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terça-feira, 1 de julho de 2014

Brasil, contas externas: deterioracao da balanca comercial - Banco Itau

A despeito da relativa melhoria no mês de junho, a tendência é preocupante.
Mais uma herança maldita?
Paulo Roberto de Almeida 

BRASIL - Balança comercial apresenta superávit em junho

O mês de junho teve superávit comercial de US$ 2,4 bilhões, abaixo das nossas expectativas e do consenso do mercado (US$ 2,9 bi e US$ 2,75 bi, respectivamente). As exportações somaram US$ 20,5 bi apresentando um crescimento de 1,2% frente a maio (após ajuste sazonal) e as importações somaram US$ 18,1 bi, mostrando um recuo de 2,6% frente a maio.
Em relação ao mesmo período do ano passado, controlando pelo número de dias úteis, houve recuo nas exportações (-3,2%) e nas importações (-3,8%). No primeiro semestre de 2014, a balança comercial acumula déficit de US$ 2,5 bilhões, ligeiramente inferior ao déficit de US$ 3,1 bilhões observado nos primeiros seis meses de 2013.
Nas exportações, o destaque positivo ficou por conta dos básicos que reverteram a tendência recente de queda e apresentaram crescimento de 9,5% na média diária em comparação com junho de 2013. Essa melhoria foi puxada pelas vendas de petróleo bruto, carne suína e bovina, soja (farelo e grão) e café. Os manufaturados, por sua vez, recuaram 19,3% em relação ao ano passado, com o destaque negativo sendo novamente nas vendas de automóveis de passageiros e autopeças cujo principal mercado é a Argentina. Os semimanufaturados também registraram novamente retração (-1,9%).
As importações ex-combustíveis recuaram 2,8% em relação a maio (com ajuste sazonal), revertendo a alta que havia sido observada no mês anterior, em um movimento consistente com a moderação da atividade econômica esperada no segundo trimestre desse ano. Após o ajuste sazonal, observou-se redução mensal das importações em quatro das cinco categorias de uso. As compras de bens de capital, bens intermediários, bens de consumo não duráveis e duráveis, recuaram 1,1%, 7,8%, 0,2% e 4%, respectivamente.
As importações de combustíveis e lubrificantes, por sua vez, somaram US$ 3,3 bilhões em junho, um aumento de 43,3% em relação ao mesmo período do ano passado. Ainda assim, parte do aumento das compras de combustíveis e derivados foi compensada pelo aumento das exportações de petróleo bruto. No mês o saldo comercial de petróleo bruto foi ligeiramente superavitário em US$ 59 milhões.
Em relação ao comércio com os principais parceiros, continua destacando-se a redução das exportações para a Argentina que no primeiro semestre já recuaram 20% em relação ao mesmo período de 2013. As exportações para os Estados Unidos e para a China, por outro lado, vem compensando parte dessas perdas e avançaram no ano 10,5% e 4%, respectivamente.
Em suma, o saldo comercial de junho, apesar de um pouco abaixo das expectativas, mostrou melhora em relação aos meses anteriores. As exportações continuam em queda em comparação com 2013, mas a redução das importações compensou parte dessa retração. Esperamos resultado ligeiramente superavitário na balança comercial em 2014.

Julia Gottlieb
Economista

domingo, 11 de maio de 2014

Politica economica companheira: deterioracao das contas fiscais - Ribamar Oliveira (Valor)

Não há mais "gordura" para queimar na área fiscal

Ribamar Oliveira | Brasília
Valor Econômico, 02/05/2014
Brasil

Como os treinadores de futebol, que lutam para acumular pontos no início de um campeonato, os governos também costumam fazer superávit primário mais elevado no início do ano, pois as despesas são maiores no segundo semestre. Em ambos os casos, a ideia é fazer uma "gordura" no início para poder queimar quando as dificuldades aparecerem. O governo não está adotando essa estratégica neste ano. 
Alguns podem lembrar que isso também não ocorreu em 2013. É verdade. Mas, no ano passado houve um componente atípico, pois 57,6% do superávit primário do governo central (Tesouro, Previdência e BC) foram feitos nos meses de novembro e dezembro. Nos últimos dois meses de 2013, o governo obteve receita extraordinária superior a R$ 35 bilhões e, com isso, garantiu a meta de superávit primário. Sem essa receita extra, a meta não teria sido cumprida. 
Não há notícia de que uma receita extraordinária na dimensão da ocorrida no ano passado vá ingressar nos cofres do Tesouro Nacional em novembro e dezembro deste ano. Por essa razão, seria prudente que o governo federal fizesse um superávit primário mensal médio maior do que fez em 2013. Mas o que está acontecendo é o oposto. 
No primeiro trimestre de 2014, o superávit do governo central foi de apenas R$ 12,3 bilhões ou 1,02% do Produto Interno Bruto (PIB) do período - é o menor da série histórica desde 1999, em proporção do PIB. No ano passado, o superávit acumulado de janeiro a março ficou em R$ 20 bilhões, ou 1,79% do PIB e, em 2012, em R$ 33 bilhões ou 3,22% do PIB. 
São os Estados e municípios que estão sustentando, até agora, um nível mínimo para a meta fiscal. De janeiro a março, eles acumularam um superávit de R$ 13,2 bilhões, ou 1,09% do PIB do período. Mesmo com esse excelente resultado, o superávit primário de todo o setor público acumulado no primeiro trimestre ficou em 2,12% do PIB - o menor para o primeiro trimestre do ano em todo o governo da presidente Dilma Rousseff. 
Em março, no entanto, o resultado de Estados e municípios começou a fraquejar, quando eles registraram um superávit de apenas R$ 482 milhões (sem considerar suas estatais), o menor para o mês desde 2000. 
Em janeiro e fevereiro, o superávit dos governos estaduais e das prefeituras bateu recorde por causa das grandes transferências de recursos feitas pela União nesses dois meses. Parte dessa receita transferida era devida em 2013 e foi postergada para 2014, como é o caso do auxílio financeiro decorrente da chamada Lei Kandir e a quantia devida a eles pela arrecadação extraordinária do parcelamento de débitos tributários, que ingressou nos cofres do Tesouro em novembro e dezembro. 

A meta fiscal do governo central no primeiro quadrimestre deste ano é de R$ 28 bilhões. Para obtê-la, o governo central terá que fazer um superávit primário de R$ 15,7 bilhões em abril, ou seja, um resultado maior do que o registrado no acumulado dos primeiros três meses do ano. É possível que isso ocorra, pois abril é um mês em que se registra uma receita muito forte do Imposto de Renda. 
Há também, no entanto, despesas extraordinárias, que não ocorreram no ano passado, como a transferência de recursos do Tesouro para a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e um repasse de R$ 1,5 bilhão para os municípios, que foi acertado no ano passado pela presidente Dilma. Neste último caso, o repasse é uma despesa para a União, mas ajudará a melhorar o superávit de Estados e municípios. 
Os números fiscais mostram que o governo está operando no limite, na linha d'água. Não há "gordura" para queimar e qualquer dificuldade adicional do lado das despesas, ou uma frustração maior da receita, poderá comprometer a meta fiscal deste ano. 
O problema maior é que a receita tributária está crescendo em ritmo mais lento do que o projetado pelo governo. De janeiro a março, a arrecadação de impostos aumentou apenas 7%, em termos nominais, em comparação com igual período de 2013. A receita de contribuições cresceu menos, apenas 6,3%. A previsão oficial é de crescimento de 8,3% da receita com impostos e contribuições neste ano. 

Para piorar o quadro, os gastos públicos estão aumentando em ritmo superior ao do crescimento da economia. No primeiro trimestre deste ano, as despesas do Tesouro aumentaram 10,8% acima da variação nominal do PIB, na comparação com o mesmo período de 2013, segundo a Secretaria do Tesouro Nacional. 

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Contas publicas: governo aprofunda a deterioracao, e a enganacao... (Editorial Estadao)

Novo malabarismo fiscal

05 de maio de 2014
Editorial O Estado de S.Paulo
Como ficaram evidentes as manobras de que o governo Dilma lançou mão até agora para alcançar resultados fiscais maquiados, mas próximos das metas prometidas, os responsáveis pelas finanças federais redescobriram velhos estratagemas. Estão retardando os repasses e os pagamentos devidos, inclusive da área social, para evitar que os números comprovem a persistente deterioração da política fiscal e ampliem a desconfiança com relação ao governo da presidente que busca avidamente a reeleição.
O governo já havia feito isso no fim do ano passado, quando, sem nenhum pudor, retardou os repasses do Sistema Único de Saúde (SUS) para Estados e municípios, necessários para o custeio da assistência médica à população. Agora, como mostrou reportagem do jornal O Globo (28/4), estendeu a prática para a Previdência Social, o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), o Bolsa Família e o programa Minha Casa, Minha Vida.
O objetivo é alcançar, por quaisquer meios, a meta de superávit primário, que, em fevereiro, foi revista para R$ 91,3 bilhões, ou 1,9% do PIB projetado para 2014 (era de 2,1% do PIB). A meta, porém, está se tornando cada vez mais distante, por causa da feroz resistência do governo aos cortes de despesas, das projeções superdimensionadas das receitas e subdimensionadas dos gastos e dos dispêndios adicionais em que o Tesouro incorrerá para corrigir graves erros do programa de redução da tarifa de energia elétrica anunciado pela presidente em 2012.
Os parâmetros utilizados para fixar essa meta são questionáveis, quando não inteiramente irreais. O déficit previsto do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) é de cerca de R$ 40 bilhões, resultado que, se alcançado, reverteria a tendência histórica de aumento do rombo (em 2013, foi de R$ 50 bilhões), sem que nenhuma nova medida tenha sido adotada para justificar tal redução.
O déficit artificialmente comprimido da Previdência foi incluído nos documentos que acompanham o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2015. Também no caso das despesas com seguro-desemprego e do abono salarial, as projeções que acompanham o projeto da LDO, de responsabilidade dos Ministérios da Fazenda e do Planejamento, são menores do que as previstas pelo Ministério do Trabalho e Emprego. Os gastos com seguro-desemprego foram reduzidos de R$ 35,1 bilhões para R$ 27,7 bilhões e com abono salarial, de R$ 16,7 bilhões para R$ 15,2 bilhões.
Quanto mais distante a meta do superávit primário, maiores parecem ser o esforço e a criatividade da área financeira do governo na busca de artifícios para alcançá-la.
No caso da Previdência, de acordo com a reportagem citada, o governo negociou com o Conselho Nacional de Justiça o adiamento para novembro dos pagamentos de precatórios normalmente feitos em abril. O resultado só aparecerá em dezembro, depois da eleição presidencial. Também estão sendo retardados os repasses aos bancos para o pagamento de aposentadorias de até um salário mínimo. No Minha Casa, Minha Vida, os pagamentos às construtoras, antes liberados logo depois da medição, agora demoram até 30 dias.
Com o atraso de repasses, o FAT tornou-se devedor da Caixa Econômica Federal, responsável pelos pagamentos dos benefícios custeados pelo fundo. É um problema adicional para um fundo que, tendo registrado um rombo de R$ 10,3 bilhões no ano passado, precisará de aportes volumosos em 2014 e 2015 para equilibrar suas contas.
Segundo a reportagem mencionada, os pagamentos devidos, mas adiados já somam R$ 10 bilhões. A meta de superávit primário do governo federal é de R$ 80,8 bilhões (o restante compete a Estados e municípios). Mas essa meta foi montada sem levar em conta os R$ 10 bilhões das transferências adiadas, os prováveis R$ 10 bilhões a mais no déficit previdenciário e as despesas adicionais causadas pelos erros do programa de tarifas de energia, que podem somar dezenas de bilhões. Pode até ser alcançada, mas é enganosa.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Politica economica: governo toma choque de realidade com relatorio do FED - Editorial Estadao

O Fed e as fraquezas do Brasil

13 de fevereiro de 2014 | 2h 11
Editorial O Estado de S.Paulo
Verdadeira ou falsa, a imagem do Brasil como um dos emergentes mais vulneráveis à turbulência econômica internacional foi autenticada pelo banco central mais poderoso do mundo, o Federal Reserve (Fed), dos Estados Unidos. A vulnerabilidade brasileira, classificada como só inferior à da Turquia, foi exposta sem atenuantes no relatório semestral de política monetária entregue na terça-feira ao Congresso americano. A entrega coincidiu com o primeiro depoimento da nova presidente do Fed, Janet Yellen, perante a Comissão de Serviços Financeiros da Câmara dos Representantes. Na parte sobre a política do Fed, o discurso e o relatório funcionaram como calmantes para os mercados. O Fed continuará apoiando a recuperação econômica e a elevação do emprego e os estímulos serão retirados, como até agora, gradualmente e com base nos indicadores de atividade, prometeu Yellen. No essencial, foi uma repetição das falas do antecessor, Ben Bernanke. Em todo o mundo a reação a esse anúncio foi muito boa - muito melhor que a reação de Brasília aos comentários sobre a situação brasileira.
O comitê responsável pela moeda e pelo crédito, assegurou a nova chefe do Fed, permanecerá empenhado em cumprir o duplo mandato da instituição - cuidar da inflação, por enquanto muito baixa, e buscar ao mesmo tempo o maior nível de emprego compatível com a estabilidade geral dos preços. Os juros, nesse quadro, devem permanecer próximos de zero ainda por longo tempo, depois de abandonada a injeção mensal de dinheiro nos mercados. A primeira redução, no começo do ano, foi de US$ 85 bilhões para US$ 75 bilhões. A segunda, anunciada há poucos dias, diminuirá o volume para US$ 65 bilhões. As seguintes dependerão de novos dados sobre a economia.
O relatório semestral do Fed contém análises do quadro americano e do cenário global e uma prestação de contas da política adotada e de seus efeitos. Desde quando Bernanke anunciou, no ano passado, o plano de redução dos estímulos, investidores e especuladores em todo o mundo tentaram ajustar-se às mudanças previstas. A expectativa de uma oferta menos ampla de dólares mexeu com os fluxos de capitais em todo o mundo e valorizou a moeda americana.
Alguns países foram especialmente atingidos e a desvalorização de suas moedas foi mais acentuada. No balanço apresentado no relatório do Fed, o Brasil foi um dos mais severamente afetados nas duas fases da turbulência - logo depois de anunciado o plano de mudança, no ano passado, e no início de 2014, quando começou de fato a redução dos estímulos.
A avaliação apresentada no documento foi baseada em um índice composto de seis variáveis. O saldo em conta corrente, a dívida pública, a evolução do crédito ao setor privado nos últimos cinco anos e o volume de reservas são apresentados como porcentagens do Produto Interno Bruto (PIB). A dívida externa é comparada com as exportações. Além disso, considera-se a inflação nos últimos três anos. A análise mostra uma relação entre as maiores desvalorizações e os piores índices de vulnerabilidade calculados a partir daqueles elementos.
Não se trata de uma avaliação baseada em vagas impressões ou em critérios estritamente subjetivos. A fragilidade do Brasil é perceptível sem muito esforço em vários desses indicadores, como a rápida expansão do crédito, o aumento da dívida pública bruta e a inflação acima dos padrões internacionais. Os autores do estudo citaram medidas tomadas em vários países a partir do ano passado, como a elevação dos juros e a adoção de reformas. Isso enfraquece os argumentos da direção do Banco Central do Brasil em reclamação dirigida ao pessoal do Fed.
Mesmo com alguma possível injustiça, a avaliação contida no relatório pode produzir efeitos e, além disso, coincide com a opinião de operadores do mercado e de especialistas em análise de risco de crédito. Por seus muitos desacertos e por seu voluntarismo, o governo brasileiro comprometeu sua credibilidade e expôs o País ao risco de julgamentos como o dos técnicos do Fed. Não adianta reclamar. A imagem só será melhorada com medidas sérias e com a reconquista da credibilidade.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

As transacoes correntes e a deterioracao do balanco de pagamentos - Ilan Goldfajn

Medidas e anúncios na virada do ano

07 de janeiro de 2014 | 2h 06

Ilan Goldfajn* - O Estado de S.Paulo
Medidas econômicas às vezes têm alma. O momento e a forma como são apresentadas transmitem sinais que vão além do escrito. Sinalizam as motivações e os receios do governo, fatores fundamentais para moldar as expectativas sobre a direção da política econômica que afetam as tão importantes decisões econômicas (investimento, consumo, etc.). Nem sempre o sinalizado vai na direção do pretendido. Nesta virada do ano testemunhamos dois anúncios: a elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para pagamentos e saques no exterior e a antecipação do resultado fiscal do governo central em 2013. O primeiro sinalizou escassez de dólares (sem que estejam de fato faltando) e o segundo, preocupação com a imagem da política fiscal.
Na sexta-feira 27 de dezembro, à noite, o governo encareceu as viagens internacionais dos brasileiros. Aumentou a alíquota do IOF de 0,38% para 6,38% para gastos em cartões de débito e pré-pagos, para saques de dinheiro no exterior e para cheques de viagem. O imposto sobre gastos em cartões de crédito já havia sido elevado antes. Vários turistas foram apanhados de surpresa nesse período do ano. Alguns se apressaram a trocar dinheiro por dólares antes de viajar para evitar o custo extra (não pagar alíquota total, nesse caso). Houve até falta temporária de dólares à vista para alguns viajantes. Sinalizou-se a intenção de diminuir os gastos dos turistas por meio de aumento de impostos. E, também, a preocupação com a piora do déficit externo do Brasil. Mas qual é a situação do déficit externo do País? Qual o papel dos gastos no exterior?
Medido pela conta corrente do balanço de pagamentos, o déficit somou US$ 81,1 bilhões, equivalentes a 3,7% do PIB, nos últimos 12 meses. Esse déficit tem aumentando nos últimos anos. Em 2012 o déficit foi de 2,4% e em 2011, de 2,1% (há menos de dez anos o saldo em conta corrente era positivo).
Um déficit entre 3,5% e 4% do PIB é de fato desconfortável, já que mostra nosso excesso de gastos em relação ao montante produzido localmente, que precisa ser financiado. Mas esse montante está longe de valores que internacionalmente estão necessariamente associados a crises cambiais. O problema é a piora nos últimos anos. Quais itens foram responsáveis pelo aumento do déficit?
Uma boa parte desse aumento foi resultado da queda do superávit da balança comercial (exportações menos importações), que passou de US$ 30 bilhões em 2011 para US$ 2,6 bilhões no ano passado. Um dos itens mais relevantes para a piora foi a queda do saldo comercial de petróleo e derivados em razão das dificuldades de oferta nesse setor. Parte dessa queda do saldo no setor será revertida, por ter caráter temporário (interrupções, adiantamentos).
Mas não foi só a balança comercial que piorou, já que houve aumento no déficit da balança de serviços e rendas (viagens internacionais, aluguéis, juros, lucros, dividendos). O déficit de serviços aumentou de US$ 38 bilhões em 2011 para US$ 48 bilhões nos últimos 12 meses terminados em novembro. Especificamente, os gastos dos brasileiros no exterior aumentaram de US$ 21,3 bilhões em 2011 para US$ 25,1 bilhões nos últimos 12 meses, quase US$ 4 bilhões a mais. É um aumento considerável, em menos de dois anos, embora não represente o grosso da piora da conta corrente.
À medida que aumenta, o IOF não deve alterar a dinâmica da conta corrente. Esta vai depender, de forma geral, de uma combinação de ajustes nos gastos (via políticas monetária e fiscal), da depreciação cambial (parte já ocorrida) e, principalmente, de medidas e reformas que aumentem a produtividade no Brasil, para torná-lo mais competitivo. No médio e no longo prazos, a abertura de mercados por meio de acordos comerciais será essencial.
O simbolismo de uma medida que atua nos sintomas (turistas comprando no exterior) pode dar a impressão de que os fundamentos não estão recebendo a atenção devida. Pode passar a ideia de que o problema atual é de perda de reservas, que requer medidas de controle cambial, pois interfere no cotidiano das pessoas. O problema é que, para alguns, a medida lembra, em escala e situação econômicas completamente distintas, as adotadas na Argentina, onde a perda de reservas já levou a alíquota do imposto sobre gasto no exterior a atingir 35%.
Mas não há falta de dólares no Brasil, já que as reservas cambiais alcançam US$ 376 bilhões. A intervenção do Banco Central no mercado de câmbio tem-se concentrado no mercado de derivativos, evidenciando que as pressões atuais não vêm da demanda para saques e remessas de dólares.
Uma das medidas que poderiam atacar o fundamento da piora das contas externas seria uma política fiscal mais restritiva, que simultaneamente reduzisse o excesso de gastos e facilitasse o financiamento externo pelo ganho de credibilidade. Nesse sentido, o anúncio do resultado fiscal de sexta-feira poderia passar esse sinal, principalmente por causa do cumprimento da meta do governo central.
O problema é que o cumprimento da meta do governo central não muda a tendência de queda do resultado do superávit primário consolidado, que deve ficar abaixo de 2% do PIB no ano passado. O resultado fiscal recorrente ainda é menor, dado que quase 1% a 1,2% do PIB do resultado veio de receitas extraordinárias.
O anúncio do cumprimento da meta foi antecipado em quase um mês para adiantar o bom resultado e melhorar as expectativas. Indica preocupação com a imagem da política fiscal e mostra desejo de ganhar credibilidade com a antecipação.
Tanto o aumento da alíquota do IOF quanto a antecipação do resultado fiscal mostram que o governo está corretamente preocupado com o desenrolar das contas externas e fiscais e com a necessidade de transmitir uma melhora futura. Mas é preciso adicionar medidas concretas que venham a alterar os fundamentos da dinâmica recente.
*Ilan Goldfajn é economista-chefe e sócio do Itaú. 

sábado, 1 de junho de 2013

O Brasil a caminho de uma crise fiscal...

Quanto antes ela chegar, melhor, pois permitiria que o governo corrigisse as orientações de política econômica antes da crise de transações correntes, que também se avizinha...
Paulo Roberto de Almeida

Déficit público vai a R$ 132,2 bilhões e é o segundo pior da história

Eduardo Cucolo e Adriana Fernandes


O Estado de S.Paulo, 31 de maio de 2013

A combinação de aumento de gastos, arrecadação em baixa e inflação em alta elevou o déficit público para R$ 132,2 bilhões nos 12 meses encerrados em abril. É o segundo pior valor das estatísticas do Banco Central.
Esse déficit, chamado nominal, é o que faltou para zerar a diferença entre a conta de juros, que foi de R$ 218 bilhões no mesmo período, e o dinheiro economizado por União, Estados e municípios para pagar a dívida pública - o chamado superávit primário, que ficou em R$ 85,8 bilhões.
Mesmo com a redução da taxa básica de juros (Selic) iniciada em 2011, os gastos com juros da dívida pública se mantiveram praticamente estáveis. Isso porque alguns títulos que compõem o endividamento são antigos e foram emitidos com taxas elevadas. Além disso, há papéis cujo valor é corrigido conforme a inflação, que tem se mantido alta desde 2010.
Ao mesmo tempo, o superávit primário continua em trajetória de queda, por causa da atividade mais fraca da economia e das medidas de aumento de gastos e redução tributária para alguns setores. Em 2013, a economia do setor público deve ficar novamente abaixo de 3,2% do Produto Interno Bruto (PIB), nível que serviu de meta nos últimos anos.
Nos 12 meses encerrados em abril, por exemplo, a economia é de 1,89% do PIB e as previsões do mercado são de queda para um nível ainda menor neste ano. Nas estatísticas do BC, porcentuais abaixo disso só foram registrados no segundo semestre de 2009, em plena crise.
Segundo o BC, o superávit primário tem mostrado tendência de baixa este ano. No primeiro quadrimestre, a economia do setor público recuou 32% ante o mesmo período de 2012, para R$ 41 bilhões. Os gastos com juros praticamente dobraram, com valor recorde de R$ 80,3 bilhões. Com isso, o déficit das contas públicas somou R$ 39,2 bilhões entre janeiro e abril, também o maior valor da série histórica iniciada em 2001.
O chefe adjunto do Departamento Econômico do BC, Fernando Rocha, afirmou que a trajetória do superávit primário no ano é de redução e destacou que a economia feita em abril, de R$ 10,3 bilhões, é o pior resultado para o mês desde 2004. Sazonalmente, abril é um mês de resultados bons, pois é um período de ingresso de receitas com Imposto de Renda (IR), pessoa física e jurídica.
Questionado sobre a piora nas contas públicas, afirmou que esse é um indicador que está fora da área de controle do BC, que é responsável apenas por medir o resultado. Na semana passada, o presidente da instituição, Alexandre Tombini, afirmou que o a política fiscal hoje é expansionista, ou seja, funciona neste momento como estímulo à demanda.
Antes da crise de 2008, o bom momento da economia levou o déficit público ao menor nível da história, 1,35% do PIB para um período de 12 meses. Hoje, o rombo nas contas de União, Estados e municípios está em 2,92% do PIB. Para Felipe Salto, da consultoria Tendências, a deterioração observada nos números do setor público soma-se à piora nas contas externas do País, que também apresentam déficit próximo de 3% do PIB.
"Os resultados fiscais e de contas externas do primeiro quadrimestre, portanto, são negativos para o cenário de crescimento e apontam para a redução das possibilidades de variações reais minimamente elevadas para a atividade econômica doméstica a médio prazo. Dificilmente, será possível levar à frente um modelo que se baseou, de maneira equivocada, em expansão do crédito e do consumo doméstico (público e privado)."
Dívida
O superávit primário menor também contribuiu para interromper o processo de queda da dívida líquida do setor público, que atingiu o menor nível da história recente em maio do ano passado (35% do PIB) e vem se mantendo desde então acima. O BC estima, no entanto, que o indicador tenha fechado maio de 2013 com novo recorde de baixa, queda provocada pela alta do dólar no mês, o que puxa a dívida líquida para baixo.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Improvisacao e enganacao companheira chega ao nucleo da politica economica - Editorial Estadao

Desde a transição de Palocci a Mantega -- e aqui junto com a ministra, depois presidentA -- verifica-se uma nítida deterioração da qualidade da política econômica.
Na verdade, devemos falar é das consequências econômicas de Mister Lula, pois o que se fez depois foi apenas acrescentar um pouco mais de incompetência ao que era pura improvisação no segundo mandato do falastrão.
As consequências, como diria um filósofo, sempre vem depois...
Paulo Roberto de Almeida


Déficit de competência

02 de maio de 2013 | 2h 05
Editorial O Estado de S.Paulo
As estropiadas contas do governo continuam ladeira abaixo, afetadas severamente pela crise cada vez mais grave - não a internacional, mas a crise de seriedade e competência da administração federal brasileira. Os resultados de março e o acumulado no ano foram os piores para o mês e para o trimestre desde 2010.
Ao divulgar os últimos números do setor público consolidado, o chefe do Departamento Econômico do Banco Central (BC), Túlio Maciel, recorreu a uma explicação generosa. Segundo ele, a arrecadação mais fraca reflete principalmente dois fatores. O primeiro é a redução de impostos e contribuições concedida a setores selecionados. O segundo é a defasagem entre a recuperação da atividade e a melhora da receita.
A referência à desoneração de tributos poderia tornar o cenário menos feio, se a renúncia fiscal, superior a R$ 40 bilhões em 2012, tivesse produzido algum benefício significativo. Mas o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu só 0,9% e o investimento produtivo encolheu 4% no ano passado.
De janeiro a março, o superávit primário, a economia destinada ao pagamento de juros, ficou em 2,72% do PIB. Um ano antes, havia chegado a 4,45%. O acumulado em 12 meses diminuiu de 2,46% em janeiro para 2,16% em fevereiro e 1,99% no mês seguinte. A meta oficial, de 3,1%, já está praticamente descartada, porque o governo deverá descontar, segundo anunciou, as desonerações e os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Há um vínculo entre a piora das contas públicas e o baixo ritmo de crescimento da economia, mas a relação é muito diferente daquela apontada por funcionários do governo. São fenômenos irmãos, porque um e outro resultam de erros da política econômica.
A presidente Dilma Rousseff aponta o corte dos juros como grande realização. No primeiro trimestre de 2011, antes da redução, o governo central gastou com juros o equivalente a 4,25% do PIB. De janeiro a março do ano passado, 4,86%. No primeiro trimestre deste ano, 4,24%. Onde está o ganho?
Quando se adicionam os juros ao resultado primário, chega-se ao resultado global. Um buraco de 2,79% do PIB foi o saldo geral do setor público no primeiro trimestre deste ano, maior que o de um ano antes (1,26%) e que o de janeiro a março de 2011 (2,05%).
Juros altos, como se comprovou, estão longe de ser, ao contrário das alegações do governo, o grande problema das finanças públicas brasileiras. Os defensores da tese governista menosprezam ou desconhecem alguns fatos simples e importantes.
A política fiscal tem sido expansionista, como lembrou mais uma vez o economista Túlio Maciel, do Banco Central. Além disso, o governo tem continuado a endividar-se. A dívida bruta cresceu 12,5% em 12 meses.
Números do governo central, divulgados no dia anterior, haviam mais uma vez comprovado a expansão dos gastos. De janeiro a março, a receita total foi 3,9% maior que a de um ano antes, enquanto a despesa foi 11,5% superior à de janeiro a março de 2012. A Previdência arrecadou 8,8% mais que nos primeiros três meses do ano passado, mas gastou com benefícios 14,3% mais que em igual período de um ano antes.
O aumento do investimento em relação ao primeiro trimestre do ano passado ficou em 7,4%, enquanto as despesas totais do Tesouro aumentaram 9,7%. A elevação do dispêndio, portanto, foi puxada principalmente pelo custeio. Além disso, boa parte do valor contabilizado como investimento corresponde a desembolsos para programas habitacionais.
Mesmo com alguma reativação econômica, o estado geral das contas públicas deverá continuar precário. A gastança e as desonerações - até agora mal planejadas e com resultados quase nulos para a economia - devem continuar, segundo informou o secretário do Tesouro, Arno Augustin.
É fácil prever o resultado. O potencial de crescimento continuará muito limitado e as finanças públicas serão sacrificadas por incompetência e demagogia eleitoreira.

domingo, 28 de abril de 2013

Deterioracao na frente externa por razoes eminentemente internas

Exportação ameaçada pela má qualidade dos serviços
Editorial econômico O Estado de S.Paulo, 28 de abril de 2013

Duas notícias recentes deram um sinal de alarme sobre as exportações brasileiras: a recusa do governo chinês ao desembarque da soja de um navio proveniente do Brasil, por considerar excessivo o custo do transporte; e a forte queda das exportações de bens manufaturados.

O governo chinês considera que o frete, incluindo o ferroviário, as despesas rodoviárias e portuárias, mais o custo do transporte marítimo tornam o preço da soja brasileira mais alto que o dos concorrentes. E queixa-se dos atrasos constantes na chegada dos navios. Como o Brasil tornou-se o maior fornecedor de soja para a China, é possível que os chineses busquem um pretexto para reduzir os contratos de importação, numa fase em que sua economia cresce menos. Mas é essencialmente a soja brasileira que recusam.

Por ora, o problema é pontual, mas pode se generalizar. Diante disso, o governo brasileiro pôs em marcha um grande número de novos projetos, o que não nos parece uma abordagem feliz do problema. Melhor seria concentrar esforços numa só ferrovia e num só frete, escolhendo os meios que melhor respondam às necessidades geográficas e aos clientes mais importantes - no caso, a China, que importa soja e minério de ferro. Caberia, também, estimular importações provenientes, por exemplo, do Japão, aproveitando o frete de retorno, a custos reduzidos.

O problema da queda das exportações de manufaturados não é novo. Decorre da política de estímulo ao consumo doméstico, ao qual se acrescentou uma taxa de câmbio até há pouco muito valorizada. Não estamos seguros de que a taxa de câmbio tenha encontrado o seu valor real, dada a deterioração das perspectivas das contas correntes. Os dois fatores estimularam os produtores locais a recorrer às importações de componentes, mais baratos que os produzidos no Brasil, iniciando um processo de desindustrialização que nos afasta do comércio internacional.

Reconquistar o mercado externo não será fácil. A indústria terá de oferecer produtos com grande carga inovadora. O governo teria de assumir um papel mais importante no financiamento da pesquisa e da inovação, para que não predomine a exportação de commodities, cujos preços estão fora da nossa alçada, dependem do mercado internacional e de São Pedro, que pode oferecer chuva ou seca para a produção agrícola.

Será, ainda, indispensável um grande e rápido esforço para recuperar e melhorar a infraestrutura logística.




terça-feira, 2 de abril de 2013

O grande desmanche do saldo comercial, a unica taboa de salvacao do governo...

Informações objetivas, de 2/04/2013 (pós dia da mentira, portanto), graças a meu amigo Luiz Gonzaga Coelho Jr.

O Estado de S. Paulo - Balança tem pior março em 12 anos e alarma governo
 A balança comercial teve saldo positivo de US$ 164 milhões em março, pior resultado desde 2001 para o mês. No trimestre, há um déficit de US$ 5,15 bilhões, também o pior em 12 anos. Os resultados acenderam a luz amarela no governo, e técnicos do Ministério da Fazenda veem risco de superávit inferior a US$ 10 bilhões neste ano. 

Balança comercial tem pior resultado em 12 anos e preocupa o governo. Brasil tem déficit de US$ 5,1 bi no primeiro trimestre e técnicos da Fazenda já veem risco de saldo ticar abaixo de US$ 10 bi este ano.  
Adriana Fernandes e Renata Veríssimo, de Brasília e Fernando Dantas, do Rio
A balança comercial fechou março com saldo positivo de US$ 164 milhões, pior resultado para o mês desde 2001. As exportações foram de US$ 19,323 bilhões, e as importações de US$ 19,159 bilhões. No trimestre, há um déficit de US$ 5,150 bilhões, o o primeiro resultado negativo desde 2001. Esses resultados acenderam a luz amarela no governo, e técnicos do Ministério da Fazenda já veem risco de superávit comercial inferior a US$10 bilhões este ano. No primeiro trimestre, as exportações brasileiras, que acumularam US$ 50,839 bilhões, apresentam retração de 3,1% em relação a igual período de 2012. 
As causas apontadas para a queda do superávit comercial são a crise internacional (que reduz a demanda por exportações), a baixa competitividade dos produtos manufaturados brasileiros e o câmbio um pouco mais valorizado do que 110 fim do ano passado. A área técnica do governo está decepcionada pelo fato de que o câmbio mais desvalorizado no ano passado e o juro mais baixo não tenham impulsionado mais as exportações. A constatação agora é de que pouco pode ser feito para garantir uma melhora da balança comercial, principalmente porque o cenário externo está marcado por muitas incertezas e a economia global segue com crescimento baixo. Por outro lado, as medidas de aumento da produtividade devem demorar a surtir efeito. 
A piora da balança comercial faz parte de um quadro mais amplo de deterioração das contas externas, o que representa mais um problema para a equipe econômica, já às voltas com a inflação e o baixo crescimento. O déficit em conta corrente, que, além da balança comercial, inclui serviços, juros, dividendos e remessas, saiu de 2,12% do PIB em 2011 para 2,79% nos 12 meses até fevereiro de 2013. Para um ex-diretor do Banco Central (BC), "o déficit em conta corrente está abrindo e vai abrir ainda mais - se a economia ganhar fôlego, ele vai para 3,5%, 4% do PIB". Revisão. O BC reviu de US$ 17 bilhões para US$ 15 bilhões o superávit da balança comercial este ano. Já a previsão dos analistas financeiros, coletadas pela pesquisa Focus do BC, aponta um superávit de US$ 13 bilhões. 
A previsão deve cair mais. "Já era para a balança ter melhorado em fevereiro e março", alerta o ex-secretário de Comércio Exterior do Ministério de Desenvolvimento, Welber Barral. Ele prevê saldo comercial de apenas US$ 4 bilhões em 2013. Barral acha que os preços das commodities exportadas pelo Brasil devem melhorar em abril, mas a perspectiva para os manufaturados está cada vez pior. A balança comercial de petróleo, diz, terá déficit muito alto nos próximos anos. "No médio prazo, há o risco de o Brasil ter um déficit estrutural." Para o economista José Roberto Mendonça de Barros, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, o problema está na oferta. "Como passamos anos sem lidar com isso, o problema ficou sistêmico. Não tem bala de prata, solução rápida, porque melhorar a competitividade é trabalho para cinco anos", destaca, citando a alta dos custos trabalhistas e as filas nos portos. Mendonça de Barros nota que a pressão inflacionária impôs um limite para o governo usar a taxa de câmbio para ajudar as exportações. "Teria quer ser uma taxa de R$ 2,20 e R$ 2,25, mas aí a inflação fica impossível", diz. 
Investimento. Segundo o economista Samuel Pessoa, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, no Rio, "há uma piora inequívoca das transações correntes". Um problema adicional é que a qualidade do financiamento do déficit também piorou no primeiro bimestre de 2013, com menor proporção sendo bancada pelo investimento direto externo (IED), em produção. Em janeiro e fevereiro deste ano, o déficit atingiu US$ 18 bilhões, e o investimento, de US$ 7,5 bilhões, só financiou 42% do saldo negativo da conta corrente. O resto foi coberto com investimentos em carteira (aquisição de ações e títulos de renda fixa brasileiros) e "outros investimentos", uma rubrica variada, na qual entram linhas ligadas ao comércio internacional. Em comparação, nos dois primeiros meses de 2012, o déficit em conta corrente de US$ 8,8 bilhões foi coberto pelos investimentos de US$ 9,1 bilhões. Pessôa diz que o aumento do I déficit em conta corrente tem a ver com o aquecimento do consumo no Brasil, que reduz a poupança doméstica para financiar investimentos. Assim, parte do investimento acaba sendo financiado com poupança externa. "O mais preocupante é que o déficit esteja aumentando e o investimento caindo - isto significa que a poupança (doméstica) está caindo mais que o investimento", diz. 
Para Pessôa, o aumento do déficit externo para financiar um consumo crescente, com queda do investimento, "é uma combinação ruim". Os analistas em geral, incluindo Pessoa, não veem uma situação de alarme em relação às contas externas do Brasil, que tem reservas internacionais de US$ 376,4 bilhões. Ainda assim, a piora na posição externa do Brasil é vista como um problema de médio e longo prazo. Uma preocupação é com a possível mudança do cenário internacional de juros extremamente baixos (negativos em termos reais nos mundo rico e outros países) e liquidez abundante para os países emergentes. "Caminhamos para um momento em que vai ocorrer um início de normalização da política monetária americana, o que vai afetar os fluxos como aconteceu em 1994, mas não da mesma maneira" diz Tony Volpon, diretor de pesquisas para a América Latina da Nomura./Colaboraram Célia Froufe e Laís Alegretti

Valor Econômico – Saldo de 2013 pode ser inferior a US$ 10 bilhões. 
 Por Rodrigo Pedroso | De São Paulo.  
O mau resultado da balança comercial no primeiro trimestre (déficit de US$ 5,1 bilhões) e o comportamento dos preços de algumas commodities provocaram redução nas projeções do mercado para o superávit de 2013. Gradualmente, bancos e consultorias econômicas estão reajustando os números, em movimento que se refletiu no boletim Focus, do Banco Central. Cinco semanas atrás, o consenso de mercado registrava um saldo positivo de US$ 15,2 bilhões. No boletim divulgado ontem, a média das estimativas apontou superávit de US$ 12,4 bilhões em 2013. Entre os economistas, contudo, já há previsões de saldo entre US$ 7 bilhões e US$ 8 bilhões, o que representa resultado cerca de 60% inferior ao do ano passado. 
A piora do resultado projetado decorre tanto de uma exportação mais fraca de manufaturados (especialmente em função de mercados tradicionais, como o argentino) como do aumento do consumo e do preço de bens importados, além do efeito estatístico do registro atrasado nas compras da Petrobras. A safra agrícola, embora recorde, não será suficiente para compensar os demais efeitos negativos sobre o comércio exterior, dizem os analistas. A consultoria MB Associados começou o ano prevendo um superávit de US$ 15 bilhões. Em função dos números em janeiro e fevereiro, a projeção para o saldo diminuiu pela metade: US$ 7,4 bilhões. Dois fatores principais explicam a redução, diz o economista Sérgio Vale: primeiro, a conjuntura para este ano, com uma piora no cenário externo, em especial na Europa, e uma deterioração das vendas de manufaturados para a Argentina. Além disso, o atraso na contabilização nas importações de combustíveis realizadas no fim do ano passado também teve influência no novo cálculo. Vale também chama a atenção para a progressiva piora no saldo comercial brasileiro nos últimos anos, consequência da desaceleração chinesa e seu apetite por commodities e a "piora significativa da competitividade do Brasil, ao mesmo tempo que o mundo está se tornando muito mais competitivo." O atraso na contabilização dos combustíveis e a perspectiva de um resultado pior no comércio com a Argentina também fez a Tendências Consultoria reajustar a previsão do saldo comercial, que passou de US$ 15 bilhões para US$ 12,5 bilhões. A GO Associados, consultoria comandada pelo ex-presidente da Sabesp Gesner Oliveira, tem uma das previsões mais baixas para o saldo comercial deste ano. No início de 2013, o cenário era de superávit de US$ 9,5 bilhões. Agora, a projeção para o saldo positivo desacelerou para US$ 8 bilhões. De acordo com Fabio Silveira, diretor de pesquisa econômica da consultoria, não houve um fator específico que levou à redução. 
"Quando você junta alterações de preços, com perspectivas de volumes embarcados e desembarcados, o modelo aponta para esse saldo", afirma. O saldo bem menor do que o do ano passado, quando o superávit verificado foi de US$ 19,4 bilhões, deve acontecer principalmente em função "da quase total dependência do desempenho externo comercial do agronegócio", diz Silveira. A balança de bens intermediários também ajudou na revisão do superávit. Em 2011, esses produtos proporcionaram um saldo positivo de US$ 21 bilhões. Ano passado, o superávit desse grupo caiu para US$ 6,9 bilhões, e neste ano a balança de intermediários deve ficar em torno de zero, prevê o economista da GO. 
Na análise da distribuição por setores, o agronegócio deve contribuir com um superávit de cerca de US$ 70 bilhões em 2013, enquanto os bens de consumo devem ter déficit de cerca de US$ 5 bilhões, e os bens de capital têm projeção de um saldo negativo de US$ 47 bilhões. "Isso sugere que é o agronegócio que está trazendo dólares ao Brasil, enquanto bens duráveis e não duráveis, petróleo e derivados e bens de capital levam essas divisas para fora", diz Silveira. 
A Quest Investimentos também projeta superávit de US$ 8 bilhões. O valor é o mesmo desde o início do ano, quando a consultoria previa cenário mais pessimista para o comércio exterior. Para o economista Fabio Ramos, os dois primeiros meses do ano são tradicionalmente deficitários, mas este ano o resultado foi agravado pela contabilização atrasada das importações de petróleo e derivados. "Esse é um dos diferenciais. Mas nós também estamos observando uma tendência de conjuntura que vai definir o superávit menor: preços mais baratos das commodities e industrializados mais caros, afetando as importações", afirma Ramos. O Banco Fator, que estimava superávit de US$ 17 bilhões, está em processo de revisão dos números. A instituição deve baixar a projeção para o saldo até o fim da semana.

sábado, 20 de outubro de 2012

Derrapagem orcamentaria, financeira e inflacionaria - Celso Ming, Ricardo Bergamini


Celso Ming 
O Estado de S.Paulo18 de outubro de 2012

Ontem, o Tesouro repassou para o BNDES mais um empréstimo de R$ 20 bilhões de um total de R$ 45 bilhões previstos para este ano. No ano passado, o BNDES já recebera R$ 55 bilhões.
Essas transferências cumprem a função de suprir o BNDES de recursos oficiais destinados a empréstimos de longo prazo, para viabilizar investimentos das empresas tanto públicas como privadas. Mas não são os únicos repasses do Tesouro a bancos oficiais. O Banco do Brasil deve receber neste ano até R$ 8,1 bilhões, e a Caixa Econômica Federal, outros R$ 13 bilhões - como munição para o crédito e para forçar os bancos privados a reduzir os juros nas suas operações ativas.
Embora decididos com as boas intenções de praxe, esses repasses produzem distorções. A primeira é a reedição da chamada conta movimento. Foi a união incestuosa entre Tesouro e Banco do Brasil que financiou despesas do governo com dívida pública e emissões de moeda. Causou enormes estragos à economia brasileira até ser extinta em 1986, no governo Sarney.
O único ponto positivo dos atuais repasses do Tesouro é o de só poderem ser feitos caso, no resto, o governo cumpra um bom programa de responsabilidade fiscal. Mas, se é uma reedição de práticas condenáveis,está visto que não podem acabar bem.
A segunda incongruência já foi reconhecida pelo próprio presidente do BNDES, o economista Luciano Coutinho. Essa gambiarra fiscal, em que dinheiro público gerado com vento é injetado nas veias de algumas empresas brasileiras, impede o desenvolvimento de um mercado de capitais sadio no Brasil - onde qualquer empresa bem administrada e com um bom projeto poderia se financiar com recursos relativamente baratos para a sua expansão. Quem e qual instituição financeira pode concorrer com o BNDES (ou com o Tesouro) no fornecimento de recursos de longo prazo nessas condições? Esse é o maior obstáculo para o desenvolv imento de um mercado de debêntures, ou seja, de lançamento de títulos de longo prazo pelas empresas. O BNDES sempre fornecerá recursos mais baratos do que o mercado vai cobrar.
No passado, a falta de recursos de longo prazo para financiar o crescimento tinha outras causas - como a inflação alta ou a insegurança criada pelos fundamentos frágeis da economia. Hoje, um dos principais motivos é a ausência de poupança de longo prazo no mercado.
Esse desvio leva a outro: os bancos oficiais acabam por fazer concorrência desleal aos privados, em capitais de investimento e de crédito a prazos mais curtos.
Outro fator negativo é a escolha arbitrária dos campeões dos torneios de crescimento econômico. À medida que passa a deter o monopólio da oferta interna dos capitais de longo prazo e escolhe as empresas que vão desfrutá-los, outros elementos de irracionalidade se instalam na economia. Muitas vezes, eleitos assim designados são as melhores opções de investimento. Transferências de recursos com critérios políticos motivam critérios também políticos de aferição de resultado. E isso já se sabe onde vai parar.
Além disso, nem sempre os financiamentos, sejam de que prazo forem, chegam ao grupo empresarial que deles mais necessita. Ao contrário, muitas vezes a empresa já detém reservas para seus planos de investimento. Mas, uma vez que conta com o beneplácito do governo federal, prefere dar-lhes outra destinação.
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Comentários do economista Ricardo Bergamini:
Comentário de Ricardo Bergamini:

É a volta da orgia financeira e o abandono da política fiscal restritiva e  o fim definitivo da lei de responsabilidade fiscal criada no governo FHC. 
É a emissão de moeda gerada pelo vento, como diz o artigo. Com isso a volta da inflação.
(Que cada um) se prepare para viver o que já vivemos outrora. Aguarde.
Cabe lembrar que inflação no primeiro momento gera crescimento econômico. Vide período do governo Sarney (1985/1989) com hiperinflação e moratória internacional, gerou um crescimento médio de 4,39% ao ano, acima do período do governo Lula de 4,06% ao ano. 
Cabe lembrar que controle da inflação é o maior mecanismo de distribuição de renda existe no planeta. Vide crescimento da renda média do brasileiro no período de inflação sob controle praticada no Brasil com o plano Real. 

O Brasil é um museu de grandes novidades (Cazuza).
No Brasil a burrice foi gloriosa no passado e será promissora no futuro (Roberto Campos).

Taxa Média/Ano de Crescimento Econômico Real Relativo
ao Período de 1964 a 2011 em Percentuais do PIB
Períodos
1964/84
 1985/89 
1990/94
 1995/02
 2003/10
 2011
Média/Ano 
Fonte: IBGE.
6,29
4,39
1,24
2,31
4,06
2,70

1 – Nos 21 anos dos governos militares, o Brasil teve um crescimento econômico real médio de 6,29% ao ano.
2 – Nos 5 anos do governo Sarney, com moratória internacional e hiperinflação, o Brasil teve um crescimento econômico real médio de 4,39% ao ano.
3 – Nos 5 anos dos governos Collor e Itamar, o Brasil teve um crescimento econômico real médio de 1,24% ao ano.
4 – Nos 8 anos do governo FHC, o Brasil teve um crescimento econômico real médio de 2,31% ao ano.
5 – Nos 8 anos do governo Lula, o Brasil teve um crescimento econômico real médio de 4,06% ao ano.
6 – No primeiro ano do governo Dilma (2011) o Brasil teve um crescimento econômico de 2,70%.

Ricardo Bergamini

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Politica fiscal brasileira: construindo a deterioracao...

Dois artigos selecionados pelo economista José Roberto Afonso, especialista na área, um pouco antigos (do final do ano passado), mas ainda plenamente válidos (e como):

Gasto & Pacto (Mansueto Almeida)
Sex, 10 de Dezembro de 2010
Gasto fiscal no Brasil de 1991 a 2009 e o novo pacto social, texto de Mansueto Almeida. Em seu blog, Mansueto comenta que entre 1991 e 2009, o gasto primário do Governo Central (inclusive transferências a estados e municípios) aumentou 13,7% para 22,6% do PIB no Brasil e que de 1970 a 1992, a carga tributária no Brasil flutuava em torno de 25% do PIB e essa carga subiu para cerca de 36% do PIB no período recente. O gasto público em uma sociedade e, consequentemente, o tamanho da carga tributária são decisões políticas que refletem a escolha social do modelo de desenvolvimento de uma determinada economia.
Link: http://bit.ly/htQ391

Regras do Jogo (Jorge Salto)
Sex, 12 de Novembro de 2010
Onde foram parar as regras do jogo fiscal? artigo de Felipe Salto da Tendências Consultoria. Felipe comenta que "Não há, no horizonte para o primeiro ano do próximo governo mudanças na qualidade do gasto público...A manutenção do atual padrão fiscal será, em última análise, a manutenção de um entrave evidente à expansão do potencial de crescimento...Hoje, o que tem ocorrido, com a piora do primário, via aumentos artificiais da receita, autorizações de abatimentos de gastos da meta oficial e elevações do endividamento bruto para conceder crédito a instituições oficiais, contornando o orçamento, é uma deterioração ou, pelo menos, uma mudança de rumos evidente. Ver PDF anexo.
Artigo_fiscal_F.Salto_Tendências_12.11.pdf 116 Kb 7/12/2010

sábado, 11 de setembro de 2010

Como diminuir a produtividade do Brasil...

Não é difícil: basta não fazer nada, e os outros países passam na frente.
Mas também tem outras formas ativas de contribuir para a deterioração geral da competitividade no Brasil, das quais enumero apenas algumas:
1) Continuar com uma carga tributária extorsiva (aliás crescente)
2) Expandir a intrusão do Estado na vida econômica
3) Aparelhar o Estado com militantes ignorantes, desprovidos de competência
4) Aumentar o poder das corporações sobre a determinação de políticas nacionais
5) Lotear cargos públicos por critérios políticos
6) Manter uma burocracia extensiva, sujeita a delongas ou corrupção
7) Ocupar estudantes com matérias dispensáveis, e várias inutilidades, em lugar de se concentrar no essencial da boa formação escolar
8) Avançar sobre a poupança privada, impedindo maior taxa de investimento na economia
9) Deixar a infra-estrutura se deteriorar, com pouco investimento na renovação ou conservação
10) Praticar políticas setoriais de cunho partidário, inclusive na frente externa, em ligar de cuidar apenas dos interesses nacionais
Etc., etc., etc. Poderia continuar mas bastam essas para evidenciar porque o Brasil é ultrapassado de longe por outros países que partiram de bases muito frágeis (China) ou que empreenderam o caminho das reformas (Chile)
Paulo Roberto de Almeida

Prioridades erradas afetam a competitividade do País
O Estado de S.Paulo, 10 de setembro de 2010

O Brasil caiu duas posições no ranking de competitividade do Fórum Econômico Mundial (WEF, na sigla em inglês) - ficou acima da Rússia, do México e da Turquia, mas abaixo de Brunei, do Chile e do Azerbaijão, entre outros. A avaliação é anual, feita em parceria com a Fundação Dom Cabral e o Movimento Brasil Competitivo, e, de 2007 a 2009, o Brasil havia ganho 16 posições. A queda de agora é um alerta para o próximo governo.

O País saiu-se pior por causa da deficiência de políticas públicas de saúde e educação primária, do mercado de trabalho, além do enfraquecimento das agências reguladoras. Como a carga tributária não se reduziu no período, o problema não foi de falta de recursos, mas de gestão na sua aplicação. Exemplo: aplicou-se menos em saneamento básico e mais em subsídio ao crédito.

A classificação do WEF leva em conta fatores favoráveis ao Brasil, tais como as dimensões do mercado interno e o conteúdo local da produção, a solidez dos bancos e o desenvolvimento do mercado financeiro, a sofisticação dos negócios, o treinamento profissional e o ensino universitário, além do baixo custo da política agrícola.

E, apesar dos problemas da infraestrutura, os empresários consultados afirmaram que houve melhora nesse item - no qual o País passou do 74.º lugar para o 62.º lugar. "Se não fossem os transportes, especialmente na parte de estradas, o Brasil teria tido uma nota melhor em infraestrutura e, por tabela, no índice geral", notou o presidente do Movimento Brasil Competitivo, Erik Caramano.

Mas, em 139 países pesquisados, o País está em último lugar quanto ao peso da regulação pelo governo e à extensão e peso da tributação; no 136.º, por desperdício nas despesas do governo e spread na taxa de juros; e no 135.º, no tempo gasto para abrir um negócio. E ficou ainda entre os 15 piores países em rigidez do mercado de trabalho, confiança nos políticos, crime organizado, custo da violência para os negócios, qualidade dos portos e problemas aduaneiros.

Em especial, ocupou o 126.º lugar em qualidade em Matemática e Ciências e o 127.º, em qualidade do ensino primário. Da falta de conhecimento básico em Português e Matemática ao analfabetismo funcional é um passo.

Todavia, a queda do Brasil no ranking geral de competitividade neste ano se deveu a que outros países fizeram mais do que o nosso. Mais do que desqualificar os critérios do WEF, está claro onde é que se deve recuperar o terreno perdido.

domingo, 8 de agosto de 2010

Not Doing Business in Venezuela: prejuizos a vista (Editorial do Estadao)

Bem, tudo isso podia ser antecipado, aliás, desde 2002, quando começou, de verdade, a onda de nacionalizações e de atentados à propriedade privada no governo do caudilho.
O que vai abaixo é uma antecipação do que pode vir a ocorrer de pior (e bota pior nisso) com os investimentos e negócios brasileiros nesse país em franco processo de desagregação econômica.
Paulo Roberto de Almeida

Prejuízos à vista na Venezuela
Editorial - O Estado de S.Paulo
08 de agosto de 2010

Empresas brasileiras poderão pagar caro por haver acreditado no presidente Hugo Chávez e, mais que isso, por ter levado a sério o entusiasmo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação ao companheiro bolivariano, grande arauto do socialismo do século 21. A Braskem já sabe onde se meteu e retirou 25 das 30 pessoas que mantinha na Venezuela para tocar dois projetos no valor de US$ 3,5 bilhões. O investimento seria realizado em associação com a estatal Pequiven, mas o governo venezuelano descumpriu sua parte, segundo uma fonte conhecedora do assunto, citada por nossa enviada a Caracas, Patricia Campos Mello. Companhias exportadoras descobriram bem mais cedo o risco enorme dos negócios com o mercado venezuelano. Já ocorreram muitos atrasos de pagamento e o perigo do calote é considerável, porque os importadores dependem de um sistema de câmbio sujeito a controle oficial e a decisões arbitrárias.

Empresas brasileiras ficariam livres do risco de estatização, segundo prometeu o presidente Hugo Chávez a seu amigo Lula. A promessa foi feita logo depois da desapropriação de uma indústria de capital argentino. E foi recebida sem sinal de indignação pela presidente Cristina Kirchner. Ela e seu marido também têm sido aliados muito próximos do chefão bolivariano. Mas parte do empresariado argentino teve uma reação à altura do ultraje e acusou seu governo de usar a parceria com Chávez para se vingar de desafetos. Agora é a vez de brasileiros perderem o sono por causa da ameaça de desapropriação.

Uma nova lei permitirá ao governo venezuelano confiscar equipamentos e apropriar-se de obras públicas paralisadas ou atrasadas. O projeto foi aprovado pela Assembleia Nacional em primeiro turno e deverá ser aprovado também no segundo, porque o Legislativo é controlado pelo governo.

"Se for aprovada, a lei poderá ser um enorme problema para empreiteiras brasileiras", disse o diretor da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Venezuela, Fernando Portela. Empreiteiras brasileiras, como Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa, estão envolvidas em grandes empreendimentos na Venezuela e sujeitas, portanto, às variações de humor de um chefão autoritário.

Mesmo agora, a única segurança dessas empresas é a proximidade entre os presidentes Chávez e Lula. Mas o mandachuva bolivariano poderá investir contra empresas brasileiras, a qualquer momento, quando julgar necessário para manter a ascendência sobre uma população cada vez mais sacrificada pela inflação, pela escassez de comida, pelos apagões e por uma prolongada crise econômica. Neste ano, só dois países da América Latina e do Caribe devem permanecer em recessão. Um deles é o Haiti, muito pobre e ainda sob os efeitos de um devastador terremoto. O outro é a Venezuela, nação rica em petróleo e com grande potencial de desenvolvimento, mas devastada por um governo irresponsável.

No ano passado o PIB venezuelano diminuiu 3,3% e a inflação ficou pouco acima de 25%. Os preços continuam subindo aceleradamente e a economia encolhe. O governo desviou os petrodólares ganhos em tempos de prosperidade para armar o país, transferir renda sem criar empregos produtivos e distribuir favores a aliados estrangeiros.

Nesse jogo, negligenciou a produção de petróleo e destruiu boa parte da economia. Foi preciso aumentar a importação de alimentos, mas nem o produto importado chega aos consumidores. Neste ano, milhares de toneladas de comida - algumas estimativas indicam 130 mil - apodreceram em contêineres.

Enquanto o país afunda, Chávez continua tentando criar inimigos externos. Ao mesmo tempo, recorre a truques macabros, como a exumação e a exibição dos ossos de Simón Bolívar, numa tentativa, talvez, de vincular sua morte - possivelmente por envenenamento - a uma conspiração da oligarquia colombiana do século 19.

Se o país de Chávez se tornar sócio pleno do Mercosul, como deseja o amigão Lula, o chefão bolivariano poderá ampliar o alcance de sua ação desagregadora. Mas alguns empresários brasileiros - poucos, é verdade - também apoiam essa insensatez. Talvez os novos desmandos cometidos na Venezuela possam mostrar-lhes o tamanho desse erro.

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Ainda assim, tem gente que insiste:

Com Chávez, Lula agradece a empresários
Flávia Marreiro
Folha de S. Paulo, 7.08.2010

Presidente diz que brasileiros confiaram em seu convite para negociar com a Venezuela, que vive grave crise
Líderes assinam 27 acordos bilaterais envolvendo uma petroquímica e três construtoras brasileiras

O presidente Hugo Chávez, o secretário-geral da Unsaul, Néstor Kirchner, e Lula durante encontro na capital Caracas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva agradeceu aos empresários brasileiros ontem em Caracas por confiarem em suas propostas para fazer negócios com a Venezuela de Hugo Chávez, que acelera a agenda parlamentar de transição ao socialismo e atravessa o segundo ano consecutivo de recessão.
Quero agradecer aos empresários brasileiros porque, apesar da preocupação com algumas notícias de que a Venezuela vai estatizar as empresas brasileiras, de que não paga as empresas brasileiras, quero dizer da confiança deles cada vez que os convido ao país, disse.
Lula assinou com o colega venezuelano 27 acordos bilaterais envolvendo as grandes construtoras brasileiras (OAS, Andrade Gutiérrez, Queiroz Galvão), concentrados nas áreas de infraestrutura e energia, e com a petroquímica Braskem, para importação de nafta.
Quando mencionou preocupação empresarial, o presidente brasileiro fazia referência a reportagem de ontem de O Estado de S. Paulo que afirmara que a petroquímica Braskem reduziu planos de investimento no país, entre outros motivos, pelo não cumprimento por parte da Venezuela de aporte de fundos conjunto em outro projeto.
Na plateia, Sérgio Thiesen, superintendente da Braskem no país, disse que a crise venezuelana -o risco-país alcançou o da Grécia- é um fator considerado, mas que a empresa seguirá no país de quem comprará, com um acordo assinado ontem, ainda mais nafta.
A crise afeta empresas, construtoras e exportadores brasileiros. As vendas de alimentos -maior parte do US$ 1,7 bilhão vendido ao país no primeiro semestre- não sofrem com a rigidez do controle cambial, intensificado neste ano, porque têm tratamento preferencial.
Mas importações como as de cosméticos e produtos naturais sofrem com o sumiço do mercado permuta -único acesso livre ao dólar, ainda que bem mais alto que o oficial. Esse setor, que deve compor US$ 40 milhões da pauta, está em stand-by, diz Fernando Portela, da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Venezuela.
Diz que investimentos em agricultura e energia também estão em stand-by. A Assembleia Nacional da Venezuela, chavista, passou há pouco uma nova lei de terras que abre mais brechas para expropriações.