internacionais (Ipri), em plena segunda-feira de Carnaval. Na versão do ministério, ele “quer aparecer” e foi afastado por ter “agredido” pelas redes sociais o ministro Ernesto Araujo e a política externa do governo.
Ao publicar no Facebook uma crítica do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso à política externa, na véspera da exoneração, Almeida escreveu sobre “os descaminhos da nossa diplomacia, entregue aos eflúvios amadores de ideólogos tresloucados, como certo sofista da Virgínia, e fundamentalistas trumpistas totalmente equivocados”. E concluiu: “Já passou da hora de superar o ridículo...”

No Itamaraty, a conclusão é que a referência a “fundamentalistas trumpistas” foi uma “agressão direta” ao chanceler Araújo, que tem textos publicados enaltecendo o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, como o único capaz de salvar os valores cristãos do Ocidente e, por isso, é costumeiramente acusado por seus críticos justamente de “fundamentalista trompista”. Além disso, a cúpula do ministério considera que ele acusou a política externa do atual governo de “descaminhos” e de ser “ridícula”.
Embaixadores sediados no Itamaraty, em Brasília, consideram que as expressões “ideólogos tresloucados” e “sofista da Virgínia” foram dirigidas frontalmente contra o filósofo Olavo de Carvalho, que mora no Estado norte-americano da Virgínia e é apontado como o principal padrinho da escolha de Ernesto Araujo como chanceler. Eles, porém, disseram que isso não pesou na exoneração, o que pesou foram os “ataques ao chanceler e à hierarquia”. 

Em entrevista ao Estado, publicada ontem, Almeida disse que foi exonerado por, além de ter criticado Olavo de Carvalho, ter publicado em seu blog um artigo de Fernando Henrique Cardoso e uma palestra do embaixador Rubens Ricupero contra a política externa do governo Jair Bolsonaro. O Itamaraty, porém, diz que tanto o artigo quanto a palestra são públicas e, inclusive, divulgadas no resumo diário de notícias sobre o Itamaraty. Logo, não seriam motivo para o afastamento.
Uma das críticas de Paulo Roberto de Almeida, na entrevista, foi que Ernesto Araujo impôs uma “subversão da hierarquia, uma reforma de cima para baixo que deixou muita gente perplexa”. Disse, também, que já estava esperando ser afastado. De fato, ele já tivera uma conversa na sexta-feira com o chefe de gabinete de Ernesto Araujo, ministro de carreira Pedro Wollny, justamente sobre seu próximo cargo. O post no domingo interrompeu a discussão, ele foi comunicado da exoneração na segunda-feira pelo próprio Wollny, por telefone, e ontem foi ao Itamaraty para formalizar a decisão.
Uma curiosidade: Paulo Roberto está escrevendo um livro junto com o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, sobre o ex-embaixador, ministro e senador Roberto Campos, um dos ideólogos da direita brasileira. Longe de ser considerado “de esquerda”, Almeida é um estudioso da vida e obra de Campos.
Na entrevista ao Estado, o embaixador disse que ficou “na geladeira”, ou “encostado na biblioteca”, nos anos dos ex-presidentes Luis Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Segundo o Itamaraty, porém, ele atuou de 2003 a 2007 como assessor especial do Núcleo de Assuntos Estratégicos do Palácio do Planalto.


2) Meu primeiro esclarecimento sobre o artigo de Eliane Cantanhêde no Estadão (7/03/2019) e seu comentário no GloboNews em Pauta (6/03):

1) Ninguém tem nenhuma dúvida sobre quem seja o sofista da Virgínia; reafirmo: é um completo inepto em relações internacionais;
2) O "fundamentalista trumpista" a quem eu me referi é aquele sujeito também amador em política externa, que passeou ridiculamente pelos EUA com um boné da reeleição de Trump em 2020, e que disse, USURPANDO sobre a opinião do povo brasileiro (que ele não consultou), que todos aqui estávamos apoiando a construção de um muro na fronteira com o México. Isso é um adesismo da pior espécie, além, é claro, de representar interferência nos assuntos internos de DOIS países. 
Ao que me consta o chanceler ainda não usou nenhum boné do Trump.


3) Meu segundo esclarecimento sobre o artigo de Eliane Cantanhêde no Estadão (7/03/2019) sobre um livro que ainda não saiu e meus “cargos” anteriores:


Tenho novamente de corrigir a Eliane Cantanhede em mais dois outros parágrafos da matéria no Estadão, ela novamente apenas informada por certos súditos do Itamaraty.
Ela escreveu:
"Uma curiosidade: Paulo Roberto está escrevendo um livro junto com o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, sobre o ex-embaixador, ministro e senador Roberto Campos, um dos ideólogos da direita brasileira. Longe de ser considerado “de esquerda”, Almeida é um estudioso da vida e obra de Campos.
Na entrevista ao Estado, o embaixador disse que ficou “na geladeira”, ou “encostado na biblioteca”, nos anos dos ex-presidentes Luis Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. Segundo o Itamaraty, porém, ele atuou de 2003 a 2007 como assessor especial do Núcleo de Assuntos Estratégicos do Palácio do Planalto."

Vamos lá:
1) NÃO estou escrevendo NENHUM livro com o ministro Gilmar Mendes. Cerca de oito meses atrás, sob recomendação do jurista Ives Gandra Martins, o gabinete do Ministro Gilmar Mendes contatou-me para colaborar num livro que ele estaria coordenando sobre os 30 anos da Constituição. Eu disse que, não sendo formado em Direito e considerando-me inepto na matéria, eu poderia no máximo contribuir com uma crítica à economia política da CF-88, pois tal é a minha especialidade, e que poderia ser algo sobre as críticas de Roberto Campos à Constituinte e à Constituição de 1988, pois eu já tinha escrito e coordenado um livro sobre o grande diplomata e economista: O Homem que Pensou o Brasil: trajetória intelectual de Roberto Campos (Appris, 2017). Disseram-me que estava bem, preparei o artigo, mandei e NUNCA mais tive notícias desse livro.
2) Aproveitei o embalo, expandi esse artigo, completei com vários outros argumentos e compus o livro A Constituição Contra o Brasil: ensaios de Roberto Campos sobre a Constituinte e a Constituição de 1988 (SP: LVM, 2018), com 65 artigos de Roberto Campos, gentilmente cedidos por seu filho, e dois longos ensaios meus.
3) Sobre o fato de eu ter "atuado", entre 2003 e 2006 (não 2007), como assessor no NAE: não o fiz por vontade própria, mas apenas a convite do ministro Gushiken, a quem eu conhecia desde os anos 1990, quando ele foi relator de alguns projetos dos quais eu me ocupava no Itamaraty (acordos de investimento) e que gostava de mim, mesmo eu dizendo a ele que a "economia" do PT era esquizofrênica (assim mesmo: ele dava risada e não falava nada).
4) Esse convite veio depois que, vergonhosamente, o Itamaraty - SG Samuel Pinheiro Guimarães e ME Celso Amorim – vetaram um convite que me foi formalmente feito pelo então Diretor do Instituto Rio Branco, João Almino​, para dirigir o Mestrado do Rio Branco, do qual eu já era professor orientador desde o seu início, em 2001. Em 2002 tirei férias da embaixada em Washington e passei uma semana em Brasília orientando 5 ou 6 alunos. O convite veio no início do governo Lula, em 2003, mas três dias depois de eu ter aceito (pois já estava há quase 4 anos em Washington), o Diretor do IRBr teve o constrangimento de anunciar-me que não podia confirmar o convite, pois "o SG tinha outras ideias". Eu sei quais eram essas ideias, pois ele já me achava liberal demais para o pequeno campo de reeducação que ele pretendia fazer no IRBr e na SG.
5) Vim a Brasília em meados de 2003 – a tempo de ouvir o ministro Celso Amorim dizer que os diplomatas "precisavam vestir a camisa do governo", uma declaração vergonhosa sob qualquer aspecto – para discutir sobre o meu futuro. Disseram-me na SG que não tinham nada previsto para mim, que não estavam me removendo para a SERE pois não havia cargos à disposição, e que eu poderia ficar mais tempo em Washington ou negociar um outro posto.
6) Foi nessas circunstâncias que eu aceitei o convite do ministro Gushiken – um dos poderosos membros da troika, mas a quem NUNCA solicitei qualquer favor, sequer promoção – para integrar o Núcleo de Assuntos Estratégicos da PR, com quem trabalhei de 2003 a 2006.
7) Quando ele se afastou do NAE, por motivo de doença – ou efeitos do Mensalão, não sei – eu me despedi do NAE e me apresentei novamente no Itamaraty, acredito que em outubro de 2006. Fui imediatamente bem recebido pela chefe de Gabinete do Ministro Amorim que me ofereceu três postos na SERE para "preenchimento imediato". Aceitei um deles e fiquei esperando. Não aconteceu nada, durante dois meses, e aí compreendi que o Ministro Amorim tampouco me queria na SERE.
8) Em dezembro de 2006, num encontro casual com o Ministro Amorim no Clube das Nações disse-lhe que eu estava voltando à SERE, para trabalhar "sob a sua gestão". Ele me olhou secamente e disse-me: "É, mas a sua entrevista ao Estadão não lhe ajudou em nada." Virou as costas e circulou. Nunca mais falei com ele diretamente, a não ser anos depois, num encontro casual numa saída de restaurante em Brasília, quando me perguntou se eu "continuava escrevendo muito". Foi a vez de eu lhe dizer: "É ministro, é um vício que eu tenho.". E nada mais.
9) A entrevista a que ele se referiu foi uma a Lourival Santana, sobre o BRIC, e eu dizia que se tratava de uma construção intelectual que não fazia muito sentido – a não ser para investidores – pois os quatro países não tinham nada em comum. Eu não sabia que o ministro já articulava com Lavrov (o eterno ministro russo das relações exteriores) a formalização de um BRIC diplomático, mas isso não tem a menor importância: continuo pensando a mesma coisa sobre o BRIC, hoje BRICS.
10) Algum tempo depois, o ministro Amorim me ofereceu um posto de embaixador na Ásia, que eu recusei gentilmente, consciente de que nada mais me seria oferecido, na SERE ou fora dela.
11) E assim passei anos no DEC, Departamento de Escadas e Corredores, fazendo da Biblioteca o meu escritório de trabalho. Tirei licença, fui dar aulas em Paris, voltei, nada...
12) Portanto, é uma falsidade o Itamaraty dizer que eu não tive trabalho na SERE, mas fui trabalhar no NAE: só fiz isso por que me recusaram qualquer cargo na SERE, e isso durou até o impeachment de Madame Pasadena, quando o governo Temer me ofereceu o cargo de diretor do IPRI, do qual acabo de ser defenestrado pelo atual chanceler.
Esta é a história completa, mas se a Eliane Cantanhede desejar posso lhe contar os detalhes de inúmeros diálogos que mantive com servidores do lulopetismo (inclusive com Marco Aurélio Garcia, a quem recebi no meu "autoexílio" na Bélgica, quando do golpe de Pinochet no Chile, em 1973), todos eles empenhados em me manter fora da SERE, já que não podiam demitir-me do serviço público.

Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de março de 2019