O presidente Lula fez, nesta terça-feira 21 de julho de 2009, comentários sobre os bancos públicos brasileiros, que foram reproduzidos num boletim da Liderança do PT na Câmara dos Deputados, com data de 22.07.2009.
Reproduzo aqui a totalidade desta nota:
Lula defende bancos públicos e critica privatizações
Informes nº 4283 - Quarta-feira 22/07/2009
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou na última segunda-feira que os bancos públicos, como o Banespa, podem ter sido usados para reforçar ilegalmente o orçamento de campanhas eleitorais no passado. Em reunião com executivos do Banco do Brasil, ele relacionou as consequências desse fato às privatizações ocorridas principalmente no fim dos anos 90 e início dos 2000. Lula fez uma defesa da existência dos bancos públicos.
"Na verdade, jogou-se em cima dos bancos a irresponsabilidade dos governantes que gerenciavam esse banco ou que muitas vezes utilizavam esse banco para fazer, quem sabe, os caixas 2 da vida em época de campanha eleitoral", disse, sem citar nenhuma instituição específica. "E, por conta disso, todos os bancos públicos estavam quebrados", afirmou, ao criticar a onda de privatizações ocorrida há cerca de dez anos.
Ao comentar que a economia brasileira tem sido beneficiada atualmente pela atuação de bancos públicos em meio à crise, Lula afirmou que "é nesse momento em que a gente sente o acerto do Brasil ter um banco como o Banco do Brasil ou uma Caixa Econômica. E talvez o arrependimento porque bancos tão importantes nesse País foram praticamente doados, como o Banespa, vendido a troco de nada", afirmou.
Em 2000, o espanhol Santander pagou R$ 7 bilhões pelo banco paulista, com ágio de 281% sobre o preço mínimo. O presidente brincou ao dizer que tem "pena" dos países ricos, que não têm bancos públicos fortes e deu como exemplos a Alemanha e os Estados Unidos. As informações são do jornal O Estado de São Paulo.
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Agrego poucos comentários:
1) De fato, bancos públicos foram usados para financiar políticos e candidatos, no passado, e por isso quebraram, provocando um imenso prejuízo ao Brasil, que teve de intervir, sanear e depois vender esses bancos. Eles hoje cumprem sua função de bancos, e não de financiadores ilegais de políticos.
2) Eles foram privatizados justamente por isso, e portanto, os argumentos do presidente não possuem consistência lógica e são absolutamente incompreensíveis para quem lida com lógica formal.
3) Se os bancos públicos existiam e estavam a serviço de governantes, é claro, evidente, cristalino, que havia o risco de sua utilização indevida. Não juntar uma coisa com outra representava um descolamento da realidade...
4) Dizer que o Banespa foi vendido a troco de nada, ou doado, não é correto e o presidente foi logo desmentido pelo próprio boletim do PT, que esclarece que o Banespa foi vendido com um ágio 281 por cento acima do preço mínimo. Se isso é doação, o presidente precisaria esclarecer o que seria uma venda com lucros...
5) Ficar com pena dos EUA e da Alemanha, porque não têm bancos públicos é extremamente magnânimo da parte do presidente, mas não creio que os dirigentes políticos concordariam com a hipótese, ou sequer com a realidade. Esses dois países têm milhares de bancos públicos, que são as cooperativas de créditos, as caixas hipotecárias, as instituições de poupança e outros entes financeiros totalmente públicos, ou seja, controlados por municípios, governos estaduais, sindicatos, cooperativas etc. Todos eles funcionando de acordo com regras de mercado, num sistema de crédito extensivo e pujante. O que eles não têm são grandes bancos públicos funcionando com verbas orçamentárias ou submetidas a comandos políticos arbitrários, que lhes digam a quem e a quanto eles devem emprestar. Acho que esses dois países estão melhor assim.
6) O presidente não mencionou todo o dinheiro público, isto é, dos cidadãos, que foi colocado no BB, ou na CEF, ou no BNDES, para livrá-los de situações constrangedoras ou de quebradeira, simplesmente. Acho que ele não foi informado sobre os bilhões que o governo passou a esses bancos, que distorcem as condições do mercado de capitais, ao emprestar a taxas que não representam a realidade do mercado.
Certas pessoas são consideradas inimputáveis em suas declarações e atos, como as crianças, os índios, os alienados...
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
quarta-feira, 22 de julho de 2009
1229) Um pouco de gozacao, pois a realidade ja é muito dura
A transcrição abaixo, puramente aleatória, não tem absolutamente nada a ver com os objetivos e o chamado "espírito" desta lista. Mas, aqui já tem posts sérios demais, tratando de relevantes problemas da nacionalidade e do assim chamado sistema internacional.
Portanto, nada como aproveitar um fim de noite (na verdade, madrugada), para postar algo risível, anódino, inocente, mas que provavelmente reflete muito bem o nosso país.
O garçom de Hamburgo
Blog do Noblat, 17.7.2009
Nunca me esqueci de uma historinha contada por Jô Soares em seu programa de entrevistas. Digo historinha porque tem princípio, meio e fim e porque não é muito longa. Mas não é história, não é ficção, é fato verídico. Não sei precisar a data, mas creio que o fato se passou há bastante tempo. Também não posso garantir a exatidão das palavras, a memória não é um gravador, mas o miolo e o desfecho do diálogo são exatamente esses que passo a relatar:
Jô Soares estava em Hamburgo, Alemanha, com seu pai. Foram almoçar. O restaurante era elegante e o cardápio indicava preços salgados. Fluentes em várias línguas fizeram seus pedidos, não sei se em alemão ou francês. Feito isso, pai e filho começaram a bater papo. Se o pai do Jô era parecido com ele, imagino o papo animado. Se fosse mais calado, o filho com certeza falava pelos dois.
De repente o garçom para diante deles e pergunta:
_ Brrrasileirrras?
_ Somos, diz o senhor Soares.
_ Von wo? Ondchi?
_ Do Rio de Janeiro.
_ Rrrrioo de Janeirrro, shodadis...
_ O senhor conhece o Brasil?
_ Sim. Trrrabalhou lá, morrrou lá.
-- É mesmo? E gostou?
_ Adorrrrooou! Vai voltarrr.
O pai do Jô olhou para o filho, com quem acabara de comentar uma das sempiternas crises brasileiras, e disse para o garçom:
_ Talvez fosse melhor pensar bem. Aqui o senhor está em sua terra, tem a proteção do Estado, muita segurança, com certeza ganha bem e ainda recebe boas gorjetas.
_ Ganharrr bem, ganharr. Segurrro, é. Mas tem grosse shodadis, grosse.
_ Deixou alguma namorada lá?
_ Non, non, non, ich casada, vai com mulherrrr.
_ Mas do que é que tem tanta saudade então?
_ Do “esculhambaçom”.
Nada para mim, nem textos dos mais brilhantes escritores brasileiros, descreve melhor o Brasil do que esse breve diálogo.
O “esculhambaçom” é um de nossos traços marcantes. Há países que mudam, há países que se transformam, há países que sofrem reformas, pacíficas umas, outras frutos de revoluções e até de guerras. Mudam inteiramente, às vezes ficam quase irreconhecíveis. Para pior, para melhor, mas mudam.
Não foi o que aconteceu conosco. As mudanças aqui foram cosméticas: as cidades cresceram, temos mais automóveis nas ruas, mais viadutos e túneis, mais aeroportos, mais edifícios, mais estados e mais políticos. Mas foi só. De resto, nosso espírito é o mesmo.
Somos diferentes até nisso: como acontece com as pessoas, a idade só fez acentuar nossas características mais marcantes. E uma delas é “o esculhambaçom”. Nunca foi tão grande. Nunca foi tão viçosa, nunca foi tão desenfreada, nunca foi tão desabrida, nunca foi tão gloriosa.
E nunca exerceu o mando como agora. As rédeas estão em suas mãos. Tomara que o hamburguês tenha vindo. Ele há de estar no sétimo céu com tanta “esculhambaçom”!
=======
PRA:
Bem, acho que isso basta: temos um brilhante futuro para a nossa “esculhambaçom”!
Portanto, nada como aproveitar um fim de noite (na verdade, madrugada), para postar algo risível, anódino, inocente, mas que provavelmente reflete muito bem o nosso país.
O garçom de Hamburgo
Blog do Noblat, 17.7.2009
Nunca me esqueci de uma historinha contada por Jô Soares em seu programa de entrevistas. Digo historinha porque tem princípio, meio e fim e porque não é muito longa. Mas não é história, não é ficção, é fato verídico. Não sei precisar a data, mas creio que o fato se passou há bastante tempo. Também não posso garantir a exatidão das palavras, a memória não é um gravador, mas o miolo e o desfecho do diálogo são exatamente esses que passo a relatar:
Jô Soares estava em Hamburgo, Alemanha, com seu pai. Foram almoçar. O restaurante era elegante e o cardápio indicava preços salgados. Fluentes em várias línguas fizeram seus pedidos, não sei se em alemão ou francês. Feito isso, pai e filho começaram a bater papo. Se o pai do Jô era parecido com ele, imagino o papo animado. Se fosse mais calado, o filho com certeza falava pelos dois.
De repente o garçom para diante deles e pergunta:
_ Brrrasileirrras?
_ Somos, diz o senhor Soares.
_ Von wo? Ondchi?
_ Do Rio de Janeiro.
_ Rrrrioo de Janeirrro, shodadis...
_ O senhor conhece o Brasil?
_ Sim. Trrrabalhou lá, morrrou lá.
-- É mesmo? E gostou?
_ Adorrrrooou! Vai voltarrr.
O pai do Jô olhou para o filho, com quem acabara de comentar uma das sempiternas crises brasileiras, e disse para o garçom:
_ Talvez fosse melhor pensar bem. Aqui o senhor está em sua terra, tem a proteção do Estado, muita segurança, com certeza ganha bem e ainda recebe boas gorjetas.
_ Ganharrr bem, ganharr. Segurrro, é. Mas tem grosse shodadis, grosse.
_ Deixou alguma namorada lá?
_ Non, non, non, ich casada, vai com mulherrrr.
_ Mas do que é que tem tanta saudade então?
_ Do “esculhambaçom”.
Nada para mim, nem textos dos mais brilhantes escritores brasileiros, descreve melhor o Brasil do que esse breve diálogo.
O “esculhambaçom” é um de nossos traços marcantes. Há países que mudam, há países que se transformam, há países que sofrem reformas, pacíficas umas, outras frutos de revoluções e até de guerras. Mudam inteiramente, às vezes ficam quase irreconhecíveis. Para pior, para melhor, mas mudam.
Não foi o que aconteceu conosco. As mudanças aqui foram cosméticas: as cidades cresceram, temos mais automóveis nas ruas, mais viadutos e túneis, mais aeroportos, mais edifícios, mais estados e mais políticos. Mas foi só. De resto, nosso espírito é o mesmo.
Somos diferentes até nisso: como acontece com as pessoas, a idade só fez acentuar nossas características mais marcantes. E uma delas é “o esculhambaçom”. Nunca foi tão grande. Nunca foi tão viçosa, nunca foi tão desenfreada, nunca foi tão desabrida, nunca foi tão gloriosa.
E nunca exerceu o mando como agora. As rédeas estão em suas mãos. Tomara que o hamburguês tenha vindo. Ele há de estar no sétimo céu com tanta “esculhambaçom”!
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PRA:
Bem, acho que isso basta: temos um brilhante futuro para a nossa “esculhambaçom”!
terça-feira, 21 de julho de 2009
1228) Desregulamentar TODAS as profissoes, Alexandre de Barros
O artigo transcrito abaixo deve ser lido em conexão com este meu post:
Sexta-feira, 17 de Julho de 2009
1224) Diploma de jornalista: um debate sobre uma excrescencia
Desregulamentar profissões. Todas!
Alexandre Barros
O Estado de São Paulo, terça-feira, 21 de julho de 2009, p. A-2
O governo anunciará em breve a proibição de carros pequenos com motores de menos de 2.0 e serão obrigatórios transmissão automática, computadores de bordo e airbags sêxtuplos. Que tal lhe pareceria essa notícia? Fords Ka, Fiats Palio, Fords Fiesta sumiriam do mercado. Todos os carros custariam muito mais caro. Adeus ao sonho do carro 1.0, sem imposto. Seria uma crise nacional.
Mas não causa crise sermos obrigados a pagar a um médico formado numa faculdade, que estudou seis anos, para girar lentes na frente do nosso rosto e nos dizer que temos 2,5 graus de miopia. Ou pagar a um médico a taxa de carta de motorista, para nos mandar ler algumas letras na parede. Nem causa espanto que precisemos pagar a advogados, formados por cinco anos, para nos tirarem da cadeia, coisa que um estudante de Direito do primeiro ano sabe fazer, ou até mesmo quem nunca estudou Direito.
Escrevi, nos anos 70, um artigo chamado Em defesa dos advogados, publicado no Jornal da Tarde. Dias depois chegou pelo correio (a vida era assim antes daquele menino maluquinho e irresponsável, William Gates III, que abandonou a faculdade) cópia de carta do presidente da OAB de São Paulo protestando e explicando detalhadamente por que a regulamentação exercida pela OAB era fundamental para a defesa dos interesses dos possíveis clientes. Mas a carta não falava nada sobre a obrigação de pagar mais caro por advogados que estudaram cinco anos para prestar serviços corriqueiros sem complexidades ou consequências jurídicas maiores. A resposta: custa muito caro porque, quando pagamos a um advogado, temos de ressarci-lo pelos anos de estudos de Direito e pagar um naco das mensalidades da OAB, que é um sindicato que defende mais os interesses dos advogados que o dos clientes.
Desregulamentar a medicina? Certamente. Faço palestras em que proponho a desregulamentação da medicina. A reação das plateias é de horror. Mas como? É a nossa saúde que está em jogo!
Imediatamente depois da reação, mas ainda durante o pânico, peço que levantem a mão todas as pessoas que utilizaram (ou seus parentes próximos) tratamentos alternativos, como cromoterapia, florais de Bach, aromaterapia, cinesiologia, hidroterapia, iridologia, quiropracticia, etc. Sempre mais de metade das audiências levantou as mãos. Ou seja, as pessoas acreditam em terapias alternativas, usam-nas em substituição à medicina e muitas depositam a continuidade de sua vida nelas (como quem se trata de câncer com extratos de sementes de pêssegos). Mas, quando perguntadas, a maioria diz-se a favor da regulamentação da medicina.
Bem-vindos ao mundo das profissões regulamentadas. O Cialis, o maior concorrente do Viagra para disfunção erétil, custou ao laboratório que o inventou, desenvolveu e comercializa entre US$ 600 milhões e US$ 800 milhões antes da venda do primeiro comprimido. Foram centenas de cientistas, pesquisadores, bioquímicos e milhares de testes exigidos pela FDA (a Anvisa americana). Cada vez que compra uma caixa de Cialis, você paga por todos esses custos. Mas há um, inútil, que você paga e não se dá conta: o salário da farmacêutica responsável da filial da empresa que produz o Cialis no Brasil. Ela entra na produção do Cialis como Pilatos no Credo, sem ter nada que ver com os benefícios do remédio. Ela só está lá porque os farmacêuticos (como todos os outros profissionais regulamentados) conseguiram que o Congresso Nacional votasse uma lei obrigando todos os laboratórios a terem um(a) farmacêutico(a) responsável, e também cada farmácia a ter um(a) farmacêutico(a) para lhe vender a caixinha dos comprimidos mágicos (ou de qualquer outro remédio que você queira comprar).
José Zanine Caldas, famosíssimo arquiteto autodidata, desenhou e construiu algumas das mais caras e belas casas do Joá e da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Quem as comprava pagava por sua competência e seu bom gosto, mas um naco era para o engenheiro formado, cuja única função era assinar a planta. Zanine foi professor na Universidade de Brasília. Hoje não poderia, porque não tinha diploma.
Em resumo, não ganhamos nada com profissões regulamentadas. Só ganham os profissionais que fazem parte delas.
Sou contra as faculdades? Não (vivo, em parte, de ser professor). Mas acho que todos devem poder contratar, para qualquer serviço, o profissional em quem confiam, independentemente de ter ou não um diploma e/ou um registro profissional.
Quando regulamentam profissões, parlamentares caem na esparrela de acreditar que estão defendendo o público. Potoca. Estão apenas defendendo um mercado cativo para grupos politicamente organizados que buzinaram nos seus ouvidos que eles deviam regulamentar alguma profissão.
O problema não é só brasileiro. Todos os prédios que você vê ao vivo em Las Vegas, ou no seriado CSI, foram construídos por pessoas de bom caráter. Pedreiros, no Estado de Nevada, precisam apresentar um atestado de bom caráter, além de saber empilhar tijolos.
Uma lei de 1952 proibia comunistas de serem farmacêuticos no Texas e, no Estado de Washington, veterinários eram proibidos de tratar de vacas enfermas se não assinassem um juramento anticomunista.
Há no Congresso brasileiro 169 projetos de regulamentação de profissões. A cada um que for aprovado você pagará mais caro por aquele serviço, em troca de proteção zero. Regulamentações profissionais só protegem os prestadores de serviços e excluem concorrentes que poderiam prestar os mesmos serviços, só que mais barato.
Acabou de ler o artigo? Não tem nada que fazer? Entre no YouTube (http://www.youtube.com/watch?v=B6vOChhue20). E ouça o hino do farmacêutico.
Parabéns! A conta é toda sua, inclusive a do hino.
*Alexandre Barros, cientista político (Ph.D. pela University of Chicago), é diretor-gerente da Early Warning: Análise de Oportunidade e Risco Político.
=========
Addendum PRA: Creio que não preciso sublinhar que também sou a favor da desregulamentação de todas as profissões, inclusive a minha própria, que seria não estável e aberta a todos os capacitados por conta própria, bastando fazer exames de entrada, sem qualquer certificado de estudos ou diploma profissional, sem sequer exigência de alfabetização.
Sexta-feira, 17 de Julho de 2009
1224) Diploma de jornalista: um debate sobre uma excrescencia
Desregulamentar profissões. Todas!
Alexandre Barros
O Estado de São Paulo, terça-feira, 21 de julho de 2009, p. A-2
O governo anunciará em breve a proibição de carros pequenos com motores de menos de 2.0 e serão obrigatórios transmissão automática, computadores de bordo e airbags sêxtuplos. Que tal lhe pareceria essa notícia? Fords Ka, Fiats Palio, Fords Fiesta sumiriam do mercado. Todos os carros custariam muito mais caro. Adeus ao sonho do carro 1.0, sem imposto. Seria uma crise nacional.
Mas não causa crise sermos obrigados a pagar a um médico formado numa faculdade, que estudou seis anos, para girar lentes na frente do nosso rosto e nos dizer que temos 2,5 graus de miopia. Ou pagar a um médico a taxa de carta de motorista, para nos mandar ler algumas letras na parede. Nem causa espanto que precisemos pagar a advogados, formados por cinco anos, para nos tirarem da cadeia, coisa que um estudante de Direito do primeiro ano sabe fazer, ou até mesmo quem nunca estudou Direito.
Escrevi, nos anos 70, um artigo chamado Em defesa dos advogados, publicado no Jornal da Tarde. Dias depois chegou pelo correio (a vida era assim antes daquele menino maluquinho e irresponsável, William Gates III, que abandonou a faculdade) cópia de carta do presidente da OAB de São Paulo protestando e explicando detalhadamente por que a regulamentação exercida pela OAB era fundamental para a defesa dos interesses dos possíveis clientes. Mas a carta não falava nada sobre a obrigação de pagar mais caro por advogados que estudaram cinco anos para prestar serviços corriqueiros sem complexidades ou consequências jurídicas maiores. A resposta: custa muito caro porque, quando pagamos a um advogado, temos de ressarci-lo pelos anos de estudos de Direito e pagar um naco das mensalidades da OAB, que é um sindicato que defende mais os interesses dos advogados que o dos clientes.
Desregulamentar a medicina? Certamente. Faço palestras em que proponho a desregulamentação da medicina. A reação das plateias é de horror. Mas como? É a nossa saúde que está em jogo!
Imediatamente depois da reação, mas ainda durante o pânico, peço que levantem a mão todas as pessoas que utilizaram (ou seus parentes próximos) tratamentos alternativos, como cromoterapia, florais de Bach, aromaterapia, cinesiologia, hidroterapia, iridologia, quiropracticia, etc. Sempre mais de metade das audiências levantou as mãos. Ou seja, as pessoas acreditam em terapias alternativas, usam-nas em substituição à medicina e muitas depositam a continuidade de sua vida nelas (como quem se trata de câncer com extratos de sementes de pêssegos). Mas, quando perguntadas, a maioria diz-se a favor da regulamentação da medicina.
Bem-vindos ao mundo das profissões regulamentadas. O Cialis, o maior concorrente do Viagra para disfunção erétil, custou ao laboratório que o inventou, desenvolveu e comercializa entre US$ 600 milhões e US$ 800 milhões antes da venda do primeiro comprimido. Foram centenas de cientistas, pesquisadores, bioquímicos e milhares de testes exigidos pela FDA (a Anvisa americana). Cada vez que compra uma caixa de Cialis, você paga por todos esses custos. Mas há um, inútil, que você paga e não se dá conta: o salário da farmacêutica responsável da filial da empresa que produz o Cialis no Brasil. Ela entra na produção do Cialis como Pilatos no Credo, sem ter nada que ver com os benefícios do remédio. Ela só está lá porque os farmacêuticos (como todos os outros profissionais regulamentados) conseguiram que o Congresso Nacional votasse uma lei obrigando todos os laboratórios a terem um(a) farmacêutico(a) responsável, e também cada farmácia a ter um(a) farmacêutico(a) para lhe vender a caixinha dos comprimidos mágicos (ou de qualquer outro remédio que você queira comprar).
José Zanine Caldas, famosíssimo arquiteto autodidata, desenhou e construiu algumas das mais caras e belas casas do Joá e da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Quem as comprava pagava por sua competência e seu bom gosto, mas um naco era para o engenheiro formado, cuja única função era assinar a planta. Zanine foi professor na Universidade de Brasília. Hoje não poderia, porque não tinha diploma.
Em resumo, não ganhamos nada com profissões regulamentadas. Só ganham os profissionais que fazem parte delas.
Sou contra as faculdades? Não (vivo, em parte, de ser professor). Mas acho que todos devem poder contratar, para qualquer serviço, o profissional em quem confiam, independentemente de ter ou não um diploma e/ou um registro profissional.
Quando regulamentam profissões, parlamentares caem na esparrela de acreditar que estão defendendo o público. Potoca. Estão apenas defendendo um mercado cativo para grupos politicamente organizados que buzinaram nos seus ouvidos que eles deviam regulamentar alguma profissão.
O problema não é só brasileiro. Todos os prédios que você vê ao vivo em Las Vegas, ou no seriado CSI, foram construídos por pessoas de bom caráter. Pedreiros, no Estado de Nevada, precisam apresentar um atestado de bom caráter, além de saber empilhar tijolos.
Uma lei de 1952 proibia comunistas de serem farmacêuticos no Texas e, no Estado de Washington, veterinários eram proibidos de tratar de vacas enfermas se não assinassem um juramento anticomunista.
Há no Congresso brasileiro 169 projetos de regulamentação de profissões. A cada um que for aprovado você pagará mais caro por aquele serviço, em troca de proteção zero. Regulamentações profissionais só protegem os prestadores de serviços e excluem concorrentes que poderiam prestar os mesmos serviços, só que mais barato.
Acabou de ler o artigo? Não tem nada que fazer? Entre no YouTube (http://www.youtube.com/watch?v=B6vOChhue20). E ouça o hino do farmacêutico.
Parabéns! A conta é toda sua, inclusive a do hino.
*Alexandre Barros, cientista político (Ph.D. pela University of Chicago), é diretor-gerente da Early Warning: Análise de Oportunidade e Risco Político.
=========
Addendum PRA: Creio que não preciso sublinhar que também sou a favor da desregulamentação de todas as profissões, inclusive a minha própria, que seria não estável e aberta a todos os capacitados por conta própria, bastando fazer exames de entrada, sem qualquer certificado de estudos ou diploma profissional, sem sequer exigência de alfabetização.
1227) STF e os poderes judiciarios dos Brics
Interessante o protocolo assinado com os congêneres dos Brics pelo presidente atual do STF.
Afinal de contas, conhecendo-se a situacao interna de cada um dos Brics, "aprofundar o estado democrático de direito, o respeito aos direitos humanos e a independência judicial" é tudo o que os paises realmente precisam.
Só me pergunto porque, especificamente, esse tipo de cooperacao precisa ser feito exclusivamente com os Brics. Por que acordos semelhantes não podem ser feitos com paises que ostentam um belo registro de adesao, respeito, defesa desses mesmos principios apregoados no protocolo de intencoes (cujo nome diz tudo)?
Suponho, por lógica elementar, que sempre procuramos cooperar com quem tem algo a nos ensinar, nos transmitir, ou seja, que esteja um patamar (ou mais) acima dos nossos próprios padrões. Com base neste critério, minha pergunta é inevitável: os outros três Brics ostentam padrões superiores aos do Brasil em matéria de estado democrático de direito, de respeito aos direitos humanos e de independência judicial?
Uma simples resposta positiva justificaria a viagem e o protocolo assinado pelo nosso juiz supremo.
Respostas negativas classificariam sua viagem como turismo judicial...
Paulo Roberto de Almeida
-------------
STF assina protocolo de intenções entre os poderes judiciários dos quatro países que compõem o bloco político conhecido como BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China).
STF assina protocolo de intenções com judiciários da Rússia, China e Índia
O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, e o vice-presidente, ministro Cezar Peluso, trouxeram da viagem oficial à Rússia, ocorrida na semana passada, o protocolo de intenções acordado entre os poderes judiciários dos quatro países que compõem o bloco político conhecido como BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China).
O documento é um acordo do Supremo Tribunal Federal (STF), do Supremo Tribunal da Federação da Rússia, do Supremo Tribunal da Índia e do Tribunal Popular Supremo da China, representados por seus presidentes: Gilmar Mendes, Viatcheslav Mickhailovich Lebedev, Konakuppakatil Gopinathan Balakrishnan e Wang Shengjun, respectivamente.
O protocolo frisa a vontade dos quatro países desenvolverem ações, programas e instrumentos para informação e cooperação entre as cortes supremas. A intenção é aprofundar o estado democrático de direito, o respeito aos direitos humanos e a independência judicial.
Além disso, o texto prevê a “troca de experiências para a modernização e o aperfeiçoamento dos sistemas jurídicos dos países” para aproximar os sistemas jurídicos e legais com intercâmbio e visitas de magistrados. As partes também se comprometem a trocar documentos como livros, estudos e avaliações estatísticas.
Essa aproximação entre os judiciários do Brasil, Rússia, Índia e China deve ocorrer por meio de conferências, seminários e outros encontros técnicos e acadêmicos nos quais serão discutidos direitos humanos, acesso à Justiça, soluções alternativas de controvérsias, proteção de menores, entre outros temas.
Afinal de contas, conhecendo-se a situacao interna de cada um dos Brics, "aprofundar o estado democrático de direito, o respeito aos direitos humanos e a independência judicial" é tudo o que os paises realmente precisam.
Só me pergunto porque, especificamente, esse tipo de cooperacao precisa ser feito exclusivamente com os Brics. Por que acordos semelhantes não podem ser feitos com paises que ostentam um belo registro de adesao, respeito, defesa desses mesmos principios apregoados no protocolo de intencoes (cujo nome diz tudo)?
Suponho, por lógica elementar, que sempre procuramos cooperar com quem tem algo a nos ensinar, nos transmitir, ou seja, que esteja um patamar (ou mais) acima dos nossos próprios padrões. Com base neste critério, minha pergunta é inevitável: os outros três Brics ostentam padrões superiores aos do Brasil em matéria de estado democrático de direito, de respeito aos direitos humanos e de independência judicial?
Uma simples resposta positiva justificaria a viagem e o protocolo assinado pelo nosso juiz supremo.
Respostas negativas classificariam sua viagem como turismo judicial...
Paulo Roberto de Almeida
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STF assina protocolo de intenções entre os poderes judiciários dos quatro países que compõem o bloco político conhecido como BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China).
STF assina protocolo de intenções com judiciários da Rússia, China e Índia
O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Gilmar Mendes, e o vice-presidente, ministro Cezar Peluso, trouxeram da viagem oficial à Rússia, ocorrida na semana passada, o protocolo de intenções acordado entre os poderes judiciários dos quatro países que compõem o bloco político conhecido como BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China).
O documento é um acordo do Supremo Tribunal Federal (STF), do Supremo Tribunal da Federação da Rússia, do Supremo Tribunal da Índia e do Tribunal Popular Supremo da China, representados por seus presidentes: Gilmar Mendes, Viatcheslav Mickhailovich Lebedev, Konakuppakatil Gopinathan Balakrishnan e Wang Shengjun, respectivamente.
O protocolo frisa a vontade dos quatro países desenvolverem ações, programas e instrumentos para informação e cooperação entre as cortes supremas. A intenção é aprofundar o estado democrático de direito, o respeito aos direitos humanos e a independência judicial.
Além disso, o texto prevê a “troca de experiências para a modernização e o aperfeiçoamento dos sistemas jurídicos dos países” para aproximar os sistemas jurídicos e legais com intercâmbio e visitas de magistrados. As partes também se comprometem a trocar documentos como livros, estudos e avaliações estatísticas.
Essa aproximação entre os judiciários do Brasil, Rússia, Índia e China deve ocorrer por meio de conferências, seminários e outros encontros técnicos e acadêmicos nos quais serão discutidos direitos humanos, acesso à Justiça, soluções alternativas de controvérsias, proteção de menores, entre outros temas.
1226) Estratégia militar e de defesa: comentários em um debate
Os comentários abaixo devem ser lidos no imediato seguimento do post anterior:
Como comentários anexos se perdem no emaranhado dos posts (a menos que alguém clique no link respectivo), resolvi transcrever os que acabo de postar na sequencia anterior.
Poderemos algum dia ter autonomia tecnológica em matéria de defesa?
O ceticismo quanto às possibilidades de o Brasil desenvolver seu próprio submarino nuclear (ou outros equipamentos de defesa, e de ataque, como aviões de combate) pode ter um fundo de verdade, pois, afinal de contas, não é fácil conceber, desenhar, projetar e construir equipamentos complexos como motores, reatores, usinas, aviões supersônicos, ou mesmo carros, tanques, mísseis, aviões em geral. É preciso não apenas dominar toda a engenharia de projetos (supondo-se que se disponhoa de projetistas suficientes e de boa qualidade), mas também todos os aspectos da engenharia bruta, isto é, a indústria em si, sem falar do mercado, ou do financiamento estatal (que pode muito bem pagar por tudo isso e depois deixar estocado ou entregar os produtos para deleite dos militares).
Tudo isso leva tempo, exige determinação, algum sentido de planejamento e, sobretudo, dinheiro, não apenas como metal sonante, mas capital físico, intelectual e em suas várias outras formas...
Não diria que o Brasil é incapaz de fazer tudo isso: finalmente, temos know-how, tecnologia e dinheiro para fazer grandes barragens e, atualmente, aviões (ainda que com muita tecnologia importada, mas sempre é assim para quem começa tarde).
O Brasil pode e já está fazendo alguma coisa, mas sempre é mais fácil comprar pronto, quando se tem pressa e necessidade. Aí a dependência é inevitável, como ocorre em várias etapas e processos da industrialização brasileira.
De todo modo, se concebermos o desenvolvimento como aquela etapa em que o país alcança autonomia tecnológica, poderíamos afirmar que o Brasil já o alcançou ou está muito perto de fazê-lo.
Não se faz mais por problemas culturais (a introversão universitária ou a imbecil e irracional rejeição de parte do mundo acadêmico à "promiscuidade" com o mundo do negócios, dos lucros e da exploração capitalista), ou por problemas de política econômica: o custo do capital, a extorsão tributária brasileira, o regulacionismo anti-competitivo e anto-mercado, etc.
Aos poucos chegaremos lá.
No que se refere ao tempo de aprendizado, ou ao custo de fazer sozinho, este é um problema típico brasileiro: ao recusar maior grau de interdependência, o que se tem é isso, atrasos e custos maiores.
Falando da Estratégia Nacional de Defesa, especificamente, eu diria que ele representa o sonho ideal de todos os militares e estrategistas políticos. Pensando como economista, porém, eu diria que ela é impossível de ser alcançada, por exigir recursos superiores às possibilidades brasileiras.
No plano da concepção, também, eu diria que ela é paranóica, esquizofrênica ou simplesmente desnecessária, por ignorar determinadas realidades geopolíticas e basear-se numa concepção ultrapassada das relações de poder.
Generais e diplomatas estão sempre pensando com os olhos no retrovisor...
Como comentários anexos se perdem no emaranhado dos posts (a menos que alguém clique no link respectivo), resolvi transcrever os que acabo de postar na sequencia anterior.
Poderemos algum dia ter autonomia tecnológica em matéria de defesa?
O ceticismo quanto às possibilidades de o Brasil desenvolver seu próprio submarino nuclear (ou outros equipamentos de defesa, e de ataque, como aviões de combate) pode ter um fundo de verdade, pois, afinal de contas, não é fácil conceber, desenhar, projetar e construir equipamentos complexos como motores, reatores, usinas, aviões supersônicos, ou mesmo carros, tanques, mísseis, aviões em geral. É preciso não apenas dominar toda a engenharia de projetos (supondo-se que se disponhoa de projetistas suficientes e de boa qualidade), mas também todos os aspectos da engenharia bruta, isto é, a indústria em si, sem falar do mercado, ou do financiamento estatal (que pode muito bem pagar por tudo isso e depois deixar estocado ou entregar os produtos para deleite dos militares).
Tudo isso leva tempo, exige determinação, algum sentido de planejamento e, sobretudo, dinheiro, não apenas como metal sonante, mas capital físico, intelectual e em suas várias outras formas...
Não diria que o Brasil é incapaz de fazer tudo isso: finalmente, temos know-how, tecnologia e dinheiro para fazer grandes barragens e, atualmente, aviões (ainda que com muita tecnologia importada, mas sempre é assim para quem começa tarde).
O Brasil pode e já está fazendo alguma coisa, mas sempre é mais fácil comprar pronto, quando se tem pressa e necessidade. Aí a dependência é inevitável, como ocorre em várias etapas e processos da industrialização brasileira.
De todo modo, se concebermos o desenvolvimento como aquela etapa em que o país alcança autonomia tecnológica, poderíamos afirmar que o Brasil já o alcançou ou está muito perto de fazê-lo.
Não se faz mais por problemas culturais (a introversão universitária ou a imbecil e irracional rejeição de parte do mundo acadêmico à "promiscuidade" com o mundo do negócios, dos lucros e da exploração capitalista), ou por problemas de política econômica: o custo do capital, a extorsão tributária brasileira, o regulacionismo anti-competitivo e anto-mercado, etc.
Aos poucos chegaremos lá.
No que se refere ao tempo de aprendizado, ou ao custo de fazer sozinho, este é um problema típico brasileiro: ao recusar maior grau de interdependência, o que se tem é isso, atrasos e custos maiores.
Falando da Estratégia Nacional de Defesa, especificamente, eu diria que ele representa o sonho ideal de todos os militares e estrategistas políticos. Pensando como economista, porém, eu diria que ela é impossível de ser alcançada, por exigir recursos superiores às possibilidades brasileiras.
No plano da concepção, também, eu diria que ela é paranóica, esquizofrênica ou simplesmente desnecessária, por ignorar determinadas realidades geopolíticas e basear-se numa concepção ultrapassada das relações de poder.
Generais e diplomatas estão sempre pensando com os olhos no retrovisor...
sexta-feira, 17 de julho de 2009
1225) Compras militares: comentarios de jornalista
Opinião e comentários de conhecido jornalista -- não muito apreciado por sua suposta "objetividade", mas ainda assim bem informado -- sobre importantes decisões de aquisições militares pelo Brasil, talvez mais por simpatias políticas do que por racionalidade econômica ou tecnológica.
Voo cego, mergulho no escuro
Jânio de Freitas
Folha de S. Paulo, 16 de julho de 2009
DESDE O SEU início, a condução das providências ligadas à escolha e às condições para compra de novos caças da FAB e submarinos marca-se, na área civil dos governos Fernando Henrique e Lula, por volteios, argumentos artificiosos, intenções encobertas e, como resultado, um conjunto de obscuridades e negaças deliberadas. Para que negócios multibilionários se decidam em um pequeno círculo à margem de conhecimento e participação que representem o país, ao menos em medida razoável. Assim se chega ao momento crucial dos negócios, que Nelson Jobim quer formalizar na França já a partir de amanhã.
As obscuridades poderiam justificar-se no caso de razões estratégicas militares e de segurança nacional. Não há nenhuma envolvida. As especificações dos tipos de caças concorrentes para a compra são públicas, estão disponíveis no mundo todo em revistas de aeronáutica e na internet, incluindo preços conforme as especificações. Os submarinos não são mais misteriosos do que os jatos.
Os caças franceses Rafale, que Lula e Nelson Jobim querem comprar, estão entre os mais caros dos possíveis para a FAB. Consideradas as dimensões extraordinárias do Brasil, não são os que têm a melhor autonomia de voo, a capacidade de percorrer as maiores extensões sem reabastecimento. Entre os países que fizeram compras mais recentes de caças, a Venezuela pode ser desconsiderada por possível influência política e ideológica de sua aproximação militar com a Rússia, mas a boa força aérea da Índia procedeu a seleção rigorosa -e não escolheu o caça francês. A equipe de pilotos e técnicos da FAB que visitou seus colegas da Índia, e testou suas decisões, deu-as como as mais acertadas.
O processo de seleção brasileiro, desde Fernando Henrique, foi uma sucessão de saltos. Da escolha propriamente militar, passou à cessão de tecnologia para produção de aviões aqui. Deveria conduzir ao caça francês, cujo fabricante, Dassault, é representado no Brasil pela Embraer. Mas não o fez, porque foi criada alternativa mais completa por outro concorrente. A dada altura, entrou nas exigências brasileiras o incremento de comércio convencional que o país fabricante dos caças se dispusesse a fazer. Até chegar-se à discussão em torno de galináceos e espigas exportáveis pelo Brasil -critério ao menos original para seleção de aviões de caça. E o caça francês não ganhou. O jeito foi deixar a seleção em banho-maria.
Lula retomou-a. Com Nelson Jobim, com mais objetividade e sem novidade: na direção que se pôde intuir desde a primeira vez em que levou seus ares de vitorioso à primeira visita a uma empresa. A Embraer. Por que a Embraer, e não a Gerdau, a Mercedes, a VW, outra das grandiosas, não ficou claro. A não ser, talvez, para quem notou uma frase dita por Lula, sem razão alguma, como complemento dos elogios à empresa e sua bem sucedida situação: Precisamos ajudar a Embraer. É verdade que, não muito depois, ele foi comprar um avião francês. Mas daí a esquecer a Embraer e o caça da França há distância.
A explicação de Nelson Jobim para gastar com submarinos franceses dez vezes a proposta alemã é que foram incluídos no pacote, pela França, uma base e um estaleiro, além de tecnologia e quatro e não dois submarinos. Se os adendos não estavam pedidos na concorrência, é claro que os demais concorrentes não os propuseram. Mais sério é que a Marinha e a engenharia civil têm habilitação para construir quantas bases e estaleiros quiserem, sem que o país precise pagar bilhões por isso.
E, afinal de contas, o que a Marinha quer são submarinos, cuja oferta pelos franceses é muito reconhecida como bastante ruim, com seu modelo Scorpène muito superado, de operação e manutenção ainda muito dispendiosas. E aquém do nível tecnológico e militar da Marinha.
O acordo militar feito com a França sem maior estudo e debate pode ser bom, eventualmente. Não para negócios como os iminentes. Também porque, se o Brasil quiser se tornar potência armamentista, que o seja para valer e com inteligência. Não faz sentido gastar bilhões para armamentos superados ou inadequados, enquanto, nas palavras de Nelson Jobim, o Brasil só terá submarino nuclear daqui a 20 anos.
Voo cego, mergulho no escuro
Jânio de Freitas
Folha de S. Paulo, 16 de julho de 2009
DESDE O SEU início, a condução das providências ligadas à escolha e às condições para compra de novos caças da FAB e submarinos marca-se, na área civil dos governos Fernando Henrique e Lula, por volteios, argumentos artificiosos, intenções encobertas e, como resultado, um conjunto de obscuridades e negaças deliberadas. Para que negócios multibilionários se decidam em um pequeno círculo à margem de conhecimento e participação que representem o país, ao menos em medida razoável. Assim se chega ao momento crucial dos negócios, que Nelson Jobim quer formalizar na França já a partir de amanhã.
As obscuridades poderiam justificar-se no caso de razões estratégicas militares e de segurança nacional. Não há nenhuma envolvida. As especificações dos tipos de caças concorrentes para a compra são públicas, estão disponíveis no mundo todo em revistas de aeronáutica e na internet, incluindo preços conforme as especificações. Os submarinos não são mais misteriosos do que os jatos.
Os caças franceses Rafale, que Lula e Nelson Jobim querem comprar, estão entre os mais caros dos possíveis para a FAB. Consideradas as dimensões extraordinárias do Brasil, não são os que têm a melhor autonomia de voo, a capacidade de percorrer as maiores extensões sem reabastecimento. Entre os países que fizeram compras mais recentes de caças, a Venezuela pode ser desconsiderada por possível influência política e ideológica de sua aproximação militar com a Rússia, mas a boa força aérea da Índia procedeu a seleção rigorosa -e não escolheu o caça francês. A equipe de pilotos e técnicos da FAB que visitou seus colegas da Índia, e testou suas decisões, deu-as como as mais acertadas.
O processo de seleção brasileiro, desde Fernando Henrique, foi uma sucessão de saltos. Da escolha propriamente militar, passou à cessão de tecnologia para produção de aviões aqui. Deveria conduzir ao caça francês, cujo fabricante, Dassault, é representado no Brasil pela Embraer. Mas não o fez, porque foi criada alternativa mais completa por outro concorrente. A dada altura, entrou nas exigências brasileiras o incremento de comércio convencional que o país fabricante dos caças se dispusesse a fazer. Até chegar-se à discussão em torno de galináceos e espigas exportáveis pelo Brasil -critério ao menos original para seleção de aviões de caça. E o caça francês não ganhou. O jeito foi deixar a seleção em banho-maria.
Lula retomou-a. Com Nelson Jobim, com mais objetividade e sem novidade: na direção que se pôde intuir desde a primeira vez em que levou seus ares de vitorioso à primeira visita a uma empresa. A Embraer. Por que a Embraer, e não a Gerdau, a Mercedes, a VW, outra das grandiosas, não ficou claro. A não ser, talvez, para quem notou uma frase dita por Lula, sem razão alguma, como complemento dos elogios à empresa e sua bem sucedida situação: Precisamos ajudar a Embraer. É verdade que, não muito depois, ele foi comprar um avião francês. Mas daí a esquecer a Embraer e o caça da França há distância.
A explicação de Nelson Jobim para gastar com submarinos franceses dez vezes a proposta alemã é que foram incluídos no pacote, pela França, uma base e um estaleiro, além de tecnologia e quatro e não dois submarinos. Se os adendos não estavam pedidos na concorrência, é claro que os demais concorrentes não os propuseram. Mais sério é que a Marinha e a engenharia civil têm habilitação para construir quantas bases e estaleiros quiserem, sem que o país precise pagar bilhões por isso.
E, afinal de contas, o que a Marinha quer são submarinos, cuja oferta pelos franceses é muito reconhecida como bastante ruim, com seu modelo Scorpène muito superado, de operação e manutenção ainda muito dispendiosas. E aquém do nível tecnológico e militar da Marinha.
O acordo militar feito com a França sem maior estudo e debate pode ser bom, eventualmente. Não para negócios como os iminentes. Também porque, se o Brasil quiser se tornar potência armamentista, que o seja para valer e com inteligência. Não faz sentido gastar bilhões para armamentos superados ou inadequados, enquanto, nas palavras de Nelson Jobim, o Brasil só terá submarino nuclear daqui a 20 anos.
1224) Diploma de jornalista: um debate sobre uma excrescencia
Um colega sociólogo enviou-me um artigo de uma jornalista, profundamente indignada, segundo ela, pela decisão do STF de dispensar o diploma de jornalista para o exercício da profissão, com o que concordo absolutamente, aliás, dispensando até qualquer diploma, inclusive de curso primário.
Transcrevo primeiro o referido artigo e depois formulo alguns comentários.
Requiem por um diploma
Zélia Leal Adghirni * (30/06/2009)
Como professora de jornalismo na Universidade de Brasília há mais de 15 anos e como jornalista que fui durante duas décadas, no Brasil e no exterior, senti-me indignada com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de extinguir a obrigatoriedade do diploma para o exercício profissional do jornalismo. Considero o voto dos ministros do STF uma afronta aos jornalistas e uma ofensa à sociedade. Basta ouvir os argumentos dos magistrados para perceber o total desconhecimento desta área. Eles acreditam ainda que o jornalismo é “uma arte” (comparada a uma arte gastronômica, segundo o ministro Gilmar Mendes) e “uma vocação”. Em tempos de jornalismo digital, quando as tecnologias de comunicação colocam novos e inquietantes desafios para os profissionais, oito ministros do STF recuaram dois séculos para decretar o fim de uma profissão historicamente construída, com seus valores éticos, sua ciência e suas técnicas. Nos séculos XVIII e XIX escritores renomados como José de Alencar e Machado de Assis
publicavam artigos na imprensa. Mas não por isso se consideravam jornalistas. Foi preciso que surgisse João do Rio, o primeiro repórter brasileiro, para mostrar que a reportagem de rua era mais importante para a sociedade do que a crônica literária de autor.
Afirmar que a exigência do diploma é um entulho do regime militar é um falso argumento. A luta começou bem antes do golpe militar de 1964. Que a profissão tenha sido regulamentada em 1969 é uma mera coincidência. A primeira tentativa de regulamentação da profissão de jornalista foi um decreto do então presidente Jânio Quadros, em 1961. O decreto se referia a uma regulamentação explícita de 1938 (Getúlio
Vargas) que determinava a criação de escolas de preparação ao jornalismo, destinadas à formação de profissionais de imprensa. A Tribuna da Imprensa, de Carlos Lacerda, foi o primeiro jornal a contestar a medida. Não faltaram juristas para refutar a decisão e o
argumento usado para a inconstitucionalidade foi a falta de tramitação no Congresso. Um Congresso que agora, com raras vozes de exceção, calou-se diante do STF. A sociedade também não foi ouvida, não houve audiência pública. A decisão dos ministros, quase por unanimidade, foi autoritária e retrógrada.
O Brasil tinha uma das legislações mais justas em relação ao acesso profissional, firmada no ensino universitário e abalizada pelos órgãos da categoria. O recém-formado entrava no mercado com um preparo básico que seria aperfeiçoado nas rotinas produtivas do ofício, como os médicos e os advogados.
Todas as profissões se institucionalizaram através das práticas e do acúmulo de saber que proporcionam a pesquisa contínua e a permanente recriação de instrumentos de trabalho. Se as demais profissões exigem formação especializada, por que o jornalista nasceria pronto, com talento inato? Já dizia Jospeh Pulitzer, o “pai” do jornalismo
moderno, que “a única posição que um homem pode triunfalmente atingir pelo simples fato de ter nascido, é a de idiota”. Para qualquer outra, “some training is required”. O argumento de que em outros países não há necessidade do diploma demonstra total ignorância do tema. Os meios de acesso ao profissionalismo são extremamente filtrados e obedecem a critérios muito mais complexos que os nossos. Na França, por exemplo,
o interessado deve provar diante de uma comissão de especialistas que o jornalismo é sua principal fonte de renda.
Se, a partir de agora, o registro de jornalista no Ministério do Trabalho "perdeu o sentido", assim como todos os outros aspectos que regulamentavam a profissão, é preciso definir os critérios para a contratação de profissionais. As empresas dizem que será dada preferência a quem tiver passado por uma boa escola de jornalismo.
Serão estabelecidos critérios para as 400 escolas de jornalismo do país para saber quais são as boas?
Outra falácia é confundir liberdade de expressão com liberdade de profissão. A figura do colaborador já existia na antiga legislação. São especialistas convidados pelas mídias, que publicam artigos e comentários nos espaços de Opinião, remunerados ou não. Assim, podemos ler artigos do ex-ministro Jarbas Passarinho, da socióloga Barbara
Freitag, do médico Dráuzio Varela nas páginas mais nobres da imprensa, dentro dos gêneros opinativos (os acadêmicos trabalham com a tradição dos gêneros opinativos e gêneros informativos, conceitos elaborados pelo professor Jose Marques de Melo (Cátedra Unesco de Jornalismo) em sua extensa obra universitária.
A Fenaj nunca se opôs a estas colaborações muito bem vindas, mas o exercício profissional no cotidiano é o outro. Os especialistas colaboradores aceitariam ser “repórter por um dia”? É o repórter, quase sempre anônimo, que vai para a rua gastar a sola do sapato na Esplanada dos Ministérios, na Favela da Maré, na cobertura da
entrevista coletiva à imprensa, na greve dos operários, nos acidentes de trânsito e assim por diante. O jornalista sabe que neste oficio há mais transpiração que inspiração. Só o jornalista, como mediador, pode organizar o caos, selecionar e divulgar tudo aquilo que quebra a superfície lisa do cotidiano para transformar acontecimentos em notícias.O resto é amadorismo.
Que o luto de hoje se transforme em luta, é o que desejo aos alunos de jornalismo a partir de agora.
* Zélia Leal Adghirni é jornalista e professora de jornalismo na Universidade de Brasília.
=========
Meus comentários (PRA):
Os argumentos da professora padecem do defeito incuravel do jornalismocentrismo. Todo e qualquer cidadao medianamente alfabetizado pode ser um jornalista, alias ate' criancas e adolescentes podem ser, com um pouco de treinamento.
Cabe a responsaveis de meios de comunicacao contratar, ou nao, quem eles acham capazes de se desempenharem bem nas tarefas tipicas de uma entidade (qualquer uma, grande empresa ou jornal de uma pessoa so) dedicada a comunicao.
O resto e' cartorialismo, corporatismo e miopia profunda.
Nenhum dos argumentos da Zelia se sustenta com base numa analise isenta e honesta da profissao de jornalista.
Repito: qualquer pessoa medianamente alfabetizada pode se tornar um grande jornalista, e nisso nao vai nenhuma ofensa a essa professora.
Ela e' quem ofende qualquer outro universitario, ou egresso do ensino medio, ao dizer que eles nao podem ser bons jornalistas.
Retomando suas palavras, eu me sinto profundamente ofendido por suas palavras. Acredito que eu faria um bom jornalista, sem jamais ter posto os pes numa faculdade ou num curso de jornalismo (e ainda bem que nao o fiz, nao ganho certas deformacoes como essa do jornalismocentrismo).
Permito-me acrescentar: Sou contra qualquer diploma para qualquer profissao que nao "mate" ninguem, inclusive diploma de ensino superior para diplomatas.
Se dependesse de mim, nao exigiria sequer diploma de curso primario para concurso de diplomatas...
Transcrevo primeiro o referido artigo e depois formulo alguns comentários.
Requiem por um diploma
Zélia Leal Adghirni * (30/06/2009)
Como professora de jornalismo na Universidade de Brasília há mais de 15 anos e como jornalista que fui durante duas décadas, no Brasil e no exterior, senti-me indignada com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de extinguir a obrigatoriedade do diploma para o exercício profissional do jornalismo. Considero o voto dos ministros do STF uma afronta aos jornalistas e uma ofensa à sociedade. Basta ouvir os argumentos dos magistrados para perceber o total desconhecimento desta área. Eles acreditam ainda que o jornalismo é “uma arte” (comparada a uma arte gastronômica, segundo o ministro Gilmar Mendes) e “uma vocação”. Em tempos de jornalismo digital, quando as tecnologias de comunicação colocam novos e inquietantes desafios para os profissionais, oito ministros do STF recuaram dois séculos para decretar o fim de uma profissão historicamente construída, com seus valores éticos, sua ciência e suas técnicas. Nos séculos XVIII e XIX escritores renomados como José de Alencar e Machado de Assis
publicavam artigos na imprensa. Mas não por isso se consideravam jornalistas. Foi preciso que surgisse João do Rio, o primeiro repórter brasileiro, para mostrar que a reportagem de rua era mais importante para a sociedade do que a crônica literária de autor.
Afirmar que a exigência do diploma é um entulho do regime militar é um falso argumento. A luta começou bem antes do golpe militar de 1964. Que a profissão tenha sido regulamentada em 1969 é uma mera coincidência. A primeira tentativa de regulamentação da profissão de jornalista foi um decreto do então presidente Jânio Quadros, em 1961. O decreto se referia a uma regulamentação explícita de 1938 (Getúlio
Vargas) que determinava a criação de escolas de preparação ao jornalismo, destinadas à formação de profissionais de imprensa. A Tribuna da Imprensa, de Carlos Lacerda, foi o primeiro jornal a contestar a medida. Não faltaram juristas para refutar a decisão e o
argumento usado para a inconstitucionalidade foi a falta de tramitação no Congresso. Um Congresso que agora, com raras vozes de exceção, calou-se diante do STF. A sociedade também não foi ouvida, não houve audiência pública. A decisão dos ministros, quase por unanimidade, foi autoritária e retrógrada.
O Brasil tinha uma das legislações mais justas em relação ao acesso profissional, firmada no ensino universitário e abalizada pelos órgãos da categoria. O recém-formado entrava no mercado com um preparo básico que seria aperfeiçoado nas rotinas produtivas do ofício, como os médicos e os advogados.
Todas as profissões se institucionalizaram através das práticas e do acúmulo de saber que proporcionam a pesquisa contínua e a permanente recriação de instrumentos de trabalho. Se as demais profissões exigem formação especializada, por que o jornalista nasceria pronto, com talento inato? Já dizia Jospeh Pulitzer, o “pai” do jornalismo
moderno, que “a única posição que um homem pode triunfalmente atingir pelo simples fato de ter nascido, é a de idiota”. Para qualquer outra, “some training is required”. O argumento de que em outros países não há necessidade do diploma demonstra total ignorância do tema. Os meios de acesso ao profissionalismo são extremamente filtrados e obedecem a critérios muito mais complexos que os nossos. Na França, por exemplo,
o interessado deve provar diante de uma comissão de especialistas que o jornalismo é sua principal fonte de renda.
Se, a partir de agora, o registro de jornalista no Ministério do Trabalho "perdeu o sentido", assim como todos os outros aspectos que regulamentavam a profissão, é preciso definir os critérios para a contratação de profissionais. As empresas dizem que será dada preferência a quem tiver passado por uma boa escola de jornalismo.
Serão estabelecidos critérios para as 400 escolas de jornalismo do país para saber quais são as boas?
Outra falácia é confundir liberdade de expressão com liberdade de profissão. A figura do colaborador já existia na antiga legislação. São especialistas convidados pelas mídias, que publicam artigos e comentários nos espaços de Opinião, remunerados ou não. Assim, podemos ler artigos do ex-ministro Jarbas Passarinho, da socióloga Barbara
Freitag, do médico Dráuzio Varela nas páginas mais nobres da imprensa, dentro dos gêneros opinativos (os acadêmicos trabalham com a tradição dos gêneros opinativos e gêneros informativos, conceitos elaborados pelo professor Jose Marques de Melo (Cátedra Unesco de Jornalismo) em sua extensa obra universitária.
A Fenaj nunca se opôs a estas colaborações muito bem vindas, mas o exercício profissional no cotidiano é o outro. Os especialistas colaboradores aceitariam ser “repórter por um dia”? É o repórter, quase sempre anônimo, que vai para a rua gastar a sola do sapato na Esplanada dos Ministérios, na Favela da Maré, na cobertura da
entrevista coletiva à imprensa, na greve dos operários, nos acidentes de trânsito e assim por diante. O jornalista sabe que neste oficio há mais transpiração que inspiração. Só o jornalista, como mediador, pode organizar o caos, selecionar e divulgar tudo aquilo que quebra a superfície lisa do cotidiano para transformar acontecimentos em notícias.O resto é amadorismo.
Que o luto de hoje se transforme em luta, é o que desejo aos alunos de jornalismo a partir de agora.
* Zélia Leal Adghirni é jornalista e professora de jornalismo na Universidade de Brasília.
=========
Meus comentários (PRA):
Os argumentos da professora padecem do defeito incuravel do jornalismocentrismo. Todo e qualquer cidadao medianamente alfabetizado pode ser um jornalista, alias ate' criancas e adolescentes podem ser, com um pouco de treinamento.
Cabe a responsaveis de meios de comunicacao contratar, ou nao, quem eles acham capazes de se desempenharem bem nas tarefas tipicas de uma entidade (qualquer uma, grande empresa ou jornal de uma pessoa so) dedicada a comunicao.
O resto e' cartorialismo, corporatismo e miopia profunda.
Nenhum dos argumentos da Zelia se sustenta com base numa analise isenta e honesta da profissao de jornalista.
Repito: qualquer pessoa medianamente alfabetizada pode se tornar um grande jornalista, e nisso nao vai nenhuma ofensa a essa professora.
Ela e' quem ofende qualquer outro universitario, ou egresso do ensino medio, ao dizer que eles nao podem ser bons jornalistas.
Retomando suas palavras, eu me sinto profundamente ofendido por suas palavras. Acredito que eu faria um bom jornalista, sem jamais ter posto os pes numa faculdade ou num curso de jornalismo (e ainda bem que nao o fiz, nao ganho certas deformacoes como essa do jornalismocentrismo).
Permito-me acrescentar: Sou contra qualquer diploma para qualquer profissao que nao "mate" ninguem, inclusive diploma de ensino superior para diplomatas.
Se dependesse de mim, nao exigiria sequer diploma de curso primario para concurso de diplomatas...
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