terça-feira, 11 de abril de 2023

A new world order? BRICS nations offer alternative to West - Astrid Prange (Deutsche Welle)

 A new world order? BRICS nations offer alternative to West

Astrid Prange
April 10, 2023

Predictions about the BRICS countries as the fastest growing economies haven't quite panned out. Instead, the alliance is now offering a diplomatic forum and development financing, outside of the Western mainstream.

The acronym began as a somewhat optimistic term to describe what were the world's fastest-growing economies at the time. But now the BRICSnations — Brazil, Russia, India, China, South Africa — are setting themselves up as an alternative to existing international financial and political forums.

"The founding myth of the emerging economies has faded," confirmed Günther Maihold, deputy director of the German Institute for International and Security Affairs, or SWP. "The BRICS countries are experiencing their geopolitical moment."

BrazilRussiaIndiaChina and South Africa are trying to position themselves as representatives of the Global South, providing "an alternative model to the G7."

The G7 is an "informal forum" of heads of state of the world's most advanced economies, founded in 1975. GermanyFrancethe United KingdomItalyJapanCanada and the US are members, as is the EU.

The acronym BRIC, which initially stood for Brazil, Russia, India and China, was coined by Jim O'Neill in 2001 when he was chief economist of the multinational investment bank, Goldman Sachs. At the time, the four countries had sustained rates of high economic growth and the BRIC label stood for economic optimism about the future of those nations. Opponents of the label said the countries were too diverse to be grouped together like this and that it was really just a Goldman Sachs marketing ploy.

But what may have started as a marketing ploy to encourage investors has grown into a platform for intergovernmental cooperation similar to the G7. In 2009, the four nations met for their first summit in Russia's Yekaterinburg. In 2010, South Africa was invited to join the group, adding the "S" to BRICS.

Challenging the World Bank model

In 2014, with $50 billion (around €46 billion) in seed money, the BRICS nations launched the New Development Bank as an alternative to the World Bank and the International Monetary Fund. In addition, they created a liquidity mechanism called the Contingent Reserve Arrangement to support members struggling with payments.

These offers were not only attractive to the BRICS nations themselves, but also to many other developing and emerging economies that had had painful experiences with the IMF's structural adjustment programs and austerity measures. This is why many countries said they might be interested in joining the BRICS group.

The BRICS bank is open to new members. In 2021, Egypt, the United Arab Emirates, Uruguay and Bangladesh took up shares. However, these were much lower than the respective $10 billion investments made by the bank's founding members.

Set to expand

South African Foreign Minister Naledi Pandor has said worldwide interest in the BRICS group was "huge." In early March, she told television interviewers that she had 12 letters from interested countries on her desk.

"Saudi Arabia is one," she said. "United Arab Emirates, Egypt, Algeria, and Argentina,"  as well as Mexico and Nigeria.

“ Once we've shaped the criteria [for lending], we will then make the decision," she said, noting that the topic would be placed on the agenda for the upcoming August summit in South Africa.

The most recent economic developments in BRICS member states have little to do with the initial myths upon which the group was founded. Of the five members, only China has achieved sustained and extensive growth since then. 

As China's gross domestic product grew from $6 trillion in 2010 to nearly $18 trillion in 2021, the economies in Brazil, South Africa and Russia stagnated. India's GDP grew from $1.7 trillion to $3.1 trillion, but was outpaced by China's growth.

No sanctions against Russia

Since the start of the Russian war in Ukraine, the BRICS countries have only distanced themselves further from the so-called West. Neither India, Brazil, South Africa or China are taking part in sanctions against Russia. This has become increasingly clear with near-historic levels of trade between India and Russia, or in Brazil's dependence on Russian fertilizer.

"Diplomatically, the war in Ukraine appears to have drawn a stark dividing line between an eastern-backed Russia and the West," political scientist Matthew Bishop from the University of Sheffield wrote for the Economics Observatory late last year. "Consequently, some European and US policymakers worry that the BRICS may become less an economic club of rising powers seeking to influence global growth and development, and more a political one defined by their authoritarian nationalism."

Maihold of the German Institute for International and Security Affairs agrees. He said the BRICS alliance is not so much a counter to the West but more a forum for increased sovereign and autonomous thought. In a bipolar world, he believes South Africa, India and Brazil are simply "vying for better terms."

China, on the other hand, is using the platform for its global political ambitions, Maihold added, pointing to Beijing's offers to mediate the war in Ukraine and the joint military exercises it held with Russia in South Africa.

Maihold believes the West has noticed this change in tack and is trying to counteract it. "They are looking very closely," he said. "At the G7 summit in Germany in 2022, they made a point of inviting South Africa and India, in order to prevent the optics that the G7 was standing against BRICS."

This article was translated from German.

Guerra de agressão à Ucrânia: os documentos secretos americanos - David E. Sanger (Estadão)

Vazamento de segredo do Pentágono na Ucrânia é mais grave que de Snowden e WikiLeaks

Por David E. Sanger
O Estado de S. Paulo, 10/04/2023

WASHINGTON - Quando o WikiLeaks divulgou um imenso volume de comunicações do departamento de estado dos Estados Unidos 13 anos atrás, o mundo teve uma ideia do que fazem diariamente os diplomatas americanos — as cotoveladas, as dúvidas diante de aliados vacilantes e um vislumbre de como Washington estava se preparando para um eventual colapso da Coreia do Norte e as capacidades nucleares do Irã.

Quando Edward Snowden revelou os segredos da Agência de Segurança Nacional, três anos mais tarde, os americanos descobriram subitamente até que ponto a nova era digital tinha trazido consigo uma notável nova era de vigilância por parte da agência, permitindo a ela entrar na indústria chinesa das telecomunicações e nos servidores do Google no exterior para interceptar comunicações estrangeiras.

O conjunto de aproximadamente 100 diagramas apresentado dados operacionais da guerra da Ucrânia é distintamente diferente. Os dados revelados até o momento são menos abrangentes do que os dos vastos arquivos secretos já citados, mas sua relevância é muito mais oportuna. E é justamente a validade imediata dessas informações o que mais preocupa os funcionários da Casa Branca e do Pentágono.

Parte do material mais delicado (mapas das defesas antiaéreas ucranianas e uma descrição detalhada dos planos sul-coreanos para entregar 330.000 munições à Ucrânia a tempo da sua ofensiva de primavera) é revelada em documentos que parecem ser de apenas 40 dias atrás.

O que torna as revelações particularmente nocivas é a natureza recente dos documentos “secretos” e “ultrassecretos”, e os indícios neles contidos de operações a serem realizadas no futuro, de acordo com funcionários do governo. No domingo, Sabrina Singh, porta-voz do Pentágono, disse que funcionários americanos notificaram as comissões do congresso a respeito do vazamento e encaminharam o caso ao departamento de Justiça, que iniciou uma investigação.

Envolvimento americano na guerra
As mais de 100 páginas de documentos e diagramas acabam com qualquer dúvida em relação ao envolvimento dos EUA no curso diário da guerra, oferecendo uma precisão na logística e nas informações que ajuda a explicar o sucesso da Ucrânia no conflito até o momento. Se o presidente Biden vetou que forças americanas disparem diretamente contra alvos russos, e impediu o envio de armas que poderiam alcançar o território russo, os documentos deixam claro que, passado um ano desde o início da invasão, os EUA estão profundamente envolvidos em praticamente todos os seus demais aspectos.

As informações contidas nos documentos são detalhadas a ponto de indicar alvos. Revela a coordenação da longa esteira de logística que leva armas aos ucranianos. E, como deixa claro um documento de 22 de fevereiro, as autoridades americanas já estão se preparando para um ano em que a batalha pelo Donbas “provavelmente avançará para um impasse” que vai frustrar o objetivo de Vladimir Putin de capturar a região, e o objetivo da Ucrânia de expulsar os invasores.

Um funcionário do alto escalão da espionagem ocidental resumiu as revelações como “um pesadelo”. Dmitri Alperovitch, nascido na Rússia e presidente do Silverado Policy Accelerator, mais conhecido pelo seu trabalho pioneiro em segurança cibernética, disse no domingo temer que há “várias maneiras de causar estrago com base nessas informações”. De acordo com ele, isso inclui a possiblidade de a espionagem russa usar as páginas, divulgadas no Twitter e no Telegram, “para entender como estamos reunindo” informações a respeito dos planos do GRU, serviço de espionagem do exército da Rússia, e da movimentação de unidades militares.

Na verdade, os documentos divulgados até o momento são um breve retrato de como os EUA enxergam a guerra na Ucrânia. Muitas páginas parecem tiradas diretamente dos manuais de informações que circulam entre os membros do estado maior conjunto e, em alguns casos, de atualizações de casos do centro operacional da CIA. São uma combinação entre a ordem de batalha atual e projeções americanas de onde as defesas aéreas trazidas às pressas até a Ucrânia podem estar situadas no próximo mês, algo especialmente valioso para o planejamento militar russo.

Hackers no Canadá
Há também alguns alertas indicando como a Rússia poderia retaliar além da Ucrânia caso o conflito se arraste. Um documento da CIA particularmente preocupante faz referência a um grupo de hackers aliado à Rússia que teria invadido com sucesso a rede canadense de distribuição de gás e estaria “recebendo instruções de um suposto oficial do Serviço Federal de Segurança (F.S.B.) para conservar o acesso à rede canadense de infraestrutura de gás e aguardar novas instruções”. Por enquanto, nada indica que agentes russos tenham iniciado um ataque destrutivo, mas esse era o temor explicitado no documento.

Como alertas desse tipo são extremamente delicados, muitos dos documentos “ultrassecretos” são restritos a autoridades americanas ou aos “cinco pares de olhos” — a aliança de agências de espionagem dos EUA, Reino Unido, Austrália, Nova Zelândia e Canadá. Esse grupo mantém um acordo informal que impede a espionagem mútua. Mas, claramente, isso não se aplica a outros aliados e parceiros dos americanos. Há evidências de que os EUA teriam invadido conversas internas do presidente Volodmir Zelensky e até dos aliados mais próximos do país, como a Coreia do Sul.

Em um documento que lembra bastante os vazamentos do WikiLeaks de 2010, um despacho baseado naquilo que é descrito delicadamente como “inteligência de sinais” descreve o debate interno em Seul a respeito de como lidar com a pressão americana pelo envio de mais auxílio letal à Ucrânia, o que violaria a prática do país de não enviar armamento diretamente para uma zona de guerra. O material informa que o presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, temia a possibilidade de ser chamado por Biden a fazer maiores contribuições para os militares da Ucrânia.

Trata-se de um tema extremamente delicado entre as autoridades sul-coreanas. Em visita recente a Seul, antes do surgimento dos documentos vazados, funcionários do governo se esquivaram das perguntas de um repórter a respeito dos planos para o envio de munição de artilharia de 155 milímetros, produzida no país em grandes quantidades, para auxiliar o esforço de guerra. Um funcionário disse que a Coreia do Sul não quer violar suas próprias políticas, nem colocar em risco sua delicada relação com Moscou.

Agora o mundo inteiro viu o “cronograma de entrega” do Pentágono prevendo um carregamento marítimo dessa munição, além de estimativas do custo dessa remessa (US$ 26 milhões).

Interesse público?
É claro que cada vazamento de documentos secretos traz o temor de um estrago duradouro, que às vezes é exagerado. Isso ocorreu em 2010, quando o New York Times começou a publicar uma série de reportagens chamada “Segredos de Estado”, detalhando e analisando documentos selecionados a partir do imenso volume de material levado por Chelsea Manning, que na época servia no exército no Iraque, e publicado por Julian Assange, fundador do WikiLeaks. Pouco após a publicação de alguns artigos, a secretária de estado Hillary Clinton expressou o temor de todos se afastarem para sempre dos diplomatas americanos.

“Além de colocar em perigo indivíduos específicos, revelações desse tipo erodem o tecido da função adequada e um governo responsável”, disse ela aos repórteres nas instalações do departamento de estado. É claro que o contato com diplomatas americanos não cessou, mas muitas autoridades estrangeiras dizem que, ao manter contato com eles atualmente, tomam cuidado com o que dizem, temendo serem citados em documentos do departamento que podem vazar no futuro.

Quando Snowden divulgou um vasto volume de dados da Agência de Segurança Nacional, reunidos a partir de um software de US$ 100 que simplesmente reuniu as informações às quais ele tinha acesso em uma instalação no Havaí, houve temores semelhantes de estragos na coleta de espionagem. A agência passou anos alterando seus programas, a um custo de centenas de milhões de dólares, e as autoridades dizem que ainda estão acompanhando o estrago causado, mesmo dez anos depois. Em setembro, Putin concedeu a cidadania russa plena a Snowden, um funcionário de espionagem de baixo escalão; os EUA ainda tentam trazê-lo ao país para processá-lo.

Mas Manning e Snowden dizem que sua motivação foi revelar aquilo que consideraram transgressões por parte dos EUA. “Dessa vez, não parece ser uma questão ideológica”, disse Alperovitch. O surgimento de alguns dos documentos parece ter ocorrido em plataformas de games, talvez como forma de encerrar uma discussão online a respeito dos combates na Ucrânia.

“Pense nisso”, disse Alperovitch. “Uma discussão na internet que acaba virando um grande desastre para a espionagem.” / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL


segunda-feira, 10 de abril de 2023

Paulo Roberto de Almeida no YouTube: uma profusão de vídeos inéditos até para mim

Ao assistir a emissão de uma de minhas entrevista disponíveis no YouTube, constatei que existiam dezenas de outras, algumas até desconhecidas para mim mesmo. Fiz uma pequena listagem de algumas delas, inclusive para assistir as que ainda me são inéditas.

 4360. “Paulo Roberto de Almeida no YouTube”, Brasília, 10 abril 2023, 27 p. Simples transcrição parcial dos URLs de alguns vídeos encontrados no YouTube com entrevistas ou aulas minhas. Divulgado na plataforma Academia.edu (link: https://www.academia.edu/100012745/Paulo_Roberto_de_Almeida_no_Youtube)

Transcrevo a introdução deste meu arquivo: 

Paulo Roberto de Almeida no Youtube

 

Paulo Roberto de Almeida

Diplomata, professor

(www.pralmeida.org; diplomatizzando.blogspot.com; pralmeida@me.com)

Simples transcrição dos URLs de todos os vídeos encontrados no YouTube com entrevistas ou aulas minhas. 

Mera transcrição a partir de: https://www.youtube.com/results?search_query=%22paulo+roberto+de+almeida%22

Inepto como sou para as ferramentas sociais, não produzi, criei ou inseri nenhum dos vídeos abaixo nessa grande biblioteca audiovisual. Foram todos convites formulados por grupos, foros, sites educativos ou de debates, dos quais recebi convites para falar algumas coisas. Alguns eu nem desconfiava que existiam, e meu trabalho agora seria o de simplesmente colocar em ordem cronológica essas poucas dezenas de vídeos, que se fossem para alugar, já me garantiriam bilhetes de ida e volta a Paris, para comprar mais livros obviamente...





Política externa: cem dias do Itamaraty sob Lula têm reconstrução de pontes e prioridades errantes - Mayara Paixão (Folha de S. Paulo)

Cem dias do Itamaraty sob Lula têm reconstrução de pontes e prioridades errantes

Política externa liderada por Mauro Vieira e Celso Amorim faz acenos múltiplos, retoma protagonismos e vive pressão interna
Mayara Paixão
Folha de S. Paulo, 9.abr.2023


SÃO PAULO - Estava um clima tão descontraído —dentro dos padrões do rito diplomático— que, a certa altura, Celso Amorim esqueceu que seu interlocutor era russo e começou a falar em português. Do outro lado de uma mesa gigante no Kremlin, estava Vladimir Putin, que por uma hora conversou com o enviado de Lula.

O russo riu. Foi uma quebra de gelo que, para o assessor especial da Presidência e ex-chanceler, cristalizou a receptividade que nem ele esperava. Amorim, afinal, foi à Rússia vender a Putin a ideia de Lula sobre o "clube da paz" para frear a guerra em curso na Ucrânia.

A viagem representou o mais recente aceno da política externa brasileira novamente sob a batuta de Lula. Os cem primeiros dias do novo Itamaraty foram marcados por acenos múltiplos em várias direções. O desafio, agora, é esclarecer o que será prioridade.

Com a ressaca do bolsonarismo —um período que apartou o Brasil da China, seu principal parceiro econômico, e tornou o país quase um pária— o clima geral sobre a agenda externa capitaneada por Lula, pelo chanceler Mauro Vieira e por Celso Amorim é de otimismo.

Mas diplomatas e acadêmicos salientam que, daqui para a frente, é preciso medir a materialidade dessas propostas e, claro, quais sairão primeiro do papel. "Quando há uma multiplicidade de prioridades, pode-se incorrer em erros de concretização e materialização de alguns projetos", diz Hussein Kalout, pesquisador de Harvard e membro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).

Em três meses a pasta fez acenos à América do Sul aos EUA, à China —para onde Lula viaja nesta semana—, à União Europeia, à agenda ambiental, à igualdade de gênero e à Guerra da Ucrânia.

Foi também um período inicial de ampla agenda no exterior. Enquanto Lula esteve em Portugal, antes mesmo da posse, na Argentina, no Uruguai e nos EUA, Vieira fez, além dessas, outras cinco viagens oficiais —como à Alemanha, para a Conferência de Segurança de Munique, e a Índia, para reunião do G20.

Ao todo, segundo levantamento da Folha junto ao Itamaraty, foram 65 encontros bilaterais de Vieira com chanceleres e ministros desde 1º de janeiro. Ao Brasil, já vieram seis chanceleres nestes cem dias —de Japão, Grécia, França, Portugal, Uruguai e Angola.

Figuras próximas aos principais formuladores da atual política externa argumentam que a multiplicidade de acenos se trata, na verdade, da construção de pontes necessárias para fazer avançar áreas prioritárias, como a agenda climática, o combate às desigualdades e a mediação da paz e da democracia (na Ucrânia e em outros lugares, como na Venezuela, para onde Amorim também foi enviado por Lula).

O próprio chanceler adota essa linha. À Folha Vieira afirma que, nestes cem dias, o foco inicial foi "normalização" das relações com o mundo. "Transmitimos aos nossos parceiros uma mensagem clara, de que o Brasil retomou suas linhas tradicionais de política externa, como parceiro comprometido sempre com o diálogo."

"Com os canais já plenamente restabelecidos, o momento é o de trabalhar no seguimento e na retomada de projetos com nossos vizinhos sul-americanos, com a América Latina como um todo, com os EUA, China e Europa, e também com nossos parceiros africanos", acrescenta o chanceler.

Os cem primeiros dias também não deixaram de registrar certos entraves. Nos EUA, onde Lula esteve em fevereiro, a frustração se deveu ao valor enxuto destinado pelo governo de Joe Biden ao Fundo Amazônia: US$ 50 milhões (R$ 260 milhões).

Mas a proximidade da administração do democrata à do petista não deixa de ser vista com bons olhos por especialistas na agenda climática. "É impressionante como a filantropia internacional se moveu [desde a eleição de Lula]", avalia Renata Piazzon, membro da Coalizão Brasil Clima e diretora do Instituto Arapyaú.

Ela diz que caberá ao Itamaraty, em articulação com outros ministérios, saber aproveitar o momento. "Nos próximos dois ou três anos, temos que surfar nessa onda de olhares voltados para o Brasil, porque ela vai passar rapidamente"

Houve, ainda, a resposta à pressão da Alemanha —cujo premiê, Olaf Scholz, veio ao Brasil— para não enviar armas à Ucrânia. E as rusgas com Washington após a decisão de receber navios de guerra do Irã.

Com a União Europeia, o esforço é para tirar do papel um acordo comercial com o Mercosul gestado há mais de 20 anos. A expectativa vendida por Lula, de assinar as tratativas finais até o meio do ano, parece compartilhada por parte da diplomacia do bloco europeu. Em certa medida, o arranjo vem também com a expectativa de fazer deslanchar a aliança sul-americana. Há, no entanto, arestas a serem aparadas com o Uruguai, que publicamente manifesta querer arranjos por fora do Mercosul, em especial com a China.

Lula, aliás, embarca para o gigante asiático na terça (11) —iria no último dia 26, mas a viagem foi adiada pelo quadro de saúde do presidente. Em Pequim, devem ser publicizados mais de 20 acordos bilaterais.

Com a viagem, Lula também almeja mostrar "equilíbrio pragmático" entre as duas principais potências globais, EUA e China. A ideia é enfatizar a defesa de um mundo multipolar, sem alinhamento automático a Washington ou Pequim. A Guerra da Ucrânia, por óbvio, também será posta em discussão.

Mas a proposta de Lula para o chamado "clube da paz" é vista com pouco crédito mesmo entre alguns aliados. A avaliação é de que, a despeito do crédito de colocar o Brasil como um interessado em atuar pelo fim do conflito, não há materialidade na proposta.

Para o ex-chanceler Celso Lafer, a medida dialoga, em partes, com "um componente de antiamericanismo da instintiva tradição de correntes do PT". "E propicia menor abertura para a tragédia da Ucrânia e da sensibilidade política dos que a respaldam", diz.

"A credibilidade do Brasil como um terceiro em prol da paz não aumenta com a viagem de Amorim a Moscou, não acompanhada de prontas e explícitas iniciativas em relação à Ucrânia", acrescenta Lafer. "Correm o risco de serem vistos como um terceiro aparente, que não é neutro e busca se beneficiar de um conflito que é pluridimensional."

Amorim, depois de retornar da Rússia, argumentou à Folha que um cessar-fogo realmente não está na agenda imediata. Mas sinalizou a vontade de Brasília de se mostrar disponível para quando houver a possibilidade de esboçar um plano de paz.

Para Kalout, "antes da paz, que não está dada, o Brasil pode ser proponente de ações humanitárias". "Isso é muito mais importante no momento. O Brasil está fazendo todo um movimento tático para garantir um assento na mesa. Mas pode não ser da forma como o Brasil espera. É preciso recalibrar o discurso."

Outro ponto sensível tem sido a relação com ditaduras como Venezuela e Cuba. Enquanto o governo Lula parece querer ser um dos mediadores de acordos entre regime e oposição em Caracas, o discurso sobre Nicarágua sofreu alterações após Daniel Ortega ser acusado por um comitê da ONU de práticas nazistas.

Brasília chegou a ofertar nacionalidade aos mais de 300 expatriados de Ortega e tem manifestado preocupação com o contexto regional, mas evitado críticas mais assertivas à ditadura centro-americana.

Outra frente abraçada no ministério foi a igualdade de gênero. Para enviar uma mensagem aos parceiros internacionais, a pasta criou o cargo de alta representante para temas de gênero. A escolhida foi a diplomata Vanessa Dolce de Faria. O tema ganha contornos mais sensíveis, porém, nas fileiras do próprio Itamaraty, onde há pressão crescente por paridade. Entre as diplomatas, a visão é de que a pasta tem adotado boas políticas, mas que para isso tem sido necessária pressão constante e pública.

Há também um receio de que as esparsas e ainda raras nomeações femininas sejam uma espécie de token —símbolo feito para atenuar demandas e reclamações. O temor foi expressado em carta enviada pela embaixadora Irene Vida Gala ao senador Renan Calheiros (MDB-AL), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado.

No texto obtido pela reportagem, Gala, presidente da recém-fundada Associação das Mulheres Diplomatas Brasileiras, aponta que, de 23 indicações para os maiores postos diplomáticos, apenas uma é feminina —Maria Luiza Viotti, em Washington. Pouco depois da pressão, a diplomata Claudia Vieira Santos foi indicada para a Agência Internacional de Energia Atômica, em Viena.

"Tem de haver pressão continuada da nossa parte e reconhecimento, por parte da chefia do Itamaraty, de que eles precisam conversar com a gente", diz Gala. "Não adianta a chefia do ministério nos demonizar ou desqualificar como lideranças na questão de gênero. As diplomatas têm apoio dentro do governo e na sociedade civil."

Na última semana, o Itamaraty iniciou ciclos de conversa sobre gênero, raça, pessoas com deficiência e pessoas LGBTQIA+. No discurso de abertura, ao qual a Folha também teve acesso, Mauro Vieira reconheceu a necessidade de avançar na inclusão. "O Itamaraty reproduziu discriminações e preconceitos herdados do colonialismo e da escravidão. Esperamos, a partir desse diálogo, seguir avançando na dimensão étnico-racial", disse.

Para os próximos meses, também estarão na agenda da diplomacia brasileira a organização do encontro de líderes do G20, a partir de dezembro, a ser sediado no Brasil, e da cúpula dos países amazônicos, prevista para agosto. "Buscaremos respostas conjuntas para os desafios da sustentabilidade e da criminalidade ambiental", afirma o chanceler.

https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2023/04/cem-dias-do-itamaraty-sob-lula-tem-reconstrucao-de-pontes-e-prioridades-errantes.shtml

Brasil na presidência do G20: quando menos poderá ser mais - Assis Moreira, Valor

Brasil na presidência do G20: quando menos poderá ser mais

A ostentação da Índia na presidência do grupo das maiores economias vai custar R$ 500 milhões neste ano
Por Assis Moreira
Valor — Genebra, 07/04/2023

A Índia tem atualmente a presidência do G20, o grupo das maiores economias e que pretende ser o fórum para solução de grandes problemas. Sua presidência culminará com a cúpula de chefes de Estado e de governo em Nova Déli em 9 e 10 de setembro. No começo de dezembro, os indianos passarão a presidência para o Brasil, no que marcará um importante retorno do país à cena internacional.

Pelo que se viu até agora na Índia, o mínimo que se pode dizer é que o Brasil precisará evitar o show de ostentação dos indianos.

Quem chega na Índia tem a impressão de que a principal preocupação do país atualmente é a presidência do G20, como notou recentemente a revista The Economist. É difícil escapar dos grandes cartazes de propaganda espalhados pelo país com o logo do G20 e a foto do primeiroministro Narendra Modi, que tem tendências crescentemente autoritárias.

Uma observação corrente entre delegados no G20 é sobre os excessos de todo tipo. Por exemplo, na escolha de 56 cidades para acolher reuniões do grupo. Há cidade que terá uma única reunião técnica, mas precisa fazer gastos para se preparar. Somente neste mês de abril, há encontros do grupo em Siliguri/Darjeeling, Gandhinagar, Guwahati, Kumarakom, Goa, Hyderabad, Varanasi e Bhubaneswar.

A programação para cada reunião de três dias é recheada com eventos que vão de apresentação de elefantes, de música e dança, passeio de barco onde isso é possível, jantares demorados. Sobra pouco tempo para fazer reuniões bilaterais e focar mais nos temas em discussão.

Com tudo isso, vem uma fatura pesada. A India vai gastar R$ 500 milhões, pelo menos, com sua presidência do G20 – e, por tabela, com a propaganda favorável a Modi e a seu partido Bharatiya Janata Party.

Para sua presidência do G20, a Índia escolheu como tema ‘Vasudhaiva Kutumbakam’, uma expressão sânscrita encontrada em textos hindus, que significa "o mundo é uma família’.

Sobretudo, o governo de Modi tenta apresentar seu país como voz do ‘Sul Global’, ou dos países em desenvolvimento, em rivalidade com a China. O acúmulo de papelada colocada na mesa por Nova Deli também é grande

E todo esse barulho resultará em nada, ou pouco. A cooperação internacional está em frangalhos, em meio à intensidade das tensões geopolíticas. As reuniões do G20 continuam sendo marcadas pela ausência mesmo de simples declarações comuns, illustrando a dificuldade de o grupo das maiores economias se engajar em discussões construtivas por causa da invasão da Ucrânia pela Rússia.

Nas reuniões do G20, as discussões sobre a guerra na Ucrânia tomam quase toda a agenda. A maioria destaca que o conflito deve ser tratado no Conselho de Segurança das Nações Unidas, mas é inevitável insistir com a preocupação com os efeitos econômicos da invasão russa

O racha é claro no grupo: Rússia e China de um lado e os países do G7 (EUA, Alemanha, Japão, França, Itália, Canadá, Reino Unido) de outro. No meio, estão emergentes como a própria Índia, Brasil, México, Indonésia, Argentina, tentando evitar fragmentação maior. Mas a dinâmica é mesmo de desconfiança. Dificilmente haverá ações concretas, a partir do grupo, agora ou no ano que vem, quando o Brasil assumirá a presidência.

Para o Brasil, estar na presidência do G20 em dezembro, por um ano, dará a oportunidade para o país moldar a agenda, com suas prioridades e aspirações na cena internacional. Mas é preciso focar em alguns temas principais, sem querer tratar de tudo. Para ser eficaz, o governo brasileiro precisará evitar dispersão com uma agenda enorme que não teria continuidade depois.

Além disso, o Brasil não pode gastar tanto dinheiro como os indianos. Ter marca de perdulário, no estado atual das finanças nacionais, não é a melhor política. Como nota um negociador de país do G20, em referência ao que a Índia vem fazendo: 'Vocês não vão fazer assim, não é?'.

O Brasil precisará definir também com cuidado onde vai organizar o número enorme de reuniões. Os problemas de logística são conhecidos. Já será um quebra-cabeça fazer uma reunião de ministros de energia em Foz do Iguaçu. Juntar ministros de meio-ambiente em Rio Branco (Acre), então, seria um desafio adicional. Quanto à cúpula de chefes de Estado e de governo, se depender dos parceiros, seria realizada no Rio de Janeiro.

Depois do show de exageros da Índia, a presidência brasileira do G20 poderia mostrar que ‘menos pode ser mais’ em certas ocasiões. Mas é preciso combinar com o presidente Lula.

Já ouviram falar de "desconhecimentos desconhecidos"? - Paulo Roberto de Almeida

 Já ouviram falar de "desconhecimentos desconhecidos"?

Pois é...

Não sei por quais razões, exatamente, Lula defende tanto Cuba, Venezuela, Nicarágua, e agora China e Rússia. Ou melhor, penso que sei, mas como não tenho provas documentais disponíveis, vou me eximir de acusá-lo disso ou daquilo. Basta constatar, e ninguém me dirá que minha afirmação é falsa. Ele mesmo confirmou isso muitas vezes.
Eu sei por quais razões eu me oponho a esses países, ou melhor, a seus governos do presente. Simplesmente porque são DITADURAS, não sei se Lula sabe exatamente o que isso significa.
Eu sei, como acadêmico. Em minha qualidade de livre pensador e participante dos debates em torno das políticas públicas, eu posso dizer o que penso, sem precisar esconder, sem temer retaliações, a não ser a crítica de colegas acadêmicos ou até de funcionários públicos e dirigentes governamentais. Mas ninguém me impedirá de dizer o que eu penso.
Ora, isso é impossível em qualquer um dos países citados, e em dezenas de outros. Os acadêmicos, membros de think tanks, professores, jornalistas, cidadãos comuns NÃO PODEM escrever, dizer, publicar posturas criticas ao governo, a não ser em termos muito velados e apenas em algumas circunstâncias. 
Isso é DITADURA, coisa da qual tenho HORROR!
Apenas por isto, o que para mim é muito.
Sendo amigo da LIBERDADE, só posso lamentar que meus confrades nesses países não sejam livres para escrever o que pensam, ou até para defender o governo (até para isso, eles precisam passar pela censura do regime, para verificar que os seus elogios estão dentro das conformidades do momento). 
Acho que Lula ainda não aprendeu isso, ou não quer, ou não pode.
Mas isso talvez só seja esclarecido um dia.
Lembram-se da queda do Muro de Berlim?
Foi tudo tão rápido que a Stasi, a política política, não teve tempo de apagar os arquivos, destruir papéis comprometedores.
Os cubanos já tiveram muito tempo para fazê-lo, assim como russos e chineses...
Mas, sempre aparece alguma coisa, algum Wikileaks cubano, chinês ou russo...
Aguardemos...
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 10/04/2023

Picassos iranianos?

 

1,000 Words

A painting by Emad — an Iranian artist in Tehran who described himself as “an objector to the Islamic Republic” — that represents violence perpetrated by the Islamic Revolutionary Guard Corps. (Emad)

A painting by Emad — an Iranian artist in Tehran who described himself as “an objector to the Islamic Republic” — that represents violence perpetrated by the Islamic Revolutionary Guard Corps. (Emad)

A painting by Emad representing Iranian government repression and propaganda aired by state media. (Emad)

A painting by Emad representing Iranian government repression and propaganda aired by state media. (Emad)

My colleague Miriam Berger profiled three Iranian artists whose recent work “reflects the hope, turmoil and tragedy of the popular uprising and the violent crackdown that followed.”“It was incredibly risky to film or photograph the anti-government protests that swept Iran after the September death of Mahsa Amini. In the privacy of their homes and studios, however, some Iranian artists began to take inspiration from the scenes on the streets.”

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Meu mais recente livro – que não tem nada a ver com o governo atual ou com sua diplomacia esquizofrênica, já vou logo avisando – ficou final...