quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

1684) Brasil diz que não apoiará sanção ao Irã na ONU

Um exemplo de coerência com as próprias ideias (ou posições), sem dúvida...

Brasil diz que não apoiará sanção ao Irã na ONU
Bloomberg, Valor Econômico, 18/02/2010

O Brasil disse aos EUA e à França que não apoiará sanções mais duras ao Irã e que pretende continuar sua política de aumento das relações comerciais com o país islâmico, apesar das objeções feitas pelo governo Obama.

"Não achamos que as sanções serão uma boa ideia agora", disse a embaixadora Maria Viotti. "As negociações têm de continuar. Se adotarmos sanções, isso tiraria as negociações dos trilhos."

A resistência do Brasil a mais sanções mostram a dificuldade dos EUA de manter a unidade que caracterizou as três resoluções anteriores da ONU contra autoridades e bancos iranianos.

O Brasil assumiu em janeiro uma vaga rotativa de dois anos no Conselho de Segurança da ONU e pode se juntar a China, Líbano e Turquia, que já deram indícios de que devem se abster ou votar contra novas sanções ao país.

O governo do presidente Barack Obama vem aumentando a pressão para que os membros do Conselho de Segurança apoiem penalidades maiores contra o Irã. A secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, disse que seria uma "má ideia" para os países da América Latina aumentarem os laços com o Irã.

O governo brasileiro defende que a aproximação comercial com Teerã seria um fator positivo.

"O Irã é um grande mercado para os produtos alimentícios do Brasil", disse a embaixadora Viotti. Além disso, afirmou ela, uma relação comercial mais forte colocaria o Brasil em posição de forçar uma negociação.

1683) Um estudante que estuda (e gosta de faze-lo...)

A proósito do meu post, abaixo:

1681) Estudantes, estudai! (acho que é isso)
Cui prodest? (Ou, para quem escrevo?)


um estudante de escreveu-me o que segue:

On 18/02/2010, at 02:29, Jhonny E. wrote:

Oi professor, tudo bom?

Lendo seu post 'Estudantes, estudai', percebi algo singular em suas palavras, algo que me deixou até...como diria, de certo modo 'inspirado' e emocionado. Sobre a 'abertura dos olhos' para a nova geração, que realmente deve ser cética e completamente autodidata, tanto com os livros quanto com as relações humanas, algo que o senhor me ensinou e 'tento' praticar ( usualmente com o senhor e eventualmente com pessoas mais 'vividas' de conhecimento).
Porém, acredito que a teoria não basta para justificar nossas ações, há tantas personalidades que possuem profundos conhecimentos acerca de vários assuntos e nem por isso mexem sequer um dedo para 'mover' o mundo ao seu redor, deixando da mesma forma que o encontrou ao nascer, não contribuindo para nada.

Teoria e prática devem se aliar, não a prática 'ideológica', nem tampouco ausente desta. Todos esses encontros, cada qual com seu proposito implica-se em suas ideologias, uns...a praticam outros a manifestam apenas em dados momentos.

Aprecio muito do que o senhor ensina para os mais jovens, refutando o falso e revelando o verdadeiro. Mesmo não aceitando o seu 'realismo' sobre o futuro do Brasil e seu afundamento. Lamento, e muito, o fato das pessoas não se juntarem por uma causa comum, concentrarem todo o acumulo de conhecimento que tem e realizarem ao menos uma reforma em todos os setores, lamento pelo fato das pessoas serem inertes em relação ao estudo, serem deficientes em suas análises, pobres em suas contribuições de mudança, fracas em relação a autoridade do argumento, cegas em enxergar o mundo e continuar caminhando, tentando se adaptar usando óculos para evitar que a vista canse.
O senhor já me disse mil vezes, 'continue a estudar, a aprender com os mais vividos, a ser um cidadão responsável intelectualmente', por isso e muito mais continuo firme, ao passo de pensar lamentavelmente que esse esforço não contribua para nada, ou ao menos contribua, mas não significamente como penso em fazer.
A única expectativa que vejo para mudar esse 'quadro do caos' que o mundo se encontro é por meio da reação em cadeia, mas pelo 'realismo' que aprendi do senhor cada dia vejo que ela fica mais longe e além de distante distorcida, pois de nada adiantará tentar mudar o mundo se nem ao menos mudamos nós mesmos.....

Abraços,
Jonathan Yuri

OBS: Se com meus 19 anos já estou 'frustado' imagina quanto tiver 60.

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Por falta de tempo, respondi apenas o que segue, mas pretendo voltar ao assunto:

Você, meu caro, vai viver num Brasil melhor do que o atual: mais desenvolvido, com brasileiros mais prósperos, instituições menos corruptas, mais justiça e mais educação, tenho certeza, mas isso nao vem de graça, é preciso esforço constante e um empenho de cada um para fazer do Brasil um país melhor do que aquele que encontramos quando aqui "chegamos". Persista, e você será feliz.
O abraço do
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Paulo Roberto de Almeida

1682) Teses para discussao num congresso partidario...

Sabedor que um desses partidos que pretende construir o futuro encontra-se fazendo um congresso numa cidade importante, resolvi dar uma ajuda na definição de alguns princípios de base.

Teses para o encontro nacional de um grande partido

Companheiros,

Chegamos ao governo e estamos no poder. Junto a nós e dos movimentos sociais e de trabalhadores, que sempre defendemos, está também o grande capital, um formidável adversário no passado, mas um aliado no presente, pois ele pretende que continuemos a fazer mudanças no Brasil, na sua economia e nas instituições políticas, sem contudo provocar aquelas rupturas que constantemente anunciávamos no passado.

Pensando bem, em todos os custos e benefícios de qualquer processo de mudança numa sociedade complexa – como são todas as sociedades –, decidimos fazer uma aliança tática e estratégica com o capital, para conduzir um processo de ruptura com nossas velhas teses e aprovar algumas novas, que agora se seguem.

1. O partido não é socialista, e sim reformista.
Independentemente de continuarmos a nos chamar de “socialistas” (para fins de propaganda e de identificação políticas), vamos terminar com a hipocrisia de pretender implantar o socialismo no Brasil. O que faremos, abertamente daqui para a frente, será administrar o velho e duro capitalismo, com todo o apoio e a satisfação dos nossos novos aliados na burguesa nacional e no capital financeiro internacional.

Acreditamos que a economia de mercado é a que melhor se presta ao atendimento das satisfações básicas da população, e que o Estado deve ser contido nas suas finalidades essenciais da segurança, educação, saúde e infra-estrutura, ademais do estabelecimento de regras gerais para o bom funcionamento da economia de mercado (competição, estabilidade de políticas, abertura à inovação etc.). Vamos continuar reformando as instituições regulatórias para que a economia de mercado promova os interesses do maior número de cidadãos.

2. O partido adota uma política econômica responsável e pró-mercado.
Vamos parar de acreditar que o Estado será o grande promotor, distribuidor e equalizador das chances e oportunidades no Brasil. Da forma como ele atua, hoje, no Brasil, o Estado transformou-se no principal obstáculo a um processo sustentado de crescimento, com transformação estrutural e distribuição de benefícios, uma vez que ele atua como um despoupador líquido dos recursos privados, cristaliza benefícios em prol dos já integrados e vem redistribuindo os recursos de todos em benefício da minoria.

Nossos princípios econômicos, de agora em adiante, serão definidos por quatro diretrizes: (a) uma macroeconomia estável, dotada de responsabilidade fiscal e sério comprometimento com o combate à inflação, o principal imposto que se abate sobre os pobres; (b) uma microeconomia aberta, competitiva, aberta às novas iniciativas, dotada de instituições que favorecem o empreendimento privado e criando um bom ambiente para os negócios de modo geral; (c) um investimento maciço na qualidade dos nossos recursos humanos, a começar pelo ciclo básico e pelo ensino profissional, pois o único critério que nos separa, hoje, dos países mais desenvolvidos, é o diferencial de produtividade do trabalho humano, o que depende da variável educacional; finalmente, (d) uma abertura ao comércio e aos investimentos internacionais, no entendimento de que a interdependência econômica é a que melhor se ajusta aos nossos padrões de economia integrada aos fluxos mais dinâmicos da globalização contemporânea.

3. O partido quer uma reforma política que transforme o modo de ação do Estado.
O fazer política, no Brasil, tornou-se um modo de vida, quando não uma atividade rendosa. Os meios parecem ter se substituído aos fins e quase toda a máquina pública, em especial o legislativo e o judiciário, converteram-se em redomas privilegiadas de altos salários e de produtividade mínima. Queremos mudar profundamente tudo isso, já que o povo está descobrindo com razão com o dinheiro dos impostos, duramente arrecado em detrimento de seu consumo, vem sendo desperdiçado de maneira indigna, alimentando gastos inúteis nos gabinetes de políticos profissionais.

Por isso, o partido vai propor uma reforma política que contemple, em primeiro lugar, a redução do volume de gastos e uma mudança no tipo de representação política que se está exercendo em nome do povo. Sobretudo nos municípios menores, mas também nas assembléias dos estados mais populosos e no próprio Congresso nacional, o dinheiro do povo está sendo gasto indevidamente, com mordomias incontáveis, em total descompasso com o trabalho necessário e honesto da representação política. Sabemos disso, pois nós mesmos nos acostumamos a esse tipo de coisa.

Os poderes legislativos e judiciário consomem muito mais recursos do que o justificado, sobretudo pela forma como trabalham (ou deixam de fazê-lo). Outros questões, vinculadas à lei eleitoral ou ao financiamento dos partidos, podem vir a fazer parte do debate político num segundo momento, mas o partido deve agora esforçar-se por redimensionar a representação política nos três níveis da federação ao que se possa considerar como normal e razoável em condições democráticas. A política não pode mais continuar sendo um meio de ganhar a vida.

4. O partido não quer um Estado mínimo, mas um Estado que funcione.
Durante muito tempo acreditamos que o Estado era uma espécie de varinha mágica, que poderia fazer acontecer tudo o que se desejasse, bastando um simples toque de botão. Descobrimos que não é assim, e por isso estamos, humildemente, revisando nossas posições. Pois bem, o partido está propondo uma reforma administrativa com diminuição radical do número de ministérios e a conseqüente atribuição de diversas funções a agências reguladoras.

Também nos convencemos que as PPPs (parcerias público-privadas) constituem no máximo um paliativo e por isso estamos retomando a privatização de alguns grandes monstrengos públicos que ainda existem e são fontes de ineficiência e de corrupção, no setor financeiro, energético, de transportes e outros. Também vamos propor, mesmo sob risco de bombardeio do quartel-general pelos nossos velhos aliados sindicais, o fim da estabilidade no serviço público, que em muitos casos se converteu num incentivo à preguiça e ao ócio remunerado, como visto nas greves das universidades federais.

Provavelmente vamos propor também a concessão de autonomia completa a essas universidades, assegurando um patamar mínimo de dotações públicas e deixando-as, em seguida, livres para buscar o dinheiro onde queiram e gastá-lo como desejam, inclusive remunerando seus professores da forma como lhes parecer mais apropriada. Queremos um Estado forte nas áreas em que ele deve necessariamente atuar, não em todos os setores onde ele atua hoje, nos quais segue esbanjando recursos do povo sem resultados práticos comensuráveis. Estado bom é o Estado que tem condições de atuar de maneira efetiva, não aquele que apenas finge ou tem a pretensão de fazê-lo, mas não faz.

5. Contra a derrama fiscal: o partido quer redução de impostos.
Vamos propor uma reforma econômica ampla, com diminuição da carga tributária e a redução das despesas correntes do Estado. O Brasil já ultrapassou limites razoáveis de carga fiscal e isto se traduz no “desinvestimento” estatal e na incapacidade de se ter poupança privada para fins de investimento. Vamos impulsionar também uma série de reformas microeconômicas, com vista a criar um ambiente favorável ao investimento produtivo, ao lucro e para diminuir a sonegação e a evasão tributárias.

Ao mesmo tempo, vamos dar um aperto fiscal nesses “criadores de despesas” irresponsáveis que são os legislativos e o judiciário. Esses poderes possuem a incrível capacidade de determinar eles mesmos suas próprias despesas, sem atender a qualquer critério de disponibilidade do recursos do ponto de vista orçamentário. No plano da federação, caberia revisar a situação dos municípios sem capacidade arrecadadora, e que são obrigados a viver de “mensalão” federal: essa situação não pode mais se sustentar.

6. Por uma nova classe trabalhadora, livre da mão pesada do Estado.
Chegamos ao que um ilustre antecessor chamou de “aristocracia operária”, uma classe que se reproduz a si mesma e que inclusive ocupa diversas funções no Estado e nos sindicatos, com remunerações, comissões e outras prebendas que não encontram correspondência no trabalho dispendido em defesa dos interesses da classe trabalhadora, sobretudo daqueles que ainda não estão incorporados ao mercado formal de trabalho.

Por isso estamos propondo uma reforma trabalhista radical, com flexibilização da legislação laboral, dando maior espaço às negociações diretas entre as partes. Também propomos a extinção do imposto sindical, que alimenta sindicalistas profissionais, em contradição com o que se esperaria de representantes temporários, em sindicatos de fato livres.

Por fim, vamos encerrar de vez a era Vargas, propondo a extinção da Justiça do Trabalho, que é uma fonte de criação e de sustentação de conflitos, substituindo seus pesados procedimentos pela via arbitral, ou por varas especializadas na justiça comum. De forma geral, a legislação trabalhista vai ser reformada para facilitar e ampliar a empregabilidade daqueles que hoje estão excluídos do mercado trabalho.

7. O partido é, doravante, globalizado e favorável à globalização.
Sinto muito, mas teremos de dizer aos nossos amigos do Fórum Social Mundial que eles conduzem um combate de retaguarda, uma luta até mesmo reacionária, do ponto de vista dos países mais pobres e dos estratos sociais mais humildes. Defender os subsídios agrícolas e o protecionismo nessa área não é apenas insensato; é criminoso do ponto de vista dos povos africanos, sem condições de competir em outros setores. Falar de “segurança alimentar” e ao mesmo tempo pretender que os mercados agrícolas sejam apenas locais não é apenas irracional economicamente, é também risível do ponto de vista dos fins pretendidos, uma vez que a maior segurança se obtém, justamente, na interdependência recíproca dos mercados globais de alimentos, complementados, se for o caso, por programas de assistência emergencial que não reproduzam esse engodo que são os “dumpings” organizados pelos países ricos com seus produtos subsidiados.

Da mesma forma, o combate às instituições-chave da globalização contemporânea – OMC, FMI e Banco Mundial – não só é risível como contraproducente no plano da cooperação internacional, assim como são patéticas essas tentativas de se introduzir taxas sobre os movimentos de capitais, o que só resulta em encarecer o custo dos recursos que os países em desenvolvimento necessariamente captam nos mercados financeiros. As teses comerciais dos anti-globalizadores representam o contrário do que devem fazer os países em desenvolvimento que aspiram galgar novos patamares de produtividade nos intercâmbios globais.

Por isso, o partido não tem medo de afirmar que ele se posiciona resolutamente em favor da globalização, que tem retirado milhões de chineses e indianos de uma miséria ancestral, assim como o partido não tem mais vergonha de participar dos encontros dos capitalistas em Davos, que são uma forma de continuar discutindo condições e formas de se ampliar a globalização, num sentido plenamente responsável e conectado com as necessidades dos países mais pobres.

8. O partido se pauta, no plano externo, exclusivamente pelos interesses nacionais.
A política internacional é a continuidade da política nacional, por outros meios. Assim como estamos comprometidos com o interesse nacional no plano interno, assim deve ser feito no contexto internacional. Por isso estamos encerrando a fase de posições de princípio quando estávamos sobretudo interessados em reunir os pobres e oprimidos para lugar contra a hegemonia dos poderosos. Não vamos mais designar tal ou qual país como “aliado estratégico”, e sim julgar quais são os nossos interesses nacionais numa análise concreta de cada situação internacional.

Nenhuma situação de relacionamento externo, nem mesmo a integração regional, deve ser vista como um fim em si mesmo, mas como um meio para se atingir objetivos nacionalmente desejáveis, que são o progresso e a prosperidade da nação. Não se deve cultivar a busca de prestígio internacional apenas pelos seus efeitos de imagem, mas sim como resultado indireto de nossa cooperação desinteressada, desde que disponhamos das condições materiais e humanas para fazê-lo.

Nossas forças armadas, por exemplo, elas primeiro devem ser aparelhadas internamente, antes de fazê-las cumprir missões internacionais que podem estar acima de sua capacidade operacional. A liderança, outro exemplo, decorre do acúmulo de certo substrato material – financeiro e tecnológico, sobretudo – para o cumprimento de missões externas que sejam solicitadas pelos vizinhos ou pela comunidade internacional, não da vontade unilateral de proclamá-la.

Para aumentar sua capacitação no plano internacional, o país precisa estar disposto a conceder graus ainda maiores de abertura econômica – que aumentam nossa competitividade internacional ao atuar sobre os níveis de produtividade internos --, bem como operar novos patamares de liberalização comercial, condição para a expansão de todo o nosso comércio exterior, não só das exportações. Ele também precisa demonstrar, na prática, bom acolhimento ao investimento estrangeiro e decidir-se pela adesão a regimes proprietários mais avançados, que estão tradicionalmente associados a uma subida na escala tecnológica do sistema produtivo.

Voilà: estas oito teses já bastam, por enquanto, para uma profícua discussão no encontro. Depois poderei comentar cada uma com maior grau de detalhe. Por enquanto, desejo apenas bons trabalhos nesse importante encontro político.

[PS: Feito originalmente para um encontro nacional de 2006, do mesmo partido.]

1681) Estudantes, estudai! (acho que é isso)

Cui prodest? (Ou, para quem escrevo?)

De vez em quando eu perpetro a ousadia de escrever para o Mundorama. Ou melhor, seus responsáveis é que cometem a ousadia de me publicar, posto que eu não escrevo especialmente para o Mundorama, em todo caso muito raramente, ou quase jamais, pensando em Mundorama, que é um boletim muito simpático e variado de relações internacionais, animado por esse gigante (stricto et lato sensi) da didática internacionalista que é o professor Antonio Carlos Lessa.
Estudantes, leiam, visitem, eu recomendo: http://mundorama.net/

Pois bem, meu último coup pervers foi um post sobre o inacreditável Fórum Social Mundial. Digo inacreditável, pois que nem mesmo seus promotores desonestos acreditam de fato nas bobagens que eles dizem (se o fizessem, além de desonestos, seriam ingênuos, o que talvez seja muito pior). Eles apenas vivem daquilo, de preferência sem trabalhar, com dinheiro público, ou melhor, com o meu, o seu, o nosso dinheiro. Como eu tenho alergia a burrice, mas ojeriza absoluta à desonestidade intelectual (se a palavra se aplica), eu não deixo passar uma oportunidade para cobrar um pouco, só um pouco, de coerência nas ideias (if any), como se isso fosse possível (mas, não custa cobrar, e eles deveriam pelo menos tentar).

Meu último post foi este aqui:

Triste Fim de Policarpo Social Mundial, por Paulo Roberto de Almeida
2010 fevereiro 2

Recebi, como seria de se esperar sendo tão provocador (confesso que deliberadamente), muitos comentários, alguns sorrindo comigo ante tantas inconsequencias desse bando de malucos que são os antiglobalizadores, outros indagando questões específicas (que respondo quando consigo entender, o que nem sempre é o caso), e um ou dois, finalmente, me criticando, o que é sempre bem-vindo (e agradeço sinceramente, não hipocritamente; tenho vários defeitos, mas não o dom da hipocrisia).

As criticas são de dois gêneros, e já descarto a primeira por inepta, incompetente ou descartável:

1) Eu seria um apologista do capitalismo, do neoliberalismo, seja lá o que for isso, e meus argumentos estariam errados, pois o capitalismo é de fato perverso, etc, etc, etc. Bem, digo que é inepta pois as pessoas que fazem esse tipo de rejeição de minhas críticas às posições dos antiglobalizadores, nunca, NUNCA dizem em que as propostas dos maluquetes do FSM teriam alguma coerência intrínseca (ou até extrínseca, vá lá). Por outro lado, eu não sei porque ainda ando de carro velho e de baixa potência sendo um defensor tão acirrado do capitalismo: Wall Street certamente ainda não ouviu falar de mim, e ainda não me colocou no seu contracheque. Bem, não quero me estender, mas essas pessoas não distinguem racionalidade econômica e raciocínio lógico da simples peroração ideológica: elas devem estar com o parafuso dos modos de produção um pouco desajustados, e a cada momento de distração, soltam um capitalismo para variar. Elas talvez não saibam a diferença entre capitalismo e economia de mercado, ao que eu diria: minha gente, leiam Max Weber, leiam Fernand Braudel, leiam Albert Hirschmann, Jean Baechler (não confundir com o Jean Ziegler, por favor, pois este é do bando de perfeitos idiotas).

2) A segunda crítica é aparentmente mais "séria", mas ela se engana totalmente de foco. Diz um desses jovens afoitos que se o FSM não fosse importante, eu não estaria escrevendo tanto sobre ele. Se eu insisto em voltar ao assunto, repetidamente diz ele, é porque suas ideias (sic, tres vezes) sao relevantes.
Bem, esse jovem ainda não percebeu uma coisa: eu escrevo justamente para ele, não para o bando de velhacos desocupados que animam e promovem esses piqueniques anuais sem qualquer relevância para o mundo real.
Repitam comigo: nada do que se diz ou se aprova, unanimemente (comme il faut, quando se trata de pensamento único) nesses encontros regados a slogans vazios tem a mínima importância para o mundo real. Nada, nadica, necas de pitibiribas. Quem quiser me provar o contrário, ou seja, que alguma nova e relevante proposta emergiu desses jamborees, eu posso oferecer um livro ou dois. Precisando: que tenha emergido do FSM, não que já exista nas faculdades de humanidades -- que também produzem uma tonelada de ideias inuteis -- ou que circule na sociedade como produção, digamos, intelectual.

Pois eu escrevo justamente para esses jovens idealistas que querem salvar o mundo dele mesmo, ou melhor, salvá-lo do capitalismo globalizador (ou vice-versa), mas que ainda leram pouco, estudaram menos ainda, e aprenderam só um tiquinho (e, no que depender de certos professores, vão aprender menos ainda, no que lhes resta de diversão universitária).

Como eu sou uma pessoa que aprendeu nos livros ou com pessoas mais espertas, considero ser assim meu dever, digamos, espiritual, transmitir um pouco do que aprendi a esses jovens sedentos de sabedoria globalizante, mas que acabam encontrando apenas essas fontes barrentas da pilantragem universitária e das imposturas intelectuais desses velhacos da antiglobalização.
Que posso fazer? Tenho essa vocação didática voluntária -- e já vou avisando que não é dela que retiro meu sustento, nem faço desse hobby minha ocupação principal -- e por isso fico assim de noite escrevendo para esses moços -- como diria o Lupiscínio Rodrigues -- que não sabem o que eu sei. Não por qualquer virtude extraordinária, ou inteligência excepcional, longe disso. Eu sou apenas um gajo esforçado, que lê muito, que pensa muito sobre o que leu, observou e retirou de sua experiência de vida, e que coloca essas reflexões à disposição dos mais jovens, posto que eu também já fui jovem e tive professores honestos e outros desonestos (talvez involuntariamente, concedamo-lhes essa dúvida).

Finalizando, meu jovem, você que me acusa de bater em "cachorro morto" (talvez seja bem o caso), não é para o cachorro que estou escrevendo, nem para os "donos" dos cachorros, pois estes já incorporaram o cérebro dos cachorros.
Estou escrevendo para você mesmo, e apenas aconselhando-o a abrir os olhos, ler e se informar um pouco mais, viajar pelo mundo (Davos é uma excelente estação de esqui, mas talvez você ainda não tenha dinheiro para ir lá), enfim aprenderem, de preferência de maneira autodidata, pois sempre se deve desconfiar de professores (inclusive deste que aqui escreve).

Ser cético é um dever, mas deve-se sempre cultivar um ceticismo sadio, ou seja, opor ideias melhores, e mais coerentes, a ideias más, que são estas que não se conformam à realidade empírico, que não seguem os mínimos preceitos da lógica formal, enfim, que ficam no slogan vazio em lugar de ir para a pesquisa e confrontar os números. Ou seja, exatamente essas que estão no centro (e nas bordas também) do FSM.

Eu, na verdade, estou pouco preocupado com os velhacos do FSM, meu objeto próprio são os jovens. Como observo com certa preocupação a marcha da mediocrização na universidade brasileira, e como constato que os jovens que me escrevem cada vez escrevem mais mal, sem uma exposição coerente das ideias, sem se fazer entender direito, eu me sinto, como dizer?, compelido a escrever estas bobagens que escrevo noite adentro, para ver se evito um pouco da mediocrização em curso e contribuo, minimamente que seja, com a tarefa da elevação intelectual de jovens como esse que me escreve me acusando de apologista do capitalismo.

Acho que ele não encontrou argumentos para me rebater, e aí foi logo sacando o capitalismo e o neoliberalismo. Puxa vida, está ficando aborrecido debater assim...

Paulo Roberto de Almeida (18.02.2010)

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

1680) De volta a um grande negocio (estrategico, il semble): Rafale...

Agora que o Carnaval passou, é hora de esclarecer um grande negócio muito mal explicado
Coluna do Augusto Nunes
16 de fevereiro de 2010

Com palavras e imagens, esta página tenta apressar a chegada do futuro que o Brasil espera deitado em berço esplêndido. E lembrar aos sem-memória o que não pode ser esquecido.

Nos quatro primeiros parágrafos do discurso de posse, Nelson Jobim tratou de justificar a fama de gaúcho sabido com a evocação de episódios protagonizados por Dom Pedro II, Zacharias de Goes e Vasconcellos, Benjamin Constant e outras placas de ruas, praças ou avenidas. No quinto, o novo ministro da Defesa encerrou a aula de História com uma frase de Benjamin Disraeli, duas vezes primeiro-ministro do império britânico no fim do século 19. “Never complain, never explain, never apologise”, falou bonito o novo ministro da Defesa.

Caridoso com os muitos monoglotas presentes, traduziu a citação: “Nunca se queixe, nunca se explique, nunca se desculpe”. Fez então uma pausa, armou a carranca no rosto de glutão sem remorso e rugiu: “Aja ou saia, faça ou vá embora!”. Como quem age faz alguma coisa, como quem sai vai embora, uma das duas frases já estaria de bom tamanho. Jobim deve ter embarcado na redundância para mostrar que não estava para brincadeiras. Estava lá para liquidar o apagão aéreo que acabara de festejar o primeiro aniversário. Os culpados que se cuidassem.

A ameaça causaria forte impressão mesmo se gaguejada por um vereador de grotão. Produzida pela figura com mais de 100 quilos esparramados por quase 2 metros, a trovoada no coração do poder ultrapassou os limites do Palácio do Planalto. Andorinhas voaram de costas, urubus ficaram brancos de medo, aviões de carreira enveredaram por loopings involuntários, helicópteros flutuaram na estratosfera. Não demoraram a descobrir que o ultimato não passaria do falatório.

Jobim não agiu, mas não saiu. Não fez, mas não foi embora. Fez que conta que esqueceu o grande momento do discurso de posse. Até que o apagão morreu de morte natural e o ministro resolveu começar a agir. Acabou demonstrando que a lição de Disraeli nem sempre dá certo. Por ter feito tudo errado, o que fez causou mais estragos que o que deixou de fazer. A última do Jobim foi convencer o presidente Lula de que a compra dos 36 caças franceses Rafale é um grande negócio para o Brasil.

Antes do Aerolula, a milhagem aérea do Primeiro Passageiro era inferior à de uma abelha. Jobim só aprendeu, em viagens internacionais, que não cabe na poltrona. Pois os dois se acharam qualificados para decidir qual fábrica seria contemplada com uma fabulosa bolada extraída dos bolsos dos pagadores de impostos. Acabaram por desmoralizar os chefes da Aeronáutica e os técnicos incumbidos de produzir o relatório que classificou os três concorrentes.

O documento recomendou a escolha dos caças suecos Gripen, que custariam US$ 4,5 bilhões. A segunda opção foi o americano F-18, fabricado pela Boeing (US$ 5,7 bilhões). Para desconforto dos especialistas, e para alegria dos acionistas da Dassault, Lula e Jobim preferiram o lanterninha Rafale. Os brasileiros vão desembolsar US$ 6,2 bilhões (ou R$ 11,4 bilhões) para que os pilotos da FAB voem nos caças que não desejaram. A justificativa para o injustificável foi uma misteriosa “parceria estratégica” com a França.

Agora que o Carnaval passou, os responsáveis pela escolha precisam deixar de conversa fiada e buscarem explicações mais convincentes para a transação bilionária. O país que presta está exausto de eufemismos espertos. A novilíngua da Era Lula já transformou ladroagem em “recursos não-contabilizados” e fez dinheiro sujo virar “caixa 2″. Os dois truques tentaram camuflar negociações suspeitíssimas entre os partidos que hoje compõem a base parlamentar do Planalto. Para quem enxerga, é uma base alugada. Para o governo, é uma parceria estratégica.

1679) A revolucao de 1817 pelo angulo diplomatico


Recomendo fortemente este livro, e não apenas para os que apreciam história regional, ou movimentos políticos e sociais durante o Império:

Gonçalo de Barros Carvalho e Mello Mourão:
A Revolução de 1817 e a História do Brasil: um estudo de história diplomática
(Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2009, 352 p.; ISBN: 978-85-7631-171-3)

Trata-se da segunda edição de uma obra relevante na historiografia da revolução de 1817 em Pernambuco, cujos vínculos internacionais foram pesquisados com uma competência raramente vista nos anais da diplomacia brasileira.
Em duas partes, a obra analisa a correspondência diplomática portuguesa e estrangeira a partir de capitais européias, de Washington e do Prata, para reconstituir as ligações internacionais dos revoltosos do Recife; na segunda parte, a obra discute a opção pela monarquia no Brasil, a partir do impacto dessa revolução talvez mais federalista do que republicana, bem como a repercussão do precedente haitiano no Brasil do começo do século 19: a imagem de escravos eliminando seus senhores brancos deve ter assustado as elites do Império.
Poderia o Brasil ter sido um grande Haiti?
Questão para uma história virtual...

1678) Um removedor de mofo do Itamaraty

Estou lendo, atualmente, o livro seguinte:

Ovídio de Andrade Melo:
Recordações de um Removedor de mofo no Itamaraty: relatos de política externa de 1948 à atualidade
(Brasília: Fundação Alexandre de Gusmão, 2009, 192 p.; ISBN: 978-85-7631-175-5)

Em três partes, o depoimento do primeiro "embaixador" em Angola, trata da política nuclear e da recusa ao TNP, do reconhecimento de Angola (com telegramas secretos revelados) e dos périplos afro-asiáticos do embaixador aposentado. As aspas se devem a que ele era um encarregado de negócios, em serviço provisório, num escritório de representação criado para a transição política da antiga colônia portugues para a Republica Democrática e Popular de Angola, tendo permanecido na capital durante a fase da luta entre os três movimentos de libertação contra o colonialismo português.
Na quarta parte, Ovídio diz que fez a sua parte ao tentar remover do Itamaraty ideias antiquadas e desajustadas, entre elas a decisão de se assinar o TNP. Um dos fantasmas do passado é o imperialismo dos EUA na América Latina, um mofo muito pegajoso, a crer no embaixador.
Cabem elogios ao “simpático casal Kirchner”, referências a “explosões nucleares pacíficas” e certa nostalgia pelas posições que o Brasil exibia no passado.
O livro é importante pelo depoimento em si, menos talvez pela mensagem que pretende transmitir aos atuais removedores de mofo, pois caberia distinguir qual camada, exatamente, remover...

Paulo Roberto de Almeida (17.02.2010)

Postagem em destaque

Livro Marxismo e Socialismo finalmente disponível - Paulo Roberto de Almeida

Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...