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segunda-feira, 9 de junho de 2014

Brasil-Argentina: disputa pela pior politica economica - Rolf Kuntz

Competição difícil essa: saber quem ganha o prêmio IgNobel de pior administração em geral, e na economia em particular...
Paulo Roberto de Almeida 


A política da estagflação e do atraso industrial

Rolf Kuntz
O Estado de São Paulo, 7/6/2014
A emperrada economia brasileira está sujeita a dois dos governos mais desastrosos do mundo, o da presidente Dilma Rousseff, gerente da estagflação, e o de sua colega Cristina Kirchner, chefe da diplomacia comercial do Mercosul e dona, portanto, da palavra final em qualquer negociação relevante. Isso vale para as discussões com parceiros de fora, como a União Europeia, ou para os arranjos internos, como o acordo bilateral para o setor automotivo – revisto mais uma vez segundo os critérios da Casa Rosada. De janeiro a maio deste ano o Brasil exportou para os Estados Unidos produtos no valor de US$ 10,51 bilhões, pouco mais do que o vendido para o Mercosul, US$ 10,13 bilhões, e muito mais do que o embarcado para a Argentina, US$ 6,19 bilhões. As exportações para o mercado argentino foram 18,6% menores que as de um ano antes, pelas médias diárias, enquanto as vendas para os Estados Unidos ficaram 13,2% acima das contabilizadas no mesmo período de 2013.
Nenhum outro mercado aumentou tanto a absorção de produtos brasileiros, segundo registros do Ministério do Desenvolvimento. Indústria e Comércio Exterior. Mas o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ao explicar o pífio crescimento econômico do Brasil no primeiro trimestre, 0,2%, apontou de novo as condições do mercado internacional, incluída a desaceleração americana, como principais entraves à expansão brasileira. Como de costume, ele descreveu um mundo bem diferente daquele reconhecido por qualquer observador razoavelmente atento e informado.
De janeiro a abril, 50,36% das exportações brasileiras para os Estados Unidos foram de manufaturados. Esse é o último período com informações detalhadas sobre a composição do comércio com cada parceiro. Nesses quatro meses, as vendas de manufaturados corresponderam a apenas 35,6% da receita geral. A dos básicos, a 48,9%. Somados os semimanufaturados, a parcela das commodities correspondeu a 61,6% do total (outros 2,8% ficaram na categoria de operações especiais).
A participação dos manufaturados continuou em queda. De janeiro a maio, esses produtos proporcionaram 34,8% do total faturado. O resto – quase dois terços – veio das commodities, principalmente dos básicos, 50,3% das vendas totais.
O Brasil assume, cada vez mais claramente, o papel de fornecedor de matérias-primas, principalmente no comércio com a China e outros países da Ásia. Até abril, os manufaturados foram só 3,09% das exportações para o mercado chinês. Em contrapartida, a China exporta principalmente manufaturados para o mercado brasileiro e, de quebra, toma do Brasil fatias crescentes do comércio com os latino-americanos.
O Brasil assume, cada vez mais claramente, o papel de fornecedor de matérias-primas, principalmente no comércio com a China e outros países da Ásia
Mas há nessa história um aspecto paradoxal, pelo menos à primeira vista. Cerca de metade das vendas brasileiras para os Estados Unidos ainda é formada por manufaturados. O peso desses produtos nas vendas à União Europeia é bem menor, 34,96% de janeiro a abril, mas, ainda assim, muito maior que no comércio com os parceiros da Ásia. No entanto, a indústria brasileira perde espaço no mercado externo, incluída a vizinhança latino-americana, e até no mercado interno. Aqui, a participação de fornecedores estrangeiros tem crescido há vários anos e passou de 20,4% no primeiro trimestre de 2012 para 22,5% dois anos depois, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Em resumo: algumas indústrias conseguem manter presença no mercado americano e também – com dificuldade crescente – no europeu, enquanto a maior parte do setor manufatureiro perde espaço em quase todos os mercados. Montar uma história clara e coerente com esses pedaços é uma boa tarefa para pesquisadores, mas pelo menos alguns detalhes parecem evidentes. Um deles é a acomodação da maior parte do setor industrial no comércio com economias em desenvolvimento, quase todas menos industrializadas que a brasileira. Hoje até esse papel é inseguro, por causa da presença crescente de fortes competidores, especialmente asiáticos, na América Latina e até no Mercosul. Essa acomodação é denunciada também pelo baixo grau de inovação, discutido quarta-feira no Fórum Estadão – Inovação, Infraestrutura e Produtividade. O protecionismo, outro detalhe importante, é obviamente parte dessa história.
O estímulo à modernização e à busca de competitividade teria sido, com certeza, maior se o Brasil houvesse buscado acordos comerciais com os países mais avançados, como os da América do Norte e da Europa, mas a diplomacia econômica brasileira preferiu outro caminho a partir de 2003. O governo recusou o projeto da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), no começo da primeira gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e fixou como prioridade a integração Sul-Sul.
O acordo com a União Europeia poderia ter aberto uma porta no mundo mais avançado, mas a aliança com o protecionismo argentino, depois convertida em sujeição, entravou as negociações. Enquanto isso, outros emergentes com facilidade de acesso ao mercado europeu, como a Turquia, consolidavam suas posições. Os demais Brics – Rússia, Índia, China e África do Sul – jamais se juntaram ao delirante e anacrônico projeto terceiro-mundista do governo brasileiro.
Alguns capítulos dessa história são temas do dia a dia: a tributação sobre o investimento e a exportação, a infraestrutura insuficiente e ruim, o atraso educacional, agravado pelas prioridades mal escolhidas, o excesso de gastos e o desperdício do dinheiro público, a tolerância à inflação elevada e o intervencionismo desastrado. As tentativas de maquiar as contas públicas e a inflação ilustram de maneira pitoresca a baixa disposição do governo de reconhecer e de resolver problemas.
O investimento reduzido a apenas 17,7% do produto interno bruto (PIB) no primeiro trimestre, 0,5 ponto abaixo do nível já ridículo de um ano antes, 18,2%, resume boa parte do quadro: incompetência governamental somada à crescente e muito compreensível insegurança do setor privado. É o Brasil em rápido processo de subdesenvolvimento.


Rolf Kuntz

Rolf Kuntz é professor titular de Filosofia Política na Universidade de São Paulo (USP) e colunista de economia do jornal “O Estado de S. Paulo”. É autor dos livros "François Quesnay: economia" (Atica, 1984), da coleção Grandes Cientistas Sociais, e "Qual o futuro dos direitos? Estado, mercado e justiça na reestruturação capitalista" (Max Limonad, 2002). Kuntz é mestre e doutor em Filosofia pela USP. Tem interesse especial pela obra de David Hume, Jean-Jacques Rousseau, John Locke e Adam Smith.

domingo, 11 de maio de 2014

2015, o ano do ajuste (qualquer que seja o governo) - Claudia Safatle

A urgência do ajuste
Claudia Safatle | De Brasília.
Valor Econômico, 02/05/2014
Especial.Rumos da Economia. 

Com o ano de 2014 congelado pelas eleições presidenciais de outubro, todos os olhares se voltam para 2015. 
O estoque de decisões adiadas para o próximo ano, para não comprometer a campanha pela reeleição de Dilma Rousseff, se avoluma. Forma-se o entendimento de que o próximo presidente da República terá que enfrentar um duro ajuste. Não há indícios de que haverá maior crescimento econômico, expansão da taxa de investimento, queda da inflação em direção à meta e redução da taxa de juros em um futuro próximo. Ao contrário. 2015 deve ser o ano de preparação do país para a retomada, no período seguinte, de uma maior taxa de crescimento, objetivo final de qualquer governo. 

Diante da incerteza sobre quem será vitorioso nas eleições de outubro, abrem-se pelo menos duas vertentes de possibilidades na economia: com Dilma Rousseff reeleita ou com a vitória de um dos candidatos da oposição - Aécio Neves, do PSDB, ou Eduardo Campos, do PSB. 

No primeiro caso, prevalece o receio de que a presidente "dobre a aposta" na forma e no conteúdo do seu primeiro mandato, mas não é prudente desconsiderar a hipótese de que Dilma mudou e continuará mudando em direção a uma gestão mais amigável ao setor privado. Seu governo tende a ser "gradualista" na solução dos problemas. O grande desafio da presidente será recuperar a confiança dos agentes econômicos. 
Já os candidatos da oposição têm emitido sinais de que optariam por um "tratamento de choque" que se traduziria, por exemplo, em uma solução definitiva e mais rápida para a correção dos preços represados (combustíveis, energia e transportes urbanos). No gradualismo, os preços seriam corrigidos um pouco a cada ano, até eliminar a defasagem. 
Se há algum consenso entre os economistas de todos os matizes, é na política fiscal. Tanto os que são próximos ao governo quanto os de oposição focam na deterioração das condições fiscais nos últimos três anos como um dos pontos prioritários a serem atacados em 2015. 
O gasto público crescente acompanhado de aumento modesto das receitas minou a capacidade de produção de superávit primário. O saldo das contas públicas, que no primeiro ano do governo Dilma foi de 3,11% do PIB, no ano passado caiu para 1,9% do PIB, percentual que se repete como meta para este ano. 
O aspecto mais delicado do processo de corrosão fiscal, porém, está na taxa implícita de juros da dívida, hoje de cerca de 19% ao ano, embora a Selic seja de 11% e tenha caído para 7,25% sem, no entanto, reduzir o custo da dívida pública. 
Os juros implícitos resultam da diferença entre as taxas pagas sobre os passivos do setor público (Selic) e as que remuneram os ativos, bem mais baixas e que incidem sobre as reservas cambiais e os créditos do BNDES. 
O BNDES foi pródigo na concessão de crédito em nome de uma suposta política de criação de "campeões nacionais" e para sustentar a atividade econômica. Os empréstimos do banco subiram de 1,2% do PIB em 2008 para 8,6% do PIB em 2013. Para aliviar a dívida dos altos juros será crucial um cronograma de desmobilização de recursos da União para o BNDES. 
Foi pela piora da situação das contas públicas que o país sofreu o rebaixamento do "rating" de grau de investimento pela agência Standard & Poor's. 
Economistas que apoiam candidatos da oposição já começaram a alinhavar medidas que podem ser tomadas em janeiro de 2015, caso sejam eleitos, para recolocar a gestão fiscal nos trilhos. Cogita-se da suspensão das desonerações da folha de salários à elevação de impostos como, por exemplo, a Cide-Combustíveis. O próprio governo admite que as desonerações da folha não deram os resultados imaginados e deve reduzir o seu alcance, se reeleito. 
Com uma política fiscal mais eficaz, tira-se o peso do combate à inflação hoje nas costas do Banco Central. Mesmo assim, não é seguro que o país escape de uma nova rodada de elevação da taxa Selic a partir de janeiro do ano que vem. O BC acredita que entregará, ao fim deste ano, a inflação abaixo do teto de 6,5%. Para 2015 as expectativas do mercado são de uma variação de 6,3% do IPCA, taxa ainda distante da meta de 4,5%. Após quase 20 anos do Plano Real, a inflação continua a atormentar a vida do país. Nos doze anos de gestão do PT não foi dado um só passo para reduzir a meta rumo a uma taxa neutra. 
Uma inversão de objetivos marcou o governo Dilma Rousseff. Imaginava-se que a redução dos juros levaria à expansão automática dos investimentos, aumentando a oferta de bens e serviços. Com isso a inflação, fruto do descasamento entre a oferta e o consumo, estaria domada. As coisas não funcionaram como o Palácio do Planalto previa, porque juros por si só não determinam o investimento. 
Tudo conspirou para o governo abandonar a discussão ideológica estéril e retomar as privatizações, mediante contratos de concessão. Parte relevante das obras de infraestrutura do país foi ou será licitada. Rodovias e aeroportos avançaram. Portos e ferrovias ainda não. 
Assessores de Dilma começam, agora, a rascunhar uma "agenda de transição" deste para o eventual segundo mandato. Dentre as medidas elencadas consta a limitação do gasto público por lei, iniciativa que também faz parte da agenda de outros candidatos. Outras três medidas da lista já poderiam ter sido tomadas há anos, que são regras mais restritivas de acesso ao seguro-desemprego, ao abono salarial e às pensões por morte - cujos gastos crescem em progressões geométricas. 
São medidas necessárias, mas insuficientes para dar um novo arranjo à política fiscal e melhorar as condições de competitividade da economia brasileira. Conforme o resultado das urnas, serão retomadas a reforma da Previdência, com o estabelecimento de idade mínima para aposentadoria, e a flexibilização das regras que atam o mercado de trabalho, sobretudo no tocante à primazia do que é negociado entre patrões e empregados sobre a legislação. 
Do lado externo, a situação do balanço de pagamentos toma rumo inquietante. Apesar da desvalorização do real, dificilmente a balança comercial terá saldo positivo este ano. O déficit nas transações correntes com outros países é de US$ 25,186 bilhões desde o início do ano e deve encerrar 2014 na casa de US$ 80 bilhões. Em 12 meses até março a diferença entre o que país gastou e o que recebeu em decorrência de transações internacionais (comércio, serviços e outros) alcançou US$ 81,556 bilhões, o equivalente a 3,64% do Produto Interno Bruto (PIB). 
A desvalorização de 2013 conteve a escalada de aumento do déficit. A perspectiva de a recente valorização se mostrar duradoura, no entanto, pode interromper ou mesmo reverter o sinal. 
Os investimentos estrangeiros diretos financiam, hoje, cerca de 80% do déficit. Os outros 20%, que representam cerca de R$ 20 bilhões, são cobertos por investimentos financeiros que entram no país atraídos pela taxa de juros. Ficar dependente de capitais voláteis pode não ser uma boa estratégia quando se sabe que em algum momento haverá uma elevação da taxa de juros americana. 
Por estilo e personalidade, a presidente também deixou marcas e rachaduras no microgereciamento de seu governo, ao interferir em preços importantes da economia. 
O exemplo mais dramático da microgestão está na política energética, dos combustíveis à energia elétrica. A defasagem dos preços da gasolina, porém, é apenas uma fração dos danos produzidos na Petrobras, empresa envolvida em suspeitas de corrupção e negócios deletérios durante o governo Lula. 
Na área de energia elétrica, as contas não param de chegar. O represamento dos preços da energia, após a redução de tarifas em 2013, já custou quase R$ 10 bilhões no ano passado em recursos do Tesouro Nacional para a CDE. Recursos que terão que ser devolvidos à União pelo aumento da conta de luz dos consumidores nos próximos quatro anos. 
As despesas referentes a este ano começaram com o empréstimo bancário de R$ 11,2 bilhões para a Câmara Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), mas devem superar esse valor e também serão pagas pelos consumidores. 
Os aumentos de até 29% concedidos nas últimas semanas para as tarifas de energia não têm relação com o acionamento das usinas térmicas. São aumentos de preços gerados pela desvalorização da taxa de câmbio dos últimos doze meses, que afeta a energia de Itaipu; e pelos contratos antigos das distribuidoras que foram substituídos por energia negociada em leilão de 2008, basicamente de térmicas. Substituiu-se, assim, contratos baratos do passado por outros mais caros. 
Adiciona-se a esse quadro geral do setor, o fato de os reservatórios chegarem ao fim de novembro deste ano - quando volta a chover - no nível mais baixo da história, deixando para 2015 o risco de racionamento. 
O modelo de exploração do petróleo do pré-sal, herança do governo Lula, ao substituir o regime de concessões pelo sistema de partilha - pelo qual a participação da Petrobras é de 30% em cada poço - criou um compromisso para a estatal incompatível com a política de preços determinada pelo governo federal. O Palácio do Planalto fez alguns ensaios de mudança na partilha que não vingaram. O futuro da Petrobras, hoje, é uma incógnita. A companhia, que chegou a ser cotada no mercado a R$ 472 bilhões em maio de 2008, hoje vale cerca de R$ 180 bilhões. 
Para os estudiosos da economia brasileira, porém, não basta só fazer de 2015 um ano de "ajustes" e de "transição" para melhores políticas fiscal, monetária e de preços, dentre outras. É preciso cuidar da política. Esgota-se o modelo do "presidencialismo de coalizão", calçado na aliança entre o governo e uma base aliada forjada em numerosos partidos fracos, pouco representativos, e sem um projeto coerente de política econômica. 

"Nova Matriz Economica": quatro anos perdidos e mais heranca maldita da politica economica companheira - Gustavo Loyola

Gustavo Loyola
O Estado de S.Paulo, 11/05/2014

Configura-se no horizonte o cenário de um quadriênio perdido para o Brasil. Relatório divulgado pela OCDE na semana passada trouxe uma revisão para pior das projeções da entidade para a economia brasileira no corrente ano, juntando-se às previsões igualmente pessimistas do FMI e dos analistas participantes da pesquisa Focus do Banco Central (BC). A expectativa da maioria é a de que o PIB cresça abaixo de 2% neste ano, com a inflação beirando o teto da banda de tolerância estabelecido no regime de metas (6,5%). Se tais prognósticos se confirmarem, o Brasil apresentará crescimento médio em torno de 2% e inflação ao redor de 6% ao ano, entre 2011 e 2014.

O quadriênio perdido é filho bastardo da "Nova Matriz Econômica" que pretendia impunemente combinar juros baixos, câmbio competitivo e afrouxamento fiscal. O tiro saiu pela culatra. O País cresce menos, sua indústria continua pouco competitiva, apesar da depreciação da moeda, e a inflação se mantém teimosamente elevada. A "Nova Matriz" gerou também perda de credibilidade na política econômica e prejuízos à imagem do País perante os investidores internacionais.

É verdade que, nos últimos meses, o governo deu sinais de recuo em relação ao seu projeto da "Nova Matriz". Não se veem mais discursos presidenciais sobre "juros baixos" e o Banco Central conseguiu promover uma elevação da taxa básica de 7,25% para 11% nos últimos 12 meses. As restrições cambiais fruto da veleidade do "câmbio competitivo" foram desmontadas e o BC luta agora para evitar que a depreciação excessiva do real jogue mais combustível na inflação. Todavia a gestão fiscal continua frouxa e dependente de receitas extraordinárias ou de jogadas contábeis.

Além dos problemas na esfera macroeconômica, a gestão microeconômica também deixa muito a desejar e igualmente dificulta o desempenho da economia. Numa situação de baixo desemprego como ora existente, o crescimento maior do PIB depende do aumento do investimento e da aceleração do crescimento da produtividade. Porém, a intervenção do governo na economia vem produzindo o resultado oposto. As regras do jogo ficaram opacas para os empresários e cada vez mais as decisões de investimento tornam-se dependentes de alguma prebenda do Estado. Ora são as linhas de crédito subsidiadas do BNDES, ora é um regime especial de tributação, ora é a proteção contra a importação do exterior. Tais vantagens, porém, não estão disponíveis para todos os empreendedores e mesmo seus beneficiários têm dúvidas sobre a sustentabilidade dessa política ao longo do tempo.

Por outro lado, acumularam ineficiências e distorções na economia. O regime tributário é cada vez mais disfuncional e custoso para os contribuintes. As exigências burocráticas se multiplicaram pela necessidade de "enquadramento" do contribuinte a cada um dos regimes especiais.

Além disso, a má gestão setorial trouxe à baila o risco de falta de energia elétrica. Obviamente, existe uma séria questão hidrológica, mas o melhor gerenciamento do modelo em vigor poderia ter minimizado o risco de apagão. A redução voluntariosa de 20% nas tarifas de energia no ano passado está custando caro, principalmente por causa do aumento das incertezas para os operadores atuais e potenciais do setor elétrico e pela ampliação da necessidade de subsídios fiscais. Vale lembrar que a miopia nessa questão não foi monopólio do governo, já que entidades empresariais como a Fiesp apoiaram demagogicamente a medida.

O setor de combustíveis também sofre com os equívocos acumulados. A Petrobrás vem arcando com os custos do artificialismo de preços no mercado doméstico, além de estar sobrecarregada pela necessidade de investir no pré-sal em razão do modelo de exploração adotado pelo governo.

Por tudo isso, não será boa a herança que Dilma deixará para o próximo governo. Ajustes fortes e dolorosos serão necessários para evitar mais quatro anos perdidos de baixo crescimento e alta inflação. O retorno pleno às políticas macroeconômicas responsáveis e ao realismo dos preços administrados afetará o crescimento em 2015. Porém, seria um primeiro e necessário passo para a retomada sustentável do crescimento a partir do ano seguinte.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Politica economica companheira: incompetencia com mentiras - Editorial Estadao

Confissão de incompetência

08 de maio de 2014 | 7h 08
Editorial O Estado de S.Paulo
A presidente Dilma Rousseff reuniu dez mulheres jornalistas para afirmar sua satisfação diante do pífio desempenho econômico do Brasil e sua incapacidade de imaginar um país com inflação menor e prosperidade maior. Não há problemas sérios e em 2015 "o Brasil vai é bombar", garantiu a presidente, como se os desajustes apontados por analistas da imprensa, de consultorias privadas, do setor financeiro e de entidades multilaterais fossem imaginários ou insignificantes.
Não se esperem, portanto, correções na política econômica, em caso de reeleição. Para começar, a tolerância à inflação será mantida, em nome de uma falsa defesa dos trabalhadores e dos brasileiros mais pobres.
"Faz uma meta de inflação de 3% e sabe o que isso significa? Significa desemprego lá pelos 8,2%. Eu quero ver como se mantêm o investimento social e o investimento público em logística com essa meta", desafiou a presidente. Ela poderia evitar essa imprudência se fosse um pouco mais informada e menos dependente de assessores incapazes.
Chile, Colômbia, Equador e Peru, para citar só uns poucos exemplos da vizinhança, têm crescido muito mais que o Brasil com inflação muito menor. No ano passado as taxas de expansão econômica desse grupo ficaram entre 4,2% e 5%. Neste ano devem ser pouco maiores. A menor inflação, de 1,9%, ocorreu na Colômbia. A maior, de 3%, no Chile. O desemprego na Colômbia, de 10,6%, foi o único muito acima da média latino-americana (6,3%). Ficou em 4,6% no Equador, 5,9% no Chile e 6% no Peru.
No Brasil, o dado oficial, repetido pelos organismos internacionais, apontou 5,5% de desocupação, pouco abaixo do nível registrado em países latino-americanos mais dinâmicos e com inflação bem menor. Mas será correto esse número, apurado em seis regiões metropolitanas? Outra pesquisa do IBGE, a Pnad Contínua, realizada em 3.500 municípios, apontou uma desocupação na faixa de 7%, superior à média da América Latina. Por uma extraordinária coincidência, aliados do governo tentaram interromper a divulgação de novos dados dessa pesquisa.
Mas a recusa da meta de 3% está muito longe de corresponder à defesa de uma inflação de 4,5%, a meta em vigor. A inflação acumulada em 12 meses tem ficado em torno de 6% e a presidente, assim como seu ministro da Fazenda, Guido Mantega, tem-se mostrado satisfeita com qualquer número até 6,5%, limite da margem de tolerância, impropriamente chamado de "teto da meta". Mas a meta é de 4,5% e nada, nos últimos anos, justificou resultados piores.
Na noite do jantar presidencial, o ministro Guido Mantega também rejeitou, em entrevista à TV Brasil, a redução da meta de inflação. Usou as desculpas de sempre, mencionando choques de preços, como se ocorressem apenas no Brasil. Pelo menos quanto a isso a presidente concordou com seu ministro. Mas ela o desmentiu, ao descartar a ideia de aumento de impostos para reforçar a política fiscal.
"Não sei em que circunstâncias ele falou", explicou a presidente. "Às vezes a gente escorrega em casca de banana." A fala seria mais convincente se ela contasse como seu governo alcançará a meta fiscal prometida para este ano e como se compensarão as perdas acumuladas por empresas do setor elétrico, prejudicadas pela contenção de tarifas imposta pelo governo.
A presidente insistiu em atribuir os problemas brasileiros à crise internacional e em bravatear, comparando o desempenho brasileiro com o de outros países. "Estamos nos saindo muito bem diante da conjuntura mundial." Esse discurso é velho e repetidamente superado pelos fatos. Foi desmentido, nos últimos anos, na comparação do pífio crescimento e da elevada inflação do Brasil com os números de outros países emergentes. Agora é desmentido também quando se compara o déficit nominal das contas públicas brasileiras com os dados dos países mais avançados. O déficit brasileiro tem aumentado e é hoje muito parecido com a média da zona do euro.
A presidente parece acreditar nas próprias palavras. Isso apenas reforça as previsões de tempos ainda muito ruins para a economia brasileira.

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Contas publicas: governo aprofunda a deterioracao, e a enganacao... (Editorial Estadao)

Novo malabarismo fiscal

05 de maio de 2014
Editorial O Estado de S.Paulo
Como ficaram evidentes as manobras de que o governo Dilma lançou mão até agora para alcançar resultados fiscais maquiados, mas próximos das metas prometidas, os responsáveis pelas finanças federais redescobriram velhos estratagemas. Estão retardando os repasses e os pagamentos devidos, inclusive da área social, para evitar que os números comprovem a persistente deterioração da política fiscal e ampliem a desconfiança com relação ao governo da presidente que busca avidamente a reeleição.
O governo já havia feito isso no fim do ano passado, quando, sem nenhum pudor, retardou os repasses do Sistema Único de Saúde (SUS) para Estados e municípios, necessários para o custeio da assistência médica à população. Agora, como mostrou reportagem do jornal O Globo (28/4), estendeu a prática para a Previdência Social, o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), o Bolsa Família e o programa Minha Casa, Minha Vida.
O objetivo é alcançar, por quaisquer meios, a meta de superávit primário, que, em fevereiro, foi revista para R$ 91,3 bilhões, ou 1,9% do PIB projetado para 2014 (era de 2,1% do PIB). A meta, porém, está se tornando cada vez mais distante, por causa da feroz resistência do governo aos cortes de despesas, das projeções superdimensionadas das receitas e subdimensionadas dos gastos e dos dispêndios adicionais em que o Tesouro incorrerá para corrigir graves erros do programa de redução da tarifa de energia elétrica anunciado pela presidente em 2012.
Os parâmetros utilizados para fixar essa meta são questionáveis, quando não inteiramente irreais. O déficit previsto do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) é de cerca de R$ 40 bilhões, resultado que, se alcançado, reverteria a tendência histórica de aumento do rombo (em 2013, foi de R$ 50 bilhões), sem que nenhuma nova medida tenha sido adotada para justificar tal redução.
O déficit artificialmente comprimido da Previdência foi incluído nos documentos que acompanham o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2015. Também no caso das despesas com seguro-desemprego e do abono salarial, as projeções que acompanham o projeto da LDO, de responsabilidade dos Ministérios da Fazenda e do Planejamento, são menores do que as previstas pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Os gastos com seguro-desemprego foram reduzidos de R$ 35,1 bilhões para R$ 27,7 bilhões e com abono salarial, de R$ 16,7 bilhões para R$ 15,2 bilhões.
Quanto mais distante a meta do superávit primário, maiores parecem ser o esforço e a criatividade da área financeira do governo na busca de artifícios para alcançá-la.
No caso da Previdência, de acordo com a reportagem citada, o governo negociou com o Conselho Nacional de Justiça o adiamento para novembro dos pagamentos de precatórios normalmente feitos em abril. O resultado só aparecerá em dezembro, depois da eleição presidencial. Também estão sendo retardados os repasses aos bancos para o pagamento de aposentadorias de até um salário mínimo. No Minha Casa, Minha Vida, os pagamentos às construtoras, antes liberados logo depois da medição, agora demoram até 30 dias.
Com o atraso de repasses, o FAT tornou-se devedor da Caixa Econômica Federal, responsável pelos pagamentos dos benefícios custeados pelo fundo. É um problema adicional para um fundo que, tendo registrado um rombo de R$ 10,3 bilhões no ano passado, precisará de aportes volumosos em 2014 e 2015 para equilibrar suas contas.
Segundo a reportagem mencionada, os pagamentos devidos, mas adiados já somam R$ 10 bilhões. A meta de superávit primário do governo federal é de R$ 80,8 bilhões (o restante compete a Estados e municípios). Mas essa meta foi montada sem levar em conta os R$ 10 bilhões das transferências adiadas, os prováveis R$ 10 bilhões a mais no déficit previdenciário e as despesas adicionais causadas pelos erros do programa de tarifas de energia, que podem somar dezenas de bilhões. Pode até ser alcançada, mas é enganosa.