RESEARCH AND ANALYSIS
World Trade Report 2011
The WTO and preferential trade agreements: From co-existence to coherence
The ever-growing number of preferential trade agreements (PTAs) is a prominent feature of international trade. The World Trade Report 2011 describes the historical development of PTAs and the current landscape of agreements. It examines why PTAs are established, their economic effects, and the contents of the agreements themselves. Finally it considers the interaction between PTAs and the multilateral trading system.
Accumulated trade opening — at the multilateral, regional and unilateral level — has reduced the scope for offering preferential tariffs under PTAs. As a result, only a small fraction of global merchandise trade receives preferences, and preferential tariffs are becoming less important in PTAs.
The report reveals that more and more PTAs are going beyond preferential tariffs, with numerous non-tariff areas of a regulatory nature being included in the agreements.
Global production networks may be prompting the emergence of these “deep” PTAs as good governance on a range of regulatory areas is far more important to these networks than further reductions in already low tariffs. Econometric evidence and case studies support this link between production networks and deep PTAs.
The report ends by examining the challenge that deep PTAs present to the multilateral trading system and proposes a number of options for increasing coherence between these agreements and the trading system regulated by the WTO.
Download pdf:
> Complete report (256 pages; 8034KB)
> Contents, acknowledgements, disclaimer, DG Foreword and Executive Summary (19 pages; 820KB)
I- World trade in 2010 (22 pages; 451KB)
II- The WTO and preferential trade agreements: From co-existence to coherence
> A. Introduction(6 pages; 78KB)
> B. Historical background and current trends(46 pages; 2315KB)
> C. Causes and effects of PTAs: Is it all about preferences?(30 pages; 550KB)
> D. Anatomy of preferential trade agreements(42 pages; 1063KB)
> E. The multilateral trading system and PTAs(32 pages; 485KB)
> F. Conclusions(3 pages; 61KB)
> Statistical appendix(29 pages; 324KB)
> Bibliography(11 pages; 178KB)
> Technical notes, glossary, abbreviations and list of figures (16 pages; 859KB)
(links)
> Previous World Trade Reports
Temas de relações internacionais, de política externa e de diplomacia brasileira, com ênfase em políticas econômicas, viagens, livros e cultura em geral. Um quilombo de resistência intelectual em defesa da racionalidade, da inteligência e das liberdades democráticas. Ver também minha página: www.pralmeida.net (em construção).
terça-feira, 26 de julho de 2011
segunda-feira, 25 de julho de 2011
Banqueiros preocupados (nao no Brasil; dos EUA)...
A principal revista do "capital financeiro monopolista internacional", como se dizia antigamente (quando todo mundo era marxista), ou seja, dos financistas, agiotas e especuladores de Wall Street, lança um alerta ao seus afiliados: por força de uma legislação muito intrusiva e reguladora, o setor bancário americano pode ficar atrás e já estaria perdendo terreno para seus concorrentes de outros países.
Paulo Roberto de Almeida
American Banker
Letter from the Chairman
Dear Colleague:
It’s been nearly a year since the passage of the Dodd-Frank Act, the most significant financial services legislation since the Great Depression, and banks, industry representatives, academics and analysts are still trying to come to grips with it.
At more than 2,300 pages containing hundreds of new rules – not to mention the creation of a new agency devoted solely to consumer protection – the impact of the law may not ultimately be clear for years to come. Regulators are still in the process of identifying systemically important banks and nonbanks, forcing securitizers to retain at least some of the risk of loans they sell and creating new mortgage disclosure standards, just to name a few.
While it’s tempting for bankers to look at the size and scope of the regulatory reform law and throw up their hands in confusion, understanding the aftermath of Dodd-Frank will be critical for their business in the months and years ahead. That’s why American Banker is holding its first Regulatory Symposium.
In speeches from top lawmakers and regulators, and panel discussions covering the hot topics in the policy world, we hope to shed light on how regulatory reform has changed the business of banking, and what financial services executives can expect next.
Please accept our invitation to join us September 19 and 20 in Washington D.C. It’s your chance to find out first hand from the key policy players what’s happening in the nation’s capital, and where regulators and lawmakers are liable to focus in the future.
Sincerely,
Rob Blackwell
Washington Bureau Chief
American Banker
Paulo Roberto de Almeida
American Banker
Letter from the Chairman
Dear Colleague:
It’s been nearly a year since the passage of the Dodd-Frank Act, the most significant financial services legislation since the Great Depression, and banks, industry representatives, academics and analysts are still trying to come to grips with it.
At more than 2,300 pages containing hundreds of new rules – not to mention the creation of a new agency devoted solely to consumer protection – the impact of the law may not ultimately be clear for years to come. Regulators are still in the process of identifying systemically important banks and nonbanks, forcing securitizers to retain at least some of the risk of loans they sell and creating new mortgage disclosure standards, just to name a few.
While it’s tempting for bankers to look at the size and scope of the regulatory reform law and throw up their hands in confusion, understanding the aftermath of Dodd-Frank will be critical for their business in the months and years ahead. That’s why American Banker is holding its first Regulatory Symposium.
In speeches from top lawmakers and regulators, and panel discussions covering the hot topics in the policy world, we hope to shed light on how regulatory reform has changed the business of banking, and what financial services executives can expect next.
Please accept our invitation to join us September 19 and 20 in Washington D.C. It’s your chance to find out first hand from the key policy players what’s happening in the nation’s capital, and where regulators and lawmakers are liable to focus in the future.
Sincerely,
Rob Blackwell
Washington Bureau Chief
American Banker
Para maior gloria dos gloriosos: crescendo sobre o proprio mito (quem mais?)
Ego inflado pode ser como essas bolhas financeiras (derivativos, títulos, ações, whatever...) que crescem desmesuradamente, e um dia estouram, provocando certo ruído e algum desgaste na paróquia.
Por vezes a paróquia é o mundo inteiro, como se viu em 2008, quando loiros de olhos azuis mergulharam o mundo na crise e na recessão.
Ainda bem que morenos de olhos negros estavam atentos para nos livrar dessas "marolas" do capitalismo globalizado, perverso, iníquo, concentrador e assimétrico...
Bem, tendo feito obra meritória de reformas incontáveis pelo Brasil afora durante oito anos inteiros (fora os de preparação), o nosso guia maior empreende agora vôos mais altos, para reformar a África, a América Latina, o mundo inteiro, se deixarem.
Eu pessoalmente acho que ele deveria começar pelo Maranhão e pelo Piauí, mas parece que é pouco para sonhos megalomaníacos...
Mas, sobrou para o Brasil também: ele vai interferir poderosamente nas eleições de 2012, e se prepara para novo pleito em 2014.
Adoradores incondicionais estão delirando de contentamento. Acham estranho que pessoas normais achem estranho...
Paulo Roberto de Almeida
Fora da Presidência, Lula monta estrutura paralela de diplomacia
Cristiane Agostine
Valor Econômico, 25/07/2011 – p. A6
São Paulo - Lula com Chávez (foto): ex-presidente sente-se à vontade para dar bronca e conselhos a governantes
No início de junho, em uma conversa com o presidente Hugo Chávez, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu broncas e conselhos ao amigo venezuelano. Lula repassou a Chávez a reclamação de empresários brasileiros em relação à dificuldade para importar coque de petróleo daquele país e o questionou sobre o programa habitacional "Gran Misión Vivienda Venezuela", a versão local do "Minha Casa, Minha Vida". No Palácio Miraflores, em Caracas, o petista colocou em xeque a meta ambiciosa do programa, de construir dois milhões de casas até 2017.
No fim daquele mês, em encontro com o presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, o ex-presidente o orientou a mapear e cadastrar todas as famílias carentes do país, antes de pensar na criação de um programa como o Bolsa Família, carro-chefe de sua gestão na Presidência. Em maio, Lula esteve no Panamá com o presidente Ricardo Martinelli. O petista aconselhou o governante, empresário varejista que ascendeu por fora da elite do país, como driblar resistências sociais. Recém-eleito presidente do Peru, Ollanta Humala também procurou o ex-presidente em busca de aconselhamento.
Fora da Presidência, Lula tem feito de seu trabalho uma espécie de diplomacia paralela ao governo federal. O ex-presidente recebe chefes de Estado, empresários e é sondado até a intermediar o diálogo da oposição com governos estrangeiros, como na Venezuela. A seus auxiliares, o ex-presidente diz que está vivendo o melhor dos mundos: pode falar aquilo que deseja, sem os limites e obrigações diplomáticas que o cargo lhe impunha.
Instituto Lula poderá reeditar Caravanas da Cidadania em países da África e da América Latina
No primeiro semestre longe do Palácio do Planalto, Lula atua em três frentes: a montagem do Instituto Lula; a elaboração de um memorial com sua trajetória sindical e política e a empresa L.I.L.S. Palestras, Eventos e Publicações LTDA. O instituto será lançado até setembro e o projeto do memorial deve ficar pronto até o fim do ano. O museu está sendo negociado com o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e deve ser instalado em um prédio a ser doado pela prefeitura.
O Instituto Lula substituirá o Instituto Cidadania, atual local de trabalho do ex-presidente. Por enquanto, a entidade vai continuar na mesma casa onde funciona o Cidadania, no Ipiranga, na zona sul de São Paulo, mas os auxiliares do petista buscam uma sede maior.
Do instituto, o ex-presidente comandará ações voltadas para a América do Sul e África. Uma das ideias estudadas, mas sobre a qual ainda não há consenso, é articular uma espécie de "Caravana da Cidadania" em países latino-americanos e africanos. Segundo o ex-presidente do Sebrae Paulo Okamotto, responsável pela organização do instituto, seria uma reedição internacional das caravanas feitas por Lula, então candidato à Presidência, no início dos anos 90. "Por que não fazer uma Caravana da Cidadania nesses países?", diz Okamoto. " Não podemos ficar daqui pensando e dizendo como eles têm que viver. Temos que fazer nesses países o que fizemos no Brasil, conhecer as classes políticas, as culturas, a realidade local", explica.
A entidade já organizou dois debates sobre a África e a América Latina, com a participação de representantes do Banco Mundial, e pretende criar um conselho com especialistas, para elaborar programas. Empresários e governantes têm procurado o instituto para participar de projetos. Lula poderia atrair investidores àqueles países. "É importante fazer desses países grandes mercados consumidores. Isso acaba gerando empregos também para os países ricos, que vão produzir mais para vender nesses lugares", analisa Okamotto. "Queremos mostrar um novo modelo econômico", afirma.
A preocupação, diz Okamotto, é que a atuação de Lula não fique resumida às palestras. "Queremos trabalhar em projetos para ajudar no desenvolvimento econômico da África e da América Latina. Não somos uma ONG para ficar fazendo projetinhos", comenta Okamotto. "Ele não terá papel de consultor, mas sim animador, fomentador", registra.
A agenda internacional do ex-presidente tem sido intensa e deve continuar assim no segundo semestre. Nos primeiros seis meses longe da Presidência, Lula já visitou 18 países. Na sexta-feira, o petista disse, em Pernambuco, que deverá fazer mais 23 viagens internacionais até o fim do ano. "Muitos governantes querem falar com ele e saber como é que ele promoveu o desenvolvimento com inclusão social, como fez o Brasil", conta Okamotto.
Em todos os países que visitou, Lula foi reconhecido e tratado como celebridade, com direito a fotos, abraços e autógrafos. Em algumas viagens, o ex-presidente saiu para jantar e conhecer lugares. O petista tem feito o mesmo em São Paulo, ainda que com pouca frequência. Na Presidência, sempre evitava sair.
Os auxiliares do ex-presidente aproveitam essa demanda de viagens para ganhar tempo e tentar focar a atuação do instituto. No comando das ações para os países africanos e latino-americanos estão o ex-ministro Luiz Dulci e a ex-assessora especial da Presidência Clara Ant.
O Instituto Cidadania é considerado como a "incubadora" da futura entidade. Criada em 1990, sob comando de Lula, depois da derrota para Fernando Collor de Mello na disputa presidencial, a organização não governamental fomentou durante anos debates sobre políticas públicas até ser esvaziada com a vitória de Lula em 2002. Com o fim dos oito anos de governo, foi retomada. O Cidadania tem uma dúzia de funcionários e custa mensalmente cerca de R$ 100 mil, entre folha de pagamento, contas de água, luz e telefone e viagens de Lula. Os deslocamentos, no entanto, não costumam pesar no orçamento. Em geral, a passagem de avião é custeada pela empresa ou banco que contrata o ex-presidente para uma palestra. Lula costuma "pegar carona" em aviões de empresários.
Kassab deve ajudar o petista e sinaliza com a doação de terreno e prédio para abrigar memorial
Na direção do instituto está o deputado federal José de Fillipi (SP), ex-prefeito de Diadema e responsável pelas finanças das campanhas presidenciais de Lula em 2006 e de Dilma Rousseff, em 2010. A receita do Cidadania é obtida por meio de doações de empresários, pessoas físicas e do que o ex-presidente ganha com suas palestras de R$ 300 mil. Em geral, os doadores são também financiadores de campanhas. "É gente que conheci em campanhas passadas, há muito tempo", diz Okamotto. "Cada vez peço 50 paus [R$ 50 mil], 100 paus [R$ 100 mil], diz.
Ao lançar o Instituto Lula, Okamotto afirma que a receita da entidade crescerá de forma significativa. "Para o novo instituto vamos fazer uma campanha mais forte de arrecadação. Vai levantar muito, mas muito dinheiro", afirma. "Hoje, muitos empresários oferecem dinheiro, mas não é o momento. Dinheiro não é o problema. Estou preocupado com o que o instituto vai fazer, em como vai atuar", explica.
Okamotto buscou referências em diferentes institutos espalhados pelo mundo: dos americanos Al Gore e Jimmy Carter, do africano Nelson Mandela, outros na Índia e em Portugal. Em março, visitou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, no instituto do tucano, para trocar experiências. "Pesquisei vários no mundo todo e não tinha motivo para não visitar o de Fernando Henrique", diz. Foram estudados dois modelos: instituto e fundação. Descartaram esse último por avaliarem que criaria amarras como a fiscalização do Ministério Público e a abertura de contas da entidade.
A principal finalidade do instituto será a de manter Lula no centro do cenário político. "Lula quer fazer política, ele quer continuar. Tem muita coisa ainda para fazer, para fortalecer a democracia. Fazer política não significa que isso desembocara em uma candidatura, mas ele pode ser candidato a tudo: prefeito, deputado, senador e presidente", comenta Okamotto.
O ex-presidente concentrou a agenda internacional neste ano para dedicar-se em 2012 às viagens pelo país. Com vistas às eleições municipais, Lula estuda refazer trajetos das Caravanas da Cidadania e se empenhará na construção de alianças políticas e de candidaturas.
A principal renda do ex-presidente têm sido as palestras pagas. Os pronunciamentos do petista ajudam a sustentar também Okamotto, sócio de Lula na empresa de palestras L.I.L.S. (de Luiz Inácio Lula da Silva), constituída em março deste ano. Okamotto é amigo de Lula há mais de 30 anos e diz ter pago uma dívida de R$ 29,4 mil do ex-presidente com o PT, em uma ação investigada na CPI dos Bingos. Ex-tesoureiro do partido, o petista diz não receber um salário no instituto, mas afirma que já estava preparado para isso. "Ganhei dinheiro quando estava no Sebrae, guardei. Tenho uma empresa de vendas pela internet [a Red Star Ltda.], sou aposentado e tenho a participação nessa empresa. Já estava preparado para passar alguns meses sem salário", comenta.
O ex-presidente, além de atuar no instituto e fazer palestras, investe no lançamento de um memorial que contará os oito anos de sua gestão, sua história sindical e política e as transformações do país desde o fim do regime militar. Articulado por Okamotto, o projeto será lançado até o fim deste ano com apoio do ex-ministro Paulo Vannuchi.
O memorial, denominado provisoriamente como da Democracia, será interativo, nos moldes dos museus da Língua Portuguesa e do Futebol, e deve ser instalado no centro de São Paulo, na região conhecida como cracolândia, para ajudar na revitalização da área. As negociações com o prefeito Gilberto Kassab estão avançadas e a prefeitura poderá doar um terreno e até um prédio para o museu. Assim como o instituto, o museu será custeado por empresários e buscará leis de incentivo cultural. O memorial deve ser gerido pela Universidade Federal de São Paulo.
Por vezes a paróquia é o mundo inteiro, como se viu em 2008, quando loiros de olhos azuis mergulharam o mundo na crise e na recessão.
Ainda bem que morenos de olhos negros estavam atentos para nos livrar dessas "marolas" do capitalismo globalizado, perverso, iníquo, concentrador e assimétrico...
Bem, tendo feito obra meritória de reformas incontáveis pelo Brasil afora durante oito anos inteiros (fora os de preparação), o nosso guia maior empreende agora vôos mais altos, para reformar a África, a América Latina, o mundo inteiro, se deixarem.
Eu pessoalmente acho que ele deveria começar pelo Maranhão e pelo Piauí, mas parece que é pouco para sonhos megalomaníacos...
Mas, sobrou para o Brasil também: ele vai interferir poderosamente nas eleições de 2012, e se prepara para novo pleito em 2014.
Adoradores incondicionais estão delirando de contentamento. Acham estranho que pessoas normais achem estranho...
Paulo Roberto de Almeida
Fora da Presidência, Lula monta estrutura paralela de diplomacia
Cristiane Agostine
Valor Econômico, 25/07/2011 – p. A6
São Paulo - Lula com Chávez (foto): ex-presidente sente-se à vontade para dar bronca e conselhos a governantes
No início de junho, em uma conversa com o presidente Hugo Chávez, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu broncas e conselhos ao amigo venezuelano. Lula repassou a Chávez a reclamação de empresários brasileiros em relação à dificuldade para importar coque de petróleo daquele país e o questionou sobre o programa habitacional "Gran Misión Vivienda Venezuela", a versão local do "Minha Casa, Minha Vida". No Palácio Miraflores, em Caracas, o petista colocou em xeque a meta ambiciosa do programa, de construir dois milhões de casas até 2017.
No fim daquele mês, em encontro com o presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, o ex-presidente o orientou a mapear e cadastrar todas as famílias carentes do país, antes de pensar na criação de um programa como o Bolsa Família, carro-chefe de sua gestão na Presidência. Em maio, Lula esteve no Panamá com o presidente Ricardo Martinelli. O petista aconselhou o governante, empresário varejista que ascendeu por fora da elite do país, como driblar resistências sociais. Recém-eleito presidente do Peru, Ollanta Humala também procurou o ex-presidente em busca de aconselhamento.
Fora da Presidência, Lula tem feito de seu trabalho uma espécie de diplomacia paralela ao governo federal. O ex-presidente recebe chefes de Estado, empresários e é sondado até a intermediar o diálogo da oposição com governos estrangeiros, como na Venezuela. A seus auxiliares, o ex-presidente diz que está vivendo o melhor dos mundos: pode falar aquilo que deseja, sem os limites e obrigações diplomáticas que o cargo lhe impunha.
Instituto Lula poderá reeditar Caravanas da Cidadania em países da África e da América Latina
No primeiro semestre longe do Palácio do Planalto, Lula atua em três frentes: a montagem do Instituto Lula; a elaboração de um memorial com sua trajetória sindical e política e a empresa L.I.L.S. Palestras, Eventos e Publicações LTDA. O instituto será lançado até setembro e o projeto do memorial deve ficar pronto até o fim do ano. O museu está sendo negociado com o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, e deve ser instalado em um prédio a ser doado pela prefeitura.
O Instituto Lula substituirá o Instituto Cidadania, atual local de trabalho do ex-presidente. Por enquanto, a entidade vai continuar na mesma casa onde funciona o Cidadania, no Ipiranga, na zona sul de São Paulo, mas os auxiliares do petista buscam uma sede maior.
Do instituto, o ex-presidente comandará ações voltadas para a América do Sul e África. Uma das ideias estudadas, mas sobre a qual ainda não há consenso, é articular uma espécie de "Caravana da Cidadania" em países latino-americanos e africanos. Segundo o ex-presidente do Sebrae Paulo Okamotto, responsável pela organização do instituto, seria uma reedição internacional das caravanas feitas por Lula, então candidato à Presidência, no início dos anos 90. "Por que não fazer uma Caravana da Cidadania nesses países?", diz Okamoto. " Não podemos ficar daqui pensando e dizendo como eles têm que viver. Temos que fazer nesses países o que fizemos no Brasil, conhecer as classes políticas, as culturas, a realidade local", explica.
A entidade já organizou dois debates sobre a África e a América Latina, com a participação de representantes do Banco Mundial, e pretende criar um conselho com especialistas, para elaborar programas. Empresários e governantes têm procurado o instituto para participar de projetos. Lula poderia atrair investidores àqueles países. "É importante fazer desses países grandes mercados consumidores. Isso acaba gerando empregos também para os países ricos, que vão produzir mais para vender nesses lugares", analisa Okamotto. "Queremos mostrar um novo modelo econômico", afirma.
A preocupação, diz Okamotto, é que a atuação de Lula não fique resumida às palestras. "Queremos trabalhar em projetos para ajudar no desenvolvimento econômico da África e da América Latina. Não somos uma ONG para ficar fazendo projetinhos", comenta Okamotto. "Ele não terá papel de consultor, mas sim animador, fomentador", registra.
A agenda internacional do ex-presidente tem sido intensa e deve continuar assim no segundo semestre. Nos primeiros seis meses longe da Presidência, Lula já visitou 18 países. Na sexta-feira, o petista disse, em Pernambuco, que deverá fazer mais 23 viagens internacionais até o fim do ano. "Muitos governantes querem falar com ele e saber como é que ele promoveu o desenvolvimento com inclusão social, como fez o Brasil", conta Okamotto.
Em todos os países que visitou, Lula foi reconhecido e tratado como celebridade, com direito a fotos, abraços e autógrafos. Em algumas viagens, o ex-presidente saiu para jantar e conhecer lugares. O petista tem feito o mesmo em São Paulo, ainda que com pouca frequência. Na Presidência, sempre evitava sair.
Os auxiliares do ex-presidente aproveitam essa demanda de viagens para ganhar tempo e tentar focar a atuação do instituto. No comando das ações para os países africanos e latino-americanos estão o ex-ministro Luiz Dulci e a ex-assessora especial da Presidência Clara Ant.
O Instituto Cidadania é considerado como a "incubadora" da futura entidade. Criada em 1990, sob comando de Lula, depois da derrota para Fernando Collor de Mello na disputa presidencial, a organização não governamental fomentou durante anos debates sobre políticas públicas até ser esvaziada com a vitória de Lula em 2002. Com o fim dos oito anos de governo, foi retomada. O Cidadania tem uma dúzia de funcionários e custa mensalmente cerca de R$ 100 mil, entre folha de pagamento, contas de água, luz e telefone e viagens de Lula. Os deslocamentos, no entanto, não costumam pesar no orçamento. Em geral, a passagem de avião é custeada pela empresa ou banco que contrata o ex-presidente para uma palestra. Lula costuma "pegar carona" em aviões de empresários.
Kassab deve ajudar o petista e sinaliza com a doação de terreno e prédio para abrigar memorial
Na direção do instituto está o deputado federal José de Fillipi (SP), ex-prefeito de Diadema e responsável pelas finanças das campanhas presidenciais de Lula em 2006 e de Dilma Rousseff, em 2010. A receita do Cidadania é obtida por meio de doações de empresários, pessoas físicas e do que o ex-presidente ganha com suas palestras de R$ 300 mil. Em geral, os doadores são também financiadores de campanhas. "É gente que conheci em campanhas passadas, há muito tempo", diz Okamotto. "Cada vez peço 50 paus [R$ 50 mil], 100 paus [R$ 100 mil], diz.
Ao lançar o Instituto Lula, Okamotto afirma que a receita da entidade crescerá de forma significativa. "Para o novo instituto vamos fazer uma campanha mais forte de arrecadação. Vai levantar muito, mas muito dinheiro", afirma. "Hoje, muitos empresários oferecem dinheiro, mas não é o momento. Dinheiro não é o problema. Estou preocupado com o que o instituto vai fazer, em como vai atuar", explica.
Okamotto buscou referências em diferentes institutos espalhados pelo mundo: dos americanos Al Gore e Jimmy Carter, do africano Nelson Mandela, outros na Índia e em Portugal. Em março, visitou o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, no instituto do tucano, para trocar experiências. "Pesquisei vários no mundo todo e não tinha motivo para não visitar o de Fernando Henrique", diz. Foram estudados dois modelos: instituto e fundação. Descartaram esse último por avaliarem que criaria amarras como a fiscalização do Ministério Público e a abertura de contas da entidade.
A principal finalidade do instituto será a de manter Lula no centro do cenário político. "Lula quer fazer política, ele quer continuar. Tem muita coisa ainda para fazer, para fortalecer a democracia. Fazer política não significa que isso desembocara em uma candidatura, mas ele pode ser candidato a tudo: prefeito, deputado, senador e presidente", comenta Okamotto.
O ex-presidente concentrou a agenda internacional neste ano para dedicar-se em 2012 às viagens pelo país. Com vistas às eleições municipais, Lula estuda refazer trajetos das Caravanas da Cidadania e se empenhará na construção de alianças políticas e de candidaturas.
A principal renda do ex-presidente têm sido as palestras pagas. Os pronunciamentos do petista ajudam a sustentar também Okamotto, sócio de Lula na empresa de palestras L.I.L.S. (de Luiz Inácio Lula da Silva), constituída em março deste ano. Okamotto é amigo de Lula há mais de 30 anos e diz ter pago uma dívida de R$ 29,4 mil do ex-presidente com o PT, em uma ação investigada na CPI dos Bingos. Ex-tesoureiro do partido, o petista diz não receber um salário no instituto, mas afirma que já estava preparado para isso. "Ganhei dinheiro quando estava no Sebrae, guardei. Tenho uma empresa de vendas pela internet [a Red Star Ltda.], sou aposentado e tenho a participação nessa empresa. Já estava preparado para passar alguns meses sem salário", comenta.
O ex-presidente, além de atuar no instituto e fazer palestras, investe no lançamento de um memorial que contará os oito anos de sua gestão, sua história sindical e política e as transformações do país desde o fim do regime militar. Articulado por Okamotto, o projeto será lançado até o fim deste ano com apoio do ex-ministro Paulo Vannuchi.
O memorial, denominado provisoriamente como da Democracia, será interativo, nos moldes dos museus da Língua Portuguesa e do Futebol, e deve ser instalado no centro de São Paulo, na região conhecida como cracolândia, para ajudar na revitalização da área. As negociações com o prefeito Gilberto Kassab estão avançadas e a prefeitura poderá doar um terreno e até um prédio para o museu. Assim como o instituto, o museu será custeado por empresários e buscará leis de incentivo cultural. O memorial deve ser gerido pela Universidade Federal de São Paulo.
Noticias do Planalto Central: empreitadas, protecionismo, guerra fiscal, enfim, o habitual...
Sempre me surpreendo -- ou melhor, acho que não me surpreendo mais -- com as manchetes de jornais brasileiros relatando o nosso habitual costumeiro.
Sem pretender fazer propaganda de um ou outro jornal, em especial, relato apenas as manchetes que tenho lido, desde a última semana, quando estive viajando e com pouco acesso a jornais:
"Aditivos param obras no São Francisco"
PRA: se refere às demandas de empresas para receber uns 700 milhões a mais para continuar obras na famosa (e controversa) transposição de águas do Rio São Francisco. "Até 3 meses atrás, a lista de aditivos da transposição somava 43 pedidos de empresas de construção e serviços. Todas [repito: TODAS] as empreiteiras que trabalham nos 12 consórcios na transposição do rio pediram aditivos ao Ministério da Integração Nacional... (...) Há 11 aditivos que cobram reajuste de mais de 25% no preço do contrato, limite definido por lei. (...) [Um deles] pode aumento de 70% no preço original do contrato para entregar estruturas de canais e dois reservatórios. O mesmo percentual é reivindicado na construção de um túnel no lote 12".
"Setor siderúrgico vai a Dilma pedir ajustes"
O alto comando da siderurgia brasileira... busca um encontro com a presidente... para uma apresentação detalhada de dados que consideram ameaças à competitividade do setor no país. ... temas da desindustrialização -- acelerada pelo aumento da importação indireta de produtos feitos em aço, como autopeças, carros e máquinas -- até a guerra fiscal entre estados. (...) No Brasil, a sobra de capacidade das usinas já representaria 53% da demanda doméstica. (...) [O] ministro do Desenvolvimento... recentemente disse que o aço brasileiro é caro. Os industriais acham que ele está desinformado sobre a carga tributária, o câmbio e outros fatores que afetam a competitividade do setor."
"Tablets acirram guerra fiscal"
"O governo do Amazonas vai acionar o Supremo Tribunal Federal para questionar incentivos do Estado de São Paulo para produção e comercialização de tablets. (...) Na prática, São Paulo eliminou a incidência do imposto para estimular a produção de tablets no estado, prejudicando a competitividade da Zona Franca de Manaus, que já conta com cinco empresas interessadas em produzir a uma alíquota de 12%."
"Câmara dos Deputados gastará RS$ 300 milhões para construir anexo"
O presidente da CD... autorizou a construção de um novo anexo da Casa para abrigar 86 gabinetes, restaurantes, salas de reuniões e garagem subterrânea, a um custo estimado de RS$ 300 milhões. (...) [Em 2007] o arquiteto Oscar Niemeyer fez o estudo preliminar quer previa um novo anexo... [que] custaria RS$ 700 milhões, podendo chegar a R$ 1 bilhão."
Enfim, tem notícias sobre corrupção, reús de mensalões (são vários), gastos faraônicos, para todos os gostos.
Eu me pergunto se o Brasil é um país normal.
Não pode ser...
Paulo Roberto de Almeida
Sem pretender fazer propaganda de um ou outro jornal, em especial, relato apenas as manchetes que tenho lido, desde a última semana, quando estive viajando e com pouco acesso a jornais:
"Aditivos param obras no São Francisco"
PRA: se refere às demandas de empresas para receber uns 700 milhões a mais para continuar obras na famosa (e controversa) transposição de águas do Rio São Francisco. "Até 3 meses atrás, a lista de aditivos da transposição somava 43 pedidos de empresas de construção e serviços. Todas [repito: TODAS] as empreiteiras que trabalham nos 12 consórcios na transposição do rio pediram aditivos ao Ministério da Integração Nacional... (...) Há 11 aditivos que cobram reajuste de mais de 25% no preço do contrato, limite definido por lei. (...) [Um deles] pode aumento de 70% no preço original do contrato para entregar estruturas de canais e dois reservatórios. O mesmo percentual é reivindicado na construção de um túnel no lote 12".
"Setor siderúrgico vai a Dilma pedir ajustes"
O alto comando da siderurgia brasileira... busca um encontro com a presidente... para uma apresentação detalhada de dados que consideram ameaças à competitividade do setor no país. ... temas da desindustrialização -- acelerada pelo aumento da importação indireta de produtos feitos em aço, como autopeças, carros e máquinas -- até a guerra fiscal entre estados. (...) No Brasil, a sobra de capacidade das usinas já representaria 53% da demanda doméstica. (...) [O] ministro do Desenvolvimento... recentemente disse que o aço brasileiro é caro. Os industriais acham que ele está desinformado sobre a carga tributária, o câmbio e outros fatores que afetam a competitividade do setor."
"Tablets acirram guerra fiscal"
"O governo do Amazonas vai acionar o Supremo Tribunal Federal para questionar incentivos do Estado de São Paulo para produção e comercialização de tablets. (...) Na prática, São Paulo eliminou a incidência do imposto para estimular a produção de tablets no estado, prejudicando a competitividade da Zona Franca de Manaus, que já conta com cinco empresas interessadas em produzir a uma alíquota de 12%."
"Câmara dos Deputados gastará RS$ 300 milhões para construir anexo"
O presidente da CD... autorizou a construção de um novo anexo da Casa para abrigar 86 gabinetes, restaurantes, salas de reuniões e garagem subterrânea, a um custo estimado de RS$ 300 milhões. (...) [Em 2007] o arquiteto Oscar Niemeyer fez o estudo preliminar quer previa um novo anexo... [que] custaria RS$ 700 milhões, podendo chegar a R$ 1 bilhão."
Enfim, tem notícias sobre corrupção, reús de mensalões (são vários), gastos faraônicos, para todos os gostos.
Eu me pergunto se o Brasil é um país normal.
Não pode ser...
Paulo Roberto de Almeida
Elogios e criticas a diplomacia brasileira - Luiz Felipe Lampreia
Em complemento ao post abaixo (antepenultimo a este) de elogios à diplomacia brasileira, creio ser útil repostar (se existe a expressão) este artigo de um ex-chanceler brasileiro, levantando dúvidas sobre algumas das iniciativas do governo anterior (de Lula), que estão sendo aparentemente continuadas neste governo (com algumas evidentes descontinuidades, estilo retirando o bode da sala). O post original é de 13 de abril de 2011.
Paulo Roberto de Almeida
A Política Externa no Governo Dilma - Luiz Felipe Lampreia
Agenda para a Política Externa no Governo Dilma
LUIZ FELIPE LAMPREIA
Revista Interesse Nacional, n. 13, abril-junho 2011
De todas as heranças boas e más que o atual governo recebeu, a política externa é uma das mais negativas. O elenco dos erros é longo e inclui, principalmente:
a) a fracassada tentativa de envolvimento diplomático na querela sobre armas nucleares do Irã com as grandes potências, que terminou levando a uma contundente derrota por 12 a 2 no Conselho de Segurança da ONU e abalou o prestígio internacional do Brasil, naquilo que terá sido o mais grave erro em toda a história de nossa política externa;
b) a abstenção em resoluções da ONU que condenavam violações gritantes de direitos humanos no Irã, no Sudão e em outros regimes ditatoriais, o que representou um sério afastamento do Brasil de sua tradicional posição na matéria;
c) a defesa incondicional do regime cubano, inclusive de sua política repressiva, com manifestações do presidente Lula em Havana no sentido de que os dissidentes em greve de fome eram comparáveis a criminosos comuns;
d) a quixotesca tentativa de desempenhar o papel de mediador entre israelenses e palestinos, que nem chegou a começar por total falta de credibilidade;
e) as sucessivas derrotas de candidaturas brasileiras ou apoiadas pela nossa diplomacia em disputas por cargos relevantes em órgãos internacionais, como na Unesco, no Banco Interamericano de Desenvolvimento, na Organização Mundial do Comércio (OMC) e em muitos outros;
f) a nacionalização da Petrobras pelo governo boliviano, que resultou na perda de um investimento de mais de US$ 1,5 bilhão;
g) a atuação diplomática muito discreta do Brasil em situações tensas e conflitivas na América do Sul, como entre a Colômbia e a Venezuela, o Peru e o Chile, ou entre o Uruguai e a Argentina, por exemplo, o que significou um déficit comentado por diversos líderes, como a ex-presidente Michelle Bachelet, do Chile, e debilita a liderança brasileira na região.
Não é desejável frequentar Ahmadinejad, os ditadores do Cazaquistão e da Guiné Equatorial, mandar um embaixador para a Coreia do Norte, fazer gestos positivos para o ditador do Sudão. São iniciativas gratuitas que nos tiram credibilidade. Este balanço negativo fez com que a política externa se tornasse muito polêmica no Brasil. Todos os principais jornais, numerosos analistas e a maior parte da opinião pública que segue estes assuntos, todos tomaram posições muito críticas. O desafio da diplomacia brasileira, hoje, é voltar a fazer com que a política externa consiga um amplo apoio nacional e possa recuperar o terreno que o Brasil perdeu com os equívocos do governo passado.
América do Sul: Prioridades e desafios
O Brasil não se envolve em conflitos regionais há quase 150 anos. Não tem inimigos, nem enfrenta ameaças internacionais que nos obriguem a colocar a segurança nacional como um imperativo prioritário. Tem, por isso, como objetivo básico de política externa a promoção de seu desenvolvimento econômico. O comércio internacional adquire, obviamente, importância central para atingi-lo e nossos vizinhos são parceiros fundamentais.
O palco histórico do Brasil e a âncora de nossa política externa é, desde sempre, a América do Sul. Aqui estão nossas principais prioridades e desafios. A relação com os países da região está hoje assinalada pelo considerável avanço que o Brasil realizou com a expansão de sua economia e pelo fortalecimento de suas empresas estatais e privadas. Até o final da década de 1980, o comércio regional de mercadorias era inexpressivo, enquanto o investimento brasileiro nesses países era praticamente nulo.
Hoje, existe uma corrente forte de intercâmbio, uma série de empresas brasileiras possuem forte presença nos setores produtivos – sejam eles agrícolas, industriais ou de mineração e de serviços – em diversos países da América do Sul. Daí derivam algumas considerações principais que o novo governo brasileiro precisa levar em conta.
Em primeiro lugar, há que dar novo impulso ao Mercosul. O ambicioso projeto da Unasul de promover a integração sul-americana ainda se encontra em fase inicial, sendo muito mais uma ambição do que uma realidade. O Mercosul, com todas as suas falhas, é tangível. Seu relançamento deve começar por abrir mais o mercado brasileiro para nossos vizinhos. Boa parte da responsabilidade pela relativa estagnação do Mercosul, depois do ímpeto que teve em seus primeiros anos, deveu-se a que nenhum dos países membros observou suficientemente os preceitos de livre comércio entre si. O Brasil teve, inclusive, uma parte considerável de responsabilidade nisso. No momento em que existe um crescimento bastante forte e simultâneo em todos os quatro países membros, seria muito oportuno que houvesse um importante avanço na liberalização do comércio dentro do Mercosul para benefício de todos. Isto permitiria reforçar também a união aduaneira – hoje muito limitada e permeada de exceções – mediante a ampliação da tarifa externa comum, o que por sua vez favoreceria o Brasil.
O Mercosul, que parecia ter sido condenado a uma paralisia definitiva, ressurge agora como uma nova oportunidade para todos os seus integrantes, devendo ser fortalecido em suas disciplinas básicas. Como disse em meu livro O Brasil e os Ventos do Mundo: “O Mercosul é mais do que uma união aduaneira ou um mecanismo de promoção do comércio. O Mercosul tem efetivamente criado uma série de níveis de entendimento com a cooperação militar, a cooperação entre profissionais liberais, o intercâmbio educacional e cultural, em suma criou uma verdadeira intimidade que não existia antes até porque vivíamos de costas uns para os outros”. Isto não deve significar, porém, que o Mercosul volte a ser encarado como a melhor opção de inserção internacional do Brasil, como foi o caso na década de 1990. Adquirimos um peso internacional próprio. Nem sequer do ponto de vista dos acordos de livre comércio é do interesse brasileiro estar necessariamente obrigado a encontrar um denominador comum. Seria útil realizar estudos que permitissem um certo grau de flexibilidade no conceito de negociação em bloco. Deveria ser explorada a possibilidade de que nosso país adquirisse autonomia para negociar com diversos países do mundo.
Com o fim da opção da Alca e a realização de numerosos acordos de livre comércio por muitos de nossos principais parceiros comerciais, na região e fora dela, o Brasil encontra-se na situação de ter desvantagem concorrencial pela falta de preferências comerciais. Fica, assim, dificultado o acesso de nossos produtos de maior valor agregado aos maiores mercados mundiais.
Hoje, mesmo a negociação em curso com a União Europeia parece ter poucas possibilidades de avanço, enquanto não há sequer um começo com outros grandes países. A autonomia negociadora poderia abrir novas perspectivas para o Brasil. É necessário, porém, ter em mente as limitações destes acordos, especialmente o risco de obtermos muito pouco em termos de acesso adicional a mercados em setores em que já existem contenciosos (como algodão e açúcar, por exemplo) e onde os lobbies protecionistas são muito entrincheirados e poderosos, em especial na agricultura.
Em segundo lugar, o Brasil precisa desempenhar um papel mais ativo na solução de eventuais conflitos regionais. Não se trata de impor uma presença mediadora constante, mesmo porque não é evidente que nossa intervenção seja desejada, nem que a posição brasileira seja acompanhada por todos, sempre. Porém, a omissão que caraterizou a atuação brasileira no governo passado é uma lacuna que debilita a liderança regional que pretendemos exercer. Ela deveu-se provavelmente ao cálculo de que o envolvimento poderia ser excessivamente desgastante se não fosse efetivo, ou ser visto como a tomada de partido por um dos lados da questão.
O Brasil não tem os meios militares e econômicos para impor soluções, mas tem certamente condições para exercer um peso político e diplomático considerável na região. Nossa presença não precisa ser singular. Ela pode ocorrer em conjunto com os outros países ou no contexto de ações da OEA ou da Unasul. Mas é indispensável que o Brasil tenha um papel de destaque, sem se omitir em questões fundamentais, como a paz na América do Sul. No passado, o Brasil desempenhou este papel com grande êxito em diversas situações históricas, em especial na solução definitiva do secular conflito entre o Peru e o Equador, pelo Tratado do Itamaraty, de 1998.
Em terceiro lugar, pelo peso crescente que o Brasil vai adquirindo na economia dos países vizinhos, precisamos encontrar um equilíbrio entre a submissão aos caprichos de governos populistas (como foi o caso da nacionalização da Petrobras Bolívia) e uma postura intervencionista. O governo tem a obrigação de proteger os interesses das empresas brasileiras, por um lado, mas não pode adotar uma conduta prepotente que seja explorada contra nós, com acusações de “imperialismo”.
Obviamente, o Brasil não pode ameaçar seus vizinhos, mas tem suficiente influência para dar avisos claros e tomar posições firmes em defesa de seus interesses. Foi o caso do Equador em setembro de 2008, quando o presidente Ra¬fael Correa, às vésperas de um referendo sobre uma nova constituição, expulsou a Odebrecht e ameaçou não pagar o empréstimo de US$ 200 milhões que o BNDES concedeu ao seu país para financiar as obras que a construtora levava adiante. Nesse caso, a resposta do governo brasileiro foi comedida e rápida, com o adiamento da visita do ministro de Transportes do Brasil, na qual seriam discutidos temas ligados a obras de infraestrutura viária de interesse do Equador. Na sequência, houve uma posição diplomática brasileira firme, mas discreta. O presidente do Equador “deplorou” a decisão do adiamento, mas acabou por atenuar sua posição. Os pagamentos da dívida equatoriana foram honrados. Em julho de 2010, a Odebrecht voltou ao Equador.
O caso da hidrelétrica de Itaipu é emblemático. Desde o Tratado de 1973, tem sido um ícone da colaboração bilateral com o Paraguai, tendo nosso país uma postura exemplar, que permitiu ao vizinho assumir posições paritárias na gestão da empresa Itaipu Binacional. Há alguns anos, o Paraguai reivindica a revisão dos pagamentos da sua dívida. Seria, a meu ver, um equívoco fazer concessões sobre a dívida paraguaia (já que o Brasil financiou 100% da construção da usina), pois o Paraguai terá, em 2023, 50% do grande patrimônio que é a usina, sem dever mais nada. Não devemos tampouco aceitar que o consumidor brasileiro arque com novos e maiores ônus pela energia de Itaipu, sob qualquer forma, levando-se em conta que uma parte substancial do consumo do Sudeste brasileiro é atendido por essa energia. Encontrar um equilíbrio que dê satisfação ao Paraguai é importante, porque o Brasil não pode ser uma ilha de prosperidade e precisa levar em conta as aspirações justas de seus vizinhos. Nesse sentido, o apoio brasileiro à construção de nova linha de transmissão para a capital paraguaia é muito oportuno.
Devemos contribuir na medida de nossas possibilidades para que este país possa renovar sua economia, tornando-a menos dependente do comércio eufemisticamente chamado de “triangular” e até de atividades ilícitas. Temos todo o interesse em que a economia paraguaia se fortaleça e que haja uma melhor distribuição de renda, capaz de permitir um efetivo progresso social. Será necessário encontrar fórmulas que ajudem o desenvolvimento do Paraguai sem criar uma penalização injusta para o consumidor brasileiro. Mas praticar uma política externa baseada na ideia da generosidade é um sério equívoco.
O governo passado inaugurou uma postura inédita na nossa história diplomática: a tomada de posição na política dos vizinhos. Com sucessivas declarações de apoio em pleitos eleitorais – a favor de Néstor Kirchner, Evo Morales e Hugo Chávez – praticamos o que o Brasil se abstinha de fazer desde que deixou de imiscuir- -se nas questões internas dos países da região há quase 150 anos, em particular desde a gestão Rio Branco (1902–1910). Esta conduta deveria continuar sendo a linha mestra da política externa brasileira. A sucessiva intervenção a favor de um candidato nas eleições dos vizinhos pode levar-nos a situações muito difíceis de manejar.
Não há motivo igualmente para continuar a demonstrar uma inclinação tão favorável a Hugo Chávez. O Brasil ignorou todos os abusos totalitários de poder, inclusive na área de direitos humanos, que o líder venezuelano cometeu, assim como suas intervenções em países da região – como o apoio que sempre deu às FARC na Colômbia, sua atuação no Peru e mesmo o incentivo e suporte à nacionalização da Petrobras na Bolívia. Com isso, foi possível construir uma relação amistosa que teve reflexos positivos no comércio e na presença favorecida de empresas brasileiras na Venezuela.
Porém, a administração venezuelana tem sido muito incompetente. A inflação está quase fora de controle, em particular no setor de alimentos, tendo chegado a 9% em janeiro passado; faltou energia elétrica e água. A Venezuela foi o único país com PIB negativo em 2010, quando todas as economias do subcontinente tiveram excelentes performances. Assim sendo, é possível que, nas eleições de 2012, o autoritário Chávez venha a perder a Presidência, especialmente se a oposição for capaz de apresentar-se unida em torno de um candidato forte. Não se trata aqui de preconizar uma atitude permanentemente crítica ao líder bolivariano, mas de exercer uma influência moderadora, tanto no plano externo (onde está perdendo influência e capacidade de liderança), quanto, sobretudo, no âmbito interno, à medida que as eleições se aproximam e podem resultar em enfrentamentos.
Riscos nas relações com os Estados Unidos
A nossa relação com os Estados Unidos não tem mais a centralidade que a caracterizava no passado recente. Mas continua a ser uma dimensão muito importante de nossa política externa. O Brasil e os Estados Unidos nunca foram inimigos e nem ameaça recíproca. Falar em relações perigosas é uma fantasia carregada de distorção ideológica. É do interesse de ambos os países ter boas relações, mas é igualmente verdade que o Brasil nunca será um aliado sistemático dos Estados Unidos. Como escreveu Peter Hakim, em artigo recente da revista Foreign Affairs Latinoamérica: “É quase inevitável que Brasil e Estados Unidos venham a divergir nos próximos anos neste continente e no mundo. […] Suas políticas e agendas refletem diferentes prioridades, abordagens e interesses. Eles não poderão sempre encontrar posições comuns ou manter suas divergências em surdina”.
Houve um rápido avanço nas relações com os Estados Unidos nos primeiros meses do governo da presidente Rousseff, que deu claros sinais de desejo de reaproximação, em decisão pragmática e acertada. Nos últimos dois anos do governo anterior, tinha ocorrido um afastamento crescente, em razão da postura antiamericana que foi adotada pelo presidente Lula e seu ministro. Superar as divergências recentes, todavia, não será tarefa fácil.
O governo americano decidiu investir mais atenção e capital político na relação com o Brasil, o que também representa um gesto construtivo. Há, porém, alguns riscos neste momento. O primeiro deles é a questão do apoio à legítima pretensão do Brasil a ter uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU. Esta aspiração é vista pelo governo e pela sociedade brasileira como o marco mais concreto do novo status internacional do Brasil. Tendo anunciado que apoiará a entrada da Índia como membro permanente, em sua visita recente a Nova Delhi, o presidente Obama criou um precedente entre os países emergentes, pois até então os Estados Unidos nunca se tinham manifestado abertamente em favor do Japão e procuravam delongar a reforma do Conselho. Se não fizer o mesmo em relação ao Brasil nos próximos tempos, criará um desapontamento que outras manifestações positivas dificilmente poderão compensar.
O segundo risco consiste em que os americanos interpretem a aproximação em curso como um sinal de que vão receber de nós um apoio regular e que atenderemos a todos os seus pedidos, o que não acontecerá, por certo. Na agenda continental, pode haver expectativas de que o Brasil gerencie as idiossincrasias da região, em particular na Venezuela, onde há um desafio crescente à hegemonia de Hugo Chávez, ou mesmo em Cuba. Isto certamente não nos interessa, embora o Brasil deva desempenhar um papel por conta própria, especialmente no primeiro caso, para favorecer a democracia e os direitos humanos.
Adesão à OCDE: Passo importante e desejável
O Brasil precisa abandonar certos preconceitos que estão hoje totalmente superados. Por exemplo, considerar que a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é um clube de ricos onde estaríamos deslocados é uma atitude míope. Por que não ingressar na OCDE? A organização, hoje liderada pelo mexicano José Angel Gurría, já fez numerosos pedidos para que o Brasil se torne membro. Durante o governo FHC, o Brasil aproximou-se gradativamente da OCDE, ingressando em diversos comitês que nos interessavam. Houve, porém, um afastamento da entidade, que ainda é tratada de forma pejorativa, por alguns setores da burocracia e da diplomacia nacionais, como o “clube dos ricos”. A adesão cuidadosamente negociada à OCDE traria benefícios palpáveis às nossas empresas em termos de financiamentos mais favoráveis à exportação e seria um adicional de peso ao status cada vez mais ponderável do Brasil na cena internacional. Na agenda internacional, esta é uma das mais importantes decisões que a presidente Dilma poderia tomar.
Direitos humanos: Sem tergiversações
Há posições morais que um país deve tomar mesmo que isto seja contrário a seus interesses econômicos. A área de direitos humanos é uma das que não devem ser objeto de tergiversações. Não foi o que se verificou no governo passado, pois a delegação brasileira se absteve em votações no Conselho de Direitos Humanos. O Brasil tem adotado algumas posturas ambíguas que desvirtuaram nossa posição tradicional e o mandato desse órgão. Destacam-se, recentemente, os votos no tratamento das violações ocorridas sobre a Coreia do Norte, Irã, Sri Lanka e diversos outros países. É frequente o uso por autoridades brasileiras do argumento de que o Conselho de Direitos Humanos não deve ser seletivo no tratamento de violações de direitos humanos. Mas ações de cada governo devem ser julgadas individualmente. A delegação brasileira também alega com regularidade ser contraproducente discutir e aprovar uma resolução sem o envolvimento do país em questão. As violações de direitos humanos não podem ser assim relativizadas, nem submetidas a dinâmicas políticas ou geopolíticas locais, sejam elas em Cuba, no Irã, na Líbia ou na China.
É por isso bem-vinda a recente afirmação da ministra Maria do Rosário no Conselho de Direitos Humanos, no sentido de que “no governo Dilma, direitos humanos não se negociam e a presidenta é intransigente com o tema”. O recente almoço em Genebra da embaixadora Maria Nazareth Farani Azevêdo com a dissidente exilada iraniana Shirin Ebadi, ganhadora do Prêmio Nobel da Paz de 2003, foi um sinal concreto desta mudança na posição brasileira. O próximo passo coerente seria copatrocinar o projeto de resolução que cria uma comissão para investigar as violações de direitos humanos no Irã.
Relacionamento Sul–Sul, sim, mas sem criar frente unida
Uma das principais ênfases da política externa do governo passado foi no chamado relacionamento Sul–Sul, quase um tentativa de reeditar o terceiro-mundismo dos anos 1950 e 1960. Não há dúvida de que é importante para o Brasil manter as melhores relações com os mais destacados países do Hemisfério Sul. Nos últimos quinze anos, demos sempre grande importância às relações com a China, a Índia e a África do Sul. O que não tem cabimento é a ideia de formar uma frente unida do Sul (como inaugurado na conferência de Bandung, em 1955,quando se falava em países do Terceiro Mundo), como forma de oposição aos países do Norte.
Um dos fundamentos desta orientação era o declínio de poder dos Estados Unidos. Ele é sensível em termos relativos, mas está muito longe de ser intenso e decisivo. Como disse o analista chinês Minxin Pei, na edição de julho/agosto de 2009 da revista Foreign Policy: “Não creiam na badalação (hype) intensa feita sobre o declínio da América e o despertar de uma nova era asiática. Muitas décadas passarão antes que a China, a Índia e o resto da região dominem o mundo, se é que algum dia o farão”. Felizmente, esta não deve ser a ênfase do atual governo. Como disse o ministro Antonio Patriota, em recente entrevista a importante revista brasileira: “Durante o governo Lula, a linha de atua¬ção Sul–Sul ficou em evidência porque era o aspecto mais inovador da política externa. Mas já naquela época, como embaixador em Washington, eu defendia que isso não se dava em detrimento da atenção a parceiros tradicionais do mundo desenvolvido. Esse é o espírito com que continuaremos a trabalhar”.
O País deve reforçar o sistema de não proliferação
O Brasil deve procurar desempenhar um papel significativo nas discussões para reforçar o sistema internacional de não proliferação e evitar a multiplicação de armas nucleares. Devemos fazer pleno uso de nossas credenciais, que são impecáveis, pois temos um compromisso constitucional e fazemos parte de todos os acordos internacionais globais e regionais de renúncia às armas nucleares. Com as recentes evoluções na Coreia do Norte e no Irã, o próprio regime de não proliferação está sob crescente ameaça e precisa ser reforçado.
Existe, no momento, uma questão em aberto neste terreno, que é a adesão do Brasil ao Protocolo Adicional do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares. Esse mecanismo, criado em 1997, permite fiscalização mais precisa das instalações atômicas dos países signatários, sem aviso prévio. A rejeição do protocolo pelo Brasil é posta em questão pelos países ocidentais, em especial os Estados Unidos, como incompreen¬sível. Creio, contudo, que a decisão pode ser adiada. Por ora, não existe nenhuma suspeita internacional de que o Brasil esteja desenvolvendo um programa nuclear encoberto, embora o ex-vice-presidente da República e um ministro do anterior governo tenham advogado publicamente que o país adquirisse armas nucleares. Esta posição terá de ser reavaliada mais adiante quando o país estiver em condições de produzir maiores quantidades de urânio enriquecido e eventualmente de tornar-se um exportador.
O que não deve repetir-se é o envolvimento brasileiro com o Irã nesta matéria, no qual fomos usados pelo regime de Teerã para tentar ganhar tempo e evitar novas sanções da ONU. É patente que esse país está buscando, no mínimo, ter capacidade de dotar-se de armas nucleares. Não há outra explicação para a multiplicidade de centros – por vezes secretos – de enriquecimento de urânio. Há um impasse completo nos esforços para colocar as instalações nucleares iranianas sob salvaguardas da Agência Atômica de Viena e para obter qualquer cooperação desse país com as decisões do Conselho de Segurança da ONU. O Brasil deve defender a liberdade de cada país buscar desenvolver sua indústria nuclear para fins pacíficos. Mas não havia nenhuma razão para que o Brasil buscasse ter um papel de mediador entre o Irã e as grandes potências, para o qual nosso país não tinha motivos geopolíticos ou econômicos sérios. Este afã de protagonismo resultou em sério fracasso, já que não produziu acordo e acelerou a votação de sanções pelo Conselho de Segurança da ONU, decisão tomada por todos os membros permanentes, contra a qual votaram apenas o Brasil e a Turquia, sofrendo uma derrota contundente por 12 a 2.
Potência global e política externa equilibrada
A afirmação do Brasil como potência global está em curso, sendo cada vez mais reconhecida. A inclusão no BRIC e no G-20, o crescente interesse que recebe na grande imprensa internacional, a boa performance da economia brasileira, os progressos havidos na promoção de maior inclusão social e no enfrentamento do crime organizado no Rio de Janeiro – nossas credenciais estão em alta. Por isso, é necessário atuar além das questões anteriormente abordadas neste artigo, em todas as suas vertentes do cenário global, em especial:
a) uma participação ativa na busca de fórmulas internacionais para equacionar o problema do aquecimento global, como vem fazendo desde que, a partir de 2009, deixou de refugiar-se atrás do conceito de responsabilidade histórica dos países que se industrializaram mais cedo e conseguiu resultados muito animadores na redução do desmatamento da Amazônia, principal calcanhar-de-aquiles brasileiro;
b) um papel importante nas principais negociações comerciais, em especial na OMC. À medida que as maiores economias ocidentais se recuperem da grande crise que começou em 2008 e quando não houver mais preocupação com o ressurgimento do protecionismo, surgirão novas oportunidades na OMC ou mesmo fora dela. A ênfase brasileira no G-20 da OMC como nosso principal grupo deve ser recalibrada, já que, como ficou evidente nas últimas reuniões ministeriais, os interesses brasileiros divergem dos da China e da Índia em matéria de agricultura;
c) o Brasil, como outros países emergentes, inclusive a China e a Índia, reivindicam maior participação no poder decisório do Fundo Monetário Internacional. Este é um importante objetivo estratégico. Para desempenhar suas novas e crescentes responsabilidades, o Brasil precisa ter uma política externa equilibrada que não incorra nos arroubos que nos levaram a grandes desgastes em passado recente. Com os novos avanços no processo de inclusão social que, desde o Plano Real, em 1994, vem permitindo a redução gradual da pobreza e uma melhor distribuição de renda, o Brasil vai superando seu principal desafio e projetando-se internacionalmente como país democrático, pacífico e mais justo.
Paulo Roberto de Almeida
A Política Externa no Governo Dilma - Luiz Felipe Lampreia
Agenda para a Política Externa no Governo Dilma
LUIZ FELIPE LAMPREIA
Revista Interesse Nacional, n. 13, abril-junho 2011
De todas as heranças boas e más que o atual governo recebeu, a política externa é uma das mais negativas. O elenco dos erros é longo e inclui, principalmente:
a) a fracassada tentativa de envolvimento diplomático na querela sobre armas nucleares do Irã com as grandes potências, que terminou levando a uma contundente derrota por 12 a 2 no Conselho de Segurança da ONU e abalou o prestígio internacional do Brasil, naquilo que terá sido o mais grave erro em toda a história de nossa política externa;
b) a abstenção em resoluções da ONU que condenavam violações gritantes de direitos humanos no Irã, no Sudão e em outros regimes ditatoriais, o que representou um sério afastamento do Brasil de sua tradicional posição na matéria;
c) a defesa incondicional do regime cubano, inclusive de sua política repressiva, com manifestações do presidente Lula em Havana no sentido de que os dissidentes em greve de fome eram comparáveis a criminosos comuns;
d) a quixotesca tentativa de desempenhar o papel de mediador entre israelenses e palestinos, que nem chegou a começar por total falta de credibilidade;
e) as sucessivas derrotas de candidaturas brasileiras ou apoiadas pela nossa diplomacia em disputas por cargos relevantes em órgãos internacionais, como na Unesco, no Banco Interamericano de Desenvolvimento, na Organização Mundial do Comércio (OMC) e em muitos outros;
f) a nacionalização da Petrobras pelo governo boliviano, que resultou na perda de um investimento de mais de US$ 1,5 bilhão;
g) a atuação diplomática muito discreta do Brasil em situações tensas e conflitivas na América do Sul, como entre a Colômbia e a Venezuela, o Peru e o Chile, ou entre o Uruguai e a Argentina, por exemplo, o que significou um déficit comentado por diversos líderes, como a ex-presidente Michelle Bachelet, do Chile, e debilita a liderança brasileira na região.
Não é desejável frequentar Ahmadinejad, os ditadores do Cazaquistão e da Guiné Equatorial, mandar um embaixador para a Coreia do Norte, fazer gestos positivos para o ditador do Sudão. São iniciativas gratuitas que nos tiram credibilidade. Este balanço negativo fez com que a política externa se tornasse muito polêmica no Brasil. Todos os principais jornais, numerosos analistas e a maior parte da opinião pública que segue estes assuntos, todos tomaram posições muito críticas. O desafio da diplomacia brasileira, hoje, é voltar a fazer com que a política externa consiga um amplo apoio nacional e possa recuperar o terreno que o Brasil perdeu com os equívocos do governo passado.
América do Sul: Prioridades e desafios
O Brasil não se envolve em conflitos regionais há quase 150 anos. Não tem inimigos, nem enfrenta ameaças internacionais que nos obriguem a colocar a segurança nacional como um imperativo prioritário. Tem, por isso, como objetivo básico de política externa a promoção de seu desenvolvimento econômico. O comércio internacional adquire, obviamente, importância central para atingi-lo e nossos vizinhos são parceiros fundamentais.
O palco histórico do Brasil e a âncora de nossa política externa é, desde sempre, a América do Sul. Aqui estão nossas principais prioridades e desafios. A relação com os países da região está hoje assinalada pelo considerável avanço que o Brasil realizou com a expansão de sua economia e pelo fortalecimento de suas empresas estatais e privadas. Até o final da década de 1980, o comércio regional de mercadorias era inexpressivo, enquanto o investimento brasileiro nesses países era praticamente nulo.
Hoje, existe uma corrente forte de intercâmbio, uma série de empresas brasileiras possuem forte presença nos setores produtivos – sejam eles agrícolas, industriais ou de mineração e de serviços – em diversos países da América do Sul. Daí derivam algumas considerações principais que o novo governo brasileiro precisa levar em conta.
Em primeiro lugar, há que dar novo impulso ao Mercosul. O ambicioso projeto da Unasul de promover a integração sul-americana ainda se encontra em fase inicial, sendo muito mais uma ambição do que uma realidade. O Mercosul, com todas as suas falhas, é tangível. Seu relançamento deve começar por abrir mais o mercado brasileiro para nossos vizinhos. Boa parte da responsabilidade pela relativa estagnação do Mercosul, depois do ímpeto que teve em seus primeiros anos, deveu-se a que nenhum dos países membros observou suficientemente os preceitos de livre comércio entre si. O Brasil teve, inclusive, uma parte considerável de responsabilidade nisso. No momento em que existe um crescimento bastante forte e simultâneo em todos os quatro países membros, seria muito oportuno que houvesse um importante avanço na liberalização do comércio dentro do Mercosul para benefício de todos. Isto permitiria reforçar também a união aduaneira – hoje muito limitada e permeada de exceções – mediante a ampliação da tarifa externa comum, o que por sua vez favoreceria o Brasil.
O Mercosul, que parecia ter sido condenado a uma paralisia definitiva, ressurge agora como uma nova oportunidade para todos os seus integrantes, devendo ser fortalecido em suas disciplinas básicas. Como disse em meu livro O Brasil e os Ventos do Mundo: “O Mercosul é mais do que uma união aduaneira ou um mecanismo de promoção do comércio. O Mercosul tem efetivamente criado uma série de níveis de entendimento com a cooperação militar, a cooperação entre profissionais liberais, o intercâmbio educacional e cultural, em suma criou uma verdadeira intimidade que não existia antes até porque vivíamos de costas uns para os outros”. Isto não deve significar, porém, que o Mercosul volte a ser encarado como a melhor opção de inserção internacional do Brasil, como foi o caso na década de 1990. Adquirimos um peso internacional próprio. Nem sequer do ponto de vista dos acordos de livre comércio é do interesse brasileiro estar necessariamente obrigado a encontrar um denominador comum. Seria útil realizar estudos que permitissem um certo grau de flexibilidade no conceito de negociação em bloco. Deveria ser explorada a possibilidade de que nosso país adquirisse autonomia para negociar com diversos países do mundo.
Com o fim da opção da Alca e a realização de numerosos acordos de livre comércio por muitos de nossos principais parceiros comerciais, na região e fora dela, o Brasil encontra-se na situação de ter desvantagem concorrencial pela falta de preferências comerciais. Fica, assim, dificultado o acesso de nossos produtos de maior valor agregado aos maiores mercados mundiais.
Hoje, mesmo a negociação em curso com a União Europeia parece ter poucas possibilidades de avanço, enquanto não há sequer um começo com outros grandes países. A autonomia negociadora poderia abrir novas perspectivas para o Brasil. É necessário, porém, ter em mente as limitações destes acordos, especialmente o risco de obtermos muito pouco em termos de acesso adicional a mercados em setores em que já existem contenciosos (como algodão e açúcar, por exemplo) e onde os lobbies protecionistas são muito entrincheirados e poderosos, em especial na agricultura.
Em segundo lugar, o Brasil precisa desempenhar um papel mais ativo na solução de eventuais conflitos regionais. Não se trata de impor uma presença mediadora constante, mesmo porque não é evidente que nossa intervenção seja desejada, nem que a posição brasileira seja acompanhada por todos, sempre. Porém, a omissão que caraterizou a atuação brasileira no governo passado é uma lacuna que debilita a liderança regional que pretendemos exercer. Ela deveu-se provavelmente ao cálculo de que o envolvimento poderia ser excessivamente desgastante se não fosse efetivo, ou ser visto como a tomada de partido por um dos lados da questão.
O Brasil não tem os meios militares e econômicos para impor soluções, mas tem certamente condições para exercer um peso político e diplomático considerável na região. Nossa presença não precisa ser singular. Ela pode ocorrer em conjunto com os outros países ou no contexto de ações da OEA ou da Unasul. Mas é indispensável que o Brasil tenha um papel de destaque, sem se omitir em questões fundamentais, como a paz na América do Sul. No passado, o Brasil desempenhou este papel com grande êxito em diversas situações históricas, em especial na solução definitiva do secular conflito entre o Peru e o Equador, pelo Tratado do Itamaraty, de 1998.
Em terceiro lugar, pelo peso crescente que o Brasil vai adquirindo na economia dos países vizinhos, precisamos encontrar um equilíbrio entre a submissão aos caprichos de governos populistas (como foi o caso da nacionalização da Petrobras Bolívia) e uma postura intervencionista. O governo tem a obrigação de proteger os interesses das empresas brasileiras, por um lado, mas não pode adotar uma conduta prepotente que seja explorada contra nós, com acusações de “imperialismo”.
Obviamente, o Brasil não pode ameaçar seus vizinhos, mas tem suficiente influência para dar avisos claros e tomar posições firmes em defesa de seus interesses. Foi o caso do Equador em setembro de 2008, quando o presidente Ra¬fael Correa, às vésperas de um referendo sobre uma nova constituição, expulsou a Odebrecht e ameaçou não pagar o empréstimo de US$ 200 milhões que o BNDES concedeu ao seu país para financiar as obras que a construtora levava adiante. Nesse caso, a resposta do governo brasileiro foi comedida e rápida, com o adiamento da visita do ministro de Transportes do Brasil, na qual seriam discutidos temas ligados a obras de infraestrutura viária de interesse do Equador. Na sequência, houve uma posição diplomática brasileira firme, mas discreta. O presidente do Equador “deplorou” a decisão do adiamento, mas acabou por atenuar sua posição. Os pagamentos da dívida equatoriana foram honrados. Em julho de 2010, a Odebrecht voltou ao Equador.
O caso da hidrelétrica de Itaipu é emblemático. Desde o Tratado de 1973, tem sido um ícone da colaboração bilateral com o Paraguai, tendo nosso país uma postura exemplar, que permitiu ao vizinho assumir posições paritárias na gestão da empresa Itaipu Binacional. Há alguns anos, o Paraguai reivindica a revisão dos pagamentos da sua dívida. Seria, a meu ver, um equívoco fazer concessões sobre a dívida paraguaia (já que o Brasil financiou 100% da construção da usina), pois o Paraguai terá, em 2023, 50% do grande patrimônio que é a usina, sem dever mais nada. Não devemos tampouco aceitar que o consumidor brasileiro arque com novos e maiores ônus pela energia de Itaipu, sob qualquer forma, levando-se em conta que uma parte substancial do consumo do Sudeste brasileiro é atendido por essa energia. Encontrar um equilíbrio que dê satisfação ao Paraguai é importante, porque o Brasil não pode ser uma ilha de prosperidade e precisa levar em conta as aspirações justas de seus vizinhos. Nesse sentido, o apoio brasileiro à construção de nova linha de transmissão para a capital paraguaia é muito oportuno.
Devemos contribuir na medida de nossas possibilidades para que este país possa renovar sua economia, tornando-a menos dependente do comércio eufemisticamente chamado de “triangular” e até de atividades ilícitas. Temos todo o interesse em que a economia paraguaia se fortaleça e que haja uma melhor distribuição de renda, capaz de permitir um efetivo progresso social. Será necessário encontrar fórmulas que ajudem o desenvolvimento do Paraguai sem criar uma penalização injusta para o consumidor brasileiro. Mas praticar uma política externa baseada na ideia da generosidade é um sério equívoco.
O governo passado inaugurou uma postura inédita na nossa história diplomática: a tomada de posição na política dos vizinhos. Com sucessivas declarações de apoio em pleitos eleitorais – a favor de Néstor Kirchner, Evo Morales e Hugo Chávez – praticamos o que o Brasil se abstinha de fazer desde que deixou de imiscuir- -se nas questões internas dos países da região há quase 150 anos, em particular desde a gestão Rio Branco (1902–1910). Esta conduta deveria continuar sendo a linha mestra da política externa brasileira. A sucessiva intervenção a favor de um candidato nas eleições dos vizinhos pode levar-nos a situações muito difíceis de manejar.
Não há motivo igualmente para continuar a demonstrar uma inclinação tão favorável a Hugo Chávez. O Brasil ignorou todos os abusos totalitários de poder, inclusive na área de direitos humanos, que o líder venezuelano cometeu, assim como suas intervenções em países da região – como o apoio que sempre deu às FARC na Colômbia, sua atuação no Peru e mesmo o incentivo e suporte à nacionalização da Petrobras na Bolívia. Com isso, foi possível construir uma relação amistosa que teve reflexos positivos no comércio e na presença favorecida de empresas brasileiras na Venezuela.
Porém, a administração venezuelana tem sido muito incompetente. A inflação está quase fora de controle, em particular no setor de alimentos, tendo chegado a 9% em janeiro passado; faltou energia elétrica e água. A Venezuela foi o único país com PIB negativo em 2010, quando todas as economias do subcontinente tiveram excelentes performances. Assim sendo, é possível que, nas eleições de 2012, o autoritário Chávez venha a perder a Presidência, especialmente se a oposição for capaz de apresentar-se unida em torno de um candidato forte. Não se trata aqui de preconizar uma atitude permanentemente crítica ao líder bolivariano, mas de exercer uma influência moderadora, tanto no plano externo (onde está perdendo influência e capacidade de liderança), quanto, sobretudo, no âmbito interno, à medida que as eleições se aproximam e podem resultar em enfrentamentos.
Riscos nas relações com os Estados Unidos
A nossa relação com os Estados Unidos não tem mais a centralidade que a caracterizava no passado recente. Mas continua a ser uma dimensão muito importante de nossa política externa. O Brasil e os Estados Unidos nunca foram inimigos e nem ameaça recíproca. Falar em relações perigosas é uma fantasia carregada de distorção ideológica. É do interesse de ambos os países ter boas relações, mas é igualmente verdade que o Brasil nunca será um aliado sistemático dos Estados Unidos. Como escreveu Peter Hakim, em artigo recente da revista Foreign Affairs Latinoamérica: “É quase inevitável que Brasil e Estados Unidos venham a divergir nos próximos anos neste continente e no mundo. […] Suas políticas e agendas refletem diferentes prioridades, abordagens e interesses. Eles não poderão sempre encontrar posições comuns ou manter suas divergências em surdina”.
Houve um rápido avanço nas relações com os Estados Unidos nos primeiros meses do governo da presidente Rousseff, que deu claros sinais de desejo de reaproximação, em decisão pragmática e acertada. Nos últimos dois anos do governo anterior, tinha ocorrido um afastamento crescente, em razão da postura antiamericana que foi adotada pelo presidente Lula e seu ministro. Superar as divergências recentes, todavia, não será tarefa fácil.
O governo americano decidiu investir mais atenção e capital político na relação com o Brasil, o que também representa um gesto construtivo. Há, porém, alguns riscos neste momento. O primeiro deles é a questão do apoio à legítima pretensão do Brasil a ter uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU. Esta aspiração é vista pelo governo e pela sociedade brasileira como o marco mais concreto do novo status internacional do Brasil. Tendo anunciado que apoiará a entrada da Índia como membro permanente, em sua visita recente a Nova Delhi, o presidente Obama criou um precedente entre os países emergentes, pois até então os Estados Unidos nunca se tinham manifestado abertamente em favor do Japão e procuravam delongar a reforma do Conselho. Se não fizer o mesmo em relação ao Brasil nos próximos tempos, criará um desapontamento que outras manifestações positivas dificilmente poderão compensar.
O segundo risco consiste em que os americanos interpretem a aproximação em curso como um sinal de que vão receber de nós um apoio regular e que atenderemos a todos os seus pedidos, o que não acontecerá, por certo. Na agenda continental, pode haver expectativas de que o Brasil gerencie as idiossincrasias da região, em particular na Venezuela, onde há um desafio crescente à hegemonia de Hugo Chávez, ou mesmo em Cuba. Isto certamente não nos interessa, embora o Brasil deva desempenhar um papel por conta própria, especialmente no primeiro caso, para favorecer a democracia e os direitos humanos.
Adesão à OCDE: Passo importante e desejável
O Brasil precisa abandonar certos preconceitos que estão hoje totalmente superados. Por exemplo, considerar que a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é um clube de ricos onde estaríamos deslocados é uma atitude míope. Por que não ingressar na OCDE? A organização, hoje liderada pelo mexicano José Angel Gurría, já fez numerosos pedidos para que o Brasil se torne membro. Durante o governo FHC, o Brasil aproximou-se gradativamente da OCDE, ingressando em diversos comitês que nos interessavam. Houve, porém, um afastamento da entidade, que ainda é tratada de forma pejorativa, por alguns setores da burocracia e da diplomacia nacionais, como o “clube dos ricos”. A adesão cuidadosamente negociada à OCDE traria benefícios palpáveis às nossas empresas em termos de financiamentos mais favoráveis à exportação e seria um adicional de peso ao status cada vez mais ponderável do Brasil na cena internacional. Na agenda internacional, esta é uma das mais importantes decisões que a presidente Dilma poderia tomar.
Direitos humanos: Sem tergiversações
Há posições morais que um país deve tomar mesmo que isto seja contrário a seus interesses econômicos. A área de direitos humanos é uma das que não devem ser objeto de tergiversações. Não foi o que se verificou no governo passado, pois a delegação brasileira se absteve em votações no Conselho de Direitos Humanos. O Brasil tem adotado algumas posturas ambíguas que desvirtuaram nossa posição tradicional e o mandato desse órgão. Destacam-se, recentemente, os votos no tratamento das violações ocorridas sobre a Coreia do Norte, Irã, Sri Lanka e diversos outros países. É frequente o uso por autoridades brasileiras do argumento de que o Conselho de Direitos Humanos não deve ser seletivo no tratamento de violações de direitos humanos. Mas ações de cada governo devem ser julgadas individualmente. A delegação brasileira também alega com regularidade ser contraproducente discutir e aprovar uma resolução sem o envolvimento do país em questão. As violações de direitos humanos não podem ser assim relativizadas, nem submetidas a dinâmicas políticas ou geopolíticas locais, sejam elas em Cuba, no Irã, na Líbia ou na China.
É por isso bem-vinda a recente afirmação da ministra Maria do Rosário no Conselho de Direitos Humanos, no sentido de que “no governo Dilma, direitos humanos não se negociam e a presidenta é intransigente com o tema”. O recente almoço em Genebra da embaixadora Maria Nazareth Farani Azevêdo com a dissidente exilada iraniana Shirin Ebadi, ganhadora do Prêmio Nobel da Paz de 2003, foi um sinal concreto desta mudança na posição brasileira. O próximo passo coerente seria copatrocinar o projeto de resolução que cria uma comissão para investigar as violações de direitos humanos no Irã.
Relacionamento Sul–Sul, sim, mas sem criar frente unida
Uma das principais ênfases da política externa do governo passado foi no chamado relacionamento Sul–Sul, quase um tentativa de reeditar o terceiro-mundismo dos anos 1950 e 1960. Não há dúvida de que é importante para o Brasil manter as melhores relações com os mais destacados países do Hemisfério Sul. Nos últimos quinze anos, demos sempre grande importância às relações com a China, a Índia e a África do Sul. O que não tem cabimento é a ideia de formar uma frente unida do Sul (como inaugurado na conferência de Bandung, em 1955,quando se falava em países do Terceiro Mundo), como forma de oposição aos países do Norte.
Um dos fundamentos desta orientação era o declínio de poder dos Estados Unidos. Ele é sensível em termos relativos, mas está muito longe de ser intenso e decisivo. Como disse o analista chinês Minxin Pei, na edição de julho/agosto de 2009 da revista Foreign Policy: “Não creiam na badalação (hype) intensa feita sobre o declínio da América e o despertar de uma nova era asiática. Muitas décadas passarão antes que a China, a Índia e o resto da região dominem o mundo, se é que algum dia o farão”. Felizmente, esta não deve ser a ênfase do atual governo. Como disse o ministro Antonio Patriota, em recente entrevista a importante revista brasileira: “Durante o governo Lula, a linha de atua¬ção Sul–Sul ficou em evidência porque era o aspecto mais inovador da política externa. Mas já naquela época, como embaixador em Washington, eu defendia que isso não se dava em detrimento da atenção a parceiros tradicionais do mundo desenvolvido. Esse é o espírito com que continuaremos a trabalhar”.
O País deve reforçar o sistema de não proliferação
O Brasil deve procurar desempenhar um papel significativo nas discussões para reforçar o sistema internacional de não proliferação e evitar a multiplicação de armas nucleares. Devemos fazer pleno uso de nossas credenciais, que são impecáveis, pois temos um compromisso constitucional e fazemos parte de todos os acordos internacionais globais e regionais de renúncia às armas nucleares. Com as recentes evoluções na Coreia do Norte e no Irã, o próprio regime de não proliferação está sob crescente ameaça e precisa ser reforçado.
Existe, no momento, uma questão em aberto neste terreno, que é a adesão do Brasil ao Protocolo Adicional do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares. Esse mecanismo, criado em 1997, permite fiscalização mais precisa das instalações atômicas dos países signatários, sem aviso prévio. A rejeição do protocolo pelo Brasil é posta em questão pelos países ocidentais, em especial os Estados Unidos, como incompreen¬sível. Creio, contudo, que a decisão pode ser adiada. Por ora, não existe nenhuma suspeita internacional de que o Brasil esteja desenvolvendo um programa nuclear encoberto, embora o ex-vice-presidente da República e um ministro do anterior governo tenham advogado publicamente que o país adquirisse armas nucleares. Esta posição terá de ser reavaliada mais adiante quando o país estiver em condições de produzir maiores quantidades de urânio enriquecido e eventualmente de tornar-se um exportador.
O que não deve repetir-se é o envolvimento brasileiro com o Irã nesta matéria, no qual fomos usados pelo regime de Teerã para tentar ganhar tempo e evitar novas sanções da ONU. É patente que esse país está buscando, no mínimo, ter capacidade de dotar-se de armas nucleares. Não há outra explicação para a multiplicidade de centros – por vezes secretos – de enriquecimento de urânio. Há um impasse completo nos esforços para colocar as instalações nucleares iranianas sob salvaguardas da Agência Atômica de Viena e para obter qualquer cooperação desse país com as decisões do Conselho de Segurança da ONU. O Brasil deve defender a liberdade de cada país buscar desenvolver sua indústria nuclear para fins pacíficos. Mas não havia nenhuma razão para que o Brasil buscasse ter um papel de mediador entre o Irã e as grandes potências, para o qual nosso país não tinha motivos geopolíticos ou econômicos sérios. Este afã de protagonismo resultou em sério fracasso, já que não produziu acordo e acelerou a votação de sanções pelo Conselho de Segurança da ONU, decisão tomada por todos os membros permanentes, contra a qual votaram apenas o Brasil e a Turquia, sofrendo uma derrota contundente por 12 a 2.
Potência global e política externa equilibrada
A afirmação do Brasil como potência global está em curso, sendo cada vez mais reconhecida. A inclusão no BRIC e no G-20, o crescente interesse que recebe na grande imprensa internacional, a boa performance da economia brasileira, os progressos havidos na promoção de maior inclusão social e no enfrentamento do crime organizado no Rio de Janeiro – nossas credenciais estão em alta. Por isso, é necessário atuar além das questões anteriormente abordadas neste artigo, em todas as suas vertentes do cenário global, em especial:
a) uma participação ativa na busca de fórmulas internacionais para equacionar o problema do aquecimento global, como vem fazendo desde que, a partir de 2009, deixou de refugiar-se atrás do conceito de responsabilidade histórica dos países que se industrializaram mais cedo e conseguiu resultados muito animadores na redução do desmatamento da Amazônia, principal calcanhar-de-aquiles brasileiro;
b) um papel importante nas principais negociações comerciais, em especial na OMC. À medida que as maiores economias ocidentais se recuperem da grande crise que começou em 2008 e quando não houver mais preocupação com o ressurgimento do protecionismo, surgirão novas oportunidades na OMC ou mesmo fora dela. A ênfase brasileira no G-20 da OMC como nosso principal grupo deve ser recalibrada, já que, como ficou evidente nas últimas reuniões ministeriais, os interesses brasileiros divergem dos da China e da Índia em matéria de agricultura;
c) o Brasil, como outros países emergentes, inclusive a China e a Índia, reivindicam maior participação no poder decisório do Fundo Monetário Internacional. Este é um importante objetivo estratégico. Para desempenhar suas novas e crescentes responsabilidades, o Brasil precisa ter uma política externa equilibrada que não incorra nos arroubos que nos levaram a grandes desgastes em passado recente. Com os novos avanços no processo de inclusão social que, desde o Plano Real, em 1994, vem permitindo a redução gradual da pobreza e uma melhor distribuição de renda, o Brasil vai superando seu principal desafio e projetando-se internacionalmente como país democrático, pacífico e mais justo.
A frase permanente (enquanto durar): Jose Guilherme Merquior
Enviada por um leitor anônimo, a propósito de um post meu anunciando uma exposição em homenagem ao escritor, diplomata, pensador, crítico literário (na ordem que vocês quiserem) José Guilherme Merquior, na Academia Brasileira de Letras:
"Pessoalmente, há muitos anos eu me espanto com a irresponsabilidade de alguns intelectuais que tendem a minimizar, em nome de uma vesga modernice, o problema do ensino básico, da alfabetização, de dotar as pessoas com instrumental mínimo do pensamento articulado, que é a capacidade de falar e escrever corretamente. Fala-se mal, escreve-se mal, pensa-se mal no Brasil."
José Guilherme Merquior
Entrevista; Veja Edição Especial 35 anos
"Pessoalmente, há muitos anos eu me espanto com a irresponsabilidade de alguns intelectuais que tendem a minimizar, em nome de uma vesga modernice, o problema do ensino básico, da alfabetização, de dotar as pessoas com instrumental mínimo do pensamento articulado, que é a capacidade de falar e escrever corretamente. Fala-se mal, escreve-se mal, pensa-se mal no Brasil."
José Guilherme Merquior
Entrevista; Veja Edição Especial 35 anos
O melhor chanceler do Brasil?; ou do mundo?; EUA se curvam (finalmente) ao Brasil...
Pois é, nós tivemos o melhor chanceler de todos os tempos e nem desconfiávamos disso. Aliás, o melhor presidente desde Cabral, e não sabíamos disso. Pode até ser um dos melhores presidentes do mundo, e o melhor chanceler deste planetinha.
Leiam o artigo do ex-chanceler, que fui capturar no Luis Nassif Online, e atestem se tudo isso não é um sonho ou realidade: pela primeira vez na história, os EUA se curvam ao Brasil, e humildemente propõem que nosso status seja elevado. Começa assim:
"Até os jornais brasileiros tiveram de noticiar."
Pois é, os jornalões do PIG (Partido da Imprensa Golpista, para os que esqueceram que existia essa entidade maléfica) tiveram de se curvar ao Council on Foreign Relations e reconhecer que somos mesmo o máximo.
Leiam depois os comentários, e concluam:
Antes desses dias, meses e anos gloriosos, éramos -- quer dizer, os membros da diplomacia brasileira e outros afins -- uns vira-latas, complexados, submissos ao império, ao FMI, totalmente subservientes a tudo o que vinha do império, enquadrados pelo Consenso de Washington e sem voz própria. Foi preciso aguardar o grande guia dos povos e seu indômito conselheiro de relações internacionais para finalmente libertar o Brasil dos grilhões da arrogância imperial.
Aprenderam neoliberais?
Paulo Roberto de Almeida
Os elogios à diplomacia brasileira
Enviado por luisnassif, sab, 23/07/2011 - 13:30
Por Sérgio Troncoso
Aqui Celso Amorim e suas cutucadas na nossa elite covarde e vira-latas.
A obsessão e o complexo de vira-lata
Celso Amorim na Carta Capital 23 de julho de 2011 às 11:05h
Até os jornais brasileiros tiveram de noticiar. Uma força-tarefa criada pelo Conselho de Relações Exteriores, organização estreitamente ligada ao establishment político/intelectual/empresarial dos Estados Unidos, acaba de publicar um relatório exclusivamente dedicado ao Brasil, -pontuado de elogios e manifestações de respeito e consideração. Fizeram parte da força-tarefa um ex-ministro da Energia, um ex-subsecretário de Estado e personalidades destacadas do mundo acadêmico e empresarial, além de integrantes de think tanks, homens e mulheres de alto conceito, muitos dos quais estiveram em governos norte-americanos, tanto democratas quanto republicanos. O texto do relatório abarca cerca de 80 páginas, se descontarmos as notas biográficas dos integrantes da comissão, o índice, agradecimentos etc. Nelas são analisados vários aspectos da economia, da evolução sociopolítica e do relacionamento externo do Brasil, com natural ênfase nas relações com os EUA. Vou ater-me aqui apenas àqueles aspectos que dizem respeito fundamentalmente ao nosso relacionamento internacional.
Logo na introdução, ao justificar a escolha do Brasil como foco do considerável esforço de pesquisa e reflexão colocado no empreendimento, os autores assinalam: “O Brasil é e será uma força integral na evolução de um mundo multipolar”. E segue, no resumo das conclusões, que vêm detalhadas nos capítulos subsequentes: “A Força Tarefa (em maiúscula no original) recomenda que os responsáveis pelas políticas (policy makers) dos Estados Unidos reconheçam a posição do Brasil como um ator global”. Em virtude da ascensão do Brasil, os autores consideram que é preciso que os EUA alterem sua visão da região como um todo e busquem uma relação conosco que seja “mais ampla e mais madura”. Em recomendação dirigida aos dois países, pregam que a cooperação e “as inevitáveis discordâncias sejam tratadas com respeito e tolerância”. Chegam mesmo a dizer, para provável espanto dos nossos “especialistas” – aqueles que são geralmente convocados pela grande mídia para “explicar” os fracassos da política externa brasileira dos últimos anos – que os EUA deverão ajustar-se (sic) a um Brasil mais afirmativo e independente.
Todos esses raciocínios e constatações desembocam em duas recomendações práticas. Por um lado, o relatório sugere que tanto no Departamento de Estado quanto no poderoso Conselho de Segurança Nacional se proceda a reformas institucionais que deem mais foco ao Brasil, distinguindo-o do contexto regional. Por outro (que surpresa para os céticos de plantão!), a força-tarefa “recomenda que a administração Obama endosse plenamente o Brasil como um membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. É curioso notar que mesmo aqueles que expressaram uma opinião discordante e defenderam o apoio morno que Obama estendeu ao Brasil durante sua recente visita sentiram necessidade de justificar essa posição de uma forma peculiar. Talvez de modo não totalmente sincero, mas de qualquer forma significativo (a hipocrisia, segundo a lição de La Rochefoucault, é a homenagem que o vício paga à virtude), alegam que seria necessária uma preparação prévia ao anúncio de apoio tanto junto a países da região quanto junto ao Congresso. Esse argumento foi, aliás, demolido por David Rothkopf na versão eletrônica da revista Foreign Policy um dia depois da divulgação do relatório. E o empenho em não parecerem meros espíritos de porco leva essas vozes discordantes a afirmar que “a ausência de uma preparação prévia adequada pode prejudicar o êxito do apoio norte-americano ao pleito do Brasil de um posto permanente (no Conselho de Segurança)”.
Seguem-se, ao longo do texto, comentários detalhados sobre a atuação do Brasil em foros multilaterais, da OMC à Conferência do Clima, passando pela criação da Unasul, com referências bem embasadas sobre o Ibas, o BRICS, iniciativas em relação à África e aos países árabes. Mesmo em relação ao Oriente Médio, questão em que a força dos lobbies se faz sentir mesmo no mais independente dos think tanks, as reservas quanto à atuação do Brasil são apresentadas do ponto de vista de um suposto interesse em evitar diluir nossas credenciais para negociar outros itens da agenda internacional. Também nesse caso houve uma “opinião discordante”, que defendeu maior proatividade do Brasil na conturbada região.
Em resumo, mesmo assinalando algumas diferenças que o relatório recomenda sejam tratadas com respeito e tolerância, que abismo entre a visão dos insuspeitos membros da comissão do conselho norte-americanos- e aquela defendida por parte da nossa elite, que insiste em ver o Brasil como um país pequeno (ou, no máximo, para usar o conceito empregado por alguns especialistas, “médio”), que não deve se atrever a contrariar a superpotência remanescente ou se meter em assuntos que não são de sua alçada ou estão além da sua capacidade. Como se a Paz mundial não fosse do nosso interesse ou nada pudéssemos fazer para ajudar a mantê-la ou obtê-la.
23 comentários
sab, 23/07/2011 - 14:12
Dxxxx Cxxxx
Celso Amorim, além de ser o chanceler que por mais tempo ocupou o cargo de Ministro das Relações Exteriores do Brasil, é, sem sombra de dúvidas um dos maiores chanceleres da história de nosso país!
Os complexados que procurem consolo entre os colonistas do PiG, o vira-latismo foi superado, em que pese o rancor e a mágoa dos e das viúvas da subalternidade...
—
Dxxxx Cxxxx
sab, 23/07/2011 - 14:18
xxxxxxxxx
Agora é que os fundamentalistas pró-USA desse blog vão cortar os pulsos...
Parabéns ao grande Celso Amorim!!!
Parabéns ao Lulão!!!
sab, 23/07/2011 - 14:31
Mxxxxx
Faço coro a vcs.
Celso Amorim é o cara!
Leiam o artigo do ex-chanceler, que fui capturar no Luis Nassif Online, e atestem se tudo isso não é um sonho ou realidade: pela primeira vez na história, os EUA se curvam ao Brasil, e humildemente propõem que nosso status seja elevado. Começa assim:
"Até os jornais brasileiros tiveram de noticiar."
Pois é, os jornalões do PIG (Partido da Imprensa Golpista, para os que esqueceram que existia essa entidade maléfica) tiveram de se curvar ao Council on Foreign Relations e reconhecer que somos mesmo o máximo.
Leiam depois os comentários, e concluam:
Antes desses dias, meses e anos gloriosos, éramos -- quer dizer, os membros da diplomacia brasileira e outros afins -- uns vira-latas, complexados, submissos ao império, ao FMI, totalmente subservientes a tudo o que vinha do império, enquadrados pelo Consenso de Washington e sem voz própria. Foi preciso aguardar o grande guia dos povos e seu indômito conselheiro de relações internacionais para finalmente libertar o Brasil dos grilhões da arrogância imperial.
Aprenderam neoliberais?
Paulo Roberto de Almeida
Os elogios à diplomacia brasileira
Enviado por luisnassif, sab, 23/07/2011 - 13:30
Por Sérgio Troncoso
Aqui Celso Amorim e suas cutucadas na nossa elite covarde e vira-latas.
A obsessão e o complexo de vira-lata
Celso Amorim na Carta Capital 23 de julho de 2011 às 11:05h
Até os jornais brasileiros tiveram de noticiar. Uma força-tarefa criada pelo Conselho de Relações Exteriores, organização estreitamente ligada ao establishment político/intelectual/empresarial dos Estados Unidos, acaba de publicar um relatório exclusivamente dedicado ao Brasil, -pontuado de elogios e manifestações de respeito e consideração. Fizeram parte da força-tarefa um ex-ministro da Energia, um ex-subsecretário de Estado e personalidades destacadas do mundo acadêmico e empresarial, além de integrantes de think tanks, homens e mulheres de alto conceito, muitos dos quais estiveram em governos norte-americanos, tanto democratas quanto republicanos. O texto do relatório abarca cerca de 80 páginas, se descontarmos as notas biográficas dos integrantes da comissão, o índice, agradecimentos etc. Nelas são analisados vários aspectos da economia, da evolução sociopolítica e do relacionamento externo do Brasil, com natural ênfase nas relações com os EUA. Vou ater-me aqui apenas àqueles aspectos que dizem respeito fundamentalmente ao nosso relacionamento internacional.
Logo na introdução, ao justificar a escolha do Brasil como foco do considerável esforço de pesquisa e reflexão colocado no empreendimento, os autores assinalam: “O Brasil é e será uma força integral na evolução de um mundo multipolar”. E segue, no resumo das conclusões, que vêm detalhadas nos capítulos subsequentes: “A Força Tarefa (em maiúscula no original) recomenda que os responsáveis pelas políticas (policy makers) dos Estados Unidos reconheçam a posição do Brasil como um ator global”. Em virtude da ascensão do Brasil, os autores consideram que é preciso que os EUA alterem sua visão da região como um todo e busquem uma relação conosco que seja “mais ampla e mais madura”. Em recomendação dirigida aos dois países, pregam que a cooperação e “as inevitáveis discordâncias sejam tratadas com respeito e tolerância”. Chegam mesmo a dizer, para provável espanto dos nossos “especialistas” – aqueles que são geralmente convocados pela grande mídia para “explicar” os fracassos da política externa brasileira dos últimos anos – que os EUA deverão ajustar-se (sic) a um Brasil mais afirmativo e independente.
Todos esses raciocínios e constatações desembocam em duas recomendações práticas. Por um lado, o relatório sugere que tanto no Departamento de Estado quanto no poderoso Conselho de Segurança Nacional se proceda a reformas institucionais que deem mais foco ao Brasil, distinguindo-o do contexto regional. Por outro (que surpresa para os céticos de plantão!), a força-tarefa “recomenda que a administração Obama endosse plenamente o Brasil como um membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. É curioso notar que mesmo aqueles que expressaram uma opinião discordante e defenderam o apoio morno que Obama estendeu ao Brasil durante sua recente visita sentiram necessidade de justificar essa posição de uma forma peculiar. Talvez de modo não totalmente sincero, mas de qualquer forma significativo (a hipocrisia, segundo a lição de La Rochefoucault, é a homenagem que o vício paga à virtude), alegam que seria necessária uma preparação prévia ao anúncio de apoio tanto junto a países da região quanto junto ao Congresso. Esse argumento foi, aliás, demolido por David Rothkopf na versão eletrônica da revista Foreign Policy um dia depois da divulgação do relatório. E o empenho em não parecerem meros espíritos de porco leva essas vozes discordantes a afirmar que “a ausência de uma preparação prévia adequada pode prejudicar o êxito do apoio norte-americano ao pleito do Brasil de um posto permanente (no Conselho de Segurança)”.
Seguem-se, ao longo do texto, comentários detalhados sobre a atuação do Brasil em foros multilaterais, da OMC à Conferência do Clima, passando pela criação da Unasul, com referências bem embasadas sobre o Ibas, o BRICS, iniciativas em relação à África e aos países árabes. Mesmo em relação ao Oriente Médio, questão em que a força dos lobbies se faz sentir mesmo no mais independente dos think tanks, as reservas quanto à atuação do Brasil são apresentadas do ponto de vista de um suposto interesse em evitar diluir nossas credenciais para negociar outros itens da agenda internacional. Também nesse caso houve uma “opinião discordante”, que defendeu maior proatividade do Brasil na conturbada região.
Em resumo, mesmo assinalando algumas diferenças que o relatório recomenda sejam tratadas com respeito e tolerância, que abismo entre a visão dos insuspeitos membros da comissão do conselho norte-americanos- e aquela defendida por parte da nossa elite, que insiste em ver o Brasil como um país pequeno (ou, no máximo, para usar o conceito empregado por alguns especialistas, “médio”), que não deve se atrever a contrariar a superpotência remanescente ou se meter em assuntos que não são de sua alçada ou estão além da sua capacidade. Como se a Paz mundial não fosse do nosso interesse ou nada pudéssemos fazer para ajudar a mantê-la ou obtê-la.
23 comentários
sab, 23/07/2011 - 14:12
Dxxxx Cxxxx
Celso Amorim, além de ser o chanceler que por mais tempo ocupou o cargo de Ministro das Relações Exteriores do Brasil, é, sem sombra de dúvidas um dos maiores chanceleres da história de nosso país!
Os complexados que procurem consolo entre os colonistas do PiG, o vira-latismo foi superado, em que pese o rancor e a mágoa dos e das viúvas da subalternidade...
—
Dxxxx Cxxxx
sab, 23/07/2011 - 14:18
xxxxxxxxx
Agora é que os fundamentalistas pró-USA desse blog vão cortar os pulsos...
Parabéns ao grande Celso Amorim!!!
Parabéns ao Lulão!!!
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