Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, em viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas.
O que é este blog?
Este blog trata basicamente de ideias, se possível inteligentes, para pessoas inteligentes. Ele também se ocupa de ideias aplicadas à política, em especial à política econômica. Ele constitui uma tentativa de manter um pensamento crítico e independente sobre livros, sobre questões culturais em geral, focando numa discussão bem informada sobre temas de relações internacionais e de política externa do Brasil. Para meus livros e ensaios ver o website: www.pralmeida.org. Para a maior parte de meus textos, ver minha página na plataforma Academia.edu, link: https://itamaraty.academia.edu/PauloRobertodeAlmeida.
sexta-feira, 18 de julho de 2014
Contra a hegemonia do dolar: uso de moedas nacionais - o que pensar dessa coisa? Paulo Roberto de Almeida
Ah, parece que foi num recente encontro em algum lugar deste nosso planetinha redondo...
Quando eu ouço certas coisas, vocês me desculpem, mas me dá um comichão, desses que ficam coçando no cérebro, eu eu me pergunto onde foi mesmo que eu ouvi a mesma coisa antes?
Ah, me lembrei: foi aqui mesmo, neste cantinho irrelevante de inteligência, neste quilombo de resistência intelectual contra certas ideias, as ruins e as más, as desajeitas e as feias...
Em 2009, vejam vocês, algum desses gênios da Unicamp deve ter falado novamente em comércio em moedas locais.
Eu logo saquei do meu coldre o meu Moleskine e uma caneta e anotei a sugestão; chegando em casa perpetrei essa peça de desatino que segue abaixo, e que por acaso encontrei hoje, no pré-cambriano deste blog (OK, foi um pouco mais tarde, foi no Ordoviciano, não importa).
Transcrevo novamente agora, sem sequer ler o que escrevi antes. Não devo ter mudado muito de ideias. Os outros é que continuam repetindo bobagens...
Paulo Roberto de Almeida
O grande retrocesso Monetário e cambial:
comércio em moedas locais
Paulo Roberto de Almeida
18.06.2009
Existem coisas que escapam à compreensão de economistas, ou até de pessoas normais.
Refiro-me, por exemplo, à febre ou frenesi em torno do comércio internacional feito em moedas locais, ou seja, dispensando o dólar, que desde a Segunda Guerra Mundial converteu-se no padrão de referência e veículo efetivo da maior parte das transações monetárias, financeiras, cambiais e, sobretudo, comerciais no mundo.
Isso não impede, obviamente, que outras moedas sejam usadas, como é o caso do euro nos países membros da UE e entre esta e uma multiplicidade de parceiros. O iene, a libra e algumas outras moedas também são utilizadas para determinadas transações ou entre número seleto de países.
O dólar não foi imposto a todos os demais países do mundo por alguma medida de força, ou de direito, dos EUA. Trata-se apenas do simples reconhecimento da importância econômica dos EUA, da confiança que os agentes econômicos e os próprios países têm na sua manutenção como instrumento confiável, que responde aos três critérios básicos de uma moeda.
Não custa nada lembrar quais são:
1) unidade de conta
2) instrumento de troca
3) reserva de valor
Ponto. Apenas isso. Claro, toda moeda é antes de mais nada uma questão de confiança: se você acredita que aquele papel pintado possui efetivamente poder de compra, que você poderá utilizá-lo de diferentes formas, para as mais variadas transações, ao longo do tempo, isto é, preservando o seu poder de compra, então você decide, em total liberdade, utilizar aquele papel pintado. Se você não confia, faz qualquer outra coisa, mas se desfaz desse papel pintado que não merece a sua confiança.
Pois bem: o mundo demorou anos, décadas, para construir um sistema multilateral de pagamentos e um regime de trocas que facilite as transações entre os países, com o mínimo de restrições possível. O multilateralismo monetário, por imperfeito que seja -- posto que as autoridades monetárias americanas podem decidir dar um calote no mundo, deixando de honrar seus compromissos externos, com os compradores de títulos do Tesouro, por exemplo -- é o melhor sistema possível, pois permite que a mesma moeda seja usada com os mais diferentes parceiros em todas as transações que eles desejem, sem se amarrar em um instrumento único, como ocorria ainda com o bilateralismo estrito dos anos 1930, baseado em compensações diretas entre os países.
À luz destas reflexões, eu não consigo compreender como se deseja recuar do multilateralismo -- ou seja, da liberdade cambial e monetária -- para o bilateralismo, no qual só poderemos utilizar a moeda de um parceiro com esse mesmo parceiro.
Me desculpem os mais bem informados, mas não consigo encontrar nenhuma explicação racional para esse tremendo equívoco conceitual, para esse imenso retrocesso econômico, para essa servidão voluntária, como já disse um filósofo.
Será que a inteligência econômica está recuando no mundo, ou em determinados países?
Paulo Roberto de Almeida
terça-feira, 15 de julho de 2014
70 anos depois de Bretton Woods, Brics querem dar passo atras na multilateralizacao dos pagamentos
Valor Econômico, 15/07/2014
quinta-feira, 18 de abril de 2013
O Brasil que recua: MEC pede menos formacao de professores (combina...)
Agora querem implementar o padrão medíocre para todos os brasileiros...
Combina...
Paulo Roberto de Almeida
Lei tira exigência de pós-graduação para novos professores de federais
Fabio Takahashi
Folha de S.Paulo, 18/04/2013
Uma lei de iniciativa do governo federal que entrou em vigor no mês passado determinou que as universidades federais não podem mais exigir nos concursos para professor os títulos de mestre ou doutor dos candidatos. Na prática, quem só tiver diploma de graduação pode agora disputar todas as vagas abertas nas universidades. Até então, esses candidatos eram aceitos como exceção.
Após ser procurado pela Folha, o governo afirmou ontem que pretende alterar novamente a regra, para que as instituições possam voltar a exigir diploma de pós-graduação, como condição primordial para a inscrição. O governo ainda não sabe, porém, se mandará um projeto de lei ao Congresso ou se editará medida provisória. Dirigentes de universidades disseram à Folha que o Executivo não tinha a intenção de proibir a exigência de mestrado ou doutorado. Houve um erro no projeto, segundo eles, só percebido quando as universidades consultaram suas áreas jurídicas para abrir os concursos.
A mudança, porém, já trouxe resultados práticos. A Federal de Santa Catarina, por exemplo, está selecionando 200 professores com diploma de graduação (inicialmente, exigia doutorado). Na Federal de Pernambuco, os departamentos de física e de química decidiram suspender os processos por discordar da nova regra.
sexta-feira, 6 de julho de 2012
Fascismo cambial argentino: retrocedendo meio seculo...
Apenas depois de 1992 é que começamos a ter cartões de crédito válidos no exterior. Antes era preciso ir aos bancos acreditados para comprar, em limites que variavam de 1.000 a 4.000 dólares, os dólares para viajar ao exterior. O resto era com o cambista, que chegou a ser, em meu ministério, a segunda pessoa mais importante da estrutura oficial, depois do ministro (e ainda assim, se tinha mais relações com o cambista do que com o ministro).
Escapamos dos aspectos mais nocivos, e ridículos, do controle cambial, mas a obsessão cambial ainda não acabou no Brasil. Somos impedidos, por exemplo, de ter contas em moedas estrangeiras. Assim, se você chega com um resto de dinheiro do exterior, ou quer fazer uma pequena poupança em cash em divisas, para eventuais viagens-surpresa, você tem três soluções: (a) troca de volta no banco, que agradece pelas generosas e extorsivas comissões que cobra a cada vez; (b) aluga um cofre no banco, ou faz um em sua casa, com as despesas correspondentes; (c) guarda de qualquer jeito em sua casa, esperando a passagem de algum bandido.
A proibição de se ter contas em dólares é uma lembrança dos tempos de depressão, 80 anos atrás, quando havia penúria de dólares.
O atraso mental brasileiro é tão grande que ainda não nos libertamos dessa obsessão, numa fase de abundância de dólares (para o bem e para o mal). As autoridades mantêm controles de capitais alegadamente para preservar o equilíbrio monetário e evitar problemas de balanço de pagamentos. Melhor seria se o Brasil caminhasse no sentido da plena conversibilidade, que abandonamos em 1931 e ainda não restabelecemos plenamente. Um dia o atraso mental acaba e viramos normais outra vez.
Mas o caso da Argentina é diferente. Não se trata apenas de atraso mental, mas de retrocesso voluntário, de loucuras kafkianas, como demonstrado nesta circular do Banco Central, dizendo que o Estado, esse ente fascista por excelência, vai ter de controlar se os cidadãos possuem de fato recursos -- legalmente declarados -- para poder comprar dólares.
É o fascismo no seu estado mais elementar.
E um retrocesso de mais de 80 anos na história econômica.
Paulo Roberto de Almeida
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E se não bastasse como fascismo econômico, ainda tem mais esta: os bancos são obrigados a emprestar, mesmo que queiram fazer reservas ou ter outras aplicações. O Estado fascista é assim: ele não permite você dispor do seu próprio dinheiro, ele é quem determina o que fazer, já que sabe melhor do que nós como ficar pobres e arruinados...
Paulo Roberto de Almeida
Argentina obriga bancos a dar crédito
segunda-feira, 26 de dezembro de 2011
Mais uma das invencoes economicas geniais do governo: regressismo patina ate para tras...
Como é que o Brasil, com seus competentes economistas no Banco Central - mas muitos outros incompetentes na Fazenda -- consegue dar um passo atrás, de mais ou menos 80 anos (para ser gentil), e reverter um sistema tão simples quanto a contabilidade uniforme em dólares, segundo regras já testadas intensamente por dezenas de países e pelo FMI?
Como e por que diabos, o Brasil resolve abandonar o dólar, numa relação comercial altamente instável -- como ocorre com a errática e protecionista Argentina -- e introduzir um sistema de dupla contabilidade, que só obriga o BC a ter custos administrativos acrescidos, ao ter de fazer contabilidades paralelas, em pesos e em reais, para registrar fluxos de comércio que estavam sendo perfeitamente registrados em dólares, inclusive aqueles que são cursados ao abrigo do Convênio de Créditos Recíprocos da Aladi?
Por que diabos um BC tem de ser responsável por garantir riscos cambiais e comerciais de exportadores privados? Onde mais, em quais outros países malucos, os BCs se afastam de suas funções monetárias e cambiais para adentrar em regimes privados de garantias comerciais, assumindo prejuízos para exportadores privados?
Quem é o maluco que mantém a ficção do comércio em moedas locais, quando, no final de cada dia, os valores correspondentes precisam ser referidos ao dólar, para que os Bancos Centrais respectivos liquidem suas posições superávitárias ou deficitárias?
Quem foi o idiota que, por preconceito contra o dólar, ordenou todas essas bobagens?
Quem é o economista maluco que acha que as empresas exportadoras também vão gastar dinheiro à toa -- como faz o governo, mas com o nosso dinheiro -- mantendo duas contabilidades paralelas, uma, normal, a que é feita em dólares há décadas, para todas as finalidades, e uma outra, especialíssima e exclusiva, em reais, ou pior, em pesos, pagando o dobro de contabilistas, para fazer o mesmo trabalho dobrado, e inútil?
Qual é o banco estúpido, que vai montar um sistema paralelo para também lidar com reais voláteis, e pesos, altamente voláteis, quando ele o faz tranquilamente em dólares, sendo que todo o financiamento comercial internacional é mesmo contabilizado em dólar?
Quem foi o idiota que propôs tudo isso, para nada, ou quase nada?
Deve ter sido o mesmo idiota que queria fazer livre comércio com a China e que também queria comércio em moedas nacionais com a China. INACREDITÁVEL!!! Todo o saldo que conseguiríamos com a China, num sistema maluco como esse, teria de ser revertido em compras obrigatórias no próprio mercado chinês, já que receberíamos em yuan, uma moeda inconvertível (como o real, aliás, e o peso argentino também). Incrível.
Esses economistas geniais do governo deveriam merecer o Darwin Award, se ele existisse para economistas.
O Brasil avança rapidamente para trás em matéria econômica. Consegue voltar ao tempo das moedas inconversíveis e do intercâmbio equilibrado...
Mais um pouco ele volta ao tempo das diligências e vai passar a usar a Western Union...
Paulo Roberto de Almeida
Patina o comércio 'sem dólar' entre Brasil e Argentina
Sistema que permite trocas comerciais entre países sem utilização de dólar cresceu em 2011, mas ainda é pouco representativo.
domingo, 15 de maio de 2011
Como retrocedem os politicos: um exemplo (entre muitos outros)
Ao contrário da incrível história de Benjamin Button, que nasceu velho e ia ficando cada vez mais moço, fisicamente, os políticos brasileiros retrocedem mentalmente.
Um exemplo, o senador Cristovam Buarque, do PDT-DF, que já foi inclusive reitor da UnB (coincidentemente ela começou a decair em sua gestão) e ministro da (des)Educação (ele deve acreditar nas bobagens do Paulo Freire, também).
A indecência da mentalidade proibicionista
Bruno Garschagen
Ordem Livre, 11 de Março de 2011
A capacidade dos políticos brasileiros de nos surpreender é infinita. Mas nem vou dizer que fui surpreendido porque desde há muito os preclaros membros do Legislativo e do Executivo fizeram-me perder essa extraordinária capacidade humana da surpresa sincera. O assunto não é novo, mas merece reiterada repulsa. Falo do projeto de lei nº 480, de 2007, de autoria do senador Cristovam Buarque, que diz o seguinte:
"Art. 1º Os agentes públicos eleitos para os Poderes Executivo e Legislativo federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal são obrigados a matricular seus filhos e demais dependentes em escolas públicas de educação básica".
A justificativa do senador à necessidade da aprovação do projeto era a seguinte:
"No Brasil, os filhos dos dirigentes políticos estudam a educação básica em escolas privadas. Isto mostra, em primeiro lugar, a má qualidade da escola pública brasileira, e, em segundo lugar, o descaso dos dirigentes para com o ensino público.Talvez não haja maior prova do desapreço para com a educação das crianças do povo, do que ter os filhos dos dirigentes brasileiros, salvo raras exceções, estudando em escolas privadas. Esta é uma forma de corrupção discreta da elite dirigente que, ao invés de resolver os problemas nacionais, busca proteger-se contra as tragédias do povo, criando privilégios.
Além de deixarem as escolas públicas abandonadas, ao se ampararem nas escolas privadas, as autoridades brasileiras criaram a possibilidade de se beneficiarem de descontos no Imposto de Renda para financiar os custos da educação privada de seus filhos".
E a lei, em vigor, teria quatro objetivos:
a) ético: comprometerá o representante do povo com a escola que atende ao povo;
b) político: certamente provocará um maior interesse das autoridades para com a educação pública com a consequente melhoria da qualidade dessas escolas.
c) financeiro: evitará a “evasão legal” de mais de 12 milhões de reais por mês, o que aumentaria a disponibilidade de recursos fiscais à disposição do setor público, inclusive para a educação;
d) estratégica: os governantes sentirão diretamente a urgência de, em sete anos, desenvolver a qualidade da educação pública no Brasil.
Muito embora a intenção da medida seja fazer com que os políticos sintam na pele o que é ter um filho estudando numa escola pública e tal situação os pressione a trabalhar para melhorar a educação do país, há diversas consequências não-intencionais que a tornam problemática, para usar um eufemismo. Pensando bem, às favas com o eufemismo; trata-se de uma indecência e de uma estupidez.
Em primeiro lugar, essa mentalidade de obrigar o cidadão a agir de determinada forma mediante uma lei é autoritária quando tal norma não serve para proteger um inocente de um agressor. Em segundo lugar, é legítimo que uma criança ou adolescente sejam obrigados a estudar numa escola pública porque o pai é político? Impor aos filhos a responsabilidade exclusiva dos pais como agentes políticos de trabalhar para melhorar a educação (considerando que eles devam fazer
isso, o que discordo) é uma indecência.
Acreditar que o simples fato dessa obrigatoriedade irá, necessariamente, melhorar a educação por causa da pressão direta sobre a família do político não me parece razoável porque há uma série de contingências e eventos que podem fazer com que a lei até piore a situação. Você pode me perguntar: e se a educação, de fato, melhorar? Eu pergunto: por causa de uma finalidade utilitária a ser perseguida devemos renunciar aos princípios, valores e à ordem que nos sustentam enquanto sociedade?
Mais uma vez, um político tenta resolver um problema sério por uma imposição legal. Se aceitarmos que tal ação se converta num hábito e, depois, num valor social, insisto, abriremos uma vereda para qualquer tipo de sandice, desde nos obrigar a comer salada porque carne vermelha faz mal a esterilizar os pobres porque, enfim, os pobres provocam mal-estar na sociedade.
O projeto de lei é mais um da galeria do senador, que no ano passado achou por bem converter a felicidade em assunto de Estado e elaborou uma proposta para acrescentar ao artigo 6º da Constituição Federal a busca da felicidade como um direito social. Tal acréscimo, por certo, consagraria a farsa deste dispositivo constitucional, que define como direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados. Para não fazer a indagação óbvia sobre quem vai pagar a conta, gostaria humildemente de perguntar se eu poderia receber a minha parte em dinheiro e livre de impostos.
O senador, novamente, pretende validar a genial máxima do saudoso Helio Beltrão: “O Brasil é uma ilha de iniciativa cercada de governo por todos os lados”.