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quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

José Guilherme Merquior, 80 anos (3): coletânea de textos de e sobre Merquior - Paulo Roberto de Almeida

 Nesta nova repostagem figura a informação sobre a brochura que eu havia montado com materiais de e sobre o grande intelectual, como abaixo: 

3894. José Guilherme Merquior: um intelectual brasileiro, Brasília, 19 abril 2021, 322 p. Coletânea de textos de e sobre o grande intelectual diplomata, com exceção do prefácio, agregado posteriormente. Em revisão para tornar o volume menos pesado. Versão abreviada, com links remetendo a pdfs em Academia.edu, 187 p. Postado na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/46954903/Jose_Guilherme_Merquior_um_Intelectual_Brasileiro_2021_); divulgado no blog Diplomatizzando (20/04/2021; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2021/04/jose-guilherme-merquior-uma-homenagem.html).



terça-feira, 20 de abril de 2021

José Guilherme Merquior: uma homenagem nos seus 80 anos de nascimento - Paulo Roberto de Almeida

 O livro em homenagem a Merquior, para os seus 80 anos, está pronto: eis o sumário



Sumário

 

Prefácio   

       Paulo Roberto de Almeida 

 

Parte I: 

Textos de José Guilherme Merquior

 

1.      Discurso como orador da turma do Instituto Rio Branco (1963)

2.      O sistema internacional e a Europa Ocidental (1973)

3.      A arte e alienação na sociedade de massa (1974) 

4.      Verso e Universo em Drummond: Conclusão (1975) 

5.      O problema da legitimidade em política internacional (1978) 

6.      A legitimidade na perspectiva histórica (1979)  

7.      Discurso de posse na Academia Brasileira de Letras (1983)

8.      Socialismo e liberalismo (1987)  

9.      Para uma crítica da ideologia pós-moderna (1990)

10.   Brésil: cent ans de bilan historique (1990)  

 

Parte II: 

Textos sobre José Guilherme Merquior

 

11.   Discurso de recepção na Academia Brasileira de Letras, Josué Montello

12.   O problema da legitimidade em política internacional, Celso Lafer

13.   A diplomacia da inteligência, Rubens Ricupero =

14.   Merquior: dois momentos e duas dimensões, Marcos Azambuja 

15.   Merquior: um depoimento pessoal, Luiz Felipe Seixas Corrêa 

16.   Introdução ao problema da legitimidade, Gelson Fonseca Jr. 

17.   O fenômeno Merquior, José Mário Pereira

18.   Redescobrindo José Guilherme Merquior, Gabriel de Arruda Castro

19.   O príncipe dos sonâmbulos, Martim Vasques da Cunha 

20.   O esgrimista liberal, Paulo Roberto de Almeida 

 

Apêndices:

Biografias de José Guilherme Merquior (ABL; É Realizações)

Obras de José Guilherme Merquior 

Nota sobre o organizador


Disponível neste link: 

https://www.academia.edu/46954903/Jose_Guilherme_Merquior_um_Intelectual_Brasileiro_2021_




quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Revista Confins n. 50: homenagem a Neli Aparecida de Mello-Théry

 Confins est une revue franco-brésilienne de géographie, consacrée à la publication d’articles originaux, en français ou en portugais et à des traductions d’articles existants. Abondamment illustrés, les articles portent sur des sujets brésiliens, français ou autres, avec une préférence donnée aux articles comparatifs et aux articles de Brésiliens sur l’Europe.

La revue diffuse dans les deux sens les acquis de la recherche en géographie, dans toutes ses composantes, avec toutefois une priorité à la géographie régionale. Sur les approches, aucune exclusive mais toute l’exigence d’une revue scientifique, et donc la validation des articles par des comités internationaux.

(…)


sexta-feira, 3 de setembro de 2021

Escolha do meu pai como patrono de diplomatas mostra país que não quer ser pária - Lygia Jobim (FSP)

 A filha do patrono do embaixador homenageado pela mais recente turma do Instituto Rio Branco, em formatura que não teve a presença do PR (ainda bem), demonstra seu orgulho pelo gesto dos jovens diplomatas.


Escolha do meu pai como patrono de diplomatas mostra país que não quer ser pária
Formandos do Instituto Rio Branco elegeram José Jobim, embaixador morto pela ditadura, como símbolo da turma
Lygia Jobim - jornalista e advogada
Folha de S. Paulo, 3.set.2021 às 11h37

Mais do que um artigo, este texto é uma carta aberta a vocês, 20 jovens diplomatas da turma do Instituto Rio Branco que formalizou, na última quarta-feira (1º), sua entrada no Itamaraty.

A escolha que fizeram do nome de meu pai, embaixador José Jobim, torturado até a morte pela ditadura militar que durante 25 anos manchou de sangue o chão do nosso país, para patrono da turma à qual para sempre pertencerão é uma declaração explícita de que não compactuam com o negacionismo e com a corrupção nem concordam que o nosso país se sujeite a ser um pária na comunidade internacional.

Tenho certeza de que saberão honrá-lo, agindo com firme delicadeza na defesa dos interesses do país.

Vocês conseguiram resgatar em mim o respeito que José Jobim sentia e me ensinou a sentir pela Casa a que pertenceu. Durante anos, disse a mim mesma que não sabia o que o Itamaraty havia feito a meu pai, mas sabia perfeitamente o que não havia feito.

Com sua omissão, fez com que meu caminho até a conquista de um atestado de óbito que retratasse a verdade responsabilizando o Estado por sua morte fosse muito mais árduo. Com seu silêncio, endossou a tese inicial de suicídio. Mas vocês, dentro da instituição à qual ele dedicou sua vida, o colocaram de volta no lugar respeitado que durante anos seus colegas lhe negaram.

O orgulho que sinto por saber que parte da juventude que meu pai tanto gostava reconhece nele um exemplo a ser seguido é imenso. A emoção de ouvir seu nome ser proclamado patrono fez com que não conseguisse segurar as lágrimas. Foi lindo ver a esperança de dias mais dignos brilhar naquele momento!

Por favor, não percam esse brilho. Nós dependemos dele.

Lamento que tenham que começar a carreira tendo na Presidência uma figura tão nefasta quanto Jair Messias Bolsonaro. Mas vocês têm uma vida pela frente e verão dias melhores. Nunca se esqueçam de que, por pior que seja o presidente, defendem e representam o Brasil, não o governo.

Assim, não percam nunca a humanidade. Não se dobrem. Não abandonem nunca a dignidade que demonstraram ter ao defender com firmeza a escolha do patrono da turma. Ela vale muito mais que uma promoção ou uma remoção.

Só me resta dizer obrigada a cada um e esperar, em breve, conhecê-los pessoalmente para abraçar aqueles que, por opção, tornaram-se meus irmãos.

https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2021/09/escolha-do-meu-pai-como-patrono-de-diplomatas-mostra-pais-que-nao-quer-ser-paria.shtml

sábado, 12 de junho de 2021

Marco Maciel: uma homenagem a um mestre na arte do entendimento político - Alfredo Bertini (FPE)

 A ENGENHARIA DO ENTENDIMENTO FICOU ÓRFà

Alfredo Bertini (*)


Dias atrás, nesse clima reflexivo imposto pelos dissabores da pandemia, conversava entre amigos sobre essa conjuntura política de tão baixo nível, sobretudo, no campo do entendimento. 

É impressionante que num ambiente onde ainda se impõem regras e instituições democráticas, o exercício salutar da boa conversação e da busca por consensos seja algo tão escasso. Ultimamente, a sociedade parece ter admitido com espantosa naturalidade que o contraditório é nocivo e por essa razão precisa ser eliminado do contexto. No discurso reacionário do anti-establishment, fez-se emergir essa onda perniciosa de se negar uma essência fascinante da política: sua engenharia.

Aqui e agora, na minha modesta pretensão de reforçar essa tese e ainda render uma justa homenagem a quem foi mestre nesse ofício político, parece-me que uma boa releitura do velho "O Príncipe" ajuda a endossar essas minhas discretas palavras. Afinal, pode-se extrair da obra de Maquiavel um entendimento a respeito dessa raridade em encontrar políticos hábeis e prudentes no exercício democrático do poder, justo nos climas de acirramentos ideológicos.

Bem, naquela conversa entre amigos, lembrava de grandes nomes que deram brilho ao nosso parlamento, tais como Tancredo Neves e Marco Maciel, na intenção de destacá-los como exemplos dignos do  quanto eles fazem falta nesse mundo de polarização, pautado por um desentendimento que se traduz em intolerâncias descabidas e inimizades quase homicidas. Surrealismos e absurdos que vão além das visões de Dali e Kafka. 

É evidente que faz parte da cena política as divergência de idéias, os desencontros nas formas de pensar e executar as ações públicas. O mínimo de respeito aos valores democráticos faz com que esse contexto político seja tratado como algo natural. E justo nesse tipo de ambiente que se vislumbra o papel de quem faz as pontes como marco. Portanto, essas são aquelas raras figuras que se habilitam a praticar uma certa engenharia, que dão sentido à verdadeira essência da política. Uma arte muito própria, nata, somente encontrada em quem sabe valorizar a articulação pelo entendimento, por mais distintas e extremas que sejam as ideias vigentes.

Marco Maciel foi mesmo um exemplo nesse mister. Por mais que algum adversário político tenha nutrido por ele a maior das discordâncias, não terá como desconhecê-lo na sua postura elegante, respeitadora e afável de lidar com o contraditório.  Era impossível chamá-lo para um embate agressivo. Ele se impunha na sua estatura: física e comportamental. 

Particularmente, tive meus momentos de convivência política com ele. Boas recordações de conversas serenas e equilibradas. Não só posso ratificar aqui todos esses conceitos que lhe são atribuídos, como devo externar minha mais profunda admiração pela sua maneira de tratar e considerar o conhecimento técnico-científico. Foram inúmeras as demonstrações que lhe foram creditadas. Seja pela visão dos muitos talentos que ele formou em tantas áreas na sua trajetória política. Ou mesmo, nas iniciativas que tomou a partir da sua concepção de mirar para todas formas de desenvolvimento. Tudo no seu momento certo, pois como costumava dizer: quem tem prazo não tem pressa, porque não se deve por o depois antes do antes". Previsão dos hábeis.

Nesses tempos difíceis, Pernambuco perde uma das suas referências politicas. E justo no momento em que o equilíbrio e o entendimemto se fazem imprescindíveis. Ficam suas boas lições.

A orfandade da engenharia politica consumada hoje com a irreparável perda de Marco Maciel esgotou o prazo. Agora, mais do que nunca, é preciso pressa nessa busca incessante pelo entendimento. Um exercicio de foco nacional que consagraria uma justa homenagem a Marco. Sinto-me enlutado, mas na crença de que seu legado pelo entendimento representa uma lição obrigatória para este momento nacional.

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(*) Economista e colunista da Folha de PE

domingo, 30 de maio de 2021

Amado Luiz Cervo: homenagem pelos seus 80 anos; aportes teóricos e metodológicos de sua obra - Raúl Bernal-Meza

No dia 5 de maio de 2021, o professor Estevão Chaves de Rezende Martins organizou uma sessão virtual em homenagem ao professor Amado Luiz Cervo, professor emérito da UnB, grande historiador e autor de muitas obras de história diplomática e de relações internacionais do Brasil, por ocasião de seus 80 anos.


 Na ocasião, o Professor Raúl Bernal-Meza, autor de um dos artigos que figuram na revista especial  Intelligere: revista de história intelectual (revistaintelligere@usp.br), apresentou um resumo, transcrito abaixo, da colaboração que ele apresentou para a revista, cujos dados editoriais e de acesso são os seguintes: 

(n. 10, dezembro 2020, ISSN: 2447-9020; p. 1-14; DOI: 10.11606/issn.2447-9020.intelligere.2020.178316; link da revista: http://www.revistas.usp.br/revistaintelligere/issue/view/11853/1947; link do artigo: http://www.revistas.usp.br/revistaintelligere/article/view/178316/167375). Disponível na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/44801286/Intelligere_Revista_de_história_intelectual_Dossie_Amado_Cervo_2020_); divulgado no blog Diplomatizzando (30/12/2020; link: https://diplomatizzando.blogspot.com/2020/12/revista-intelligere-numero-especial-n.html).

Eis o texto do Professor Raúl Bernal-Meza lido na ocasião; 

APORTES TEÓRICOS Y METODOLÓGICOS DE AMADO

Raul Bernal Mesa

Presentación oral, 5/05/2021 

 

La contribución de Amado Luiz Cervo a las relaciones internacionales se puede clasificar en tres grandes líneas: 

1) historia de la política exterior de Brasil; 

2) historia de las relaciones internacionales de América Latina;

3) elaboración de conceptos y categorías analíticas para el estudio de las relaciones internacionales y de los tipos ideales de Estado, de cuya abstracción derivaron interpretaciones sobre la praxis de la política exterior y la diplomacia correspondiente a cada modelo, en una perspectiva histórica que se articula con los estudios de las dos líneas precedentes.

PERO HAY DOS ASPECTOS QUE ME GUSTARÍA DESTACAR DE SU TRAYECTORIA:

 

I) ES EL OBJETIVO INTELECTUAL HACIA EL CUAL AMADO HA DIRIGIDO LA REFLEXIÓN SOBRE LOS CONCEPTOS Y LAS CATEGORÍAS EN RELACIONES INTERNACIONALES, QUE SE SOSTIENE EN DOS CRITERIOS:

 

A)    El aporte al pensamiento propiamente latinoamericano sobre las cuestiones teóricas para abordar el estudio de las relaciones internacionales de América Latina y de la política exterior del Brasil.

 

B)    Su presencia activa en un grupo de académicos e intelectuales latinoamericanos que desde hace un par de décadas buscamos desarrollar nuestras propias formas teóricas y metodológicas para entender nuestras relaciones internacionales.

 

II) SU CONTRIBUCIÓN A LA  IDENTIFICACIÓN DE UNA TRADICIÓN DE PENSAMIENTO, QUE YO HE DENOMINADO COMO LA ESCUELA DE BRASILIA, INCORPORANDO ELABORACIONES DE OTRAS ESCUELAS DE RELACIONES INTERNACIONALES, COMO LA INGLESA Y LA FRANCESA y PROMOVIENDO EL DESARROLLO DE ESTUDIOS HISTÓRICOS Y ANALÍTICOS DESDE UNA PERSPECTIVA QUE RECHAZA LA EXCLUSIVIDAD TEÓRICA QUE SE HA ATRIBUIDO A LO QUE SE CONOCE COMO LA TRADICIÓN ESTADOUNIDENSE o ESCUELA NORTEAMERICANA DE RR.II. (siguiendo la opinión de Stanley Hoffmann acerca de que los estudios internacionales son un dominio excluyente de los Estados Unidos.

AMADO HA RECHAZADO ESTA INTERPRETACIÓN QUE SE ARROGA SER LA ÚNICA QUE ES CAPAZ DE PERMITIR EL CONOCIMIENTO DE LOS ESTUDIOS INTERNACIONALES.

LA ESCUELA DE BRASILIA ES EL EJEMPLO Y RESULTADO DE ESE ESFUERZO DE INDEPENDENCIA TEÓRICA E INTELECTUAL.


quinta-feira, 6 de maio de 2021

Antonio Paim: um mestre aos 87 anos - Ricardo Velez-Rodriguez (2014)

 Um antigo texto de um de seus apreciados discípulos

domingo, 13 de abril de 2014

Antonio Paim: um mestre aos 87 anos - Ricardo Velez-Rodriguez

Uma singela homenagem a um dos maiores pensadores brasileiros.
Site Rocinante, em 10/04/2014
http://pensadordelamancha.blogspot.com/2014/04/o-aniversario-do-mestre-antonio-paim.html

O ANIVERSÁRIO DO MESTRE ANTÔNIO PAIM

Da esq. para dir.: Maria, Arsênio, Leonardo, Anna Maria, Ricardo, Rosa, o mestre Antônio Paim, Augusta e Antônio Roberto



No passado 7 de Abril, um grupo de familiares, amigos e discípulos de Antônio Paim,  comemoramos em São Paulo os 87 anos do mestre. O evento aconteceu na Tasca do Zé e da Maria, em Pinheiros. A filha Augusta (que mora em S. Paulo) e a amiga Rosa Mendonça de Brito (residente em Manaus), planejaram tudo. Foi uma festa surpresa para o querido mestre. As organizadoras teriam gostado que mais amigos e discípulos do Antônio Paim estivessem presentes. Mas com o corre-corre foi difícil entrar em contato com mais pessoas. 

Estiveram presentes: Maria e Arsênio Corrêa (S. Paulo), Leonardo Prota (Londrina), Anna Maria Moog (Petrópolis), Ricardo Vélez Rodríguez (Londrina), Rosa Mendonça de Brito (Manaus), Augusta Fonseca Paim (S. Paulo) e Antônio Roberto Batista (S. Paulo).

Antônio Paim é um desses educadores que conseguem manter nexos de amizade com as várias gerações de discípulos que passaram pelas suas aulas. Coloco, a seguir, os depoimentos de três discípulos do mestre: Anna Maria Moog, Rosa Mendonça de Brito e Arsênio Corrêa. 

Eis o depoimento da Anna Maria Moog: "Ao receber o e-mail de Rosa (Mendonça de Brito)  propondo que eu fosse, dali a dois dias, participar de um jantar comemorativo do aniversário de mestre Antonio Paim, pensei que não conseguiria me desvencilhar dos compromissos prévios.  Mas logo decidi colocar tudo de lado e viajar para S. Paulo .  Valeu a pena. Foi uma enorme alegria estar com amigos de longa data, unidos justamente pela amizade, respeito e admiração que nutrimos pela figura de Paim. Ao longo dos anos, Antonio Paim tem sido nosso norte, a referência inelutável para seus amigos, ex-alunos e admiradores de sua obra, sobre todos os temas relativos à cultura, à filosofia, à moral e à política.  Acima de ser referência intelectual, reconhecemos nele o homem de bem, de postura discreta mas capaz de iluminar com suas palestras inteligentes e, por vezes, espirituosas, nossas reuniões.  O homem que nunca faltou  com seu apoio aos que a ele recorreram e jamais, jamais deixou um amigo 'na mão'.Inúmeros depoimentos sobre sua pessoa já o declamaram de sobejo. Por esse, e muitos mais motivos, o jantar dos 87 anos do jovem Antonio Paim foi festejado  com alegria, mormente porque proporcionou aos amigos a oportunidade de lhe demonstrar mais uma vez o carinho que lhe temos e a alegria de o abraçarmos".

A seguir, o depoimento de Rosa Mendonça de Brito: "O encontro com Paim, Augusta, Anna Moog, Leonardo Prota e Ricardo Vélez,   encontro de mestre e discípulos, colegas e amigos, em São Paulo, na Tasca do Zé e da Maria me fez retroceder no tempo e chegar a 1975, 39 anos atrás, quando da seleção para o Mestrado em Filosofia da PUC/RJ. Vencidas as duas etapas da seleção, a avaliação do projeto de dissertação e prova de língua estrangeira, tinha que encarar uma entrevista com três professores do Programa. Lembro-me que tive de passar pelo crivo de Celina Junqueira e de Antonio Paim, não me recordo do nome do outro professor. Naquele momento, quando da entrevista, uma pergunta de Paim me marcou profundamente. O mestre perguntou: 'EU GOSTARIA QUE VOCÊ ME EXPLICASSE POR QUE O HUME DESPERTOU O KANT DO SONO DOGMÁTICO?' Minha resposta foi: 'não sei, faço tal afirmação porque ela sempre esteve presente nos livros que estudei e nas aulas dos meus professores, mas nunca li ou ouvi qualquer explicação sobre a afirmação'. A resposta para o desconhecimento foi uma bela aula que nunca mais esqueci. Aceita, após aprovação na seleção, para compor a turma de Mestrandos de 1976, voltei a encontrar Antonio Paim em sala de aula. Minha intenção era fazer o Mestrado em Filosofia da Ciência, mas suas aulas me levaram a optar pela área de Filosofia Brasileira e procurá-lo para pedir - e confesso que bastante temerosa -, para que ele me orientasse. Para minha satisfação, ele aceitou. Naquela jornada, a fim de suprir a minha deficiência de conhecimentos - me sentia uma formiga diante de elefantes - e não decepcioná-lo, estudava pelo menos 18 horas por dia. Entrava na PUC às sete da manhã e saía às dez da noite, quando a Biblioteca fechava. Em casa, estudava pelo menos até 2 da madrugada, mas valeu a pena! Paim se colocava a disposição e, além disso, disponibilizava livros, orientava na busca de documentos e obras que deveria estudar. Defendida a Dissertação, em 1979, voltei para Manaus, mas não perdi o contato com o Mestre, que já considerava amigo. Com a criação do Doutorado em Filosofia Luso-Brasilera, na Gama Filho, submeti para a seleção de 1982 o meu Projeto de Tese com tema sugerido por Paim, feito da seguinte forma: 'Você topa realizar um estudo sobre a Filosofia de Kant no Brasil? É um estudo denso, mas é muito importante para o pensamento brasileiro'. Eu lhe perguntei: 'O senhor acha que eu tenho competência para realizar este trabalho?'  A resposta foi: 'sim, tenho certeza que você fará um bom trabalho'. Era um estudo que ele pretendia realizar 5 anos mais tarde, mas que, acreditando na minha capacidade, o delegou a mim. Diante da demonstração de confiança,  senti-me lisonjeada e, apesar de apavorada com a dimensão e profundidade do estudo, resolvi aceitar o desafio. Enfrentei algumas dificuldades: doença, fechamento do setor de obras raras da Biblioteca Nacional, 2 filhos pequenos (Márcio com 1 ano e meio e Gisele com dois anos e oito meses), falta de empregada de confiança. Apesar disso, consegui com a orientação segura e indispensável de Paim, concluir o doutorado em três anos, tendo a honra de ter como membros da banca de defesa, além de Antonio Paim, Anna Maria Moog, Creuza Capalbo, Ricardo Vélez e Aquiles Guimarães, amigos queridos a partir de então.Naquele momento, além da dimensão de educador, descobri em Paim uma dimensão humana fantástica. Nunca passou a mão na minha cabeça, ao contrário, exigia o máximo de mim, cobrava o tempo todo, mas ajudava sempre através de discussões, de indicação de onde encontrar com pessoas ou instituições o material para o desenvolvimento do trabalho que envolvia pesquisa em obras raras. Evaristo de Moraes Filho, por intermédio de Paim, me disponibilizou a sua biblioteca particular, em sua casa, para que ali realizasse estudos em obras não encontradas em outro lugar. Paim fez muito mais! Levando em consideração que eu tinha duas crianças pequenas, fazia a minha orientação em seu apartamento no Leme, com isso, tornei-me amiga de Rita, sua mulher, e suas filhas Juliana e Augusta. Toda semana, quando ia para o encontro de orientação e não tinha com quem deixar os meus filhos, eu os levava. Juliana e Augusta ficavam com eles enquanto me era dado o privilegio de receber magníficas aulas. Paim foi fundamental para o meu desenvolvimento intelectual. Ser-lhe-ei eternamente grata. Ele será sempre o meu guru e mestre favorito!"

A seguir, transcrevo o depoimento de Arsênio Corrêa: 

"Antonio Paim sempre disseminando conhecimento, conhecimento é vida, vida é alegria e a alegria é a razão de viver do ser humano. Antonio Paim é um mestre na mais pura acepção, porque a busca do saber é incessante, vibrante, contagia a todos que com ele convivem. Aprendi com ele que a pesquisa deve ser constante, sem ela nós somos ultrapassados, o tempo deve ser aproveitado, ao ser humano cabe construir e manter o conjunto do saber da humanidade, isso ele nos faz ver em todos os encontros.Aprendi com o mestre o valor da cultura".

sexta-feira, 30 de abril de 2021

Antonio Paim: do marxismo ao liberalismo - Paulo Roberto de Almeida

Antonio Paim: do marxismo ao liberalismo


 Paulo Roberto de Almeida

Uma homenagem ao grande mestre que faleceu em 30 de abril de 2021

Publicado em formato de e-book no site do Livres; link: https://www.eusoulivres.org/publicacoes/antonio-paim-uma-homenagem-ao-grande-historiador-do-liberalismo-brasileiro/ ;  pdf: https://cdn.eusoulivres.org/wp-content/uploads/2021/05/01012322/Ebook-Antonio-Paim.pdf); divulgado por via da plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/48811785/3902_Antonio_Paim_do_marxismo_ao_liberalismo_Ebook_Livres_2021_);

Entrevista com Antonio Paim, por ocasião da publicação da 2a edição da obra  História do Liberalismo Brasileiro (2a. edição, revista e ampliada; SãoPaulo: LVM, 2018), no site do Livres; link: https://www.eusoulivres.org/ideias/antonio-paim-1927-2021/  

 

A trajetória intelectual de Antonio Ferreira Paim (nascido na Bahia em 1927) é ímpar na cultura e na história das ideias políticas e filosóficas no Brasil, tendo emergido no marxismo – com curso de filosofia na Universidade do Brasil e depois na Universidade de Moscou –, e realizado ao longo da vida uma guinada política e filosófica que o levou ao liberalismo. Numa primeira etapa de sua carreira acadêmica, empreende estudos sobre as ideias filosóficas no Brasil, seguindo as correntes de pensamento desde a fase colonial até a atualidade, trajetória que ele reconstitui em dois de seus primeiros livros: História das ideias filosóficas no Brasil (1967) e O estudo do pensamento filosófico brasileiro (1979). 

Nessa primeira fase já se ocupa igualmente da questão do estatismo na formação da nação brasileira, na qual debate – em seu livro A querela do estatismo (1978) – a formação do Estado brasileiro como Estado patrimonial, notadamente através da obra de Oliveira Vianna e pelo estudo das influências pombalinas e positivistas sobre as elites dirigentes. Notadamente, ele adota o conceito difundido por Simon Schwartzman de “patrimonialismo modernizador”, que teria sido o da era Vargas e do regime militar, mesmo se a burocracia tradicional tenha conseguido manter sua supremacia sobre as elites técnicas mais identificadas com os militares e outros impulsionadores do progresso econômico. Na segunda edição desse seu livro sobre o estatismo (1994), Paim se afirma mais conclusivo e argumenta que “a estratégia mais aconselhável à sociedade consiste em tentar reduzir as funções do Estado, cuidando de retirá-lo da economia e de todas as esferas não seja imprescindível” (p. 20).

Nesse mesmo livro, ela já recusava a caracterização de “capitalista” para a formação econômica e social do Brasil, assim como tentava interpretar o fracasso da construção de um sistema representativo no país e se propunha traçar uma “estratégia para enfraquecer o patrimonialism e favorecer o capitalismo” (capítulo VII, pp. 193-200). No plano puramente teórico e conceitual, Paim acreditava que se deveria “obter algum arejamento na Universidade e conseguir quebrar o monólito da dominação marxista-positivista” nela existente (p. 194). Entre as tarefas básicas desse desmantelamento do patrimonialism no Brasil, ele sugeria algumas que em grande medida se confundiam com as preleções liberais de Roberto Campos: 

1)    “Eliminar todas as burocracias estatais devotadas aos programas oficiais de combate à pobreza”, na medida em que essas políticas, “como tudo mais, transformaram-se em mero pretexto para justificar a voracidade fiscal e permitir ao patrimonialism apropriar-se de verbas sem o menor controle da opinião pública” (pp. 195-6).

2)    “Levar a bom termo o programa de privatização, empenhando-se no sentido de transformá-lo num novo projeto de desenvolvimento” (p. 196).

3)    Efetuar um “reexame específico da estrutura dos vários órgãos integrantes da União”, que atendem “precisamente ao jogo do patrimonialismo” e do empreguismo (p. 196).

4)    Examinar concretamente as ações de que poderia resultar a dignificação do servidor, por um lado, e profissionalizar as FFAA, reduzindo suas dimensões (p. 197). 

 

Não obstante a boa análise de Paim quanto aos fundamentos do atraso brasileiro, a partir da consolidação do patrimonialismo (ainda que modernizador), ele parece acreditar na existência de uma classe empreendedora sinceramente comprometida com a construção de um capitalismo competitivo no Brasil, o que parece desmentido por quase dois séculos de extrema subserviência desses “capitalistas” (se o termo se aplica) ao Estado onipotente e onipresente. Nas próprias palavras de Paim, registre-se que ele está

... naturalmente supondo que a liderança empresarial brasileira estaria convencida de que só tem a ganhar se conseguir obstar a atuação do patrimonialismo e lograr que o capitalismo alcance um novo patamar. Estaria voltada para pactuar com aquelas forças que, no interior do Estado, se dispusessem a abdicar das tradições patrimonialistas – isto é, de estabelecer a tutela do Estado sobre a sociedade –, aceitando o penoso caminho de buscar a constituição do Estado Liberal de Direito. (...)

Ao enfrentar a questão do patrimonialismo brasileiro cumpre-nos reconhecer francamente que as tradições culturais prevalecentes em nosso país são francamente desfavoráveis ao capitalismo. (...)

A tradição liberal é débil e descontínua e sofreu tão fortes constrangimentos, sob a República, que a afetariam mesmo se se tratasse de algo melhor estruturado. (A querela do estatismo, 2ª. edição, 1994, pp. 197-8)

 

Considerando-se que a primeira edição do livro (1978) foi publicada em plena vigência do “patrimonialismo modernizador” do regime militar, e que o prefácio à sua segunda edição (1993) vem datado da grande deterioração inflacionária da redemocratização, pode-se argumentar que a análise acadêmica de Paim carece de uma percepção mais realista a respeito da extrema dependência desses “capitalistas” das políticas setoriais desenhadas pelos dirigentes políticos, mais exatamente pelas corporações estatais, que constituem precisamente o cerne e o coração do patrimonialismo conservador no Brasil. A partir dessa época, justamente, Paim se dedica a compendiar, analisar e sintetizar o pensamento político brasileiro, contribuindo para tornar mais conhecidos de pesquisadores acadêmicos e da opinião pública bem informada um conjunto importante de pensadores brasileiros (e portugueses), inserindo suas teses e propostas analíticas no contexto de um outro conjunto de pensadores estrangeiros, aqueles que, nos dois últimos séculos, influenciaram os estudos e as discussões políticas e constitucionais no Brasil. 

Nos anos 1990, Paim publicou praticamente um livro por ano, sempre sobre seus temas preferidos: o pensamento político brasileiro, a trajetória e a agenda do liberalismo, no mundo e no Brasil, assim como cursos de introdução a esses grandes temas, em colaboração com colegas e mestres nas mesmas áreas: Francisco Martins de Souza, Ricardo Vélez Rodríguez, Ubiratan Borges de Macedo, José Guilherme Merquior, Gilberto de Mello Kujawski, Carlos Henrique Cardim e Leonardo Prota, entre outros. O objetivo comum de todos esses intelectuais sempre foi a busca das bases morais de um amplo consenso nacional em torno de um sistema político liberal representativo e de um regime econômico dotado das mais amplas liberdades competitivas, propenso à inserção do país na interdependência global. Mas, a sombra do patrimonialismo se interpõe de maneira obstinada a essa conformação de uma democracia de mercado no país

Aliás, países não são exatamente condomínios, onde vizinhos se conhecem e podem se reunir para discutir benfeitorias na propriedade comum. Nações não costumam reunir-se em assembleia, de tempos em tempos, para debater tranquilamente qual caminho adotar em face de ofertas igualmente interessantes quanto às melhores políticas para guiar o seu processo de desenvolvimento, frente às quais cabe decidir sobre as de menor custo relativo e de maior retorno possível. Isso só acontece em momentos de ruptura, guerras, revoluções, golpes, quando uma nova elite sobe ao poder, e precisa adotar condições mínimas de governabilidade, para assentar as bases mais ou menos aceitáveis de sua legitimidade política (ou não). Existem também fases menos felizes, quando um país pode sair de um tipo de dominação racional-legal, para usar a terminologia weberiana, para descambar numa administração de tipo carismática, que nos remete aos piores exemplos da tradição latino-americana de caudilhos e golpes de estado; por sinal, a Argentina só decaiu durante praticamente 80 anos seguidos porque em 1930 se derrocou uma república “oligárquica” para inaugurar um ciclo de governos autoritários, e depois populistas, supostamente identificados com a “soberania” do país e “projetos nacionais” de desenvolvimento, geralmente alinhados ao protecionismo e à industrialização substitutiva, como o Brasil, aliás. 

Pois bem, sem fazer qualquer história virtual do Brasil, Antonio Paim, um dos grandes pensadores da nacionalidade, examina no seu livro, Momentos Decisivos da História do Brasil (2000), três momentos decisivos de nossa história, quando poderíamos, teoricamente, ter “escolhido” um caminho melhor, mas falhamos, terrivelmente – ou nossas elites falharam –, em adotar aquela via que poderia ter nos levado a um estágio mais elevado de desenvolvimento econômico e social, a um sistema político mais representativo e a uma organização institucional menos conspurcada pelo patrimonialismo tradicional. Não tenho certeza de que o Brasil, como nação, tenha tido essas chances, essas janelas abertas às suas elites, para debater, de forma consciente e deliberada, essas vias “progressistas”, mas cabe mencionar as “teses” de Antonio Paim, para verificar, o que perdemos como oportunidades históricas.

A primeira, ainda na fase colonial, foi o fato de ter constituído precocemente uma economia florescente, ligada ao açúcar e outras atividades paralelas, que poderia ter sido a base de um desenvolvimento ulterior mais estruturado. Tendo sido mais rico do que as colônias inglesas na América do Norte nos séculos XVI a XVII, em grande parte devido aos cristãos novos, os judeus portugueses convertidos forçadamente que se tornaram os grande financistas do comércio internacional do açúcar, a chance perdida se explica pelo papel da Contra Reforma e da Inquisição na repressão desses “capitalistas mercantis”, o que bloqueou, portanto, a possibilidade de uma economia vinculada de maneira mais “decisiva” – o termo se aplica – aos mercados internacionais. 

A segunda oportunidade perdida foi no século XIX, com a nação independente e já na fase de construir seu estado nacional, quando Paim acredita que as elites trataram de assegurar a unidade nacional, com certo sucesso até (comparativamente à completa desagregação da hispano-América, por exemplo), mas a um alto custo, perdendo, no mesmo movimento, a iniciativa de consolidar um sistema representativo eficiente. O Regresso, nos anos 1840, e, mais tarde, as teses positivistas, inspiradas em Comte, “conspiraram” para manter o Brasil um sistema político pouco funcional tanto para fins da “ordem”, quanto do “progresso”. As frequentes intervenções militares desde o início da República se encarregam de eliminar a possibilidade de constituição de uma “moral social de tipo consensual”, que nunca tivemos entre nós, nas palavras de Paim.

A terceira, em pleno século XX, foi a consolidação, que ele chama de “estruturação”, do Estado patrimonial, sob Getúlio Vargas, e o abandono do sistema representativo. Nessa terceira parte de sua obra, Paim é bastante crítico daquilo que ele chama de “lixo historiográfico”, a maior parte de extração pretensamente marxista, que produziu alguns delírios sobre o “caráter da revolução brasileira” pelos representantes dessa corrente. Já na queda da monarquia, o Brasil perdeu a oportunidade de constituir um “Estado liberal de Direito”, enveredando depois pelas “oligarquias dos estados”, mais até que a chamada “política dos governadores”. Mas, o castilhista Getúlio Vargas conseguiu implantar um Estado nacional unitário, ao mesmo tempo em que fixou o patrimonialismo, no conceito weberiano da palavra, realidade já estudada por Simon Schwartzman. O feito de Vargas, resumido por Paim, foi “retomar o projeto formulado no Império, de constituição do Estado Nacional, abdicando de dar-lhe a feição democrático-representativa e dele fazendo um autêntico Estado patrimonial. O projeto Vargas seria retomado pela Revolução de 64” (p. 217-18). 

O último capítulo desse livro de Paim tem por título, de forma otimista, “Como sair do patrimonialismo”, mas não devemos esquecer que o livro deve ter sido terminado em 1999 para ser publicado no ano seguinte. Apoiando-se na experiência das privatizações daquela década, ele concorda com Roberto Campos em que “o problema reside na adequada formulação das políticas” (p. 315), e não só econômicas. Quinze anos depois, no entanto, no livro que ele organizou e publicou, com colaborações de Paulo Kramer e de Ricardo Vélez-Rodríguez, O patrimonialismo brasileiro em foco(Campinas: Vide Editorial, 2015), ele tem de constatar, tristemente, a “sobrevivência da estatização brasileira”, e se pergunta como enfrentá-la (capítulo II, p. 35-43). Se formos ainda mais pessimistas, não há como discordar do mesmo Ricardo Vélez-Rodríguez, em seu livro A Grande Mentira: Lula e o patrimonialismo petista (Campinas: Vide Editorial, 2015), em que o patrimonialismo tradicional brasileiro foi transmutado, pelas mãos e pés dos companheiros, em um patrimonialismo de tipo criminoso. Como é mesmo que dizia Lavoisier? Na natureza, nada se perde, nada se cria, tudo se transforma. A despeito de basicamente político, este último livro possui um importante capítulo sobre as “desgraças do intervencionismo no Brasil”, que também começa pelas desgraças de Mauá, aliás recorrendo ao livro de Jorge Caldeira.

Os grandes obstáculos à conformação do capitalismo brasileiro continuaram a ser examinadas por Antonio Paim num pequeno livro publicado na passagem do milênio: O relativo atraso brasileiro e sua difícil superação (2000). Em outros termos, o autor reconhece que o Brasil ingressou decisivamente na Revolução industrial, processo notadamente acelerado a partir da segunda metade do século XX, de forma que nas últimas décadas do século esse atraso tornou-se apenas relativo, sobretudo porque o país não logrou superar sua histórica má distribuição de renda, assim como não conseguiu “estruturar a pesquisa científica, que corresponde ao motor do progresso ininterrupto” observado nos países avançados (p. 10). O que ele procura argumentar nesse seu livro é que o relativo atraso brasileiro é de “difícil superação” porque o Brasil ainda não é um país capitalista, e sim patrimonialista, tendo estruturado sua revolução industrial sem deixar de ser patrimonialista. Outras duas razões desse relativo atraso e das dificuldades em superá-lo residem no “cientificismo” – que consiste na importação de um positivismo mal digerido – e no “contra-reformismo”, que impede a mudança de arraigadas tradições culturais (como o ódio ao lucro e à riqueza), de transformação muito lenta em função da persistência de hábitos longamente arraigados na população.

No primeiro quesito, o industrialismo patrimonialista, sobressai-se o poderoso intervencionismo do Estado na esfera econômica, que antecede o próprio keynesianismo como doutrina ou guia prático a orientar a principais medidas regulatórias do Estado na vida econômica do país. Paim localiza num antigo manual do engenheiro Aarão Reis, Economia política, finanças e contabilidade (Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1918, 2 vols.), adotado oficialmente na Escola Politécnica do Rio de Janeiro e que durante longos anos constituiu a base do ensino formal de economia no país. Antonio Paim transcreve nada menos de 11 atribuições que cumpriria ao Estado observar (pp. 16-17), que se desdobrariam na era Vargas e mais além, como prescrições incontornáveis a um processo de desenvolvimento econômico, seguidos desde a implantação do Conselho Federal do Comércio Exterior, nos anos 1930, seguidos pelas ações do Estado Novo e, já na redemocratização de 1946, pela Comissão Mista Brasil-Estados Unidos e seus corolários no BNDE, na criação de algumas estatais e no Plano de Metas de JK. O regime militar representou a culminância desse processo, colocando o Brasil entre as maiores economias do mundo, mas agravando algumas distorções típicas de todo o período, como a estatização de amplos setores da economia, o nacionalismo extremado, que ambos confirmaram e consolidaram o patrimonialismo tradicional. 

O cientificismo, por sua vez, está estreitamente vinculado à penetração e difusão do pensamento positivista a partir de meados do século XIX, exemplifica por Antonio Paim na obra de Luís Pereira Barreto (1840-1923), que publica dois livros correspondendo às três filosofias do mestre francês, nomeadamente Filosofia teológica (1874) e Filosofia metafísica (1876). Posteriormente, em nome da Igreja positivista, Teixeira Mendes (1855-1927) também demonstra preconceito contra as instituições universitárias, o que reforçou, segundo Antonio Paim, as recomendações dos positivista, que “lograram influenciar a maioria dos componentes dos órgãos decisórios e [que] por isso mesmo são responsabilizados diretamente pelo abandono sistemático da ideia de implantar-se a Universidade, nos decênios iniciais da República” (p. 39). A oposição só começa a arrefecer a partir da criação da Associação Brasileira da Educação (ABE), nos anos 1920, em especial na década seguinte, com a criação da USP, em 1934, e da Universidade do Distrito Federal, no ano seguinte. O grande idealizador e fundador dessas inovações é Anísio Teixeira (1900-1971), que luta por instituições claramente identificadas com objetivos práticos de formação de recursos humanos para o desenvolvimento nacional.

Simon Schwartzman, no livro Formação da comunidade científica no Brasil (São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1979), trata da questão da integração das escolas tradicionais – faculdades de Direito, Medicina, escolas de Farmácia, Odontologia, Agronomia, Politécnica – às novas universidades, o que não se fez sem grandes dificuldades. Antonio Paim volta a registrar a permanência do cientificismo pombalino, prolongado pelo positivismo, como um dos obstáculos ao desenvolvimento do espírito científico no Brasil, e que para ele prolongou-se inclusive na formação de uma “versão positivista do marxismo”, que ele analisou em seu livro História das ideias filosóficas no Brasil (5ª. ed.; Londrina: UEL, 1997). Para ele, o varguismo, pela ação de personalidades como Francisco Campos, deformou o espírito propositor dos antigos pais fundadores da ABE, como explicitado por ele na passagem seguinte: 

Desse modo, a Universidade seria estruturada como uma federação de escolas isoladas, voltadas para a formação profissional. O projeto da ABE é inteiramente abandonado e as Faculdades de Filosofia, desmembradas após 1964, também são enquadradas na consecução de tais objetivos limitados. Há casos extremos, como os cursos de Filosofia, formalmente destinados a diplomar professores para o ensino secundário, disciplina que deixou de existir naquele nível de ensino. Assim, a atividade está voltada para si mesma, mesmo no que toca a pós-graduação, transformada em simples exigência para as promoções estatutárias. 

O marxismo positivista, por sua vez, não tem interesse no desenvolvimento de qualquer espécie de pesquisa, porquanto se trata apenas de enquadrar a realidade em determinados esquemas, não obstante a circunstância de que sua obsolescência haja transitado em julgado. (...)

E assim, consagrou-se a vitória do cientificismo, derrotando o projeto de estruturar no país pesquisa científica digna de nome, reconhecida internacionalmente... (O relativo atraso..., op. cit., pp. 58-59)

 

No terceiro e penúltimo capítulo desse seu importante pequeno livro, Paim aborda a questão da persistência da moral contra-reformista, herdada de Portugal e que “atravessou sem percalços as centúrias subsequentes” (p. 64), constituindo, ao que parece, uma das bases do ideário nacional, em especial com respeito às questões da pobreza, do lucro, do espírito capitalista. Em suas palavras: 

São muito eloquentes as evidências de que a moral contra-reformista tornou-se um dos ingredientes fundamentais de nossa moralidade social básica. O ódio ao lucro e à riqueza são sentimentos amplamente difundidos, sendo muito generalizada a condenação ao capitalismo. Defendê-lo, ainda hoje, não deixa de ser uma temeridade. (p. 75) 

 

Mesmo entre militares, politicamente adversários do socialismo, a repugnância do capitalismo, do espírito de lucro, não deixou de prevalecer, sobretudo nas estatais que vários deles comandaram durante o regime autoritário de 1964-1985. No seu último capítulo, Paim indaga se conseguiremos vencer o patrimonialismo, o cientificismo e o contra-reformismo. Ele se revela moderadamente pessimista, por várias razões, entre elas “porque a massa da população não associa a péssima distribuição de renda à persistência do patrimonialismo” (p. 122). A grande audiência de que dispõem os patrimonialistas no Brasil “é impeditiva do pleno florescimento do capitalismo, que seria a única forma de disseminar no país focos de desenvolvimento econômico” (idem). Paim termina essa sua pequena grande obra, registrando o pensamento de uma grande historiadora americana: 

Na seleção dos eventos que considerou no magnífico livro intitulado A marcha da insensatez, Barbar Tuchman (1912-1989) adotou como critério que o erro representado por aquele passo tivesse sido denunciado antes de que a elite decidisse empreende-lo. Quando mais não seja, a nossa denúncia, se não revelar maior eficácia, servirá ao menos para evidenciar, perante o historiador do futuro,  que nem todos estavam cegos. Certamente que é pouco. Mas não deixa de representar mais um estímulo à nossa persistência. (p. 122)

 

Fontes e bibliografia:

 

Obras de Antonio Paim

A filosofia da Escola do Recife. Rio de Janeiro: Saga, 1966

História das ideias filosóficas no Brasil. São Paulo: Grijalbo-USP, 1967 (5ª. ed.: 1997)

Cairu e o liberalismo econômico. RJ: Tempo Brasileiro, 1968

Tobias Barreto na cultura brasileira: uma reavaliação (com Paulo Mercadante). SP: Grijalbo-USP, 1972

Evolução histórica do Liberalismo (com Francisco Martins de Souza, Ricardo Vélez-Rodríguez, e Ubiratan Borges de Macedo). 1977

A querela do estatismo: a natureza dos sistemas econômicos: o caso brasileiro. RJ: Tempo Brasileiro, 1978. 2ª ed.: 1994.

O estudo do pensamento filosófico brasileiro. RJ: Tempo Brasileiro, 1979.

História do Liberalismo brasileiro (1ª ed. 1998; nova edição: SP: LVM, 2018)

Momentos Decisivos da História do Brasil (São Paulo: Martins Fontes, 2000)