Declarações retóricas sobre direitos humanos pode até ser uma evidência, prima facie, de que algo está mudando, mas nem sempre para melhor, pois deixar de fazer grandes bobagens feitas antes é apenas uma evidência, enviesada, de que se está corrigindo o que de errado se fez antes (retirando o bode da sala), não necessariamente de que se vai passar a fazer as coisas certas a partir de agora.
Os verdadeiros testes ainda não vieram. Pode ser que apareçam proximamente.
Paulo Roberto de Almeida
Radares atentos à visita de Chávez
Coluna Conexão diplomática - Silvio Queiroz
Correio Braziliense, 07.05.2011
Observadores tentarão uma vez mais discernir o que muda e o que se mantém na política externa brasileira com a troca de governo
Muita gente vai estar de olhos e ouvidos atentos para os mínimos detalhes do encontro desta terça-feira entre a presidente Dilma e o colega Hugo Chávez, que volta a Brasília depois de um galante beija-mão na posse e duas visitas adiadas. Em diferentes círculos diplomáticos, observadores tentarão uma vez mais discernir o que muda e o que se mantém na política externa brasileira com a troca de governo. Até aqui, uma das linhas de continuidade mais enfatizadas é justamente a prioridade para a integração sul-americana — uma empreitada na qual Lula teve de empenhar repetidas vezes seu prestígio em operações deixa-disso envolvendo o presidente venezuelano, muito especialmente com a Colômbia sob governo de Álvaro Uribe.
Para os Estados Unidos, o Brasil tem sido nos últimos anos um intermediário precioso com o bloco bolivariano, que inclui ainda Bolívia, Equador e Nicarágua, sem falar em Cuba. Mais de uma vez, a diplomacia americana fez notar o conforto de contar com um líder regional sob comando “equilibrado” e “responsável” em uma vizinhança que, por desatenção de Washington, habituou-se a seguir rumos próprios. Mas também os europeus, que sempre sondaram com interesse a relação Brasília-Caracas, acompanham agora o primeiro encontro bilateral entre Dilma e Chávez na expectativa de divisar quais serão as linhas de colaboração e até onde os conselhos do Planalto continuarão a ter ouvido em Miraflores.
Noves fora, depois do evidente ajuste de tom na relação com o Irã, marcada pela aprovação ao envio ao país de um relator da ONU para a situação dos direitos humanos, a Venezuela é vista como um novo teste sobre o alcance da reorientação. Na China, o tema foi claramente esquivado. E logo mais, em algum momento, será o momento de aferir como Dilma se comportará em relação a Cuba.
Rédea curta
Uma mudança que não escapou à vista dos círculos diplomáticos é a sintonia mais estreita entre Planalto e Itamaraty desde o começo do novo governo. Ao menos nesses primeiros três meses, ficou evidente que Dilma e o ministro Patriota conversam com intensidade e frequência. Segundo circula, a autonomia de outros ministérios para contatos externos está sendo visivelmente disciplinada. “Já falou com o Patriota?”, é a resposta-padrão que os titulares das diversas pastas têm recebido quando anunciam à presidente alguma iniciativa além-fronteiras.
O galho de cada um
Igualmente sintomático tem sido o perfil bem mais discreto do assessor internacional do Planalto, Marco Aurélio Garcia, em especial nas relações com os governos vizinhos. É verdade que foi ele fez uma visita inaugural estratégica a Cuba, no início de março. Mas, ao contrário do que foi uma constante nos anos Lula, foi Patriota em pessoa quem começou a estabelecer elos com os vizinhos sul-americanos, uma área que o ex-presidente gostava de explorar mais de perto, enviando seu assessor para colher impressões e transmitir mensagens.
Burca justa
E foi justamente de Chávez, afinal, que veio a nota dissonante na reação à morte de Osama bin Laden. Enquanto os primeiros governos começavam a congratular-se com Barack Obama, o presidente venezuelano antecipou-se até mesmo a Fidel Castro na condenação da operação dos comandos americanos no Paquistão.
E, se Caracas chamou a atenção pela eloquência, a reação brasileira foi vista em certas áreas como acanhada demais, quase envergonhada. Embora o chanceler tenha falado sobre o tema, a ausência de uma nota oficial do governo foi notada. E a impressão de alguns diplomatas foi de que o país pareceu pouco à vontade para dizer como viu a notícia propriamente dita.
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