quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Pensamento Diplomatico Brasileiro: artigo-apresentacao de Paulo Roberto de Almeida

Um dos artigos mais recentes publicados, reproduzido abaixo: 


1113. “A política externa brasileira, pelos seus principais atores e pensadores”, [Apresentação do livro “Pensamento Diplomático Brasileiro, formuladores e agentes da política externa, 1750-1964” (Brasília: Funag, 2013, 3 vols., p. 1138; ISBN: 978-85-7631-462-2)], Boletim ADB (Ano 20, n. 83, outubro-novembro-dezembro 2013, p. 33-34; ISSN: 0104–8503). Relação de Originais n. 2526.


Prata da Casa - Boletim ADB: 4to. trimestre 2013
Seção Especial sobre obra coletiva da FUNAG

Paulo Roberto de Almeida
Boletim da Associação dos Diplomatas Brasileiros
 (Ano 20, n. 83, outubro-novembro-dezembro 2013, p. 33-34; ISSN: 0104–8503).

A política externa brasileira, pelos seus principais atores e pensadores

José Vicente Pimentel (organizador):
Pensamento Diplomático Brasileiro: Formuladores e Agentes da Política Externa (1750-1964)
(Brasília: FUNAG, 2013, 1138 p. em 3 volumes; ISBN 978-85-7631-462-2)

A Fundação Alexandre de Gusmão, a instituição vinculada ao Itamaraty que mais se aproxima do conceito anglo-saxão de think tank, montou um projeto à altura de suas responsabilidades intelectuais, consistindo numa coletânea de estudos analíticos sobre as ideias e as ações de 26 personagens relevantes das relações internacionais do Brasil, entre diplomatas de carreira, políticos e intelectuais, que moldaram o pensamento e a ação da diplomacia brasileira ao longo de mais de dois séculos. Assinam as colaborações, sob a coordenação do presidente da Funag, quinze diplomatas e treze acadêmicos, todos especialistas nos personagens ou nos períodos enfocados nas três partes da obra.
O ponto de partida da obra antecede a constituição formal do Estado brasileiro, em 1822, já que não se poderia excluir de uma obra de referência a contribuição do chamado “avô da diplomacia brasileira”, o personagem que, aliás, dá o nome à Fundação que se responsabilizou pelo projeto: Alexandre de Gusmão. Ele foi, justamente, o foco do primeiro capítulo substantivo do livro, na parte que tratou das concepções fundadoras da diplomacia brasileira. Essa parte ainda abriga alguns dos “pais fundadores” da nação e do Estado brasileiro, assim como da própria diplomacia: José Bonifácio, seguido de Paulino Soares de Souza, Duarte da Ponte Ribeiro, Francisco Varnhagen, Honório Hermeto Carneiro Leão, o Visconde do Rio Branco e o “mais longevo” secretário geral do ministério, Cabo Frio.
A segunda parte, voltada para a política internacional da Primeira República, tratou de alguns grandes nomes que vieram do Império, mas que engrandeceram a diplomacia republicana, começando por Joaquim Nabuco. O Barão do Rio Branco ocupa papel de destaque nessa fase, mas também seus amigos, e eventuais auxiliares, Ruy Barbosa e Euclides da Cunha, que também cumpriram missões diplomáticas sem serem profissionais do serviço exterior. Dois outros diplomatas, Manoel de Oliveira Lima, também historiador e articulista, e Domício da Gama, completam esse primeiro ciclo republicano. Aqui entrou também o jurista Afrânio de Melo Franco, que iniciou uma carreira diplomática, foi para a política, exerceu diversas missões diplomáticas durante a República Velha – entre elas a frustrada missão de colocar o Brasil no conselho da Liga das Nações – mas que também foi o primeiro chanceler do novo regime, em 1930, e que continuou no início do governo provisório de Getúlio Vargas.
A terceira e última parte cobre toda a era Vargas e a República de 1946, começando pela própria reforma do Estado e a modernização da diplomacia, iniciada sob Afrânio de Melo Franco e continuada por Oswaldo Aranha, o homem que terminou de unificar as carreiras do ministério, e que não só liderou a revolução de 1930, como também manteve firmemente o Brasil no campo democrático durante os tempos sombrios da ascensão do nazi-fascismo e do Estado Novo no Brasil. O nome que primeiro representou a diplomacia multilateral do Brasil foi o de Cyro de Freitas Valle, que teve em sua vertente econômica a importante contribuição de Edmundo Penna Barbosa da Silva, ambos relativamente desconhecidos, hoje, dos mais jovens. Outros nomes que ilustraram tanto a era Vargas quanto o período democrático ulterior foram os do empresário e político José Carlos de Macedo Soares (chanceler nos dois regimes) e o de um militar, o Almirante Álvaro Alberto, bastante identificado tanto com o CNPq quanto com o programa nuclear brasileiro.
O final do período, cobrindo a fase otimista da presidência JK e os anos turbulentos dos governos Jânio Quadros e João Goulart, está representado pelas figuras do sociólogo Hélio Jaguaribe, do historiador José Honório Rodrigues, pelo poeta Augusto Frederico Schmidt, e pelos juristas e políticos Afonso Arinos e San Tiago Dantas. Finalmente, encerra o exame das grandes personalidades, o nome do embaixador Araújo Castro, o último ministro de Goulart e uma das cabeças que continuou a moldar a política externa brasileira nos anos à frente, influente até nossos dias.
Esta obra afirma-se como um dos mais sérios projetos de natureza intelectual implementados pelo Itamaraty. Não apenas uma coleção de biografias sintéticas, com muitas considerações analíticas sobre as ideias e ações dos personagens selecionados, este empreendimento pode ser visto como um exemplo de história intelectual, embora vários personagens tenham atuado mais pela prática do que sob a forma de escritos. Todos eles produziram narrativas sobre como viam e sobre como deveria ser a política externa, nos expedientes de serviço ou nas obras e memórias produzidas. Foram estadistas, na concepção lata da palavra, no sentido em que uma certa ideia do Brasil, geralmente grandiosa, estava sempre presente nesses escritos, a guiar-lhes os passos nas decisões mais relevantes.
Foi essa tradição que o projeto pretendeu resgatar e expor. Com as eventuais limitações que ela possa conter, este livro constitui um esforço pioneiro de identificação e de apresentação das ideias e dos conceitos que balizaram, orientaram ou guiaram a formulação e a execução prática das relações exteriores do Brasil, desde seu alvorecer, enquanto Estado autônomo, até quase o final do segundo terço do século 20; espera-se que ela possa servir de inspiração para outros empreendimentos do gênero ou para a continuidade do mesmo projeto. Referência doravante indispensável para o estudo do pensamento diplomático brasileiro, o projeto de fato merece continuar.

Paulo Roberto de Almeida

 [Hartford, 7/11/2013]

Os três volumes podem ser acessados nestes links respectivos:



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