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domingo, 29 de junho de 2014

Reflexões ao léu: deformações mentais brasileiras - Paulo Roberto de Almeida

Reflexões ao léu: deformações mentais brasileiras
proibicionismo, iniquidade, obrigatoriedade, inconsciência

Paulo Roberto de Almeida

Por vezes eu me pergunto se o Brasil, ou melhor, se os brasileiros não padecem de certos desvios de comportamento que revelam, no fundo, deformações mentais, não no sentido de doenças congênitas – típicas dos chamados retardados – mas equívocos de compreensão quanto ao funcionamento do mundo, das coisas, das relações de causa a efeito, enfim. Tantos são os exemplos dessas deformações que eu não teria problemas em ordenar toda uma lista dos desvios mais frequentes; de fato acabei colecionando alguns casos recentes que me parecem ilustrativos do argumento defendido neste texto. Alinhei no subtítulo aqueles que me parecem os mais frequentes, e vou aproveitar algumas postagens receitas feitas em meu blog Diplomatizzando para tratar de cada um deles.

1. Proibicionismo
Comecemos por este exemplo típico, aliás já tratado aqui anteriormente pelos mesmos motivos: os corporativos de sempre querem impedir os cidadãos de adotar as medidas que eles julgam mais adequadas para seus deslocamentos diários entre casa e trabalho, querendo obrigá-los a usar os transportes regulamentados, e portanto a pagar transportes coletivos (sempre péssimos, mesmo os metros) ou taxis individuais. A nova notícia é esta aqui: “Carona paga é ilegal, diz agência reguladora sobre app Uber”, já postada sob este link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/06/nosso-fascismo-ordinario-o-estado.html
Como comentei em minha introdução a essa postagem, essas novas formas de transporte “solidário” (na verdade, de fato com pagamento compartilhado) ou baseados em esquemas tipo Uber, são extremamente relevantes em nossas cidades engarrafadas, pois podem justamente desafogá-las de milhares de carros individuais. Provavelmente, as autoridades fascistas, seja porque estão a serviço de concessionários oligopolistas (e geralmente corruptos), seja porque são justamente de mentalidade fascista, querem proibir essas novas formas de transporte e, a pretexto de defender os direitos dos cidadãos, desejam impedir a concorrência aos seus pagadores corruptos habituais, daí a intenção de regulamentar proibindo e, em todo caso, taxar.

2. Iniquidade
Vejam agora esta outra idiotice econômica, que obviamente deve ter sido obtida ao cabo de um poderoso lobby de “cineastas” brasileiros desejosos de consolidar para si um mercado cativo. Já tendo obtido cotas nas salas de cinema nacionais e na programação televisiva, eles avançam agora para a parte mais passiva de todas: alunos do sistema público de ensino, aliás não só publico, mas nacional. Todas as escolas do ciclo fundamental deverão exibir pelo menos duas horas de filmes nacionais por mês. Leiam a matéria nesta postagem que fiz sobre este tema: “As escolas de educação básica terão agora que exibir no mínimo duas horas mensais de filmes de produção nacional”, neste link: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/06/deseducacao-brasileira-mais-uma-reserva.html
A medida, como sempre obrigatória, deverá gerar mais receita para os ditos “cineastas”, e mais despesas para o sistema público de ensino e para as escolas privadas. Adivinhe quem vai pagar por tudo isso caro leitor? Sim, acertou: você, e todos os demais brasileiros, mesmo aqueles que não têm nada a ver com tudo isso. Quem vai ganhar? Um punhado de dilapidadores da riqueza alheia, que conspiraram com aquele outro bando de idiotas nacionais, que são os nacionalisteiros, os patrioteiros, os tais defensores da “cultura nacional”, que usarão a lei obrigatória para transferir renda de toda a sociedade para os seus bolsos, sempre com a ajuda dos ingênuos, equivocados, dos idiotas, simplesmente. Depois eles não sabem por que, a despeito de todas as medidas distributivas, a renda no Brasil continua concentrada em favor dos mais ricos (eu diria dos mais espertos). É devido a medidas idiotas como essa que a renda continua concentrada. E os pobres dos alunos vão ter de passar a assistir essas comédias nacionais, semi-eróticas e semi-idiotas...

3. Obrigatoriedade
As suas postagens anteriores ilustram também o terceiro aspecto: o caráter compulsório das medidas adotadas pelo Estado fascista. Não basta ao Estado arvorar-se em regulamentador do que é mais positivo, adequado, útil ou saudável para o cidadão comum; ele também quer proibi-lo de decidir segundo sua própria vontade o que é melhor para ele, seja em matéria de transporte, de educação, de lazer, de qualquer coisa. A mesma obrigatoriedade está presente no decreto bolivariano emitido em 25 de maio pela presidência, ou seja, a consulta à organizações ditas sociais – sob o rótulo enganoso de “participação social” – que toda e qualquer agência pública (o que compreende cada um dos 39 ministérios) deve fazer antes de adotar qualquer medida, qualquer política de âmbito público. Não sem razão, vários observadores já chamaram o famigerado decreto de bolivariano ou de equivalente aos sovietes.
Em diversas outras instâncias, medidas que poderiam até ser adotadas segundo o arbítrio dos cidadãos, ou por decisão de um conselho de pais e mestres, acabam se tornando compulsórias em âmbito nacional. Penso, por exemplo, na introdução de espanhol e de estudos afro-brasileiros no primário, e de sociologia e de filosofia no secundário, duas medidas altamente custosas para toda a população brasileira, sendo que muitas escolas já adotam uma ou outra recomendação a título voluntário.
Esses atos discricionários do Estado custam muito caro aos cidadãos, e são muitas vezes eivados de irregularidades, ilegalidades e até de inconstitucionalidades, como salientado nesta entrevista com o advogado Ives Gandra Martins, também transcrita em meu blog: http://diplomatizzando.blogspot.com/2014/06/o-fascismo-que-chegamos-o-cidadao-so.html.

4. Inconsciência
Todas essas medidas, todas essas arbitrariedades são adotadas seja na total inconsciência dos legisladores, ou então com a sua colaboração ativa e de má-fé; eles atuam, portanto, com total consciência de que estão roubando dinheiro dos cidadãos para entregar recursos a protegidos, a protecionistas, a corruptos. Isso me faz sempre lembrar uma velha distinção que aprendi a fazer, com base em leituras, nos estudos históricos, nas pesquisas sobre as formas de comportamento social existentes nas sociedades anglossaxãs, por um lado e nas sociedades ibéricas, por outro; por facilidade, confrontemos, digamos, a livre iniciativa na América Latina e nos Estados Unidos.
Vivendo nos EUA atualmente, constato como novos negócios são lançados a cada dia, e se transformam em sucessos de público, de consumo, de moda. A própria matéria sobre o Uber ilustra bem esse aspecto: “O Uber, aplicativo americano de “carona” mais popular do mundo, anunciou sua chegada ao Brasil em maio, pouco antes de ser avaliado em 18,2 bilhões de dólares.” Ou seja, um aplicativo em quase nada revolucionário, mas sem dúvida inovador, permite ao cidadão comum dispensar um carro individual, seja para seu uso eventual, seja mesmo para posse como ativo, pois ele pode apelar para um carro tipo taxi a qualquer momento, de qualquer lugar. Esse tipo de facilidade permite, por exemplo, eliminar milhares de carros de cidades já congestionadas. O espírito fascista de nossas autoridades e a reserva de mercado de motoristas de taxi se combinaram para proibir tal prática, pretendendo, no Brasil, que ela não é regulamentada, e portanto estaria proibida. Essa é uma interpretação criativa dos fascistas nacionais, sem dúvida alguma.
Volto à minha distinção, e eis aqui como se distinguem dois modelos sociais.
Tudo o que não estiver expressamente proibido nas sociedades derivadas do velho mundo saxão, das lei costumeiras, está ipso facto permitido à iniciativa dos cidadãos, que assim podem criar um novo negócio, explorá-lo sem qualquer reserva de mercado, e ficarem ricos, com base no sucesso de mercado, ou seja, dependendo do interesse dos consumidores. Por isso mesmo, essas sociedade são ricas, produtivas, inovadoras, numa palavra: livres.
Em contraste, tudo o que não estiver expressamente previsto na lei – e sabemos que a lei tem um longo caminho pela frente – e não for detalhadamente previsto nos regulamentos, tudo aquilo que não for objeto de algum alvará régio, de uma autorização do executivo, de uma lei votada pelo parlamento, estará automaticamente proibido, e os cidadãos que tentarem começar novos negócios, sem a devida autorização das agências públicas, poderão se expor às penas da lei.
É por isso mesmo que nossa sociedade são tão pobres, tão pouco inovadoras, tão constrangidas e oprimidas pelo Estado.
Para mim isso é fascismo.
Ou seja, já vivemos num Estado fascista, mas os brasileiros não têm consciência disso.

É uma pena...
Paulo Roberto de Almeida
Hartford, 29 de junho de 2014



Nosso fascismo ordinario: o Estado proibe o cidadao de ser livre

As novas formas de transporte "solidário" (ou seja, de fato com pagamento partilhado) ou baseados em esquemas tipo Uber, são importantes, pois podem justamente desafogar as cidades de milhares de carros individuais.
As autoridades, seja porque estão a serviço de concessionários oligopolistas e geralmente corruptos, seja porque são justamente de mentalidade fascista, querem proibi-las, regulamentar e taxar. 
Paulo Roberto de Almeida 

"Carona paga" é ilegal, diz agência reguladora sobre app Uber

Segundo ANTT, oferta de transporte em troca de pagamento sem autorização pública desrespeita resolução

Renata Honorato
Veja.com, 28/06/2014
Rafiq Maqbool
Aplicativo Uber instalado em um smartphone (Rafiq Maqbool)
O Uber, aplicativo americano de "carona" mais popular do mundo, anunciou sua chegada ao Brasil em maio, pouco antes de ser avaliado em 18,2 bilhões de dólares. A startup já oferece corridas no Rio e em São Paulo, a taxas que variam de 15 a 12 reais, abrindo uma guerra com taxistas — que se dizem prejudicados. Agora, o governo entrou na discussão, afirmando que o modelo é ilegal. Questionada pela reportagem de VEJA.com, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) diz que a resolução 4.287 "considera serviço clandestino o transporte remunerado de usuários, realizado por pessoa física ou jurídica, sem autorização ou permissão do poder público competente". 
Segundo Beto Aquino Agra, coordenador do Laboratório de Inovação Digital da ANTT, a cobrança pelo serviço, como feita pelo Uber, caracteriza a modalidade de transporte público: se realizado sem a devida autorização do poder público, é ilegal. Uber e similares, como o Zaznu, que sugerem uma taxa de pagamento em troca do transporte, portanto, não obedecem à resolução.
O Uber respondeu. "Oferecemos um serviço mais sofisticado, com carros executivos, diferente do que é oferecido por táxis. Não somos um concorrente direto dos taxistas e nem de qualquer outro transporte público", diz Solamon Cruz Estin, responsável pela expansão internacional da companhia. "Estamos dispostos a colaborar com a comunidade e com o governo para criar um ambiente de harmonia para todo o ecossistema de transporte urbano."
Para coibir a "carona paga", a ANTT promete realizar inspeções, embora reconheça que não será fácil identificar os motoristas que burlam a lei. "Vamos intensificar as nossas fiscalizações, porque em muitos casos os piratas dizem se tratar de carona solidária, uma prática não considerada irregular pela resolução 4.287 ou pelo artigo 736 do Código Civil, que diz: 'Não se subordina às normas do contrato de transporte o feito gratuitamente, por amizade ou cortesia'", diz Agra. Quem for pego, contudo, será multado e poderá ter o seu carro retido por 72 horas. O valor da multa pode chegar a 5.000 reais. 
A rede Uber é composta por usuários — qualquer pessoa que baixar o app em seu smartphone — e motoristas profissionais. "Avaliamos experiências anteriores na profissão, porque nos preocupamos com o bem-estar dos nossos clientes. Para ser um motorista Uber, é preciso ter um carro executivo — modelos Chevrolet Zafira, Toyota Corolla ou Hyundai Azera —, possuir habilitação e seguro de automóvel para uso comercial", afirma Estin. Os colaboradores do Uber não têm contrato de exclusividade com a companhia e 80% do valor pago nas corridas são repassados como remuneração ao motorista. 

domingo, 15 de maio de 2011

Como retrocedem os politicos: um exemplo (entre muitos outros)

O artigo abaixo é de um colega de espanto (sim, existe isso, caro leitor). Ele se espanta, tanto quanto eu, com a inacreditável característica que apresentam políticos de retrocederem mentalmente.
Ao contrário da incrível história de Benjamin Button, que nasceu velho e ia ficando cada vez mais moço, fisicamente, os políticos brasileiros retrocedem mentalmente.
Um exemplo, o senador Cristovam Buarque, do PDT-DF, que já foi inclusive reitor da UnB (coincidentemente ela começou a decair em sua gestão) e ministro da (des)Educação (ele deve acreditar nas bobagens do Paulo Freire, também).

A indecência da mentalidade proibicionista
Bruno Garschagen
Ordem Livre, 11 de Março de 2011

A capacidade dos políticos brasileiros de nos surpreender é infinita. Mas nem vou dizer que fui surpreendido porque desde há muito os preclaros membros do Legislativo e do Executivo fizeram-me perder essa extraordinária capacidade humana da surpresa sincera. O assunto não é novo, mas merece reiterada repulsa. Falo do projeto de lei nº 480, de 2007, de autoria do senador Cristovam Buarque, que diz o seguinte:

"Art. 1º Os agentes públicos eleitos para os Poderes Executivo e Legislativo federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal são obrigados a matricular seus filhos e demais dependentes em escolas públicas de educação básica".

A justificativa do senador à necessidade da aprovação do projeto era a seguinte:

"No Brasil, os filhos dos dirigentes políticos estudam a educação básica em escolas privadas. Isto mostra, em primeiro lugar, a má qualidade da escola pública brasileira, e, em segundo lugar, o descaso dos dirigentes para com o ensino público.Talvez não haja maior prova do desapreço para com a educação das crianças do povo, do que ter os filhos dos dirigentes brasileiros, salvo raras exceções, estudando em escolas privadas. Esta é uma forma de corrupção discreta da elite dirigente que, ao invés de resolver os problemas nacionais, busca proteger-se contra as tragédias do povo, criando privilégios.

Além de deixarem as escolas públicas abandonadas, ao se ampararem nas escolas privadas, as autoridades brasileiras criaram a possibilidade de se beneficiarem de descontos no Imposto de Renda para financiar os custos da educação privada de seus filhos".

E a lei, em vigor, teria quatro objetivos:

a) ético: comprometerá o representante do povo com a escola que atende ao povo;

b) político: certamente provocará um maior interesse das autoridades para com a educação pública com a consequente melhoria da qualidade dessas escolas.

c) financeiro: evitará a “evasão legal” de mais de 12 milhões de reais por mês, o que aumentaria a disponibilidade de recursos fiscais à disposição do setor público, inclusive para a educação;

d) estratégica: os governantes sentirão diretamente a urgência de, em sete anos, desenvolver a qualidade da educação pública no Brasil.

Muito embora a intenção da medida seja fazer com que os políticos sintam na pele o que é ter um filho estudando numa escola pública e tal situação os pressione a trabalhar para melhorar a educação do país, há diversas consequências não-intencionais que a tornam problemática, para usar um eufemismo. Pensando bem, às favas com o eufemismo; trata-se de uma indecência e de uma estupidez.

Em primeiro lugar, essa mentalidade de obrigar o cidadão a agir de determinada forma mediante uma lei é autoritária quando tal norma não serve para proteger um inocente de um agressor. Em segundo lugar, é legítimo que uma criança ou adolescente sejam obrigados a estudar numa escola pública porque o pai é político? Impor aos filhos a responsabilidade exclusiva dos pais como agentes políticos de trabalhar para melhorar a educação (considerando que eles devam fazer
isso, o que discordo) é uma indecência.

Acreditar que o simples fato dessa obrigatoriedade irá, necessariamente, melhorar a educação por causa da pressão direta sobre a família do político não me parece razoável porque há uma série de contingências e eventos que podem fazer com que a lei até piore a situação. Você pode me perguntar: e se a educação, de fato, melhorar? Eu pergunto: por causa de uma finalidade utilitária a ser perseguida devemos renunciar aos princípios, valores e à ordem que nos sustentam enquanto sociedade?

Mais uma vez, um político tenta resolver um problema sério por uma imposição legal. Se aceitarmos que tal ação se converta num hábito e, depois, num valor social, insisto, abriremos uma vereda para qualquer tipo de sandice, desde nos obrigar a comer salada porque carne vermelha faz mal a esterilizar os pobres porque, enfim, os pobres provocam mal-estar na sociedade.

O projeto de lei é mais um da galeria do senador, que no ano passado achou por bem converter a felicidade em assunto de Estado e elaborou uma proposta para acrescentar ao artigo 6º da Constituição Federal a busca da felicidade como um direito social. Tal acréscimo, por certo, consagraria a farsa deste dispositivo constitucional, que define como direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados. Para não fazer a indagação óbvia sobre quem vai pagar a conta, gostaria humildemente de perguntar se eu poderia receber a minha parte em dinheiro e livre de impostos.

O senador, novamente, pretende validar a genial máxima do saudoso Helio Beltrão: “O Brasil é uma ilha de iniciativa cercada de governo por todos os lados”.