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quinta-feira, 11 de julho de 2019

Novo Dicionario do Itamaraty - Jamil Chade (UOL)

Novo dicionário do Itamaraty

Brasil tira de textos gênero e termos de consenso por 25 anos ao usar visão conservadora com base em religião

Jamil Chade Colaboração para o UOL, em Genebra, 10/07/2019

Não são raras as ocasiões em que diplomatas entram madrugada adentro negociando um texto de um acordo internacional. No centro da mesa, está o choque de interesses nacionais. Mas, no papel, aquela visão de mundo precisa ser traduzida em palavras. E nem sempre encontrar um consenso sobre o uso de palavras e termos na diplomacia é um trabalho fácil.
A realidade é que, em política externa, as palavras têm um enorme peso. Em 2002, num discurso diante dos novos formandos do Instituto Rio Branco, o então chanceler Celso Lafer já confirmava a relação entre a palavra e a atuação diplomática. "O poder da diplomacia é, em larga medida, o poder da palavra", disse. A turma que estava se formando ganhou o nome do filólogo Antonio Houaiss.
Consciente do peso das palavras para redesenhar uma visão de mundo, a nova administração do Itamaraty sob governo de Jair Bolsonaro (PSL) já imprimiu seu próprio vocabulário nos últimos seis meses e distribuiu orientações aos postos do Brasil pelo mundo sobre o que dizer. E, acima de tudo, o que não dizer.
Pelas embaixadas do Brasil espalhadas em diferentes continentes, o novo "dicionário" da diplomacia brasileira abandona palavras usadas por décadas, introduz novos termos, resgata formulações do passado e, assim, traduz em um novo léxico uma visão de mundo muito particular do chanceler Ernesto Araújo, dos discípulos do escritor Olavo de Carvalho e de grupos evangélicos mais conservadores.
Uma visão que tenta reverter um suposto "marxismo cultural", que, na visão do chanceler, teria passado a também influenciar as entidades internacionais e a diplomacia.
Parte do movimento em busca das novas palavras é informal, com diplomatas tentando se adaptar à nova ideologia de seus chefes. Mas outra parte da criação desse novo léxico é consciente e estrategicamente pensada.
Não demorou para que embaixadores começassem a receber, em telegramas, instruções precisas sobre as palavras que deveriam sumir.
Fábio MachadoFábio Machado

Palavra "gênero" incomoda o Brasil

No início de julho, o Brasil surpreendeu a muitas delegações na ONU ao exigir que o termo "gênero" fosse abolido dos textos de resoluções de diferentes assuntos. Pelo novo dicionário do Itamaraty, o termo deve ser substituído pela frase "igualdade entre homens e mulheres". A meta é simples: reivindicar que o que vale para o Brasil é o sexo biológico, e não sua construção social.
Um exemplo prático: a ministra de Direitos Humanos, Damares Alves, participou de um debate sobre igualdade de gênero em Nova York. Em seu discurso, preferiu a formulação "igualdade entre homens e mulheres".
Num texto que serve como base para a candidatura do Brasil a mais um mandato no Conselho de Direitos Humanos da ONU, por exemplo, o Itamaraty não faz qualquer referência à palavra "gênero" ao explicar o que será sua luta ao promover o direito das mulheres.
Segundo o texto, o Brasil tomará "como premissa o texto constitucional brasileiro que estabelece que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações".
O Brasil tenta explicar a mudança. "O governo tem buscado esclarecer seu entendimento sobre expressões e termos que considera ambíguos", apontou a chancelaria ao UOL em nota. "O entendimento de que 'gênero' é sinônimo de sexo masculino ou feminino baseia-se na igualdade entre mulheres e homens, conforme estabelecido pela Constituição Federal, a qual não cita o termo 'gênero'."

O Itamaraty também afirma que o governo continua comprometido com o fortalecimento dos direitos humanos das mulheres e a eliminação da violência, além defender os direitos homossexuais. "Nos foros internacionais em que atua, o Brasil tem igualmente defendido os direitos de pessoas LGBTI+. O país integra as principais iniciativas internacionais em defesa dos direitos de pessoas LGBTI+ na AGNU [Assembleia Geral das Nações Unidas], CDH [Comissão de Direitos Humanos] e OEA [Organização dos Estados Americanos], entre outros foros", disse.
Inconformados, diversos países ocidentais lembraram que, hoje, existem mais de 200 documentos oficiais, tratados e leis que citam explicitamente o termo "gênero". Um abandono da palavra significaria um retrocesso de 25 anos nos debates.

Veto a "direitos sexuais"

Na mesma linha, o Brasil passou a vetar o uso do termo "direitos sexuais e reprodutivos", já que a interpretação seria de que a frase abriria uma brecha para o reconhecimento do aborto. Há uma semana, no Conselho Econômico e Social da ONU, o Brasil se absteve em votações de resoluções que apresentavam tais palavras.
Ao se explicar, o governo indicou ao UOL que a "posição brasileira tem como base o princípio da inviolabilidade da vida, sempre de acordo com a legislação brasileira". "Portanto, o governo não favorece referências em documentos internacionais que possam imprimir conotação positiva ao aborto", disse a chancelaria, reforçando que o aborto é ilegal no país, não sendo passível de punição em três casos (risco de vida da mãe, estupro e anencefalia).
Fábio MachadoFábio Machado

Feminismo? Só se acompanhado por grupos religiosos

Entre delegações estrangeiras, surpreendeu ainda uma manobra feita pela diplomacia brasileira na ONU para tentar tirar de textos oficiais referências a "grupos feministas". Para que tal termo fosse mantido em um dos projetos de resolução, o Itamaraty exigiu que outro grupo também fosse reconhecido como tendo contribuído para a situação das mulheres: os grupos religiosos.
Numa das reuniões para debater um projeto de resolução da ONU, o Brasil ainda fez questão de que se retirasse do texto uma afirmação de que barreiras estabelecidas pelas religiões poderiam ser barreiras à defesa das mulheres. O ponto é que a religião jamais será um obstáculo.
A defesa da fé, porém, se choca com uma realidade já descrita em informes da ONU em que meninas pelo mundo acabam tendo seus direitos minados por conta da interpretação de preceitos religiosos ou de tradições locais. Ou mesmo de suas manipulações.
A manobra do Brasil foi duramente criticada nos bastidores da ONU, com delegações acusando o governo de estar "chantageando" os demais países.
Entre diferentes delegações europeias, fazer referências a grupos religiosos é considerado como um risco, já que esses termos em resoluções poderiam ser usados por países islâmicos como uma forma de limitar os direitos de mulheres.
Segundo os europeus, o Brasil sabe da resistência que existe pela inclusão do termo "grupo religioso" e interpretaram o gesto como uma forma de bloquear as referências a "grupos feministas" em resoluções da ONU.

Mais "soberania", menos "global"

Não foram só as questões relacionadas a mulher ou sexo que passaram a ser alvos do novo "dicionário" diplomático brasileiro.
Muitos dentro do Itamaraty apontam que o início da transformação no vocabulário da chancelaria se deu quando, de forma surpreendente, o Itamaraty renomeou seus departamentos. Um deles ganhou o nome de Secretaria de Assuntos de Soberania Nacional, o que agrupa as divisões que estavam antes sob a Subsecretaria de Política Multilateral.
Sob o termo "soberania" agora estão temas como direitos humanos e outros aspectos sociais. Entre parte dos diplomatas, a mudança foi interpretada como um sinal de que, nos fóruns multilaterais, o foco do Brasil será o da defesa do interesse nacional e da soberania. E não dos desafios globais.
A mudança não ficou apenas na placa da porta do gabinete dentro do palácio do Itamaraty. Aos poucos, essa mudança foi se transformando em um novo comportamento do governo em reuniões.
Uma das consequências foi a decisão de se evitar a palavra "global" em textos oficiais, em resoluções e em discursos em nome do Brasil.
Sua eliminação dependeria do contexto. Numa das resoluções sob debate na ONU, o termo "desafios globais" seria trocado por "desafios em comum".
A ideia é que não existem realidades globais, mas apenas desafios que seriam comuns a todos. Na prática, o Brasil mantém seu espaço soberano e evita aderir a princípios e padrões universais.

Questionando o "globalismo"

Tampouco o Itamaraty gosta da ideia de que os discursos de seus diplomatas tragam o termo "sistema internacional". Sempre que possível, os representantes nacionais terão de dar um enfoque no papel dos Estados soberanos. Portanto, "sistema internacional" se transformaria em "sistema de nações" ou simplesmente "Estados-membros".
A ofensiva tem um motivo claro e que, neste caso, não tem relação com a religião. No Itamaraty, uma das dimensões da política externa tem sido o questionamento ao que chamam de "globalismo". O conceito se refere supostamente a um projeto político de um governo global.
Na visão do governo brasileiro, tal proposta é uma afronta à soberania e às culturas nacionais.
Há poucas semanas, a chancelaria chegou a promover um seminário para debater essa vertente de pensamento. Ernesto Araújo, chanceler e discípulo de Olavo de Carvalho, também mantém um blog "contra o globalismo".
A vertente da diplomacia também mudou. O termo tão badalado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva --"a cooperação Sul-Sul"-- também é visto com certa suspeita na atual gestão.
Por anos, tal conceito demonstrava uma certa postura de resistência de parte dos países emergentes em relação ao poder e influência dos países ricos. Hoje, a preferência é por termos como "cooperação entre nações".

Brasil fora de exercícios diplomáticos

Em alguns outros casos, há um temor por parte da sociedade civil de que haja uma resistência por parte de alguns postos da diplomacia brasileira em fazer referências à "Agenda 2030", uma série de metas que os governos assumiram para os próximos dez anos no âmbito social e ambiental.
O governo afirma que "o Brasil não deixou de empregar os termos Agenda 2030 e desenvolvimento sustentável, tampouco se dissociou do documento".
"No nível do governo federal, a institucionalidade de acompanhamento e implementação da Agenda 2030 tem passado por revisão, de forma a aprimorar as políticas de desenvolvimento sustentável no Brasil", explicou o Itamaraty, indicando que país participará do Foro Político de Alto Nível deste ano, na sede das Nações Unidas, em Nova York.
Mas, num gesto pouco comum na diplomacia, o governo brasileiro se retirou da revisão de suas políticas públicas no setor social e ambiental que ocorreria justamente durante o Foro Político em Nova York, nesta semana.
Um dos argumentos usados pelo Planalto para explicar o gesto a interlocutores é que a Presidência de Jair Bolsonaro não iria participar de um exercício diplomático com base em resultados de governos anteriores.
Na ONU, porém, esses resultados não são considerados como dados ou políticas de um governo, e sim de Estado. Além disso, a sabatina não avalia apenas o que foi feito. Mas também os programas que estão sendo estabelecidos para reduzir pobreza, doenças e situações de violações de direitos pelos próximos dez anos.
A Revisão Voluntária Nacional na Assembleia Geral da ONU tem como objetivo avaliar e monitorar o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 2030 por parte de um Estado. Entre os assuntos que seriam examinados estão educação, meio ambiente, saúde, acesso a terras, fome e outros aspectos sociais.
Numa nota, o Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030 e a Rede ODS Brasil, grupo de ONGs com foco no acompanhamento os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, repudiaram a atitude do governo e cobram responsabilidade.
"Externamos nossa preocupação com o afastamento, cada vez maior, do compromisso que o Estado brasileiro assumiu em 2015, junto com outros 192 países-membros da ONU, de implementar um modelo de desenvolvimento voltado à prosperidade, com respeito às pessoas e ao planeta, orientado pela paz e viabilizado através de parcerias multissetoriais inclusivas, que resultem em serviços acessíveis e de qualidade para todos", disseram os grupos.
Nos últimos meses, vários incidentes marcaram a relação entre o Brasil e a ONU, inclusive o cancelamento de eventos de meio ambiente. "Tal desistência é mais uma prova do rechaço às instituições multilaterais como a ONU", alertaram.
O Itamaraty explicou sua decisão, dizendo que a apresentação dos relatórios é voluntária. "É, portanto, de livre escolha dos países a decisão de apresentar um RNV [relatório], bem como o ano de apresentação, seu conteúdo e formato. Encoraja-se que, até 2030, os países apresentem ao menos dois RNVs", explicou.

Liberdade para alguns

Mas nem todo o léxico do Itamaraty hoje busca desafazer anos de progressos na ampliação de direitos. No caso específico da Venezuela, os discursos do Brasil na ONU passaram a falar da necessidade de uma ação para "libertar" o povo venezuelano de uma ditadura.
Tal termo não vale para a Arábia Saudita e seu príncipe Mohamed Bin Salman, com quem Eduardo Bolsonaro esteve fazendo selfies, além de ser acusado de envolvimento na morte do jornalista Jamal Khashoggi e de conduzir uma repressão violenta em seu país.
Os mesmos sauditas que são um dos poucos que apoiam a agenda ultraconservadora e o novo dicionário da nova diplomacia brasileira.

Opinião: última mudança tão dramática aconteceu pós-1964

Ex-ministro e embaixador Rubens Ricúpero escreve artigo

Em diplomacia, a precisão e o sentido das palavras são fundamentais. Basta lembrar a importância que teve na época de Jânio Quadros e de San Tiago Dantas a expressão "política externa independente", na qual o adjetivo "independente" contrastava com a política externa anterior do "alinhamento automático".
Outras palavras que até hoje resumem um pensamento complexo foram as da célebre expressão "congelamento do poder mundial", inventada pelo diplomata e ministro de João Goulart [1961-64] Araújo Castro para definir a estrutura de poder imposta pelas superpotências.
Ou, em sentido positivo ou negativo, a utilização de lemas breves com a intenção de resumir o espírito de uma política, tal como o "pragmatismo responsável" de Geisel-Silveira ou a "política externa ativa e altiva" de Lula-Celso Amorim.
Nos dias atuais, quem não tiver sensibilidade para utilizar expressões como "desenvolvimento sustentável" ou "igualdade de gêneros" escolhe voluntariamente a automarginalização, a situação de pária em relação à esmagadora maioria da humanidade.
Creio que a última vez em que ocorreu uma mudança tão dramática de linguagem na diplomacia brasileira foi justamente logo depois do golpe militar de 1964.
De uma política externa independente, que recusava a lógica do automatismo do alinhamento da Guerra Fria e valorizava a soberania e o interesse nacional, passou-se subitamente ao uso de palavras e expressões como "soberania limitada", "fronteiras ideológicas", "força interamericana de paz" (para as intervenções) e a famigerada expressão de Juracy Magalhães "o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil".
Até hoje, os adeptos desse tipo de política tentam explicar o sentido dessa infeliz expressão.

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Uma estada breve (mas suficiente), na Bizarrolandia, uma experiencia inesquecivel - Paulo Roberto de Almeida

Não é exatamente Une Saison En Enfer, de Rimbaud (ou Mademoiselle Verlaine), inclusive porque o povo é simpático e acolhedor, mas é uma experiência edificante, tanto em termos econômicos, quanto políticos. Tudo é meio bizarro, surrealista, diáfano e vagamento enganador, a ponto de não se poder determinar ao certo se as novelas é que estão certas, ou se a vida real é assim mesmo maluca...
Em todo caso, foi o que me veio à mente, viajando de ônibus de Anápolis a Brasília, e me preparando para sair do Brasil...
Paulo Roberto de Almeida


Uma breve estada na Bizarrolândia

Paulo Roberto de Almeida

Acabo de passar dez dias num país profundamente anormal. Um país no qual as pessoas acreditam que existam coisas, qualquer coisa, bem ou serviço, que podem ser adquiridas em "dez vezes sem juros". A anormalidade é tão grande que as pessoas, vendedores ou consumidores, nem percebem mais a anomalia econômica. Esse é o preço final e está conversado, nem se discute e nem se contesta: ele está registrado nos cartazes, nos sites, em todos os lugares. E se por acaso você esquecer dessa particularidade, a mocinha do caixa se encarrega de lembrá-lo: "Em quantas vezes o Sr. quer pagar?"
E não precisa ser algum bem de maior valor, de consumo durável, que justifique algum financiamento embutido, aliás nunca explicitado, seja no preço, seja no ato do pagamento. Pode ser qualquer coisa, numa farmácia ou no supermercado: "Quer dividir? Em quantas vezes?" E você, meio surpreso, esboça uma resposta: "Dá para fazer em 55 vezes?" Não, em 55 vezes não dá, mas ela pode parcelar em até cinco vezes, está bem assim?
Eu sinceramente me pergunto quando começou o "dez vezes sem juros", mas sobretudo eu gostaria de saber se as pessoas realmente acreditam que elas estão adquirindo algum bem ou serviço em "dez vezes sem juros". Será possível isso? Essas coisas são normais?
Eu começo a desconfiar da capacidade de raciocínio de pessoas educadas, gente de classe média, com dinheiro, já fazendo pós-graduação: "Fessor, a gente tá viajando pra Flórida nas férias!" "Ah, tá bom, mas a alta do dólar não vai atrapalhar um pouco?" "Não, a gente tá fazendo tudo em 10 vezes sem juros." "Ah, tá bom então."
O que é que eu vou dizer? Vou chamar o cidadão de idiota, ali na frente dos outros? Mas aí eu percebo que o único anormal ali sou eu mesmo, que ainda me dou ao trabalho de questionar essas coisas e de ver anormalidades numa situação que é considerada a mais normal do mundo. Dez vezes sem juros, quem é que não gosta, quem é que não quer? Como é que eu ouso contestar essa santa paz dos negócios, essa absoluta normalidade do "Quer parcelar?"? E eu me pergunto se economistas sensatos, ou normais, não alertam para o tremendo engodo incorporado a essa mania -- ou seria já um hábito normal? -- do "dez vezes sem juros", e não começam a avisar os incautos que eles estão pagando o dobro do valor real, que eles estão pagando dois televisores e só levando um para casa, que eles estão na verdade adquirindo um financiamento a 100%, não comprando um bem ou serviço.
Mas essa não foi a única anormalidade que eu encontrei em minha recente estada na Bizarrolândia. Confesso que fiquei igualmente surpreso com o comportamento de uma tribo especial de cidadãos, os políticos, ou representantes do povo, como são chamados por aqui. Eles parecem se situar numa outra galáxia, não nesta onde estão os que os elegeram. Eles são capazes de tudo, menos de mirar a situação economicamente caótica que vive Bizarrolândia atualmente. Eles continuam a aprovar aumento de gastos -- geralmente para eles mesmos ou em benefício dos que lhes são caros -- na total indiferença em relação à inflação, ao desemprego, ao descalabro das contas públicas. E se acusam mutuamente de trapaças, de traições, até de roubalheira e de corrupção, vejam só.
Prepostos dos políticos confessam candidamente que desviaram tantos e tantos milhões de uma estatal qualquer, e que mandaram esses milhões para algum paraíso fiscal e já ninguém mais se espanta! Pior: não acontece nada, nadinha. As coisas continuam como se tudo fosse absolutamente normal. O cidadão, ou a cidadã, foi eleito com base em dinheiro desviado, extorquido de empresas privadas e tudo segue adiante na mais perfeita normalidade.
Mais estranho ainda, o que eu fiquei sabendo nessa breve estada em Bizarrolândia, foi que os guardiões do Tesouro, dos recursos duramente amealhados dos contribuintes, fraudaram completamente as contas, despeitaram o orçamento, violaram as leis e a própria Constituição de Bizarrolândia, e nada se passa: as coisas continuam fluindo na mais perfeita (a)normalidade.
E não só os guardiões, mas inacreditavelmente foi o principal responsável pelo respeito à lei e à Constituição quem incorreu nesses crimes contra a moralidade ou ao simples dever constitucional. Como é que pode?
Confesso que não sei. Não sei como é que o povo de Bizarrolândia consegue conviver com essas coisas, assim numa boa, como se tudo isso fosse absolutamente normal. Será que sou eu o anormal?
Não sei. Só sei que estou deixando Bizarrolândia por algum tempo, mas vou ficar observando de longe. Confesso que gostaria de voltar. Encontrei um povo simpático e até brincalhão, no meio do caos econômico e das esquisitices políticas. Mas gostaria de encontrar algo mudado quando eu voltar.
  
Paulo Roberto de Almeida
Em viagem, Anápolis-Brasília, 16/07/2015

sexta-feira, 28 de junho de 2013

O Brasil enlouqueceu e vai recuar muito, gracas a politicos demagogos e mediocres - Leandro Roque

O título acima é meu, mas acho que traduz perfeitamente o sentido deste longo artigo de Leandro Roque. Manifestações de rua se prestam a qualquer coisa, algumas sensatas, outras altamente delirantes. Por enquanto ganham estas últimas, não por que sejam mais factíveis, mas porque encontraram políticos medíocres, populistas, demagogos, incompetentes, eu diria até irresponsáveis, no limite da criminalidade econômica, que aproveitam para atender alguns dos slogans mais malucos -- como forma de garantir seu voto no ano que vem -- e vão precipitar o Brasil numa crise profunda, lenta e vergonhosa, feita de decadência econômica e surrealismo político.
Claro, no meio dessas manifestações, tem sempre aquelas pessoas de boa vontade, geralmente ingênuas economicamente, mas que estão exasperadas com a falta de segurança, com a desfaçatez dos mesmos políticos medíocres, que querem um país decente, livre da corja de bandidos que o tem assaltado continuamente, sem corrupção, com segurança, sem inflação, com honestidade, sem oportunismo e sem mentiras, com boa fé e responsabilidade, e que manifestam sua indignação com tudo o que vêem no cenário político.
Tem também os energúmenos de alguns movimentos surrealistas, que pensam que vão derrubar o capitalismo, e, como não poderia deixar de ser, tem os vândalos e criminosos profissionais, que estão ali para quebrar um pouco e roubar o que der. Inclusive jovens no geral bem comportados acabam se juntando aos vândalos no calor da hora: turbas desenfreadas agem como certas torcidas de futebol, ficam cegas e desembestadas, no limite da selvageria.
Do outro lado, tem a polícia emasculada e a imprensa abobalhada, feita de "profissionais do jornalismo", no limite do analfabetismo funcional.
Pronto, está aí a receita para nossa lenta decadência, permeada de gestos medíocres e oportunismos desonestos, como o de certo personagem, que acredita poder voltar triunfalmente graças ao caos que ele mesmo alimenta e estimula. Pelo que vejo, acho que vai ser difícil recuperar no curto e médio prazo, inclusive porque a dita oposição é absolutamente medíocre, inconsciente, inconsequente e impotente (fui claro?).
Desculpem o pessimismo, mas ao ver e ouvir tanta baboseira brotando de todas as partes, impossível não ser realista. Fiquem com um bom ensaio sobre nossa pior hora de loucuras coletivas.
Vou sublinhar apenas minhas poucas discordâncias com este excelente artigo.
Não concordo, por exemplo, em que "Já a depredação de patrimônio público recebe uma punição mais severa e o arruaceiro de fato pode ir para a cadeia.  Tal inversão de valores é digna de países de mentalidade coletivista."
Concordo inteiramente com a inversão de valores: esse é o resultado de anos, décadas, de educação à la Paulo Freire, a esse esquerdismo vulgar e mentiroso que prega contra o capitalismo, e que contamina sobretudo alguns juízes que pensam fazer justiça com suas próprias mãos (e patas). Mas vejo que grupelhos neobolcheviques como o MST podem depredar propriedade pública e privada à vontade, que nada lhes acontece: podem invadir o Congresso, os ministérios, as sedes do INCRA (dominado por outros malucos), que ficam impunes...
Também não acho que "Neste ponto, como é de praxe na América Latina, pode ocorrer um golpe de estado.  O governo é derrubado e uma junta militar assume o controle."
Não acredito que tenhamos condições, pelo menos no Brasil, para esse tipo de aventura caudilhesca ou militarista. Isso passou, e as FFAA vão sofrer, como o conjunto da classe média, a erosão da autoridade, da legitimidade, da moralidade, vão padecer do aumento da criminalidade, da roubalheira generalizada, da decadência do país, sem ter condições de atuar fora dos quadros institucionais. Eventualmente lideranças mais responsáveis assumirão o comando político da nação, mas o desgaste e o retrocesso já terão sido fatais para o futuro do país.
Vamos continuar nos arrastando duramente pelas trilhas escarpadas da História, avançando um passo e recuando dois, caindo e levantando, com imensas dificuldades.
Não sou pessimista. Apenas já vi esse mesmo filme antes, mais ou menos 50 anos atrás...
Paulo Roberto de Almeida

O brasileiro foi às ruas e gostou - mas continua sem entender nada
por , Instituto Von Mises Brasil, sexta-feira, 28 de junho de 2013



brasil.jpgApós mais de duas semanas de protestos diários nas ruas, já é possível fazer uma análise mais acurada das motivações das pessoas envolvidas nas manifestações. 
Até o momento, há dois grupos envolvidos.  Um grupo é formado por pessoas que fazem reivindicações as mais diversas e opostas possíveis: há desde libertários pedindo redução de impostos, livre concorrência e desregulamentações a grupos comunistas pedindo a estatização geral do transporte público.  Há grupos que fecham estradas pedindo a construção de viadutos, a instalação de lombadas eletrônicas e o barateamento do sistema de transportes, e há grupos que fecham avenidas exigindo maiores salários para professores e médicos, e mais recursos direcionados para a saúde e a educação.  Há estudantes universitários pedindo mais bolsas e um maior valor para as bolsas, e há professores universitários querendo que seus salários sejam equiparados aos dos professores das "universidades de ponta".  Há alienados que manifestam apenas pelo prazer de segurar um cartaz e gritar refrãos bacanas e há espertalhões que utilizam estes alienados para aumentar o coro em prol de suas reivindicações.
A esmagadora maioria clama pelo "fim da corrupção" e por mais e melhores serviços públicos, o que inclui "transporte público, gratuito e de qualidade", o que é equivalente a um círculo triangular.  E, até o momento, a vitória tem estado majoritariamente do lado estatista: os governadores do Rio Grande do Sul (Tarso Genro, do PT) e de Goiás (Marconi Perillo, do PSDB) acabam de anunciar o passe livre estudantil, o que significa que os pobres agora pagarão pelo transporte de universitários.  Já o senador Renan Calheiros, ávido por melhorar sua reputação perante a esquerda estudantil, foi ainda mais longe e aprovou em regime de urgência a votação da proposta de passe livre estudantil para simplesmente todo o país.  Basta o Senado aprovar e a estrovenga estará implementada.  O PLS 248/2013 "assegura gratuidade no sistema de transporte público coletivo local a estudantes do ensino fundamental, médio ou superior regularmente matriculados e com frequência comprovada em instituição pública ou privada."
Antes disso, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado já havia aprovado uma PEC que classifica o transporte como um "direito social".
O outro grupo é formado por arruaceiros — que são formados por marginais oriundos de todas as partes do país — que estão ali apenas pelo prazer de vandalizar e destruir propriedade privada.  O ocorrido na quarta-feira passada em Belo Horizonte foi sintomático: várias concessionárias de veículos foram saqueadas, incendiadas e completamente depredadas, levando a uma perda total de estoques.  Uma revendedora de motos foi invadida e, não conseguindo roubar as motos, os arruaceiros optaram por incendiá-las nas ruas.  (Veja as imagens a partir do marco 2:00).  Em Porto Alegre, além de dois prédios públicos, dois prédios residenciais, nove agências bancárias e 21 lojas foram depredadas e saqueadas, e 20 contêineres de lixo foram virados e incendiados.  Atos semelhantes ocorreram nas manifestações de todas as capitais do país.
Quanto a este segundo grupo, não há nenhuma controvérsia sobre o que deve ser feito.  Dado que o governo existe e dado que ele é uma instituição que detém o monopólio da violência, então sua função precípua é utilizar esta violência para defender o indivíduo e a propriedade privada de ataques violentos.  Logo, a polícia deve ser completamente liberada para ministrar punição instantânea a estes arruaceiros.  Mas isso não irá ocorrer porque nossa Constituição socialista não considera que danos à propriedade privada sejam crimes sequer dignos de encarceramento.  No Brasil, se você vandalizar um carro ou destruir uma agência bancária ou uma concessionária de veículos o máximo que irá lhe ocorrer será a prestação de serviços comunitários ou o pagamento de algumas cestas básicas.  Já a depredação de patrimônio público recebe uma punição mais severa e o arruaceiro de fato pode ir para a cadeia.  Tal inversão de valores é digna de países de mentalidade coletivista.  A devoção à inviolabilidade da pessoa e da propriedade privada não faz parte do nosso sistema de valores.
Os motivos das manifestações
Mas a intenção deste artigo não é se concentrar nos arruaceiros, mas sim nos motivos que levaram as pessoas às ruas para fazer reivindicações.  E o fato é que quem acompanha nossos artigos sobre a economia brasileira aqui no IMB não deveria estar surpreso com as reivindicações, mesmo com aquelas que involuntariamente clamam por mais estado.  Tudo está ocorrendo exatamente como explica a teoria dos ciclos econômicos.
Há duas grandes motivações que estão levando as pessoas às ruas: uma é de cunho econômico e a outra é de cunho emocional.  Só que ambas são interligadas.
O período que vai de 2007 até meados de 2011 foi mágico para a economia brasileira.  Mesmo a recessão de 2009 — que foi curta pelos motivos explicados aqui — não abalou em nada a confiança do brasileiro de que o futuro finalmente havia chegado, que o país deixaria de ser uma eterna promessa, e que o gigante finalmente estava desperto. 
Ledo engano.  Tudo não passava de um truque possibilitado pela expansão artificial do crédito, algo com o qual o brasileiro ainda não estava acostumado.  A expansão artificial do crédito não gera prosperidade, mas sim uma enganosa aparência de pujança.
No nosso atual sistema monetário e bancário, quando uma pessoa ou empresa pega empréstimo, os bancos criam dinheiro do nada (na verdade, meros dígitos eletrônicos), emprestam este dinheiro e cobram juros sobre eles.  Ou seja, todo esse processo de expansão de crédito nada mais é do que um mecanismo que aumenta a quantidade de dinheiro na economia.   Esse aumento da quantidade de dinheiro na economia faz com que, no primeiro momento, haja uma grande sensação de prosperidade.  A renda nominal aumenta, os investimentos aumentam, o consumo aumenta e o desemprego cai.
A sensação vivenciada pelas pessoas durante essa fase de prosperidade artificial é maravilhosa: a renda nominal das pessoas cresce anualmente; investidores se animam ao ver que o valor de suas ações cresce diariamente; as indústrias de bens de consumo conseguem vender tudo que põem no mercado e a preços crescentes; os estoques das empresas são prontamente vendidos; apartamentos são vendidos ainda na planta; novos empreendimentos são continuamente iniciados; carros zero são vendidos aceleradamente; novos restaurantes e novas lojas são inaugurados diariamente; os preços e os lucros sobem mensalmente; trabalhadores encontram empregos a salários nominais cada vez maiores; restaurantes estão sempre cheios e com longas listas de espera apenas para arrumarem uma mesa; trabalhadores e seus sindicatos veem o quão desesperadoramente empresários estão demandando seus serviços em um ambiente de pleno emprego, aumentos salariais e (nos países mais ricos) imigração; líderes políticos se beneficiam daquilo que parece ser uma economia excepcionalmente boa, a qual eles venderão ao eleitorado como resultado direto de sua liderança e de suas boas políticas econômicas; burocratas responsáveis pelo orçamento do governo ficam impressionados ao descobrir que, a cada ano, a receita está aumentando em cifras de dois dígitos.
Porém, tal arranjo não pode durar.  Há um enorme descoordenação entre o comportamento dos consumidores e dos investidores.  Os consumidores seguem consumindo sem a necessidade de poupar, pois a quantidade de dinheiro na economia aumenta continuamente, o que torna desnecessária qualquer abstenção do consumo.  E os investidores seguem aumentando seus investimentos, os quais são totalmente financiados pela criação artificial de dinheiro virtual feita pelos bancos e não pela poupança genuína dos cidadãos.  Tal arranjo é completamente instável.  Trata-se apenas de uma ilusão de que todos podem obter o que quiserem sem qualquer sacrifício prévio.
No Brasil, os indivíduos intensificaram seu endividamento para poder consumir, na crença de que a expansão do crédito continuaria farta e que sua renda futura continuaria aumentando, o que facilitaria a quitação destas dívidas.  Já as empresas embarcaram em investimentos de longo prazo estimuladas tanto pela expansão monetária coordenada pelo Banco Central (o que fez com que os investimentos se tornassem mais financeiramente viáveis) quanto pela expectativa de que o aumento futuro da renda possibilitaria o consumo dos produtos criados pelos seus investimentos. 
No entanto, este aumento do endividamento também trouxe um aumento nos calotes, o que deixou os bancos mais cautelosos em continuarem expandindo o crédito.  E os bancos estarem mais cautelosos significa menor expansão da quantidade de dinheiro na economia (como mostram os gráficos deste artigo).  Consequentemente, a taxa de crescimento da quantidade de dinheiro na economia brasileira começou a desacelerar, o que levou a uma estagnação da renda nominal das pessoas.  Isso fez com que o modelo de crescimento baseado na simples expansão do crédito se esgotasse.
No entanto, os preços continuaram subindo, tanto em decorrência de toda a expansão monetária que já havia ocorrido quanto pela súbita desvalorização da taxa de câmbio ocorrida em 2012 e intensificada agora em 2013, o que tornou as importações mais caras e as exportações mais atraentes.  Uma combinação entre menos importações e mais exportações reduz a oferta de bens no mercado interno, o que gera uma pressão nos preços destes bens.
Esse arranjo que combina renda nominal estagnada, preços em contínua ascensão e endividamento (e inadimplência) em alta está gerando não apenas uma enorme sensação de aperto financeiro nos brasileiros, como também trouxe uma grande frustração a estas pessoas.  Aquela economia que outrora parecia invejável e rumo a um futuro auspicioso repentinamente estagnou-se, perdeu todo o seu brilho e, agora sem essa camuflagem, explicitou toda a sua realidade: infraestrutura caótica, serviços públicos marfinenses, inflação de preços sempre acima da meta do Banco Central (meta esta que já é alta até mesmo entre países em desenvolvimento), endividamento crescente, renda estagnada e famílias cujos salários mal chegam ao final do mês.
010210-istoe.jpgUm perfeito exemplo de como uma expansão econômica artificial mexe com o psicológico e com o senso de realidade das pessoas nos foi fornecido por esta capa da revista IstoÉ, de 6 de janeiro de 2010, na qual o hebdomadário dizia que já éramos uma potência:
Segundo a reportagem:
"O Brasil está conseguindo o raro feito de extrair opiniões quase unânimes mundo afora. São poucos, pouquíssimos, os economistas que ousam discordar de que o País entrou em um ciclo de desenvolvimento sustentado. E mais: são ainda mais raros aqueles que duvidam da capacidade de o Brasil se tornar uma das maiores potências econômicas do planeta em um par de dezena de anos."
Dentre os "poucos, pouquíssimos, economistas que ousam discordar de que o País entrou em um ciclo de desenvolvimento sustentado" certamente estão os economistas deste site, que ainda em 2010 alertavam que tudo era infundado.
É claro que, após ter sido bombardeado por inúmeras notícias como essa durante quase 3 anos, é natural que o brasileiro médio hoje se sinta deprimido, e até mesmo revoltado, ao constatar que foi enganado e que a economia pujante que lhe haviam prometido nada mais era do que um conto de fadas.  Ludwig von Mises explicou bem este componente emocional em suas obras.  As pessoas se acostumam a um padrão de vida crescente durante a fase da expansão econômica artificial e, mais tarde, quando a nova realidade se impõe avassaladoramente, elas se recusam a aceitar que tudo não havia passado de uma gostosa mentira, pois imaginavam que aquela fase próspera realmente representava um novo e definitivo padrão.  Os países da Europa mediterrânea estão vivenciando o mesmo fenômeno.
Aturar corrupção, uma infraestrutura caótica e serviços públicos moçambicanos é relativamente fácil quando se está com a renda crescendo mais que os preços e com a capacidade de consumo em alta.  Porém, tão logo esses indicadores se invertem e o endividamento teima em não cair, a depressiva realidade se impõe e resta ao cidadão ir protestar nas ruas clamando por medidas que arrefeçam sua situação.  Ninguém vai às ruas protestar contra a corrupção ou para exigir melhorias na saúde, na educação e nos demais serviços públicos quando a economia está com bons indicadores, a capacidade de consumo está em alta e o dinheiro chega até o final do mês.  No entanto, basta esses indicadores piorarem, que todo o esforço de mobilização se torna mais fácil.  Ou será que alguém acredita que Collor caiu por causa de um Fiat Elba?
A verdade é que o povo brasileiro queria crédito farto a juros baixos para comprar imóveis, carros, motos, televisores e outros eletrodomésticos.  Conseguiu.  Queria que o governo expandisse continuamente seus gastos para, dentre outras coisas, aumentar as contratações para o setor público, que é o objetivo de vida de vários integrantes da classe média.  Conseguiu.  Queria que o governo protegesse a indústria nacional e seus empregos aumentando as alíquotas de importação de praticamente todos os produtos estrangeiros (chegando ao ponto organizar operações ao estilo da Stasi nos aeroportos, abrindo malas e confiscando até mesmo as roupas que os brasileiros compravam no exterior).  Conseguiu.  Aceitou que o governo utilizasse o BNDES para conceder empréstimos subsidiados para grandes empresas, as quais iriam se transformar em "campeãs mundiais".  E defendeu quando o governo obrigou todas as grandes empresas do país a produzir utilizando uma determinada porcentagem de insumos fabricados no Brasil, o que deu a estes fabricantes a capacidade de aumentar seus preços sem sofrer concorrência.
O povo aprovou tudo isso, mas estranhamente não quer arcar com as consequências destas políticas, que são o aumento da inflação e do endividamento, a estagnação da renda, e a perpetuação da ineficiência.  E não apenas não quer arcar, como está pedindo mais ação justamente do ente que causou tudo isso.  Trata-se de um exemplo clássico de um povo que não sabe estabelecer uma relação de causa e efeito.
Conclusão
Como já explicou o economista Gary North, a maioria dos protestos de rua tem uma mesma característica: uma hora eles acabam.  É impossível manter protestos maciços como estes que estamos vivenciando por um longo período de tempo.  Ou os manifestantes se cansam e perdem a motivação, ou as autoridades se tornam mais bem organizadas e passam a reprimir com mais vigor.  Mas há também uma pequena chance de as coisas irem para o lado oposto.  Logo, quando demonstrações como essa começam a ocorrer, ou elas se enfraquecem e desaparecem ou elas se agravam e acabam derrubando o governo.
Para o governo, a melhor estratégia é continuar prometendo reformas.  Se o povo engolir as promessas, as manifestações irão acabar.  Mas essa estratégia é um tanto arriscada, pois pode ser que as manifestações ganhem novos adeptos, se espalhem por todo o país e cheguem a um ponto em que a própria legitimidade do governo é colocada em xeque.  Neste ponto, como é de praxe na América Latina, pode ocorrer um golpe de estado.  O governo é derrubado e uma junta militar assume o controle.
Uma coisa boa que poderia advir destes protestos seria se eles solapassem a confiança e a esperança que o povo brasileiro deposita no estado.  Se eles erodissem a santidade do governo, se eles explicitassem a incompetência do governo e fizessem com que as pessoas finalmente entendessem a verdadeira natureza do governo, já teriam feito algo positivo.  Qualquer coisa que enfraqueça a crença no estado, e que não recorra à violência, é positiva.  Se uma geração de jovens entender que não deve depositar no governo suas esperanças de uma vida melhor, então as manifestações terão gerado resultados positivos.  Para que isso ocorra, é essencial que grupos pró-liberdade e pró- livre mercado se aproveitem desta oportunidade para difundir a mensagem de que menos governo e menos burocracia geram mais liberdade e mais prosperidade.  Isso sim poderia gerar efeitos positivos.
Mas não tenho muitas esperanças quanto a isso.  No geral, estes manifestantes são impermeáveis à lógica e estão defendendo apenas mais espoliação e mais verbas para políticos e sindicatos, ainda que não entendam que é isso que eles estão fazendo.
O fato é que, com a renda estagnada, com a inflação de preços em teimosa alta, com o endividamento e a inadimplência em níveis inauditos, e com o real se esfacelando perante o euro e o dólar, encarecendo sobremaneira as importações de insumos básicos e diminuindo nosso padrão de vida — exatamente como queriam o Banco Central e o Ministério da Fazenda —, há um risco real de o caldo entornar e a situação ficar realmente fora do controle.

Estamos vivenciando exatamente aquilo que ocorre quando se entrega o comando da economia a pessoas que não têm a capacidade de gerenciar nem sequer uma carroça de pipoca.  A democracia e o apelo das massas — exatamente o arranjo que todo mundo venera — levaram a isso.  Não há por que reclamar e nem há o que se estranhar.

Leandro Roque é o editor e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.

Reuniao de Emergencia num certo pais longe daqui...

Gostaria de dar créditos aos autores, aos artistas, mas ainda não consegui: só aparece ao final do video.
Quem puder, por favor...
Vale a pena ver de novo. Plim, plim...

http://www.youtube.com/watch?v=__C90xZOmsQ&feature=c4-overview&list=UUEWHPFNilsT0IfQfutVzsag

Tem também aquela história da criação de um novo ministério, absolutamente pertinente:

http://www.youtube.com/watch?v=VNK7jF_vYlU&list=UUEWHPFNilsT0IfQfutVzsag

Da Marcha da Insensatez para a Marcha da Estupidez: o Brasil continua modesto na sua decadencia...

Sempre a mesma coisa: o Brasil não consegue fazer as coisas direito nem na sua caminhada para o precipício. Em lugar de cair em grande estilo, a ponto de provocar uma catástrofe de efeitos hollywoodianos, como aquela relatada pela historiadora Barbara Tuchman (na verdade, uma grande vulgarizadora), que redundou na mais destruidora das guerras europeias, o país fica enrolando a sua própria decadência.
Bem, pelo menos o surto atual já foi apelidado de Marcha da Estupidez, o que eu acho que retrata fielmente o estado mental de certas pessoas.
Não fiquem deprimidos, pois até aqui ainda está razoável.
Tenham absoluta certeza: vai ficar muito pior, mas muuuuiiito mais pior, como diria alguém.
Aliás aquele mesmo que vocês estão pensando, objeto do próximo post.
Paulo Roberto de Almeida

Reinaldo Azevedo, 27/06/2013

Nunca se esqueçam de que este “reaça” aqui, como dizem alguns, advertiu que estava em curso a marcha da irresponsabilidade. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-RS), tornou-se agora o fanático do Passe Livre Estudantil. É o mais novo aliado da Mayara Vivian, a futura geógrafa e ex (suponho) garçonete do MPL. Ele está a fim de mudar a sua reputação junto aos chamados “progressistas”. Agora, se o povo quer, Renan quer também.
O senador conseguiu aprovar o regime de urgência para votar a proposta. Isso quer dizer que ela vai diretamente a plenário, sem passar nem pela Comissão de Constituição e Justiça. Os estudantes que, hoje em dia, já pagam meia, terão gratuidade total. Atenção! Só em São Paulo, 10% dos usuários do sistema já têm esse privilégio. Os que pagam meia são 12% — aí incluídos estudantes e professores. Por baixo, isso elevaria a gratuidade, suponho, para perto de 20%. Será assim: basta ser estudante, não paga — pouco importa a renda familiar.
A gratuidade total e mesmo a meia passagem, na maioria dos casos, já são uma estupidez, expressão óbvia de injustiça social. Mas estes são os tempos, não é? Pois é… Vamos lá, coleguinhas progressistas da imprensa! Saiam convocando as ruas “em nome do povo”. OS MAIS POBRES PAGARÃO A CONTA.
O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) tentou resistir: “Eu não sei o que diz o clamor das ruas. Mas a prudências recomenda que uma matéria dessas passe pela CCJ. Ele envolve um número enorme de recursos, não temos estimativa dos impactos. Precisamos de estimativa de quantos bilhões serão necessários para financiar o passe livre”.
Inútil. É claro que a proposta será aprovada no Senado. Os senadores não vão querer ficar de mal com o “espírito das ruas”, não é? A Comissão de Constituição e Justiça do Senado, diga-se, já aprovou uma PEC que põe o transporte entre os direitos sociais. Se é, então tem de ser oferecido de graça; será preciso haver o SUS dos ônibus, né? Espero que, ao menos, seja permitido que empresas particulares ofereçam um alternativa a quem quer pagar… Vocês sabem onde esse negócio daria: sucateamento do transporte público. É o que dá cair na conversa da Mayara Vivian. Não vou dizer que ela pensou como garçonete porque respeito a profissão.
Dilma poderia chamar o seu aliado Renan e dizer: “Isso não dá! A conta cai no colo dos prefeitos, e os prefeitos virão para cima de mim”. Para tanto, Dilma precisaria:
a: liderar — e ela não lidera:
b: ter um interlocução eficaz no Congresso — seu homem de confiança, hoje, é Aloizio Mercadante…
Se a estrovenga passar, um dos que mais vão sentir o peso, obviamente, será Fernando Haddad. A reputação deste rapaz, segundo estou sabendo, despencou. E ele nem pode acusar os “reacionários” da oposição, não é mesmo? Numa entrevista concedida à revista “Poder”, em abril, Haddad ficou muito bravo quando citaram meu nome. Babou de ódio mesmo. Afirmou que eu até fazia bem à esquerda porque demonstraria, segundo entendi, a insensibilidade da direita etc e tal. Vai lá, novo homem “sensível”! Dá o que pedem teus conselheiros “progressistas”! Faze o que querem teus aliados do Passe Livre!  

Chegou a hora de cobrar a revisão da Lei da Gravidade. Se a massa quer, Renan também quer.
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Por Gabriel Castro e Marcela Mattos,na VEJA.com, 27/06/2013

O governo pretende enviar na semana que vem ao Congresso Nacional a proposta do plebiscito para tratar da reforma política. O prazo da consulta e o conteúdo das perguntas ainda dependem, respectivamente, de uma resposta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do posicionamento de líderes partidários. “A princípio a presidente pretende encaminhar ao longo da semana que vem. Mas vamos aguardar a decisão do TSE”, disse o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, nesta quinta-feira.
A declaração de Mercadante foi dada após uma reunião nesta quinta em que a presidente ouviu presidentes de dez partidos da base aliada sobre o tema; no encontro, que durou quase três horas, a ideia do plebiscito foi aceita pela maioria das siglas – o PP defende a realização de um referendo. “Ficou absolutamente claro que a reforma política é necessária e que o povo deve ser ouvido nessa reforma”, afirmou o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, após a reunião.
Dilma receberá nesta tarde líderes de partidos aliados na Câmara e no Senado. Só depois de ouvir representantes da base e da oposição é que ela vai organizar as questões propostas ao Legislativo. Mas Mercadante já afirmou que a população decidirá apenas os “pilares” da reforma – e citou dois: o formato de financiamento de campanha e o sistema de votação para vereador e deputado.
Mercadante, que tem atuado como articulador de Dilma, disse que a consulta será feita no tempo mais curto possível, e que o tema não deve mobilizar toda a população. “Seguramente não são todos os cidadãos que vão se interessar por participar do plebiscito, mas todos aqueles que têm interesse neste debate terão espaço concreto de atuação: poder votar e ajudar a definir as prioridades da reforma política.”
O presidente do PSB, governador Eduardo Campos (PE), foi escalado para falar ao lado de Mercadante e de Cardozo após a reunião e disse que não necessariamente as mudanças devem ser aplicadas já nas próximas eleições: “Algumas coisas devem valer em 2014, mas nem todo o conjunto da reforma necessariamente valerá para 2014. Isso é uma decisão que vai ser dada no Congresso Nacional e pode, inclusive, ser objeto do plebiscito”, disse.