domingo, 21 de junho de 2009

1169) Integracao sul-americana: balanco das experiencias

Meu mais recente artigo publicado. A revista é de 2008, mas só foi lançada agora...

“Evolução histórica do regionalismo econômico e político da América do Sul: Um balanço das experiências realizadas”
Cena Internacional
Ano 10, n. 2-2008, p. 72-97
disponível neste link.

sábado, 20 de junho de 2009

1168) Jornalistas e advogados: guildas medievais e corporacoes de oficio ultapassadas

Recebi, de um amigo, uma manifestação da OAB-PE em favor da manutenção da exigência de diploma e de registro para jornalistas.
Como sou totalmente contrário a esse tipo de prática medieval, a esse cartorialismo ultrapassado, a esse regime de guildas protegidas por um decreto qualquer da autoridade, enfim, a esse tipo de corporação de ofício incompatível com um regime de liberdade e de sadia competição no mercado de trabalho, respondi o que vai um pouco mais abaixo.

Diploma: OAB-PE pede que Britto busque regulamentação da profissão de jornalista

Brasília, 19/06/2009 - O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cezar Britto, recebeu hoje (18) ofício encaminhado pelo presidente da Seccional da OAB de Pernambuco, Jayme Asfora, no qual solicita que o Conselho Federal da OAB encaminhe ao Congresso Nacional minuta de projeto de lei que busque a regulamentação da profissão de jornalista e determine a exigência do diploma de curso superior e registro profissional no Ministério do Trabalho para o exercício da profissão.

Para Asfora, a decisão do Supremo Tribunal Federal - que considerou inconstitucional a exigência do diploma para o exercício da profissão - é um "retrocesso democrático" e "uma afronta a um dos princípios fundamentais da cidadania: o acesso à informação livre e de qualidade". Ainda segundo o dirigente da OAB pernambucana, a decisão
do Supremo em nada contribuirá para o engrandecimento da sociedade, uma vez que não é possível negar que ética, informação de qualidade, com responsabilidade e preparação técnica são qualificações que devem ser consideradas essenciais para o exercício do jornalismo.


Comentários de Paulo Roberto de Almeida:

A posicao da OAB, como nao poderia deixar de ser, é totalmente corporativa.
Ninguém está pedindo que o jornalista seja um ignorante, ou que ele não possa ser, inclusive, alguém formado por um curso de jornalismo.
O que se pretende é que uma profissao essencialmente aberta como esta não esteja unicamente reservada apenas aqueles que ostentam um canudo de um curso especifico de uma faculdade qualquer (que pode muito bem ser uma Faculdade Tabajara).
O que se está dizendo é que o proprietário de um empresa de comunicacao poderá contratar qualquer um, sublinho qualquer um, como jornalista, repórter, editor, revisor, resenhista, etc, sem qualquer exigência de diploma.
Uma posicao basicamente correta, pois qualquer pessoa medianamente alfabetizada pode ser jornalista. Se ele será, ou não, um bom jornalista, isso é problema do empresário de comunicação, e de seu público, evidentemente, que saberá o que fazer com uma publicação mediocre, mentirosa, desonesta, etc.
A posição da OAB não se sustenta nem pela lógica formal de uma profissao tão aberta quanto a de jornalista, portanto menos especializada do que a de advogado ou jurista, para a qual se poderia, teoricamente, exigir formação especializada.
Minha profissao, por exemplo, diplomata, não exige nenhum diploma em particular, apenas que se tenha um diploma de qualquer ensino superior: pode ser de veterinária, educação física, engenharia, medicina, etc. Eu acho excelente essa abertura a todas as profissões, e acho que seria detestável se uma exigência legal reservasse a carreira unicamente para os formados em relações internacionais. Seria muito aborrecido.
Aliás, eu nem exigiria qualquer tipo de diploma para o concurso à diplomacia, sequer o de ensino primário. Se a intenção é a de escolher pessoas bem preparadas, de quaisquer horizontes, melhor abrir o escopo para qualquer pessoa, sem nenhum exigência educacional. Poderiamos ter, teoricamente, autodidatas integrais perfeitamente capazes.
Esse culto dos diplomas e dos canudos é perfeitamente insuportavel.
Provavelmente eu teria um critério muito simples: a profissão mata pessoas? Então se poderia pensar em alguma qualificação profissional. Digamos que seria o caso, no máximo, de médicos e engenheiros, com alguma extensão a dentistas e assemelhados.
O resto, necas de pitiribas, nenhum diploma, concursos totalmente abertos.
Advogado precisa de registro na OAB atualmente: mas isso é um resquício medieval totalmente ultrapassado, uma reserva de mercado que lhes dá o direito de cobrar um pouco mais, apenas isso. Quem quiser um advogado, basta examinar seu curriculo e provas de habilidade, assim como temos hoje um Lattes funcional e aberto a consulta.
Estariamos melhor servidos e com preços bem mais razoáveis.
Abaixo a OAB, ou que ela sobreviva num mercado em concorrência total...
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Paulo Roberto de Almeida

sexta-feira, 19 de junho de 2009

1167) Um bilhao de famintos, e as mesmas "solucoes" de sempre...

Realmente é uma tristeza tomar conhecimento de que um bilhão de pessoas, um sexto da humanidade, passam fome, como indica a matéria abaixo.
A partir daí começa o festival do déjà vu e do more of the same: os organismos internacionais vão se mobilizar, os doadores vão entrar com dinheiro ou alimentos e finalmente algum alimento vai chegar aos mais necessitados, que entretempos terão morrido aos magotes.
Observem que as pessoas estão morrendo de fome, não por falta de alimentos no mundo, mas por falta de renda ou de canais apropriados de distribuição e cobertura alimentar.
Para sermos absolutamente sinceros, a responsabilidade maior incumbe aos governos desses países, que aparentemente não conseguem garantir a segurança alimentar de suas populações mais fragilizadas.
A culpa, portanto, é desses governos, que deveriam ser responsabilizados por isso.
Em lugar de consertar as coisas, os países doadores vão apenas remediar o problema: um pouco de dinheiro aqui, um pouco de ajuda alimentar ali, e tudo fica assim até a próxima crise alimentar.
Acho que o mundo deveria partir para outras soluções, como responsabilizar os governos, por exemplo, e depois parar com a hipocrisia da ajuda alimentar e sobretudo o protecionismo agrícola nos países ricos...


World hunger 'hits one billion'
Most of the world's undernourished live in developing countries
BBC news, 19.06.2009

One billion people throughout the world suffer from hunger, a figure which has increased by 100 million because of the global financial crisis, says the UN.
The UN's Food and Agriculture Organisation (FAO) said the figure was a record high.
Persistently high food prices have also contributed to the hunger crisis.
The director general of the FAO said the level of hunger, one-sixth of the world's population, posed a "serious risk" to world peace and security.
The UN said almost all of the world's undernourished live in developing countries, with the most, some 642 million people, living in the Asia-Pacific region.
In sub-Saharan Africa, the next worst-hit region, the figure stands at 265 million.
Just 15 million people are left hungry in the developed world.
"The silent hunger crisis - affecting one-sixth of all of humanity - poses a serious risk for world peace and security," said Jacques Diouf.
"We urgently need to forge a broad consensus on the total and rapid eradication of hunger in the world and to take the necessary actions."

'Contradiction'
The increase in the number of hungry people was blamed on lower incomes and increased unemployment, which in turn reduced access to food by the poor, the UN agency said.
But it contrasted sharply with evidence that much of the developed world is richer than ever before.

WORLD HUNGER
Asia-Pacific: 642m
Sub-Saharan Africa: 265m
Latin America and Caribbean: 53m
Middle East and North Africa: 42m
Developed world: 15m
Source: FAO

"It's the first time in human history that we have so many hungry people in the world," said FAO spokesman Kostas Stamoulis, director of the organisation's development department.
"And that's a contradiction, because a lot of the world is very rich despite the economic crisis."
Mr Diouf urged governments to provide development and economic assistance to boost agriculture, particularly by smallholder farmers.
"Investment in agriculture must be increased because for the majority of poor countries a healthy agricultural sector is essential to overcome poverty and hunger and is a pre-requisite for overall economic growth," he said.
Urban poor would probably face the most severe problems in coping with the global recession, the UN warned, because lower export demand and reduced foreign investment were more likely to hit urban jobs harder.
Many migrants to urban areas would be likely to return to rural areas, it added, transferring the burden.
Incomes have also dropped "substantially" in some developing countries where families depend on remittances from relatives working abroad.
With the financial crisis hitting all parts of the world more or less simultaneously, developing countries have less room to adjust, the UN agency says.

Food prices
Among the pressures is the reality that borrowing from international capital markets is "more limited" in a global crisis, the FAO said.
Food costs in developing countries now seem more expensive, despite prices in world markets declining during the food and fuel crisis of 2006-08, it added.
They remained on average 24% higher in real terms by the end of 2008 compared to 2006.
"For poor consumers, who spend up to 60% of their incomes on staple foods, this means a strong reduction in their effective purchasing power," the FAO said.

1166) Cooperacao Internacional Euro-Brasileira

Proferi palestra, nesta quarta-feira 17 de junho, no quadro do XVI FÓRUM BRASIL-EUROPA, organizado pela Fundação Konrad Adenauer no Senado Federal.

Que cooperação euro-brasileira faz sentido no âmbito internacional?
Uma proposta de agenda maximalista para resultados minimalistas


Paulo Roberto de Almeida (www.pralmeida.org)
Professor, Centro Universitário de Brasília – UniCeub

Vou me concentrar em alguns questões muito simples, e por isso mesmo, corro o risco de parecer simplista, talvez até caricatural; mas vou insistir nos meus pontos simples, todos eles focados na cooperação euro-brasileira em direção de terceiros países. Deixo de lado, portanto, o plano bilateral Brasil-UE: ainda que não se possa descartar inteiramente essa possibilidade, eu a considero secundária, talvez mesmo desnecessária. O tema, de toda forma, concerne a cooperação euro-brasileira no âmbito internacional, não a cooperação bilateral direta. Meu foco é a cooperação para o desenvolvimento, não diretamente, mas indiretamente, como explico a seguir.

Sumário:
1. A velha questão do desenvolvimento, ou, talvez, do não-desenvolvimento
2. Insistindo no inviável: o Brasil no caminho da Europa?
3. O que, exatamente, poderia ser feito no plano internacional?
4. O que, exatamente, poderiam fazer europeus e brasileiros juntos?
5. O que é maximalista e o que é minimalista na agenda de cooperação conjunta?

Para ler o trabalho clique aqui.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

1165) Conselheiros da Petrobras: 76 mil por ano

Nota preliminar ulterior (se isso não é contradição, não sei o que é):

Coloquei aqui uma aparente matéria de -- digo aparente pois foi dessa forma que a recebi pela internet, atribuída a um -- jornal, aqui reproduzida sobre o valor dos honorários dos conselheiros da Petrobras.
Em vista da enorme confusão aqui criada, a matéria foi retirada de circulação.

Minhas desculpas aos leitores pela confusão involuntariamente criada...

Paulo Roberto de Almeida

1164) O grande retrocesso monetario e cambial: comercio em moedas locais

O grande retrocesso Monetário e cambial: comércio em moedas locais
Paulo Roberto de Almeida
18.06.2009

Existem coisas que escapam à compreensão de economistas, ou até de pessoas normais.
Refiro-me, por exemplo, à febre ou frenesi em torno do comércio internacional feito em moedas locais, ou seja, dispensando o dólar, que desde a Segunda Guerra Mundial converteu-se no padrão de referência e veículo efetivo da maior parte das transações monetárias, financeiras, cambiais e, sobretudo, comerciais no mundo.
Isso não impede, obviamente, que outras moedas sejam usadas, como é o caso do euro nos países membros da UE e entre esta e uma multiplicidade de parceiros. O iene, a libra e algumas outras moedas também são utilizadas para determinadas transações ou entre número seleto de países.
O dólar não foi imposto a todos os demais países do mundo por alguma medida de força, ou de direito, dos EUA. Trata-se apenas do simples reconhecimento da importância econômica dos EUA, da confiança que os agentes econômicos e os próprios países têm na sua manutenção como instrumento confiável, que responde aos três critérios básicos de uma moeda.
Não custa nada lembrar quais são:
1) unidade de conta
2) instrumento de troca
3) reserva de valor
Ponto. Apenas isso. Claro, toda moeda é antes de mais nada uma questão de confiança: se você acredita que aquele papel pintado possui efetivamente poder de compra, que você poderá utilizá-lo de diferentes formas, para as mais variadas transações, ao longo do tempo, isto é, preservando o seu poder de compra, então você decide, em total liberdade, utilizar aquele papel pintado. Se você não confia, faz qualquer outra coisa, mas se desfaz desse papel pintado que não merece a sua confiança.

Pois bem: o mundo demorou anos, décadas, para construir um sistema multilateral de pagamentos e um regime de trocas que facilite as transações entre os países, com o mínimo de restrições possível. O multilateralismo monetário, por imperfeito que seja -- posto que as autoridades monetárias americanas podem decidir dar um calote no mundo, deixando de honrar seus compromissos externos, com os compradores de títulos do Tesouro, por exemplo -- é o melhor sistema possível, pois permite que a mesma moeda seja usada com os mais diferentes parceiros em todas as transações que eles desejem, sem se amarrar em um instrumento único, como ocorria ainda com o bilateralismo estrito dos anos 1930, baseado em compensações diretas entre os países.

À luz destas reflexões, eu não consigo compreender como se deseja recuar do multilateralismo -- ou seja, da liberdade cambial e monetária -- para o bilateralismo, no qual só poderemos utilizar a moeda de um parceiro com esse mesmo parceiro.
Me desculpem os mais bem informados, mas não consigo encontrar nenhuma explicação racional para esse tremendo equívoco conceitual, para esse imenso retrocesso econômico, para essa servidão voluntária, como já disse um filósofo.

Será que a inteligência econômica está recuando no mundo, ou em determinados países?

Paulo Roberto de Almeida

quarta-feira, 17 de junho de 2009

1163) Um debate sobre diplomatas e políticas de Estado

Como sempre ocorre com os comentários vinculados a um determinado post, eles são lisíveis apenas para quem se dê ao trabalho de clicar em cima e seguir o fio da meada. Mas existem comentários que são importantes, e que merecem ser destacados, como parece ser o caso destes anexados a este post sobre questões monetárias:

Quinta-feira, Junho 11, 2009
1152) "Emprestimo" ao FMI: comentarios ao meu post e meu novo comentario

Para alimentar o debate -- e eu gosto de debates, pois julgo que eles são sempre esclarecedores -- permito-me transcrever aqui os comentários feitos e meus comentários a esses comentários.

Para facilitar a compreensão, transcrevo a parte final do post em questão (que já era uma assemblagem de comentários), pois o primeiro comentário feito pela Gláucia, se reportava a essa frase final.


2) Anônimo disse...

Pois é, na prova de PI de terceira fase do CACD deste ano, caiu a participação do Brasil no G20 Financeiro. E nós candidatos tivemos de tecer todos os encômios possíveis ao empréstimo brasileiro ao FMI, ecoando toda aquela ladainha de o Brasil aceitando ônus para legitimar-se no pleito de ampliação de participação no sistema internacional.
Tudo para Antônio Carlos Lessa e Alcides Costa Vaz verem. Vou começar uma campanha: "PRA na banca de PI do CACD já!"
Quinta-feira, Junho 11, 2009 2:32:00 PM

PRA: O mais irônico é que candidatos a diplomatas não podem simplesmente expor os fatos, contar a realidade, basear-se em número reais e em questões objetivas. Esses candidatos precisam "comprar" a versão chapa branca do governo e repetir bobagens, literalmente bobagens consumadas e equívocos econômicos, num papel triste de repetidores da propaganda governamental, que além de falsa, é fraudulenta. Triste isso, que já se comece mentindo...
Quanto a minha presença em banca de PI, pode esquecer: não há nenhum risco que isso ocorra, pela mesma razão de por que meus livros não constam da bibliografia oficial. Deve ser porque eu não compro fábulas oficiais...

Postado por Paulo R. de Almeida às 5:55 PM

3 Comentários

Glaucia disse...

Bem, Professor, acho que isso é até esperado, não? Afinal de contas, trata-se de um concurso para diplomatas, e não para analistas econômicos. Grave é quando acontece no IPEA.

Não me choca que o Itamaraty busque pessoas que sejam (além de - e não em vez de - tecnicamente qualificadas) suficientemente sensatas para sustentar uma política de Estado.

Eis ai um tópico que você poderia nos iluminar com sua experiência. Quanto deve um diplomata ter de si mesmo nas declarações que faz, e quanto deve ele ser um homem de Estado?

Sempre se pode apelar ao consensualismo tão lulista (e tão brasileiro) de dizer que não ha necessária oposição entre uma coisa e outra - mas seria mentira, não é mesmo? Um diplomata americano da era Obama tem direito de continuar a pregar a guerra ao terror? Um da era Bush deveria sair a campo criticando o apoio incondicional dos EUA a Israel como improdutivo? Em ambos os casos, podem eles condenar Guantanamo como contraria ao direito internacional humanitário sem ordens superiores?

Tiro disso, então, a conclusão lógica: sera um problema que o Itamaraty queira dos seus integrantes mais do que lucidez, sensatez? Será tão ultrajante pedir, sim, que conheçam a postura do Estado brasileiro, e sejam capazes de exprimi-la inclusive com a maior sinceridade?

Quarta-feira, Junho 17, 2009 9:19:00 AM


Blogger Paulo R. de Almeida disse...

Glaucia,
Você colocou questões extremamente importantes, não apenas no plano individual, ou seja do servidor do Estado enquanto ser pensante, de um lado, e enquanto servo obediente, de outro, mas sobretudo na conformação das políticas públicas: como elas se formam, se correspondem, ou não, ao interesse nacional, se respondem a critérios de racionalidade econômica, mais do que de conveniência política ou de simpaticas ideológicas, enfim, um conjunto de questões que não tenho tempo de abordar agora, mas que estou separando e guardando para um comentário futuro, talvez até um trabalho mais amplo sobre essa questão. Promessa.
No momento, e quanto a minha posição apenas, só posso dizer que nunca, em toda a minha vida, e especialmente na carreira, jamais deixei o cérebro na portaria quando ingresso para trabalhar, e jamais renuncio a pensar com minha própria cabeça na consideração e avaliação de questões como essas.
Voltarei ao assunto.
PRA

Quarta-feira, Junho 17, 2009 12:54:00 PM


Glaucia,
Não vou comentar agora a substância de seus argumentos, mas não posso deixar passar três questões em torno das quais você me parece estar "fora da marca", ou miss the point, como se diz...
Você escreveu:
1) "Afinal de contas, trata-se de um concurso para diplomatas, e não para analistas econômicos. Grave é quando acontece no IPEA."

PRA: Sua frase parece implicar que diplomatas podem se permitir o direito de serem mais relapsos, ou negligentes, com a economia, do que analistas econômicos do IPEA, o que reputo tremendamente equivocado. Não é porque se está fazendo uma seleção para diplomatas que os exames de entrada tenham de ser mais lenientes, complacentes, tolerantes com a irracionalidade econômica, ao contrário: temos de ser tão rigorosos quanto qualquer concurso de especialistas em economia, pois afinal de contas são os interesses do país que estão em jogo, não a renda individual de cada candidato à diplomacia. Não temos simplesmente o direito de ignorar a economia...

2) "Não me choca que o Itamaraty busque pessoas que sejam (além de - e não em vez de - tecnicamente qualificadas) suficientemente sensatas para sustentar uma politica de Estado."

PRA: Sensatez é um qualificativo subjetivo e alguém pode aparecer como razoavelmente sensato aos olhos de um true believer nas virtudes da economia socialista (como um Chávez, por exemplo) e aparecer como um esquizofrênico econômico aos olhos de qualquer outro economista "sensato".
Por outro lado, "sustentar uma política de Estado" me parece muito vago. O Estado é uma entidade abstrata e suas únicas políticas são aquelas propostas por pessoas de carne e osso, com suas crenças e ideologias, e aprovadas por um grupo de lobistas setoriais agregados em algo confuso que se chama Parlamento. Ou seja, sempre aplicamos políticas de governo, que se são estáveis e equilibradas o suficiente ganham credibilidade e passam a ser chamadas de políticas de Estado, pelo menos durante certo tempo. Os militares no Brasil, por exemplo, construiram muitas politicas de Estado, a ponto de este dominar 35% da economia (formação do PIB). O que era perfeitamente racional num determinado momento -- empresas de telecomunicações por exemplo -- tornou-se flagrantemente absurdo anos depois, quando você só conseguir uma linha telefônica se comprasse uma disponível no mercado, por mais ou menos 4 mil dólares. Isso não me parece uma boa política de Estado e se um diplomata continuasse a defender esse tipo de política, ele mereceria ser internado como louco de hospício.

Finalmente, você escreve:
3) "Tiro disso, então, a conclusão logica: sera um problema que o Itamaraty queira dos seus integrantes mais do que lucidez, sensatez? Sera tão ultrajante pedir, sim, que conheçam a postura do Estado brasileiro, e sejam capazes de exprimi-la inclusive com a maior sinceridade?"

PRA: Respondo expressamente que SIM, o Itamaraty quer sim algo mais do que lucidez e sensatez, que como disse são conceitos subjetivos. Se requer preparação técnica, um bom conhecimento de direito internacional, um bom domínio das realidades econômicas, uma familiaridade muito grande com os problemas brasileiros.
Como disse acima, o Estado não tem postura, e sim governos concretos. Estado é uma entidade abstrata ocupada temporariamente por grupos políticos que disputaram no mercado eleitoral o direito de administrar o Estado por um tempo limitado. Esse grupo pode ser composto de malucos de pedra que determinam "políticas de Estado" absolutamente danosas e irracionais e o diplomata precisa ter consciência disso.
Eu lhe dou dois exemplos imediatos disso.
Semana passada, o ministro do Planejamento demonstrou preocupação com a valorização do real, como aliás reclamavam os industriais (um grupo de empresários que representam no máximo 10 ou 15% da economia brasileira). Pois ele recomendou que o Banco Central comprasse mais dólares, o que significa tripudiar com a nossa inteligência e os nossos interesses como nação (100% do PIB). Pois para comprar mais dólares, o BC precisa emitir títulos da dívida pública, pois nem ele emite dólares, nem tem recursos para tanto, ou seja, precisa aumentar a dívida pública. Como é possivel fazer esse tipo de recomendação, quando se paga a Selic pela dívida pública e a "remuneração" do dólar, se houver fica abaixo disso, sendo mais provavelmente negativa?
Outro exemplo é essa idéia de malucos monetários que querem escapar do multilateralismo monetário para começar a negociar com moedas inconversíveis, como o rublo russo, o yuan chinês e a rúpia indiana. Quem propõe tal involução ao bilateralismo no sistema de pagamentos só pode ser internado como Napoleão de garagem.

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Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...